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História de vida de professoras alfabetizadoras e suas práticas docentes : transformar ou repetir ?

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Academic year: 2017

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(1)

KARINE HEPP GUIMARÃES ProfªDrª Ondina Pena Pereira

Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Programa de Pós-Graduação

Stricto Sensu

Mestrado em Psicologia

HISTÓRIA DE VIDA DE PROFESSORAS ALFABETIZADORAS

E SUAS PRÁTICAS DOCENTES: TRANSFORMAR OU

REPETIR?

Brasília - DF

2014

(2)

SANDRA RAQUEL DE ALMEIDA

HISTÓRIA DE VIDA DE PROFESSORAS ALFABETIZADORAS E SUAS PRÁTICAS DOCENTES: TRANSFORMAR OU REPETIR?

Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado em Psicologia da Universidade Católica de Brasília como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Psicologia

Orientador: Prof.ª Dr.ª Maria Aparecida Penso

(3)

7,5cm

Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB

A447h Almeida, Sandra Raquel de.

História de vida de professoras alfabetizadoras e suas práticas docentes: transformar ou repetir? / Sandra Raquel de Almeida – 2014.

158 f.; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2014.

Orientação: Profa. Dra. Maria Aparecida Penso

(4)

DEDICATÓRIA

À Vera Manzanares (in memoriam), por ser o meu principal referencial de professora

alfabetizadora em contexto de adversidade em função do seu amor pela profissão e aos seus tantos alunos aos quais ela alfabetizou. À Dona Maria, minha primeira professora no interior de Unaí, Minas Gerais.

A todos os meus alunos que, ao longo de minha trajetória, revelaram meus grandes professores ao desafiar o que eu já tinha como certeza e me obrigar superar as minhas

limitações.

Às minhas colegas participantes por

generosamente ter emprestado suas histórias de vida para que esta pesquisa pudesse ser realizada.

(5)

AGRADECIMENTOS

Em fim, chegamos ao final de mais um ciclo. Digo chegamos porque carrego interiorizados todos que passaram por minha vida. Alguns por curtos períodos, outros por períodos mais prolongados. Se a nossa gênese humana é social, cada um com quem interagi durante o meu percurso deixaram as suas marcas em meu processo de humanização. Alguns me acolhendo, incentivando, reunindo meus cacos. Outros duvidando de minha capacidade, me desencorajando, tentando minar minhas esperanças. E outros, muito especiais, barrando minha autodestrutividade, me fazendo romper com preconceitos, mitos e lealdades asfixiantes. Este feito, eu devo aos meus professores muito especiais. Assim, agradeço:

À Professora Drª Maria Aparecida Penso por sua árdua tarefa na orientação dessa dissertação com medidas enérgicas, com muita ética e profissionalismo.

À Professora Drª Esther Pillar Grossi que trabalhou na base da minha formação disponibilizando os fundamentos teóricos do pós-construtivismo que é a âncora de minha prática docente.

À Drª antropóloga Ana Luisa Rocha que, ao longo de nossa formação no GEEMPA questionava constantemente nossas ações pautadas no senso comum para que pudéssemos fundamentá-las em uma urdidura de conceitos que se articulam e se complementam que nos permitisse lidar com a contradição e com as advercidades.

Ao psicanalista Miguel Massollo que, durante minha participação no GEEMPA, levou-me a encantar pelo inconsciente e mergulhar em minha própria subjetividade para melhor lidar com a subjetividade de meus alunos.

A todos os professores de minha trajetória escolar e de formação profissional.

A todos os professores colegas que em algum momento tivemos a oportunidade de aprender e ensinar juntos.

Às minhas companheiras do grupo de estudo: Janerita Santos de Andrade, Maria Alves do Nascimento, Maristena Gonçalves Magalhães, Simone de Jesus Campos e Stella Lopes de Sousa por todo o trabalho que já realizamos em parceria e por tudo que aprendemos nesta convivência.

À professora Maria José Rocha Lima pela parceria nosprojetos de formção e na publicação dos livros de didática da alfabetização.

Às participantes da banca de qualificação: Profª Drª Claudia Fukuda, Profª Drª Viviane Neves Legnani e Profª Drª Lêda Gonçalves de Freitas por suas valiosas contribuições.

Às participantes da banca de defesa: Profª Drª Viviane Neves Legnani, Profª Drª Lêda Gonçalves de Freitas e Profª Drª Vânia Maria Medeiros por suas generosidades em contribuir com a finalização deste trabalho.

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AGRADECIMENTOS ESPECIAIS

Ao Pai Criador que nos concedeu esta oportunidade de aprimoramento no educandário terrestre.

Aos grandes educadores da humanidade que embora demoremos a aprender, nunca desistem de nós. Dentre tantos destaco Jesus Cristo, Maria de Nazaré, Paulo de Tarso, Francisco de Assis, Buda, Ganhdi, Alan Kardec, Madre Teresa de Calcutá, Pai João de Aruanda e Chico Xavier.

Aos educadores da alma, que chegam com suas artes à frente, aonde a ciência só chega muito tempo depois. Em especial, todos os escritores brasileiros que escrevem com sensibilidade e inteligência, dando destaque à Castro Alves.

A todos os educadores da mente que abdicam suas vidas a fazerem a humanidade avançar no campo das ciências e da tecnologia.

A todos meus familiares, amigos e parceiros de ideais que trabalham por um mundo mais justo, mais fraterno, mais inteligente e mais humanizado.

(7)

Se eu tivesse alguma coisa que me fosse útil, mas prejudicasse minha família,

eu a afastaria do meu espírito.

Se soubesse alguma coisa útil à minha família, mas não à minha pátria,

procuraria esquecê-la.

Se soubesse alguma coisa útil à minha pátria, mas prejudicial à Europa,

ou então, útil à Europa

e prejudicial ao gênero Humano, Eu a veria como crime.

(8)

RESUMO

Referência: ALMEIDA, Sandra Raquel de. História de vida de professoras alfabetizadoras e suas práticas docentes: transformar ou repetir? 2014. 157 f. Dissertação de Mestrado. Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2014.

A presente pesquisa tem como objetivo compreender os elementos presentes nas narrativas da história de vida de professoras alfabetizadoras e suas influências na escolha profissional, em suas práticas docentes e em suas concepções sobre as dificuldades de seus alunos no processo de aprendizagem da linguagem escrita que poderão identificar componentes importantes no processo de formação docente. Apresenta como aporte teórico a psicologia Histórico-Cultural e a psicossociologia francesa e outros autores que dialogam com os pressupostos aqui selecionados. A construção teórica perpassa pelo estudo do processo de aprendizagem na perspectiva da psicologia Histórico-Cultural; estudo dos conceitos de vulnerabilidade, exclusão social, poder, alteridade, afetividade e comunicação pedagógica em interface com o fracasso escolar e a relação professor-aluno; estudo da história de vida do professor entrelaçada ao processo sócio-histórico-cultural da instituição escolar; e, a construção cultural do papel do professor nesse processo, os motivos de sua escolha da profissão docente, sua atuação profissional e concepções sobre as questões relacionadas aos problemas de aprendizagem da linguagem escrita. É utilizada a abordagem qualitativa em busca da construção de um conhecimento construtivo-interpretativo (GONZÁLEZ REY, 2005). As participantes desta pesquisa foram cinco professoras atuantes com alunos em contexto de vulnerabilidade que apresentam problemas na aprendizagem da linguagem escrita. Os instrumentos utilizados foram roteiros de entrevista semiestruturada e roteiro para a construção de relatos autobiográficos. Os procedimentos de coleta envolveram contatos com as Regionais de Ensino e posteriormente com as professoras para apresentação da pesquisa, realização de entrevista semiestruturada, além de orientações para a construção dos relatos autobiográficos. Para a análise dos dados foram levantados os indicadores e construídas três Zonas de Sentido (GONZALEZ REY, 2005). A primeira foi nomeada: Por que ser professora?, onde verificou-se que o principal motivo da escolha profissional foram a necessidade de ajudar a família, o incentivo familiar aos estudos, e, consequentemente a promessa de entrada fácil no mercado de trabalho; a segunda, denominada: Ser professora: repetir ou transformar a experiência, possibilitou acompreensão de que suas atuações docentes foram fortemente influenciadas por suas experiências escolares, havendo uma tentativa de transformação das experiências vividas, garantindo a visibilidade aos alunos com maiores dificuldades de aprendizagem e maior aproximação afetiva com estes alunos. No entanto, a falta de referencial e formação teórica e metodológica consistentes leva-as a um movimento paradoxal de ação e/ou paralização diante da adversidade e da heterogeneidade intelectual, social e cultural de seus alunos. A terceira Zona de Sentido: Se sua família fosse como a minha, você aprenderia, discutiu o fato das participantes atribuírem a família e ao aluno as causas das dificuldades de aprendizagem. Diante dos resultados obtidos conclui-se que o maior desafio encontra-se em mexer nas bases da formação para a docência que se tem revelado ineficaz na formação de competências profissionais que abarque um campo teórico conceitual consistente, disponibilizando ao professorado signos culturais que o leva a abandonar o senso comum, para lidar com a complexidade que exige sua atuação docente.

(9)

ABSTRACT

Reference: ALMEIDA, Sandra Raquel. Life Story of literacy teachers and their teaching practices: turning or repeat? 2014. 151 f. Master Thesis. Catholic University of Brasilia, Brasilia, 2014.

This research aims to understand the elements present in the narratives of the life history of literacy teachers and their influence on career choice in their teaching practices and their views on the difficulties of their students in the learning process of written language that may identify important components in the teacher training process. Introduces psychology as the theoretical and historical-cultural social psychology and other French authors that dialogue with the assumptions selected here. The theoretical construction permeates the study of the learning process from the perspective of historical-cultural psychology; study of the concepts of vulnerability, social exclusion, power, alterity, affective and pedagogical communication interface with school failure and the teacher-student relationship; study of history of life intertwined socio- cultural-historical process of the school teacher, and the cultural construction of teachers' role in this process, the reasons for their choice of the teaching profession , their professional practice and conceptions on issues related to learning problems written language. The qualitative approach is used in seeking to build a constructive and interpretative knowledge (GONZÁLEZ REY, 2005). The participants in this study were five active teachers with students in the context of vulnerability that have problems in learning the written language. The instruments used were semi-structured interview scripts and screenplay for the construction of autobiographical accounts. The collection procedures involved contacts with the Regional Education and later with the teachers to present the research, conducting semi-structured interviews, as well as guidelines for the construction of autobiographical accounts. For the data analysis, the parameters were investigated and constructed three zones Sense ( REY GONZALEZ, 2005). The first was named: Why be a teacher, where it was found that the main reason for career choice were the need to help the family, encouraging family studies, and thus the promise of easy entry into the labor market, ? second, termed : Being a teacher: transforming or repeating the experience, enabled acompreensão that their teaching performances were strongly influenced by their school experiences , there is an attempt to transform the experiences, ensuring visibility to students with major learning difficulties and closer affective with these students. However, the lack of theoretical and methodological framework and consistent training leads them to a paradoxical movement of action and / or paralysis in the face of adversity and the intellectual, social and cultural diversity of its students. The third zone Sense: If your family was like mine, you learn, participants discussed the fact that attributing the family and the student with the causes of learning disabilities. Based on these results it is concluded that the greatest challenge lies in stirring the grassroots training for teaching which has proved ineffective in the formation of professional skills encompassing a consistent conceptual theoretical field, providing the professorship cultural signs that leads to abandon the common sense to deal with the complexity that demands their teaching performance.

(10)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...14

OBJETIVO GERAL...20

OBJETIVOS ESPECÍFICOS...20

2 REVISÃO DE LITERATURA...21

2.1 O PROCESSO DE APRENDIZAGEM SEGUNDO A PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL DE VIGOTSKY...21

2.2 A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO EM CONTEXTOS DE VULNERABILIDADE E EXCLUSÃO SOCIAL E O PROCESSO DE APRENDIZAGEM...27

2.2.1 O processo histórico de construção da relação professore-aluno em contexto socialmente desfavorecido...41

2.3 O FRACASSO ESCOLAR EM CONTEXTO DE VULNERABILIDADE E EXCLUSÃO SOCIAL...44

2.4 A HISTÓRIA DE VIDA DO PROFESSOR E SUA PRÁTICA DOCENTE...52

2.4.1 O papel social do professor e sua prática docente...52

2.4.2 História de vida e escolha da profissão docente...54

3 MÉTODO...59

3.1 O PERCURSO DA PESQUISADORA...61

3.2 PARTICIPANTES ... 64

3.3 O CONTEXTO DA PESQUISA...65

3.4 INSTRUMENTO...65

3.5 APROXIMAÇÃO DA REALIDADE...66

3.7 PROCEDIMENTOS DA COLETA DE DADOS... ... ..67

3.6 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DE DADOS... ... ..68

4 RESULTADOS ...71

4.1 HISTÓRIA DE VIDA E TRAJETÓRIA SOCIAL DAS PARTICIPANTES...72

4.1.1 Fátima: a concretização do projeto familiar...72

4.1.1.1 História familiar...72

4.1.1.2 História escolar...73

(11)

4.1.1.4 História da atuação profissional docente...75

4.1.1.5 Concepções sobre as dificuldades de aprendizagem de seus alunos...76

4.1.2 Mariana: o desejo de aprender cavando oportunidades...77

4.1.2.1 História familiar...77

4.1.2.2 história escolar...77

4.1.2.3 História da escolha profissional...78

4.1.2.4 História da atuação profissional docente...78

4.1.2.5 Concepções sobre as dificuldades de aprendizagem de seus alunos...80

4.1.3 Joice: a vergonhosa comportada...80

4.1.3.1 História familiar...80

4.1.3.2 História escolar...81

4.1.3.3 História da escolha profissional...82

4.1.3.4 História da atuação profissional docente...82

4.1.3.5 Concepções sobre as dificuldades de aprendizagem de seus alunos...84

4.1.4 Marluce: a guardiã da tradição familiar de sacralização da escola...85

4.1.4.1 História familiar...85

4.1.4.2 História escolar...86

4.1.4.3 História da escolha profissional...87

4.1.4.4 História da atuação profissional docente...88

4.1.4.5 Concepções sobre as dificuldades de aprendizagem de seus alunos...90

4.1.5 Clarice: a fome insaciável por conhecimento derrubando obstáculos...91

4.1.5.1 História familiar...91

4.1.5.2 história escolar...92

4.1.5.3 História da escolha profissional...93

4.1.5.4 História da atuação profissional docente...94

4.1.5.5 Concepções sobre as dificuldades de aprendizagem de seus alunos...97

5 DISCUSSÃO...98

5.1 1ª ZONA DE SENTIDO - POR QUE SER PROFESSORA?...98

5.2 2ª ZONA DE SENTIDO - SER PROFESSORA: REPETIR OU TRANSFORMAR A EXPERIÊNCIA...107

5.3 3ª ZONA DE SENTIDO - SE SUA FAMÍLIA FOSSE COMO A MINHA, VOCÊ APRENDERIA...126

(12)

REFERÊNCIAS...144

APÊNDICE A ...152

1 ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA...152

2 ROTEIRO PARA O RELATO AUTOBIOGRÁFICO...154

ANEXO – A DOCUMENTAÇÃO...155

PARECER DE APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA DE PSICOLOGIA...155

ANEXO – B...157

(13)

1 INTRODUÇÃO

O tema desta pesquisa é a história de vida do professor, sua escolha pela carreira docente, sua atuação profissional e suas concepções sobre as dificuldades dos alunos no processo de aprendizagem da linguagem escrita.

O interesse pelo tema em questão foi gestado ao longo de minha trajetória profissional como alfabetizadora trabalhando com alunos de escola pública em contexto de vulnerabilidade e exclusão social.

Ingressei na carreira do magistério pela primeira vez em 1989 por meio de concurso público no entorno do Distrito Federal. Lá sofri profundamente, por perceber as necessidades dos alunos e não possuir recursos culturais nem um grupo de sustentação entre pares e/ou gestores que me permitisse ensiná-los com eficácia. Seis anos mais tarde passei a pertencer ao quadro efetivo dos professores da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF), na época, Fundação Educacional do Distrito Federal (FEDF). Mais uma vez deparei com as minhas limitações ao assumir a responsabilidade docente diante de um público semelhante ao da primeira experiência. Desde então, interessei-me profundamente pela questão da alfabetização, sendo constantemente incomodada com a pouca eficácia da escola na promoção do acesso à linguagem escrita em que os excluídos de outros segmentos sociais e segregados do acesso aos bens culturais socialmente valorizados eram os mesmos a não obterem êxito em seus processos de alfabetização. Diante desta realidade, recusando a aceitar como causa das não aprendizagens os determinantes focados no indíviduo e na família, tive acesso a uma formação que ao mesmo tempo me levava a debruçar sobre os conceitos relacionados ao processo de construção do conhecimento que consideravam as instâncias cognitiva e subjetiva e associá-los à construção de uma prática que reconhece o sujeito como agente de seu processo de construção do conhecimento a partir de suas interações sociais e culturais. A partir desse entrelaçamento entre teoria e prática, consegui alcançar êxito no processo de ensino e aprendizagem com estes alunos que tanto me inquietavam e inquietam. Esta experiência me fez compreender que o processo de alfabetização em contexto de vulnerabilidade e exclusão social é um fenômeno complexo que envolve um emaranhado de aspectos sociais, culturais, psíquicos e políticos.

(14)

com a geografia física e política do país, sendo que, a pouca efetivação da alfabetização centra-se nas regiões que concentram outras carências de cunho material e investimento político afetando diretamente a população menos favorecida. Esses dados revelam que, a taxa de aprovação na 2ª série, que equivale ao 3º ano do Ensino Fundamental referente ao ano de 2005, obteve o seguinte resultado: dentre os cinco Estados com maiores índices de aprovação em 2005 encontravam-se: São Paulo, 93,8%; Santa Catarina, 89,8%; Rio Grande do Sul, 86,8%; Roraima, 84,3%; e Minas Gerais, 83,8%. Entre os cinco Estados com menor índice de aprovação nesta mesma etapa de escolaridade apresentavam-se: Bahia, 63,2%; Rio Grande do Norte, 65%; Pará, 66,3%; Alagoas, 66,5%; e Sergipe, 67,1%. Já o Distrito Federal, comparado aos demais Estados, ocupou a 8ª posição brasileira no índice de aprovação com 82,6%. (IDEB, 2007). Esses dados são importantes porque, havendo em vários Estados brasileiros a estrutura organizacional por ciclo que vem em uma crescente, as taxas de aprovação de anos subsequentes não revelam um panorama nacional de proficiência em leitura e escrita, uma vez que nesta forma de organização, geralmente a promoção é automática nos dois primeiros anos do Ensino Fundamental.

Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010) revelam que, embora os índices de reprovação sejam inferiores ao da década de 90, o senso de 2009 a respeito da proporção por faixa etária de crianças e adolescentes que se encontram frequentando escola em nível adequado à sua idade, ainda aponta para uma forte desigualdade entre os mais pobres e os mais ricos. Esses dados mostram que, do percentual total da população de adolescentes brasileiros entre 15 a 17 anos, dentre os 20% daqueles identificados como pertencentes à camada mais pobre da sociedade, apenas 32,0% estavam no Ensino Médio em 2009. Já os 20% do total de adolescentes brasileiros pertencentes à camada mais rica, 78% estavam cursando o Ensino Médio no mesmo período.

(15)

Os dados oficiais consultados também apresentam um acompanhamento estatístico sobre as taxas de analfabetismo a partir dos 10 anos no período de 1992 a 2011, assim como, a taxa de analfabetismo funcional entre 2001 e 2009. Em 1992 a taxa de analfabetismo a partir de 10 anos correspondeu a 16,4 %. Uma década mais tarde manteve 10,9%, e em 2011 o percentual apresentado foi de 7,9%. Quanto ao analfabetismo funcional, este é compreendido nos documentos oficiais como referente àqueles que manejam minimamente o código alfabético, mas enfrentam dificuldade em utilizá-lo na sua função social correspondente à capacidade de efetivar a comunicação por meio da leitura e escrita. Dentro desta categoria os índices disponibilizados pelo IBGE são de 27,3% em 2001, tendo caído apenas para 20,3% em 2009.

Em se tratando especificamente do Distrito Federal, para minimizar a repetência e evasão escolar, os órgãos oficiais vêm promovendo modificações na organização do currículo da Rede Pública de Ensino. Para isto vem implantando diferentes programas de alfabetização ao longo dos anos: o Projeto ABC em 1984, o CBA em 1985 e a Escola Candanga em 1997. Atualmente, o programa oficial de alfabetização da SEEDF é o Bloco Inicial de Alfabetização (BIA), que é a organização em ciclos de aprendizagens em contraponto à seriação (SEEDF, 2012).

O BIA surgiu como diretriz para atender a demanda de implantação do Ensino Fundamental de 9 anos na Rede Pública do Distrito Federal em razão da promulgação da Lei nº 3.483, de 25 de novembro de 2004. Em 2005, a SEEDF começou a cumprir esta lei implantando o projeto BIA primeiramente na Região Administrativa de Ceilândia, ampliando gradativamente até cobrir todas as Regionais de Ensino do DF em 2009. Em 2006, o documento elaborado segundo os princípios metodológicos da Proposta Pedagógica do BIA foi aprovado pelo Conselho de Educação do Distrito Federal através do Parecer nº 212/2006 e instituída pela SEEDF por meio da Portaria nº 4, do dia 12 de janeiro de 2007. (SEEDF, 2012).

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desenvolvimento de projetos interventivos para atender às necessidades dos alunos que não apresentam desempenho compatível com o esperado em sua turma. Para oferecer suporte aos alfabetizadores, o programa criou para cada Regional de Ensino, os Centros de Referências em Alfabetização (CRAs), composto por equipes de coordenadores do programa de alfabetização e letramento.

Embora a implantação do BIA represente um avanço e demonstre maior preocupação das políticas públicas do Distrito Federal voltadas para a alfabetização, os dados do Censo do Distrito Federal (2006 a 2010), revelaram que o índice de retenção na 1ª e 2ª séries ainda correspondia a 15%. Já os dados mais recentes informam que em 2012, no 3º Ano do Ensino Fundamental, 19,07% do total desses alunos foram retidos na Rede Pública de Ensino, somado a 352 alunos afastados por abandono, atingindo um total de 7.448 alunos não beneficiados intelectualmente em relação ao aprendizado da linguagem escrita (SEEDF, 2012).

O percurso sócio histórico de escolarização das camadas populares no Brasil, em particular, no Distrito federal, mostra que, apesar da entrada na escola por força de lei, ainda hoje parte dessa população é barrada à ascensão intelectual no processo inicial de escolarização, conforme demonstrado nos dados acima. Nesse caso, ainda temos no centro das decisões políticas brasileiras, um número expressivo de crianças e adolescentes que não se beneficiaram intelectualmente em relação ao aprendizado da linguagem escrita com o ensino da Rede Pública do Distrito Federal em 2012.

A partir da década de 90, temas relacionados à relação professor-aluno passaram a ocupar lugar de preocupação dos pesquisadores. Aquino (1998), discutiu a questão pelo enfoque da violência escolar e crise da autoridade. Almeida (1993) trouxe para o centro da discussão educacional brasileira a questão da afetividade e o desejo na relação professor-aluno. Monteiro (2006), abordou a relação professor-aluno sob a ótica de práticas bem sucedidas em alfabetização. Tacca e Branco (2008), ocuparam-se com as interações sociais, processos de significação e o fracasso escolar em interface com a relação professor-aluno. A relação professor-aluno sob a ótica da afetividade permanece ainda como objeto privilegiado nas pesquisas. (TASSONI, 2000; FERNANDEZ, 2011; LEITE, 2012).

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sociedade, ainda prevalecem ideologias missionárias e regenerativas associadas ao papel do professor no surgimento da escola primária brasileira, que resiste às reformas pedagógicas e mudanças de paradigmas, justificando esse fracasso como responsabilidade do aluno e de sua família. (PATTO, 2006; 2010; 2012; ROCHA, 2004; ASBAHR; LOPES, 2006).

Paralelo à preocupação com a relação professor-aluno, ainda na década de 80, surge o interesse pela pessoa do professor, favorecendo a utilização de métodos com foco na história de vida, privilegiando a questão de sua subjetividade até então ignorada (BUENO, 2002). Nesse cenário, as narrativas de professores em formação, mostram-se eficazes por revelar intimidades, particularidades e especificidades do trabalho docente (SILVA, 2003).

As pesquisas sobre história de vida e escolha profissional docente revelaram que, as escolhas pela carreira do magistério, estão vinculadas ao percurso pessoal e de formação (Nóvoa, 1992; Souza; Uzêda, 2009), sendo as escolhas profissionais construídas no percurso histórico da vida objetiva e subjetiva de cada um (Nascimento, 2007) e associadas à maternagem, influência familiar, oportunidade e idealismo (BRASIL; GALVÃO, 2012). A atuação docente no início da escolarização carrega marcas culturais profundas associadas ao papel feminino de reprodução sexual com forte ligação ao trabalho doméstico de cuidados. Assim, a escolha da profissão docente encontra-se intimamente ligada à trajetória social que construiu a carreira do magistério relacionada à história do sujeito professor como extensão do sujeito mulher, construído historicamente no seio de uma cultura patriarcal milenar (SOUZA; UZÊDA, 2009).

Levando em conta os estudos sobre ser professor e minha experiência profissional, o objeto de estudo desta pesquisa é a identificação de elementos presentes nas narrativas sobre a história de vida do professor alfabetizador que influenciam sua escolha profissional, sua atuação docente e suas concepções sobre as dificuldades de alunos oriundos de contextos de vulnerabilidade social no processo de aprendizagem da linguagem escrita, e como esses elementos podem contribuir com o processo de formação para a docência. Foi escolhida a metodologia qualitativa para articular o tema proposto por esta considerar a realidade acima do método (DEMO, 2012, GONZALEZ REY, 2005; 2012).

Buscando discutir este objeto, foram escolhidas como bases teóricas a psicossociologia francesa e a psicologia Histórico-Cultural, recorrendo também a outros teóricos que dialogam com estas abordagens.

(18)

totalidade, a partir de mediações no processo das interações com o social e com os signos culturais. (FACCI; EIDT; TULESKI, 2006). Dentro dessa perspectiva, o processo de aprendizagem ocorre no âmbito das interações sociais (Vigotsky, 2007; Vygotsky; Luria; Leontiev, 2010; Tassoni, 2000; Facci; Eidt; Tuleski, 2006; Lima, 2007; Tacca; Branco 2008), permeadas pela afetividade (WALLON, 2008; HINDE, 1979; ALMEIDA, 1993; PAIN, 1999; TASSONI, 2000; FERNANDEZ, 2011; LEITE, 2012).

A Psicossociologia Francesa, também considera o sujeito como um ser Social (BARUS-MICHEL, 2004). Define-se como uma disciplina que assume algumas posições centrais: uma atenção particular ao outro, respeitando a singularidade e a capacidade de evolução e de aprendizagem de cada um; uma concepção de mudança centrada sobre o processo mais do que sobre os resultados; uma ideia de que os fenômenos afetivos e inconscientes afetam as condutas e as representações individuais e coletivas; a implicação dos pesquisadores nas questões que estudam ou nas intervenções que realizam. (BARUS-MICHEL; ENRIQUEZ; LÉVY, S/D).

Conceitos importantes para o estudo do tema, como vulnerabilidade, poder, exclusão social e alteridade foram estudados à luz da Psicossociologia Francesa. (GAULEJAC; LÉONETTI, 1994; ENRIQUEZ, 1998, 2003, 2007; SAWAIA, 2011; PENSO ET AL, 2012, BARUS-MICHEL, 2004). Outros autores que dialogam com as abordagens escolhidas como, por exemplo, Foucault (2006), Bourdieu (2012), Figueiredo (1998) e Arendt (2011), Levinas (2009) foram incluídos, principalmente pela sua importância no estudo dos temas do poder, da auteridade e da comunicação pedagógica.

(19)

Objetivo Geral:

Compreender os elementos presentes nas narrativas da história de vida de professoras alfabetizadoras e suas influências na escolha profissional, em suas práticas docentes e em suas concepções sobre as dificuldades de seus alunos no processo de aprendizagem da linguagem escrita que poderão identificar componentes importantes no processo de formação docente.

Objetivos Específicos:

1 - Conhecer a história de vida de professoras alfabetizadoras de alunos oriundos de contextos de vulnerabilidade do 3º ano do BIA;

2 - Verificar a existência de relações entre a história de vida de professoras alfabetizadoras e sua escolha profissional da carreira docente;

3 - Identificar possíveis relações entre a história de vida de professoras alfabetizadoras e suas atuações docentes com alunos oriundos de contextos de vulnerabilidade e exclusão social do 3º ano do BIA;

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2 REVISÃO DE LITERATURA

A revisão dos conceitos teóricos que subsidiam este trabalho foram divididos em 4 subitens. O primeiro discute a concepção de aprendizagem defendida pela Psicologia Histórico-Cultural; o segundo aborda a questão da relação professor-aluno em contextos de vulnerabilidade e exclusão social; o terceiro dedica-se à análise histórica de como o fracasso escolar vem sendo produzido, o público por ele afetado e as justificativas de sua existência e permanência; por fim, o último, discorre sobre a história de vida do professor, analisando o contexto sócio histórico cultural de sua formação, motivação para a escolha profissional e condições de atuação.

2.1 O PROCESSO DE APRENDIZAGEM SEGUNDO A PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL DE VIGOTSKY

Neste item será discutido o processo de aprendizagem a partir da Psicologia Histórico-Cultural. Para Vygotsky (2007), o processo de aprendizagem e a constituição do sujeito ocorrem no âmbito das interações sociais, definindo sua existência humana como resultado de sua história cultural. Tal perspectiva é contrária às tendências naturalistas que limitam seus estudos psicológicos tendo por base os métodos utilizados nas ciências naturais. Para Facci, Eidt e Tuleski (2006), ao tomar como base um paradigma de análise Histórico-Cultural em substituição aos paradigmas biológico ou natural, a discussão sobre as questões de aprendizagem devem mudar radicalmente da ótica individual para a social. Para as autoras, o desenvolvimento das funções psicológicas superiores como a atenção voluntária, vontade, percepção, pensamento abstrato, memória, assim como todas as demais funções psicológicas superiores pesquisadas por Vigotsky, só se desenvolvem em sua totalidade a partir de mediações culturais.

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Para Vygotsky (2007), o aprendizado deve ser combinado de alguma maneira com o nível de desenvolvimento da criança. Contudo, para descobrir as relações reais entre o processo de desenvolvimento e a capacidade de aprendizado faz se necessário determinar pelo menos dois níveis de desenvolvimento. O primeiro pode ser chamado de nível de desenvolvimento real, isto é, o nível de desenvolvimento das funções mentais da criança que se estabeleceram como resultado de certos ciclos de desenvolvimento já completados. Conforme o autor, ao determinar a idade mental de uma criança através de testes, o foco em questão, é o nível de desenvolvimento real. Isto significa dizer que, o que se considera nestes testes como capacidade mental das crianças restringe ao que elas conseguem realizar por si mesmas sem auxílio externo. Vyigotsky (2007) afirma que, estes testes consistem em apresentar à criança várias tarefas com graus variados de dificuldades para assim julgar a extensão de seu desenvolvimento mental com base no grau de dificuldade por ela resolvido. Por outro lado, se a criança resolve o problema depois do fornecimento de pistas; ou através de modelo de como o problema pode ser solucionado; ou, o professor iniciando a resolução do problema e ela completando; ou, ainda, se o problema é resolvido por ela mediante colaboração com outras crianças não é visto como um indicativo de seu desenvolvimento mental.

Vygotsky (2007), enfatiza que, esta inobservância, inclusive de pensadores mais perspicazes desconsiderando de que aquilo que a criança consegue fazer com ajuda dos outros poderia ser, de alguma maneira, muito mais indicativo de seu desenvolvimento mental do que o que consegue fazer sozinha é criticado pela psicologia Histórico-Cultural. Para os autores que trabalham com essa teoria, considerar tais situações fornece explicações mais coerentes em relação ao processo de aprendizagem e desenvolvimento.

Para comprovar sua teoria de que as respostas das crianças obtidas sem ajuda são insuficientes para indicar o grau de desenvolvimento mental Vygotsky (2007), propôs avaliar duas crianças de dez anos cronológicos com testes padronizados para desenvolvimento mental de oito anos tomando o resultado não como ponto de chegada, mas sim, como ponto de partida. Na testagem com testes padronizados, verificou-se que pelo critério de respostas apropriadas, as crianças pareciam ser capazes de lidar com problemas até o nível de oito anos de idade, e não, além disso. (VYGOTSKY, 2007).

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que sua hipótese de que as respostas completas na resolução de problemas são insuficientes para conhecer o nível de desenvolvimento mental, alguns experimentadores, sob a orientação de Vigotsky, empregaram diferentes modos de demonstração em diferentes casos com as duas crianças acima citadas como: realizar uma demonstração inteira e pedir à criança para repeti-la; iniciar a solução e pedir que a termine; fornecer pistas, isto é, propor que a criança solucione o problema com a assistência do experimentador. Os resultados alcançados com essa forma de abordar a criança em situação de resolução de problemas levaram Vygotsky (2007) a identificar que, a primeira criança conseguiu lidar com problemas até o nível de doze anos de idade e a segunda até o nível de nove anos de idade. Dessa maneira, constatou-se que a capacidade de crianças com iguais níveis de desenvolvimento mental considerado a partir das respostas corretas no teste padronizado, para aprender sob a orientação de um professor, variava enormemente. A conclusão foi que, sem sombra de dúvida, as duas crianças com nível igual de desenvolvimento revelada pela análise das tarefas realizadas sozinhas, na verdade não tinham a mesma idade mental e que o curso subsequente de seus aprendizados seria, obviamente, diferente. (VYGOTSKY, 2007).

A partir dessa constatação, Vygotsky (2007), criou o conceito de zona de desenvolvimento proximal. Esse conceito corresponde à distância entre o nível de desenvolvimento real, que se identifica através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. Concluiu ainda o autor que, o nível de desenvolvimento real de uma criança define funções que já atingiram sua maturidade, ou seja, os produtos finais do desenvolvimento. Pain (1999), denomina este processo, de funções automatizadas no organismo. Isto é, aquilo que é possível realizar sem empreender muito esforço mental. Quanto à zona de desenvolvimento proximal, esta é identificada através de problemas que a criança não pode resolver independentemente, fazendo-o somente com assistência de sujeitos mais experientes. Em outras palavras, a zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação. São funções que amadurecerão, mas que estão naquele momento em estado embrionário. Funções estas chamadas por Vygotsky (2007) de "brotos" ou "flores" do desenvolvimento, em substituição a "frutos" que será a fase final do desenvolvimento.

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em processo de maturação e, através da mediação será possível concluir e atingir o desenvolvimento real. Nesse sentido, é a zona de desenvolvimento proximal que provéem psicólogos e educadores de um instrumento através do qual se pode entender o curso interno do desenvolvimento e dos processos de aprendizagem. (VYGOTSKY, 2007).

A zona de desenvolvimento proximal permite delinear o futuro imediato da criança e seu estado dinâmico de desenvolvimento, propiciando o acesso não somente ao que já foi atingido através do desenvolvimento, como também àquilo que está em processo de maturação. Em termos de aprendizado escolar significa que, a zona real de desenvolvimento revela o estágio final. Isto é, mede o que já é conhecido. No entanto, é o nível de desenvolvimento proximal que detecta as reais necessidades de aprendizado da criança e fornece informações para orientar o planejamento das interações mediadoras, uma vez que, quem se encontra na zona de desenvolvimento proximal possui capacidade de atingir a zona real. Se isso não acontece é em função dos procedimentos de mediação inadequados ou insuficientes e não pela incapacidade maturacional da criança. (VYGOTSKY, 2007).

A definição conceitual de zona de desenvolvimento proximal leva Vigotsky a destacar a importância da instituição escolar como recurso cultural valiosíssimo para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Segundo a teoria de Vygotsky, a diferença entre o aprendizado escolar e o aprendizado que antecede a escolaridade da criança vai além de uma definição como, aprendizado sistematizado de um lado e não sistematizado de outro, conforme defende outros estudiosos. Para esse teórico, o aprendizado escolar introduz algo totalmente novo que é a zona de desenvolvimento proximal pela qual a qualidade da mediação fará toda a diferença na apropriação ou não dos signos linguísticos e culturais responsáveis pelo desenvolvimento das funções psicológicas superiores. (VYGOTSKY, 2007).

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instrumentos aplicados para conhecer e controlar a realidade. Com essa elaboração, Vygotsky (2007), destaca a importância do outro não apenas como quem irá transmitir conhecimento, mas principalmente na constituição desse sujeito que incorporará por intermédio das relações sociais, as formas de agir e interagir como sujeito sócio-histórico-cultural. Com tal argumento, a psicologia Histórico-Cultural defende que, aprender é um ato eminentemente social que ocorre na relação sujeito-sujeito-objeto. Ou seja, o sujeito mais experiente faz a mediação entre o sujeito menos experiente e o objeto de conhecimento, que por sua vez, passa a ser incorporado pelo sujeito menos experiente. Essa internalização modificará suas funções psicológicas, ampliando a capacidade do sujeito de conhecer a realidade e agir sobre ela. (VYGOTSKY, 2007).

As funções psicológicas superiores definidas por Vygotsky são constituídas a partir de atividades interpsíquicas como, memória, atenção, abstração, aquisição de instrumentos, fala e pensamento. Estas atividades desenvolvidas em suas interações sociais e culturais ao serem internalizadas tornam-se intrapsíquicas e transformam suas funções psicológicas elementares de base biológica em funções complexas de base cultural. Nessa perspectiva teórica, as formas culturais de comportamentos que envolvem a reconstrução da atividade psicológica, têm como base as operações com signos. Os signos são entendidos no processo de transmissão do conhecimento como instrumentos construídos culturalmente. São recursos para interagir e transformar o ambiente ao mesmo tempo em que são utilizados para transformar o próprio sujeito a partir de sua interação sócio-histórico-cultural. Entre os signos encontram-se a linguagem, os vários sistemas de contagem, as técnicas mnemônicas, os sistemas simbólicos algébricos, os esquemas, diagramas, mapas, desenhos e todo o tipo de signos convencionais. (VYGOTSKY, 2007; 2010).

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estrutura dinâmica vai sofrendo uma mudança fundamental. Mudança esta, impossível de ser encontrada no processo natural dos animais. (VYGOTSKY, 2007).

O processo de interiorização das funções mentais superiores é definido como processo histórico por natureza. Dessa maneira, o organismo, recebendo uma herança filogenética, possui estruturas mentais elementares, também encontradas em animais superiores. Todavia, é a partir de suas atividades com outros de sua espécie que atuam como transportadores das experiências sociais, que o sujeito inicia seu desenvolvimento ontogenético demarcando a sua entrada no mundo da cultura (Vygotsky, 2007). Desse processo emerge o sujeito-sócio histórico-cultural, herdeiro das estruturas psicológicas superiores que vão se desenvolvendo de acordo com suas interações sociais e culturais mediadas pelos signos produzidos por sua comunidade de pertença.

Luria (2010), ao investigar comunidades iletradas ou com pouca experiência com a instrução formal, constatou que, em todos os grupos humanos, cada povo desenvolverá suas funções psicológicas superiores baseadas nas atividades práticas ou abstratas mediadas pelos signos disponíveis em seu ambiente cultural. Desse modo, o autor contestou as teorias que defendem o princípio de leis universais de percepção e demonstrou que os sujeitos iletrados não agrupavam de acordo com o nível de abstração, mas sim, de acordo com o que fazia sentido em suas atividades práticas. Mediante tais resultados o autor, confirma os achados de Vigotsky sobre a distinção entre outros animais e a espécie humana. Isto é, as funções psicológicas superiores são inerentes à espécie humana e estas se desenvolvem através das atividades e ações que ocorrem nas interações sociais e culturais mediadas pelos signos produzidos em sua cultura de origem.

Vygotsky (2007) afirma que, as estruturas da percepção, a atenção voluntária, a memória, as emoções, o pensamento, a linguagem, a resolução de problemas assumem formas diferentes conforme o contexto histórico de cada cultura. Para o autor, as formas relacionais do grupo social e suas instituições reguladoras do comportamento e das interações do sujeito e da cultura, definem a forma de interiorização dos signos culturais, das atividades práticas, das ações sensório-motoras e das formas de abstração.

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signos têm para a sociedade. Esse processo permite à criança modificar suas atitudes de cumprimento de obrigações apenas com a finalidade de agradar ou reproduzir uma atividade de um adulto, passando então, a internalizar o significado do cumprimento dessas obrigações para as funções e papeis sociais a serem ocupados em sua vida futura.

O fato das exigências ao cumprimento das obrigações atingirem um nível psicologicamente eficaz na fase escolar, não significa que estas não existiam durante a fase do jogo e do brinquedo. Todavia, inicialmente, a criança, ao começar seus estudos, a importância de tais realizações se dá pelo nível de exigência dos professores e diretores escolares. Então, ao sentar-se para fazer a tarefa, a criança se vê envolvida com uma atividade importante. Diante da proibição dos irmãos menores de importuná-la em casa durante a realização da tarefa; do sacrifício dos adultos à sua volta para garantir com que suas tarefas escolares sejam realizadas, imprime à criança a alta significação da função social da escola. Com isso, ocorre a internalização de que realizar as atividades escolares tem um valor social tão importante quanto à realização das atividades profissionais dos adultos de sua convivência. Nesse sentido, entende-se que a mediação realizada pelo professor e os elementos culturais que a escola disponibiliza nas interações ocorridas no processo de transmissão de conhecimento, criam, individualmente, nos aprendizes, novas estruturas mentais. Dessa forma, o sujeito é conduzido a resoluções de problemas gradativamente mais complexos, o que permite a modificação de suas atitudes perante a realidade, originando novas estruturas mentais e sua consciência. (LEONTIEV, 2010).

Foram aqui apresentados os conceitos de aprendizagem, funções psicológicas superiores, desenvolvimento, nível de desenvolvimento real, zona de desenvolvimento proximal, mediação, interação social e signos culturais, assim como, o papel da escola no desenvolvimento das funções psicológicas superiores na perspectiva da psicologia Histórico-Cultural. Esses conceitos contribuem para uma nova concepção do processo de aprendizagem e atenta para a necessidade de transformações na forma de se conceber os potenciais da criança para a aquisição dos signos linguísticos e da leitura.

2.2 A RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO EM CONTEXTOS DE VULNERABILIDADE E EXCLUSÃO SOCIAL E O PROCESSO DE APRENDIZAGEM

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poder, comunicação pedagógica, alteridade e afetividade. Dessa forma, pretende-se aprofundar o debate sobre como vêm sendo construídas as formas de transmissão dos legados culturais da linguagem escrita para esta parcela da população que, ao longo da história tem sido alijada de seus direitos básicos nos campos material, afetivo e psíquico.

O conceito de vulnerabilidade tem sido definido de diferentes formas. Para Hillesheim e Cruz (2008), a vulnerabilidade surge de fatores múltiplos que se cruzam como: sujeito em desenvolvimento; e a escassez de recursos materiais somando a outros fatores referentes à falta de apoio emocional familiar, de acesso a serviços de saúde, desemprego e/ou ociosidade dos adultos da família, exposição e uso de álcool e drogas, infrequência e improdutividade escolar. Pereira e Souza (2006), consideram a vulnerabilidade como um conceito complementar ao risco, podendo se referir a riscos ambientais e socioeconômicos. Para Cutter (1994), trata-se de um risco biofísico e um consenso social, ou seja, onde pessoas vulneráveis se localizam geograficamente, e os espaços sociais nos quais as pessoas destes lugares encontram-se mais vulneráveis.

Muitas outras definições poderiam ser apresentadas, mas o conceito de vulnerabilidade considerado como mais apropriado para esta pesquisa foi encontrado em Abramovay (2002). Segundo a autora, a vulnerabilidade não se restringe unicamente às questões de pobreza que impedem o acesso aos bens materiais e suas formas de produção. Mas, incorpora todo o impedimento de acesso aos bens culturais que, além de afetar a capacidade de garantia do acesso ao capital material, também afeta a capacidade de responder às crises de forma a permitir o alcance de condições de vida com um nível satisfatório de bem estar.

A partir desta definição de vulnerabilidade busca-se articular esse conceito com o processo cultural de exclusão social. Em nossa sociedade convivemos com procedimentos de exclusão, e de inclusão perversa (SAWAIA, 2011). Dentre os procedimentos de exclusão, o mais familiar, a interdição, pode se apresentar de três maneiras que são: tabu do objeto; ritual da circunstância; direito exclusivo do sujeito que fala. Esses três tipos de interdição se cruzam, se reforçam ou se complementam e rapidamente estreitam suas ligações com o desejo e o poder (FOUCAULT, 2006). Assim, manifesta-se a vontade de verdade. Como outros sistemas de exclusão, esta, apoia-se sobre um suporte institucional que utiliza da separação para definir como o saber é aplicado em uma sociedade, como é valorizado, distribuído, repartido e de certo modo atribuído. Dessa forma, o suporte institucional em que se apoia a vontade de verdade tende a exercer uma espécie de pressão e um poder de coerção. (FOUCAULT, 2006).

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alusão à figura do estrangeiro. Para Enriquez (1998; 2003), a figura do excluído metaforizada no estrangeiro retrata tudo que é obsessivamente cobiçado, invejado, e, ao mesmo tempo, perigoso, ameaçador e voraz. Este autor defende que, sendo esta potência habitante da parte obscura do próprio eu, procura-se eliminá-la, dando vazão à negação e desejo de extermínio de tudo que reflete este sujeito interno que incomoda, provocando mal-estar por não se adaptar a identificações que o escamoteia. Para Arbex Jr (1998), o estrangeiro interpõe em todas as formas de negação e exclusão do diferente, disseminado pela ideologia dominante como inferior, sujo, negativo, ameaçador, diabólico.

Na visão de Gaulejac e Léonetti (1994), a exclusão está associada à desinserção social, em que os eventos provocadores aparecem em três fatores: o desemprego, o rompimento afetivo e os problemas de saúde. Tais eventos exigem do indivíduo a utilização de estratégias que lhe permita enfrentar e sobreviver a estes problemas. Dentre estas estratégias, os autores ressaltam o isolamento, a agressividade violenta ou a fuga para o alcoolismo. Nessa perspectiva, o que caracteriza a relação entre desinserção e exclusão social, são os mecanismos culturais que o grupo, (família, escola, comunidade, sociedade em geral) utiliza em relação ao indivíduo ou grupo com características identitárias desprezadas socialmente. Dessa forma, tais indivíduos ou grupo são coagidos a desenvolverem um sentimento de menos valia.

Para esta pesquisa será utilizado o conceito de exclusão, desenvolvido por Wanderley (2011) e Penso et al. (2012), retirado da psicossociologia francesa articulada com pesquisas brasileiras. Wanderley (2011), refere-se à rejeição do mercado material e simbólico de parte da população, onde os sujeitos são excluídos pelas representações e sistemas de valores sociais. Extrapolando as esferas físicas, geográficas ou materiais do mercado de troca, são também excluídos das riquezas espirituais nas quais seus valores não são reconhecidos. Penso et al. (2012), apontam para uma dimensão social de desigualdade que provoca uma “rachadura” na construção individual do eu. Assim, o sujeito em função dos mecanismos sociais que o impedem de estabelecer uma afiliação identitária com as produções culturais, deforma sua imagem do eu que passa a ser definida pelo olhar da negatividade do outro. Isso ocorre em função de lhe ser imputado um sofrimento psíquico capaz de coagi-lo e o desligar de sua história.

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quando, o detentor do poder utiliza de procedimentos coercitivos desnecessários e gratuitos. (COSTA, 2003). Em outras palavras, a coerção aplicada não tem por finalidade nem barrar a autodestrutividade nem promover o crescimento educativo, mas sim intimidar e diminuir o outro para submetê-lo à sua dominação.

A relação professor-aluno tem sido objeto de muitas pesquisas. No final da década de 90, Aquino (1998) tratava a questão pelo enfoque da violência escolar e crise da autoridade. Para o autor, no contexto escolar há “um quantum de violência” na relação professor-aluno, considerada não pela ótica da negatividade, mas como um dispositivo de exercício do poder que a clientela delega aos representantes da instituição, baseado nas representações sociais de superioridade hierárquica que esta clientela atribui à instituição, por ser ela a guardiã ou possuidora do objeto (saber) de valoração social. Nesse sentido, o exercício do poder na relação professor-aluno a qual se refere Aquino, não teria como objetivo a dominação do sujeito para diminuí-lo e subjugá-lo, mas sim coagir suas atitudes destrutivas e levá-lo à apropriação do capital cultural disponibilizado pela escola. No entanto, Costa (2003), questiona o uso da expressão “quantum de violência necessária”, uma vez que para ele, a coerção para garantir o processo educativo representa o exercício do poder com autoridade. Já a violência, estaria na aplicação de medidas humilhantes e desnecessárias.

Para Barus-Michel (2004), as relações sociais são tramadas pelas relações de poder que geralmente são transformadas em uma força perversa, invejável, mágica em que alguns o detêm e são assediados e, a maioria, submetidos à força que imprime quem o exerce. Assim, o poder é exercido a partir de uma relação circular precedida da existência de dominadores e dominados. Essa circularidade envolve uma indução advinda do exterior que leva os sujeitos que serão submetidos ao controle da parte dominante a assimilar que não conseguem enfrentar por si só as próprias dificuldades, levando a delegar a outros, as tomadas de decisões referentes às suas próprias atuações. Esses outros, ou indivíduo único, são evocados diante das faltas não suportadas pelos futuros dominados, que revestem seus dirigentes com as representações de plenitude constituindo inexoravelmente a predominância da dependência. (BARUS-MICHEL, 2004).

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Entretanto, ressalta o autor, se a lei do pai é totalmente absorvida não por recursos de identificação, mas por imposição em que apenas a polaridade da recusa é assimilada, ocorre então a castração simbólica. Esta por fim, norteará o filho a buscar seu renascimento pela via do “assassinato” do pai. Dessa maneira, o desejo de poder, passa a ser perseguido como forma de alcançar a legitimidade que só pode ser atingida se o pai estiver morto. Contudo, essa compulsão pelo assassinato do pai, que representa a lei impeditiva da ascensão do filho ao poder, se frustra quando o desejo se concretiza. Em outras palavras, matando o pai internalizado, que é o intérprete da lei, este será divinizado e continuará ditando as leis ao mesmo tempo em que acusa o filho de não possuir legitimidade no exercício do poder, já que se trata de um usurpador da vida da própria lei, um assassino. (ENRIQUEZ, 2007).

O poder para Foucault (2006), que é manifestado em procedimento que permite o controle dos discursos trata-se de determinar as condições de seu funcionamento. Assim, impõe aos indivíduos o pronunciamento de certo número de regras para que se possa restringir quem a ele tem acesso. É constituído a partir de um ritual que define a qualificação que devem possuir os indivíduos que falam. Define os gestos, os comportamentos, as circunstâncias, e todo o conjunto de signos que devem acompanhar o discurso. Fixa a eficácia suposta ou imposta das palavras, seus efeitos sobre aqueles aos quais se dirigem os limites de seu valor de coerção. Nesses discursos, os indivíduos que falam definem por uma pertença recíproca e pela partilha de um só e mesmo conjunto de discursos. Dessa forma, fixa o reconhecimento das mesmas verdades e a ocultação de certas regras, revelando conformidade com os discursos validados. (FOUCAULT, 2006).

A educação encontra-se entre os grandes planos de dominação e apropriação social dos discursos (FOUCAULT, 2006). Isso porque, embora seja de direito, sendo instrumento ao qual todos os indivíduos teriam acesso a qualquer tipo de discurso, esta, segue em sua distribuição, no que permite e no que proíbe. No entanto, todo sistema educacional é uma maneira política para manter ou modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e os poderes que eles trazem consigo. (FOUCAULT, 2006).

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como determinantes naturais. Nesse sentido, reitera o autor, a ação pedagógica reproduz a cultura dominante e a estrutura das relações de poder, assegurando o monopólio da legitimidade de imposição e do “inculcamento” de seus sistemas de valores, também definido pelos autores como violência simbólica.

Para Bourdieu e Passeron (2012), a violência simbólica que caracteriza a ação pedagógica, encontra-se na base do poder arbitrário constitutivo de uma formação social. Este poder condiciona a instauração de uma forma de comunicação pedagógica capaz de impor e inculcar seu arbitrário cultural. Para os autores, não é somente pela imposição e inculcação de seu arbitrário cultural que se define o poder monopolizado pela classe social dominante, mas também pelas relações de violência simbólica, onde a ação pedagógica reproduz a estrutura de distribuição do capital cultural. Isto é, define as leis de mercado, material e simbólico e por meio da comunicação pedagógica, estabelece a forma de distribuição de seu capital cultural, ao mesmo tempo em que legitima seus mecanismos de distribuição e de exclusão. Dessa forma, naturaliza o arbitrário cultural levando o dominado ou excluído a não reconhecer sua própria força e capacidade de reivindicação que impulsionaria mudanças na estrutura social que mantém as desigualdades de oportunidades de acesso ao capital cultural material e simbólico. (BOURDIEU, 2012; BOURDIEU; PASSERON, 2012).

Para um melhor entendimento de como se articula essa estrutura de poder no âmbito das relações pedagógicas, é importante compreender o processo de comunicação que se materializa nas relações professor-aluno a partir da análise sociológica de Bourdieu e Passeron (2012). Para os autores, o rendimento informativo da comunicação pedagógica é sem dúvida, a forma mais eficaz de produtividade da prática educativa e, a forma como ela se efetiva, produzirá as desigualdades do êxito escolar dos alunos de acordo com suas origens sociais diferenciadas.

Desde o início da escolaridade, os alunos vão passando por uma série de seleções e, aqueles advindos das camadas menos favorecidas, além de um limitado capital cultural em decorrência das oportunidades mínimas de sua comunidade social, suas oportunidades de ascensão intelectual estão condicionadas a processos de seleção muito mais rigorosos que os exigidos de outras camadas sociais. Isso significa que, para entrarem em colégios que lhes preparariam para um melhor aproveitamento das oportunidades de enriquecimento cultural, este público depende de possuir capacidades acima dos demais como provas meritórias às oportunidades concedidas. (BOURDIEU, 2012; BOURDIEU; PASSERON, 2012).

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porque, a língua, não é apenas um instrumento de comunicação, mas é também um sistema de categoria que predispõe uma aptidão à decifração e manipulação de estruturas lógicas e estéticas de maior complexidade. Sendo assim, a aquisição dessa forma de linguagem depende em certa parte, da complexidade da língua transmitida pela família. Neste aspecto, Bourdieu aproxima-se dos conceitos de Vygotsky (2008), quando este afirma ser a maior ou menor complexidade da linguagem interiorizada dependente do tipo de interações ocorridas no seu meio cultural, em um processo mediado pelos elementos simbólicos da cultura e pela forma como os mais experientes de sua comunidade de pertença, no nosso caso de interesse, os professores, interagem com estes elementos e como os disponibilizam ao sujeito menos experiente.

Com relação ao processo comunicacional e sua importância na relação professor-aluno, as pesquisas de Pain (1999) mostram que, é a partir da necessidade de sobrevivência e não por um processo natural que o filhote de humano em seu contato com o ambiente exterior e com os outros que se ocupam dele, estabelece a comunicação através da linguagem que é a interiorização das ações motoras e perceptivas enriquecidas pelas palavras. Segundo a autora, é o entrelaçamento de ações motoras, percepção e palavra que constituirá no sujeito uma realidade que se define como o conjunto de suas recordações. Para Bourdieu e Passeron (2012) isto significa que, se este processo de internalização não incluir aspectos linguísticos que permita a decifração do que as relações pedagógicas comunicam com seus receptores, as oportunidades de aquisição de um capital cultural de maior complexidade, tornar-se-ão ínfimas, levando estes sujeitos a não sobreviverem aos processos rigorosos de seleção no âmbito escolar e na sociedade como um todo.

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Ainda sobre a questão da comunicação na relação professor-aluno no processo de aprendizagem da linguagem escrita, é importante recorrer à forma que Ferreiro e Teberosky (1999), concebem esse processo. Para as autoras, a ação que decorre da leitura e da escrita, não se trata de um acúmulo de informações depositadas na memória do sujeito aprendente. Mas trata-se de um processo complexo que exige coordenação de infomações de diversas procedências com aspectos inferenciais capazes de produzir significado passível de ser expresso linguisticamente. Com este raciocínio, as autoras colocam em relevo a lacuna das formas de comunicação pedagógica com finalidade de levar o sujeito à aquisição da linguagem escrita que o considera como um receptor de informações que as armazeniza e as reproduz de maneira passiva.

Bernardes (2013) elenca que, o processo de alfabetização inicia-se muito antes da criança frequentar a escola através das diversas formas em que ela interage com este objeto de conhecimento e com a interiorização das ações de seu meio cultural que lhe permite fazer inferência e incorporar o valor social resultante em uma significação. Esse processo é discutido por Ferreiro e Teberosky (1999), como conflito cognitivo que levaria o aprendente da língua escrita à formulação de sucessivas hipóteses na busca de interpretar a realidade inerente a este objeto de conhecimento. Bernardes (2013) considera que, de acordo com as experiências da criança que antecederam sua entrada na escola, suas hipóteses sobre a leitura e a escrita serão ainda rudimentares ou bem avançadas, sendo esta a causa de crianças iniciarem sua escolarização já alfabetizadas. Enquanto outras chegam à escola sem elementos que lhes permitem atribuir significado ao sistema de escrita alfabética, não conseguindo então interpretar o que a escola espera que ela faça.

Nesta mesma direção, já na década de 90, Moreira (1999), pontuava que, os alunos oriundos das camadas populares, geralmente chegam aos bancos escolares com a lógica sobre leitura e escrita distante da lógica entendida pela escola como legítima. Estes mesmos argumentos também foram discutidos por Oliveira (1997), Weisz (1999), Angelucci et. al (2004), Patto, (2006). Por esta linha de raciocínio, pode-se considerar que a eficácia na comunicação pedagógica entre professor e aluno que permite a aquisição da linguagem escrita depende de considerar as hipóteses e os processos de significação dos alunos sobre esse objeto de conhecimento, disponibilizando situações para as quais eles possam atribuir sentido à aprendizagem que se pretende construir.

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desfavorecidas, nos leva à discussão do conceito de alteridade. Para Figueiredo (1998), no início da constituição da subjetividade, a alteridade manifesta-se à criança no encontro com o adulto na sua estranheza.

Esta alteridade do adulto – esta fonte estrangeira de mensagens – não seria constituída apenas pela diferença entre o adulto e a criança; haveria algo mais decisivo nesta alteridade: tratar-se-ia da diferença do adulto para consigo mesmo, ou seja; da alteridade implicada no/pelo inconsciente do adulto como corpo estranho e estrangeirice própria; é esta alteridade do próprio, é este inconsciente que, torna o adulto enigmático para si mesmo e, mais ainda para a criança (FIGUEIREDO, 1998, p. 63).

Ferenczi (2011) e Figueiredo (1998) pontuam que, a “hipocrisia” que se apresenta em maior ou menor grau nas relações entre adultos e crianças, não se elimina apenas pela boa vontade ou pelo esforço de sinceridade. Tal hipocrisia é capturada através das imagens do adulto sempre “plural”, cindidas, equívocas como também promissoras e excludentes. Tais imagens inconscientes denominadas de enigmáticas vindas do adulto impõem à criança uma tarefa de “traduzir”, teorizar, simbolizar, metabolizar o corpo estranho implantado pelas mensagens. Todavia, uma parte considerável destas mensagens torna-se imetabolizável resistindo ao trabalho tradutivo, constituindo-se em recalque no inconsciente da criança, o que por sua vez, poder-se-ia ser traduzido como o estrangeiro. Para Figueiredo (1998), o sujeito vive inicialmente dentro dos outros e não de si mesmo. Este outro pode ser família, classe social, nação, tradição, sistema linguístico etc. Dessa forma, é que, a emergência da alteridade precede o surgimento da individualidade. Ou seja, o sujeito só pode emergir em sua humanidade através do pertencimento no desejo de sua linhagem humana, para em um momento posterior, poder “introjetá-la,” permitindo a construção de sua individualidade.

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que os assemelham, por tratar-se da prova de suas origens comuns. Todavia, afirma Enriquez (1998; 2007), é somente pela trilha da alteridade, do reconhecimento do diferente como parte de si, que a humanidade emerge da animalidade.

Para Lévinas (2009), a experiência com a alteridade se dá quando há o reconhecimento do outro como diferente em uma relação marcada pela ética. Caso contrário, há um encapsulamento da experiência, dando vasão à razão instrumental e seu uso nas relações humanas, onde o agir ético passa a ser destituído. Já para Enriquez (1998; 2007), com a negação da alteridade, do reconhecimento do outro como portador de uma diferença este passa a ter sua subjetividade soterrada, deixando espaço apenas para quem reflete o próprio espelho, ou seja, cultiva o mesmo conjunto de crenças, valores e preconceitos. Dessa forma, o diferente que não ajusta aos padrões determinados pela parte dominadora, simplesmente não existe como categoria humana. Portanto, reitera o autor, o pano de fundo que sustenta a negação da alteridade é a luta desigual pela manutenção do poder.

No que diz respeito ao ambiente escolar partindo desta temática, Arendt (2011), enfatiza a necessidade de que a criança seja compreendida em sua alteridade em relação ao adulto. Para a autora, esta compreensão permitiria fornecer os elementos necessários para que a criança interagisse com o mundo do adulto como aprendiz e não como responsável por preservar o que os próprios adultos não o fazem. Reitera ainda que, o motivo de crise na educação, é o seu não reconhecimento da alteridade em relação à criança pelo adulto. Sendo assim:

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