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A organização da atenção básica de saúde de Campinas/SP : perspectivas, desafios e dificuldades na visão do trabalhador

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Academic year: 2021

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ANA CAROLINA DINIZ ROSA

A Organização da Atenção Básica de Saúde em Campinas/SP:

perspectivas, desafios e dificuldades na visão do trabalhador

Campinas

2014

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Ana Carolina Diniz Rosa

A Organização da Atenção Básica de Saúde em Campinas/SP:

perspectivas, desafios e dificuldades na visão do trabalhador

Orientadora: Profa. Dra. Marta Fuentes Rojas

Dissertação de Mestrado Profissional apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Política e Gestão em Saúde do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas para obtenção do Título de Mestra em Saúde Coletiva, Política e Gestão em Saúde, área de concentração: Política, Gestão e Planejamento.

Este exemplar corresponde à versão final da dissertação defendida pela aluna Ana Carolina Diniz Rosa e orientada pela Profa. Dra. Marta Fuentes Rojas.

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Campinas

2014

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS

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Dedicatória Ao meu avô (na memória) que me ensinou a compartilhar com ternura, a reconhecer a existência do outro com altruísmo e a experimentar o prazer dos bons encontros.

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Agradecimentos

Chegar ao final desse processo de produção me desperta, ao mesmo tempo, sentimentos de nostalgia e deleite, misturados em todas as lembranças e vivências que percorri durante esses dois anos. Por isso, como forma de reviver, de celebrar e recordar essa trajetória, “eu quis cantar minha canção iluminada de sol” (Sérgio Dias) na tentativa de traduzir em singelas palavras o agradecimento a tantos atores que tornaram essa história possível de ser contada. Em meio aos desafios, às renúncias, ao aprendizado e aos encontros, descubro-me mais amadurecida e fortalecida para continuar enfrentando os obstáculos e lutando para que nos espaços caiba cada vez mais gente, pois “o homem coletivo sente a necessidade de lutar” (Chico Science).

À minha família que divide comigo os momentos de anseio e conquistas com afeto, suporte e dedicação, que me fortalece e me resgata nos momentos tortuosos. À minha mãe, que percorre a delicadeza e a fortaleza com tanta leveza, tornando as coisas mais simples e belas. Só posso agradecer por toda a dedicação, pelos ensinamentos, pelo exemplo de mulher e de profissional, pelo auxílio técnico na construção desta pesquisa e por me sustentar nos momentos de desespero e de cansaço, apostando na minha capacidade e me fazendo continuar. Tenho a certeza de que “se todos fossem no mundo iguais a você, que maravilha viver” (Vinícius de Moraes e Tom Jobim).

Ao Diogo, que me ensina “coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar” (Renato Russo) e me acompanha nas minhas fantasias, nos meus receios e dúvidas, mostrando como a vida pode ser simples, incentivando-me a experimentar os prazeres e os desafios, oferecendo-me colo quando tenho medo da travessia. Obrigada por compreender as minhas renúncias, por trazer alegria ao meu dia a dia e por garantir que a nossa rotina seja apenas o respeito e o amor que a gente sente e constrói a cada dia.

Ao meu avô, a quem “faz um tempo eu quis, fazer uma canção pra você viver mais” (John Ulhoa e Fernanda Takai). À minha avó, exemplo de força, renúncia, humanidade e respeito. Esses ensinamentos são responsáveis pelo que me tornei e pelo que busco hoje.

Ao Cicero, Sheila e Doni, pelo apoio, pela aposta e por confirmarem a importância da família. Felipe e Júlia, que me convidam a um mundo de fantasia e me ensinam sobre a doçura da vida. Tio Du e Nicole pelo exemplo de força, por mostrarem que a família é um porto seguro e por me fazerem compreender que o resgate é sempre possível.

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Aos meus amigos e companheiros de uma intensa estrada que suavizam minha vida e me ajudam a celebrá-la. Meninos e meninas, obrigada pela amizade, pela parceria e por me ensinarem que a amizade, além de bons encontros, está sustentada por uma relação de apoio, respeito e compartilhamentos. Mari, Bhell e Milena, que tornam minha vida muito mais divertida e me ensinam que ela pode ser muito mais leve e profunda, quando partilhada com pessoas tão especiais. Evelin, pelo apoio, incentivo, amizade e pela ajuda nas reflexões e formatações da pesquisa. Marília, companheira de trabalho, de fantasias, conquistas e lutas, e amiga que me fez acreditar que esta pesquisa era possível. Raquel, pela amizade, compreensão e pela aposta no meu potencial.

Aos companheiros de trabalho de Campinas, que me acolheram e me ensinaram a trabalhar para o SUS. A rede Campinas não só possibilitou a reflexão e a busca por esta pesquisa, como também, garantiu a minha formação e minha reflexão sobre o trabalho e a vida.

Aos companheiros de trabalho de Cerquilho pela confiança, pelo aprendizado e pelas inúmeras reflexões que me despertam quando experimento as conquistas das equipes.

Às equipes que participaram deste trabalho, pelo aceite e pelo deleite de encontrar minhas angústias traduzidas nas suas palavras. Que esta pesquisa tenha lhes gerado o mesmo prazer e que traga fortalecimento e possibilidades.

Aos trabalhadores do SUS e da saúde, que garantem um dos nossos direitos de cidadãos e que travam lutas diárias. Que vocês percebam que “basta ser sincero e desejar profundo, você será capaz de sacudir o mundo” (Raul Seixas).

Fazer parte da primeira turma do “Mestrado Profissional-2012” possibilitou-me conhecer tanta “gente fina, elegante e sincera” (Lulu Santos), formando um grupo coeso e acolhedor que compartilhava o aprendizado, as inseguranças, as experiências e as celebrações, proporcionando tantos bons encontros que deixarão saudades.

Aos Professores do “Mestrado Profissional” que construíram e bancaram brilhantemente/heroicamente este projeto, acreditando na possibilidade e na importância da pesquisa embasada pela prática profissional, ao mesmo tempo em que nos estimulavam e nos convidavam a participar desta construção. Além do conhecimento teórico, o maior aprendizado foi perceber que os conteúdos ministrados em aula estavam incorporados em suas posturas e visões de mundo.

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O Mestrado Profissional também proporcionou a minha entrada e participação no “Coletivo de Estudos Paidéia”, que tem garantido a continuidade da minha formação, inúmeras reflexões e aprendizado, além de uma maior segurança para desenvolver meus projetos, ações e postura profissional dentro do meu trabalho. Em especial, à Cacau e Márcia, responsáveis pela brilhante condução dos grupos de discussão desta pesquisa e que sempre com palavras de apoio e incentivo me acolhiam e me estimulavam a dar um passo adiante. À Mariana, que tanto colaborou na Banca de Qualificação, orientando para o formato final deste trabalho.

Nessa minha caminhada profissional, fui me aproximando das ideias e pensamentos de alguns professores que me encantaram, trouxeram respostas e direcionamento aos meus pensamentos. Em especial, ao Professor Gastão, Mestre da Saúde Coletiva, que investe na potencialidade dos profissionais da saúde, que defende e acredita num sistema de saúde humano, de qualidade e democrático. Ao Professor Gustavo Tenório, um exemplo de humildade e sabedoria, que sempre me estimulou nas Rodas, Coletivos e grupos, com uma percepção sutil e cuidadosa dos indivíduos, proporcionando a presença e a permanência de todos.

Gostaria, ainda, de agradecer imensamente à Banca de Defesa: Professor Gastão que está colaborando em mais uma etapa deste trabalho; Professora Daniele que aceitou esse convite com tanto afeto; Professor Gustavo que no papel de suplente tanto colaborou na Qualificação e aceitou novamente estar presente; Professora Paula Furlan que, sem me conhecer, aceitou também com muito afeto fazer parte desta etapa.

Por fim, agradeço à grande responsável por esta obra, à minha Orientadora e Professora Marta Fuentes, que aceitou trilhar comigo este caminho com tanta delicadeza, grandeza e afeto e que me ajudou a encontrar, dentro de mim, o objeto de pesquisa. Obrigada pelo apoio, pela dedicação, por apostar no meu potencial, por respeitar meus limites e desejos, pelas impecáveis correções e orientações e por comprovar que o orientador pode ser ético, próximo, afetivo e mesmo assim, continuar sendo Doutor e Mestre.

Enfim, espero que este trabalho possa despertar sonhos e prazeres por aí, assim como me proporcionou, pois nesse mundo “vou mostrando como sou e vou sendo como posso. Jogando meu corpo no mundo, andando por todos os cantos e pela lei natural do encontros, eu deixo e recebo um tanto e passo aos olhos nus ou vestidos de lunetas. Passado, presente, participo sendo o mistério do planeta” (Luiz Galvão e Moraes Moreira).

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Resumo

Esta pesquisa objetivou identificar a representação que o trabalhador da Atenção Básica de Saúde (ABS) tem sobre o seu próprio trabalho, procurando compreender de que forma a sua produção ou a sua obra, promovem a qualidade da assistência prestada na ABS e a legitimação do SUS. Com base em algumas hipóteses, como a apatia e o imobilismo do trabalhador da ABS, além de um aparente descrédito na potência da sua produção no trabalho e, com isso, um isolamento e distanciamento da equipe e do usuário, foi proposto aprofundar essas discussões a partir do referencial e do discurso do profissional da saúde. Apesar dos avanços do SUS, principalmente com relação à universalidade, muitos autores têm apontado desafios e dilemas a serem enfrentados, dentre os quais, um importante desafio concentra-se na área de Gestão de Pessoas. Dessa forma, este trabalho justifica-se pela importância em buscar junto aos profissionais de saúde, ou seja, dos atores do sistema de saúde, as dificuldades e os resultados efetivos, colocando o profissional, sua unidade de saúde e o próprio sistema de saúde em análise. Para tanto, a metodologia utilizada foi a pesquisa qualitativa com a técnica de grupos de discussão, com o objetivo de favorecer a espontaneidade dos participantes. O campo de pesquisa foi a rede básica de saúde de Campinas/SP, devido ao destaque nacional do município com relação à organização da Atenção Primária. Os grupos de discussão aconteceram com duas equipes multiprofissionais, de dois Centros de Saúde, sendo cada um situado num Distrito de Saúde do município. Os resultados apontam que o sofrimento do trabalhador da ABS está relacionado ao contexto político, à falta de investimentos, inclusive de pessoal e ao aumento da demanda atendida. Dada a escolha em trabalhar nesse nível de atenção, as narrativas indicaram que a sustentação do trabalho está relacionada à possibilidade de aproximação com o usuário e a equipe. Conclui-se que o Apoio Institucional e o modelo de Co-gestão são ferramentas importantes para o suporte do profissional e a mudança do modelo de saúde, sendo apontados, inclusive, como uma das propostas dos grupos de trabalhadores participantes desta pesquisa.

Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde, Sistema Único de Saúde, Profissional da Saúde.

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Abstract

This research aimed to identify the representation that the employee's primary health care have about your own work, seeking to understand how their production or their work, promote the quality of care delivered in this level of attention and the legitimacy of the Unified Health System. Based on some hypotheses, such as apathy and inaction of the employee's primary health care, plus an apparent disbelief in the power of their production work and, thus, isolation and detachment of the team and the user was proposed to deepen these discussions from the referential and discourse of the health professional. Despite advances Unified Health System, particularly with respect to universality, many authors have pointed out challenges and dilemmas to be faced, among them, a major challenge is concentrated in the area of People Management. Thus, this work is justified by the importance in looking at health professionals, in other words, the actors of the health system, the difficulties and actual results, placing professional, your health care facility and health system itself under review. Therefore, the methodology used was qualitative research with the technical discussion groups, with the aim of favoring the spontaneity of the participants. The field research was the basic health network of Campinas / SP, due to national prominence in the municipality regarding the organization of primary care. The group discussions took place with two professional teams, two health centers, each located in a health district of the city. The results show that the suffering of the ABS work is related to the political context, the lack of investment, including personnel and increased demand met. Dada a escolha em trabalhar nesse nível de atenção, as narrativas indicaram que a sustentação do trabalho está relacionada à possibilidade de aproximação com o usuário e a equipe. We conclude that the Institutional Support and Co-management model are important tools to support the professional and the changing model of health, being appointed, even as one of the proposals of the groups participating in this research workers.

Keywords: Primary Health Care, Unified Health System, Health Personnel.

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Lista de Abreviaturas

ABS – Atenção Básica de Saúde ACS – Agente Comunitário de Saúde

AMAQ – Autoavaliação para a melhoria do acesso e da qualidade da Atenção Básica APS – Atenção Primária de Saúde

CIT – Comissão Intergestores Tripartite

CONASEMS – Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde CONASS – Conselho Nacional de Secretários de Saúde

CNES – Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde

DEGERTS – Departamento da Gestão e da Regulação do Trabalho em Saúde ESF – Estratégia Saúde da Família

Fnepas – Fórum Nacional de Educação das Profissões na Área da Saúde IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

MEC – Ministério da Educação MS – Ministério da Saúde

NASF – Núcleo de Apoio à Saúde da Família

NOAS/ SUS – Norma Operacional da Assistência do Sistema Único de Saúde NOB/SUS – Norma Operacional Básica do Sistema de Saúde

PAB – Piso da Atenção Básica

PACS – Programa de Agente Comunitário de Saúde PCCS – Plano de Carreiras, Cargos e Salários PDI – Plano Diretor de Investimentos

PDR – Plano Diretor de Regionalização

PMAQ – Programa Nacional de Melhoria do Acesso da Qualidade da Atenção Básica PNAB – Política Nacional de Atenção Básica

PPA – Plano Plurianual

PPI – Programação Pactuada e Integrada

PROS – Programação e Orçamentação da Saúde PSF – Programa Saúde da Família

RAS – Rede de Atenção à Saúde

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RENAME – Relação Nacional de Medicamentos Essenciais RENASES – Relação Nacional de Ações e Serviços de Saúde RH – Recursos Humanos

SIA/SUS – Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde SIAB – Sistema de Informação da Atenção Básica

SGTES – Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde SUS – Sistema Único de Saúde

TCG – Termo de Compromisso de Gestão UBS – Unidade Básica de Saúde

VER/SUS – Vivências e Estágios na Realidade do Sistema Único de Saúde

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Lista de Ilustrações

Quadro 1 – Formação dos Grupos

Quadro II- Contextualização das narrativas por categorias de análise, do primeiro grupo de discussão

Quadro III - Contextualização das narrativas por categorias de análise, do segundo grupo de discussão

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SUMÁRIO

Resumo... 13

Abstract...15

Introdução... 25

Refletindo sobre a experiência da pesquisadora na Atenção Básica de Saúde de Campinas... 29

Objetivos... 32

Pressupostos Metodológicos... 33

CAPÍTULO I – Atenção Básica de Saúde... 41

1.1. A Construção da Política Nacional de Atenção Básica no Brasil... 44

1.2. A crise na Atenção Básica de Saúde no Brasil... 72

CAPÍTULO II - A Atenção Básica em Saúde no município de Campinas/SP... 102

CAPÍTULO III - Narrativas: o olhar do trabalhador da saúde...110

3.1. Partindo para a primeira experiência no campo...111

3.2. Partindo do mesmo lugar: entre as coincidências e as singularidades...124

CAPÍTULO IV – Analisando o discurso do Trabalhador... 140

4.1. A Construção da análise... 140

4.2. A Triangulação de métodos...140

4.2.1. Categoria: Dificuldades...141

4.2.2. Categoria: Sofrimento no Trabalho...146

4.2.3. Categoria: Papel da Atenção Básica...149

4.2.4. Categoria: Potencialidade/persistência da Equipe...151

4.2.5. Categoria: Gestão da Atenção Básica...153

4.2.6. Categoria: Propostas...158

4.2.7. Categoria: Avanços Percebidos...161

4.2.8. Categoria: Expectativas da Equipe...163

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CONCLUSÃO...165

Referências... 173

Anexos

Anexo I - Parecer do Comitê de Ética... 179 Anexo II - Autorização da Secretaria Municipal de Saúde de Campinas/SP... 181 Anexo III - Roteiro do Grupo de Discussão... 182 Anexo IV - Transcrição Grupo de Discussão I... 184 Anexo V - Transcrição Grupo de Discussão II... 206 Anexo VI – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido... 232

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Introdução

O Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil é apontado por muitos autores como um grande avanço da política pública de saúde e como a maior vitória da Reforma Sanitária Brasileira, visto que possibilitou a garantia da universalidade, ou seja, a garantia de saúde a toda população, tendo o Estado como seu provedor (MENDES, 2001; 2001 b).

Um estudo realizado por Starfield (2002) aponta que os países com uma orientação mais forte para a Atenção Primária, possuem maior probabilidade de ter melhores níveis de saúde e custos mais baixos. A autora justifica a importância da Atenção Básica de Saúde (ABS) no escopo das redes de atenção à saúde, devido às possibilidades de resolubilidade, ao vínculo com a comunidade e usuários, ao (re)conhecimento do território e da comunidade, e à qualidade da atenção.

O Ministério da Saúde (MS) avalia que o SUS foi uma grande transformação de um modelo excludente, centrado na doença e que privilegiava uma medicina de alto custo, para um sistema de saúde pautado em valores de solidariedade e cidadania. O grande avanço diz respeito à ampliação do acesso da população aos serviços de saúde, inscrevendo os princípios da universalidade, equidade e integralidade das ações e, garantindo constitucionalmente a qualquer cidadão o atendimento em saúde. No entanto, num país como o Brasil com tamanha extensão territorial e inúmeras diversidades regionais, muitos desafios tiveram e ainda têm que ser enfrentados, para a efetiva implantação do SUS (BRASIL, 2003).

Diversos autores avaliam que após vinte anos de SUS, muitos desafios e impasses relacionados à sua implantação ainda persistem e apontam que essas dificuldades estão relacionadas a diferentes fatores. Lopes (2001) analisa que, se por um lado, o SUS qualificou a universalidade no acesso à saúde, por outro, não garantiu a melhoria da qualidade dos serviços na mesma velocidade em que se deu a ampliação do acesso.

Para Campos (2007), o crescimento da Atenção Primária à Saúde (APS)1 está acontecendo em velocidade e com qualidade abaixo da necessária, pois a maioria dos municípios persiste na valorização e financiamento dos hospitais e serviços especializados, que, apesar disso, funcionam com baixa eficácia e eficiência.

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Neste trabalho, conforme a Política Nacional de Atenção Básica- PNAB 2011, os termos Atenção Básica de Saúde e Atenção Primária à Saúde são considerados equivalentes.

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Além disso, Campos et al. (2008) destacam inúmeros problemas quanto à estrutura física dos equipamentos, o acesso que permanece crítico, as fragilidades na gestão e organização de redes de serviço, e na composição e desempenho das equipes. Referem ainda, problemas quanto à política de pessoal (falta de formação adequada e qualificada, e vínculos precários de contratação), financiamento insuficiente e uma heterogeneidade na implantação da rede de Atenção Básica de Saúde-ABS, no sentido da diversidade da organização da rede e dos programas.

[...] pode-se observar que, apesar da mudança de cenário, a ABS tende, na prática, a reproduzir o modelo biomédico dominante, sendo necessários esforços continuados e sistemáticos para reformular esse tipo de prática e de saber (p.151). Dentro destedebate, Carvalho; Cunha (2006) afirmam que a Atenção Básica no Brasil está longe de oferecer uma ampla cobertura, com eficácia adequada. Desse modo, pode-se compreender que vários fatores contribuem para uma degradação do Sistema Nacional de Saúde gerando um desencantamento com essa política e um descrédito quanto à capacidade “de transformar em realidade uma política tão generosa e racional” (CAMPOS, 2007, p. 302).

O Ministério da Saúde criou o Programa de Saúde da Família (PSF) em 1994, com o objetivo de reorganizar a Atenção Básica e possibilitar acesso universal e contínuo aos serviços de saúde, reafirmando os princípios do SUS.

Nesta perspectiva, em meados da década de 1990 alguns municípios reestruturaram sua rede de saúde, priorizando a Atenção Básica e, principalmente, elegendo a composição de equipes multiprofissionais, entendendo a necessidade da incorporação de profissionais para a mudança de modelo e a organização dos processos de trabalho e de gestão. A gestão do município de São Paulo, no período de 1989-1992, investiu na equipe multiprofissional nas Unidades Básicas de Saúde para atendimento, prioritariamente, a uma população em situação de maior risco social (OLIVER: BARROS; LOPES, 2005). O município de Campinas, no ano de 2000, implantou o Programa Paidéia de Saúde da Família, que por sua vez, defendia a gestão como democrática e participativa e valorizou o papel do profissional da saúde, buscando garantir a dupla finalidade do modelo, ou seja, produzir bens e serviços de saúde necessários a população e produzir trabalhadores com algum grau de satisfação no trabalho (CAMPOS, 2000).

Apesar dessas experiências, o SUS não se firmou enquanto política de Estado mas como política de governo, de maneira que a ideologia predominante tem sido a de contenção de gastos

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públicos, retração dos orçamentos sociais e programas focais de baixo custo, em detrimento à lógica de bem estar social (SANTOS, 2008). Desta forma, compreendendo que o trabalho em saúde possui uma especificidade referente à subjetividade e ao papel protagonista do trabalhador, os profissionais, base do sistema de saúde, vivenciam situações inadequadas, precariedade e descompromisso por parte da gestão. Nesse sentido, um grande desafio do SUS diz respeito aos trabalhadores, visto que a precariedade das condições de trabalho dos profissionais de saúde têm gerado um distanciamento destes em relação ao projeto SUS, que na maioria das vezes tem sido banalizado (FLEURY, 2011).

Esta pesquisa pretendeu identificar os problemas e insatisfações enfrentados pelo trabalhador no cotidiano de trabalho, procurando compreender de que maneira a atuação do profissional contribui para uma qualificação da atenção prestada na ABS e para a legitimação do SUS.

A importância deste trabalho justifica-se pela necessidade de colocar em pauta o papel dos trabalhadores, identificando como o trabalhador avalia sua atuação profissional na Atenção Básica de Saúde, delimitando as dificuldades encontradas na produção do seu trabalho, assim como as expectativas e a realização pessoal e profissional.

Com base na realidade vivenciada na rede primária de saúde, esta pesquisa propõe conhecer as perspectivas que o trabalhador SUS tem a respeito da sua produção no campo da prática e às condições de trabalho que lhes são impostas. Assim como, aprofundar as problemáticas citadas por diversos autores a respeito da gestão de pessoal, citadas como: deficiência de recursos humanos, condições precárias de estrutura física, vínculo empregatício precarizado, falta de investimento e desresponsabilização por parte da gestão pública. Objetivou-se compreender a atuação profissional e pensar em possíveis estratégias para a qualificação destes profissionais, podendo contribuir com a melhoria do sistema.

Diante disso, levantou-se a hipótese de que problemáticas, como as citadas anteriormente, influenciam a prática do profissional da ABS, instalando uma situação de apatia e imobilismo por parte desses trabalhadores.

Nesta pesquisa, assim como sugere Minayo (2004, p. 90) “nada pode ser intelectualmente um problema, se não tiver sido, em primeira instância, um problema da vida prática”. Dessa forma, a escolha do objeto está intrinsecamente relacionada à implicação da pesquisadora com o tema, considerando uma preocupação com a prática exercida na ABS, com os trabalhadores que estão

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constantemente envolvidos com situações geradoras de sofrimento e, acima de tudo, com a qualidade e efetividade do Sistema Único de Saúde brasileiro.

É importante ressaltar que esta pesquisa está vinculada ao projeto “Estudo da Estratégia de Apoio Paidéia: investigação sobre Apoio Institucional e Apoio Matricial (Núcleos de Apoio à Saúde da Família – NASF) no SUS”, coordenado pelo Prof. Dr. Gastão Wagner de Sousa Campos e desenvolvido pelo Coletivo de Estudos e Apoio Paidéia. Este projeto objetiva investigar o modo como a concepção teórica e metodológica Paidéia vem sendo assimilada pelos trabalhadores e gestores da rede de saúde.

Nesse sentido, a participação da pesquisadora neste Coletivo tem possibilitado implicações, seja dela para o grupo, ou vice-versa. De fato, os relatos da prática profissional e o conhecimento produzido por cada participante deste grupo provocam na pesquisadora uma desorganização naquilo que parecia estruturado, uma vez que estava instituído. Desta forma, há um movimento de reorganização dos questionamentos e da análise previamente elaborada. Além disso, estar no grupo significa encontrar um lugar de confirmação das ideias e produções experimentadas pela pesquisadora, bem como de apoio para a produção da atenção em saúde. Por outro lado, a escolha do objeto desta pesquisa que estuda as equipes de referência com enfoque na gestão de pessoal, também interfere na produção do grupo, seja por conta da temática, da experiência e da prática profissional relatada, ou mesmo pela possibilidade de convocar o trabalhador da saúde a refletir e referir sua realidade de trabalho.

Desse modo, a composição com este projeto se dá pela possibilidade de esmiuçar os fenômenos e as informações dos trabalhadores da rede de saúde do município de Campinas que atuam na Atenção Básica e que são afetados, de certo modo, pelo Apoio Institucional e Matricial. Nesse sentido, analisar as narrativas do trabalhador sobre o sistema de saúde, contribui para a compreensão de como estão sendo assimilados os conceitos do método Paidéia.

A organização do material coletado nesta pesquisa pretende favorecer a elaboração de linhas de sentido que possam contribuir no enfrentamento dos desafios encontrados, propiciando o

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Refletindo sobre a experiência da pesquisadora na Atenção Básica de Saúde de Campinas

O objeto de estudo desta pesquisa está intrinsecamente relacionado à implicação da pesquisadora com o tema. Após oito anos de trabalho no SUS Campinas, e todos eles na atenção básica, algumas questões afligiam seu cotidiano de trabalho. Apesar de não ter feito a graduação nesse município, toda a experiência prática somada à reflexão da teoria aprendida, aconteceram nesse espaço. A crença nesse modelo de saúde, a defesa do SUS e da atenção primária, além do compromisso com a qualidade do atendimento prestado, fizeram com que procurasse recursos para refletir, diagnosticar e enfrentar os desafios, na tentativa de provocar mudanças no micro espaço do trabalho em equipe e na sua própria atuação enquanto profissional do SUS.

A experiência se deu num Centro de Saúde localizado numa região periférica da cidade e que atende a uma população de 32.617 habitantes (CAMPINAS, 2000-2007). Segundo estimativas, é a maior população do Distrito em que se encontra e uma das maiores da cidade. Este território é caracterizado, segundo dados sócio-demográficos e empíricos, por alta taxa de natalidade, áreas de invasão, difícil acesso aos recursos básicos (inclusive saneamento básico de saúde), além de alto índice de criminalidade e risco social, constituindo uma região enredada em baixas condições de vida (CAMPINAS, 2001). Os recursos comunitários existentes na região ainda são escassos para possibilitar um estado de bem estar a esta população.

No ano de 2006, a pesquisadora iniciou suas atividades nesta unidade, que contava com cerca de oitenta profissionais, divididos em quatro equipes de referência. Cada uma dessas equipes é formada por um médico generalista, um enfermeiro, quatro auxiliares/ técnicos de enfermagem, um médico pediatra, um médico ginecologista-obstetra, um dentista, um auxiliar de consultório dentário/ técnico em higiene bucal, quatro agentes comunitários de saúde, um matriciador de saúde mental. Em muitos momentos, durante esses oito anos, as equipes não estiveram com seu quadro completo de funcionários, devido à demora para reposição frente à demissões, aposentadorias ou falecimentos. De acordo com os dados referentes à população da área de abrangência desta unidade, cada equipe de referência responsabiliza-se, em média, por 8.200 pessoas.

Durante esses anos de experiência profissional, a primeira impressão que afligia a pesquisadora era a percepção de uma apatia e imobilismo por parte dos colegas de trabalho. Ou seja, uma passividade e pouca responsabilização que comprometiam, inclusive, o reconhecimento

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das necessidades de saúde da população e a qualidade do serviço prestado. Junto a isso, era visível (saltava aos olhos) a insuficiência de recursos humanos, as condições precárias de estrutura física, de material disponível (inclusive dos essenciais e básicos para a realização do trabalho, como anestésico para Odontologia, gaze para curativos e até sabonete líquido para que os profissionais pudessem higienizar as mãos) e a dificuldade de compreensão do papel do serviço e do profissional de saúde, em especial na e da atenção básica.

No discurso do trabalhador, havia frequentes reclamações sobre a precarização dos vínculos de trabalho, os baixos salários, a falta de plano de cargos e carreiras adequados e atrativos (falta de uma carreira no SUS), pouco investimento e desresponsabilização por parte da gestão pública. Por outro lado, grande parte da população atendida demonstrava vínculo com o serviço, mas principalmente com algum profissional, ao mesmo tempo em que existiam reclamações quanto à demora do atendimento e das consultas para a especialidade, além de queixas específicas quanto à conduta de alguns profissionais da unidade.

Diante deste cenário, a pesquisadora procurou criar diversas tecnologias e ações intersetoriais, estabelecendo parcerias e discutindo estratégias, com base no reconhecimento do território. O trabalho desenvolvido foi focado na qualidade da atenção prestada, mas também na tentativa de envolver os profissionais nos projetos e nas ações de saúde, procurando resgatar a potencialidade do trabalho em equipe. Assim, desde o início, foram estabelecidos grupos em parceria com a equipe, compartilhamento de casos e atendimentos, e procurou-se estabelecer parcerias e projetos para além dos muros da unidade, buscando aproximação com os demais serviços de saúde, bem como com as instituições de ensino, de cultura, de promoção social e comunidade.

Esses projetos alimentavam o cotidiano de trabalho, possibilitando prazer e uma vontade de ir adiante, mesmo frente às diversidades e desafios enfrentados. A construção de cada projeto dependeu de muito esforço, luta e disposição, pois o fato de lidar com situações de vulnerabilidade, num território com alto índice de adoecimento, demandou a criação de estratégias que pudessem garantir a participação e a co-responsabilização da comunidade .No entanto, a partir da crise que se instituiu no município de Campinas, em especial, na Secretaria Municipal de Saúde, nas duas últimas gestões, os serviços de saúde passaram por situações extremas de precariedade e abandono. Deste modo, os trabalhadores tiveram que se conformar com as “migalhas” distribuídas, quando não, com a ausência de diretrizes, apoio e incentivos da gestão. E então, depararam-se com a

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vontade de ficar, estagnar e tentar sobreviver diante da desconstrução cotidiana dos projetos até então elaborados.

Na tentativa de sustentar suas crenças e os projetos da unidade, a pesquisadora procurou amparar-se em algum conhecimento científico que pudesse dar conta desse sofrimento. Esta experiência tem sido marcada pela busca de autores que acreditam e defendem um sistema público de saúde efetivo e de qualidade, com respostas que extrapolem especificamente a área da saúde, entendendo que o trabalho intersetorial é capaz de produzir diversas potencialidades que permitem experimentar novas práticas, inclusive em situações de desigualdades, sejam elas relativas ao direito, à economia, à cidadania. De fato, a luta é em defesa da igualdade social e de um sistema público de saúde que promova a solidariedade e a justiça social.

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Objetivos

Objetivo Geral:

Identificar como o trabalhador SUS da ABS de Campinas compreende seu trabalho, a ABS e o SUS.

Objetivos Específicos:

- Identificar as expectativas que o trabalhador SUS da ABS tem em relação ao trabalho desenvolvido no serviço ao qual está vinculado.

- Identificar problemas e insatisfações do trabalhador SUS da ABS em seu cotidiano de trabalho.

-Identificar como o trabalhador da ABS avalia sua produção no trabalho com relação aos princípios da ABS

- Entender como o trabalhador considera o SUS e, em particular, a ABS.

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Pressupostos Metodológicos

Neste estudo buscou-se compreender o objeto de pesquisa a partir da análise documental, da composição do referencial teórico disponibilizado e, sobretudo, através do discurso do profissional de saúde da ABS.

O interesse em desenvolver esta temática está implicado com a experiência da pesquisadora, que durante oito anos de atuação profissional na rede básica de saúde do município de Campinas/SP, sentia-se sensibilizada ao perceber o sofrimento da equipe neste nível de atenção. Inicialmente, foi tomada por um encantamento com a proposta da Atenção Primária, dada a possibilidade de sua resolutividade advinda, tanto em relação às respostas que os usuários dão aos trabalhadores, quanto por parte da equipe profissional. Percebia que o trabalho produzido era potente e transformador para usuário, equipe e comunidade. Por outro lado, o cotidiano de trabalho também trazia frustrações, sofrimento (dos usuários e trabalhadores), falta de apoio, falta de investimento (financeiro e político), falta de recursos humanos e materiais, sobrecarga de trabalho, enfim, as condições precárias de trabalho que induziam os profissionais a praticarem ações individualizadas e isoladas, culminando numa sensação de solidão, quando não, de abandono.

Numa mistura de sentimentos entre situações de encantamento e frustrações, buscou aporte no aprofundamento científico, como forma de sobrevivência. Desde o início quando tomou essa decisão, sua busca sempre esteve pautada na defesa e qualificação da Atenção Básica, bem como na valorização do profissional. Nesse sentido, a sua preocupação girava em torno de colaborar com a equipe para oferecer um serviço de qualidade, que fosse de encontro às expectativas e necessidades da população, ao mesmo tempo em que os profissionais pudessem reconhecer neste trabalho, satisfação e prazer.

Dessa forma, surgeiram alguns questionamentos para o desenvolvimento desta pesquisa: qual é a percepção do profissional da ABS com relação ao seu trabalho? Quais as dificuldades e desafios que o profissional da ABS enfrenta no cotidiano de trabalho? Quais expectativas o profissional da ABS tem em relação ao trabalho desenvolvido pelo serviço no qual atua? Como o profissional da ABS considera o Sistema Nacional de Saúde brasileiro e, mais especificamente, a organização da ABS? O fato de lidar com casos complexos e, ao mesmo tempo, ter de encontrar respostas ou encaminhamentos frente a inúmeras dificuldades e “faltas” enfrentadas na rotina de trabalho, leva o trabalhador da ABS a estabelecer-se distante da equipe e do usuário,

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desacreditando na potência de seu trabalho e entrando num estado de desânimo, como forma de sobrevivência?

As questões teóricas que fundamentam a metodologia deste trabalho estão relacionadas à pesquisa qualitativa, pois visam compreender a realidade humana vivida socialmente, incorporando a isso a subjetividade, a intencionalidade e o significado do objeto pesquisado e considerando a impossibilidade de neutralidade por parte do pesquisador.

De maneira diversa, a pesquisa qualitativa não procura enumerar e/ ou medir os eventos estudados, nem emprega instrumental estatístico na análise dos dados. Parte de questões ou focos de interesses amplos, que vão se definindo à medida que o estudo se desenvolve. Envolve a obtenção de dados descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo contato direto do pesquisador com a situação estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo (GODOY, 1995, p. 58).

A pesquisa documental desenvolveu-se da seguinte forma:

- levantamento da documentação e textos oficiais relacionados às políticas de saúde implantadas no Brasil, a partir do SUS e com enfoque na Atenção Básica de Saúde;

- sistematização e análise da legislação que regulamenta a Atenção Básica;

- levantamento e análise do referencial teórico e das produções científicas relacionadas à Atenção Básica de Saúde, especificamente direcionadas ao profissional da saúde;

- levantamento das produções científicas no contexto histórico da implantação da Atenção Básica no município de Campinas, a partir da década de 1970.

Na pesquisa de campo utilizou-se a técnica de grupos de discussão, uma técnica de investigação qualitativa que consiste em uma entrevista realizada a todo um grupo de pessoas com o intuito de copilar informações relevantes sobre o problema de investigação. Caracteriza-se pela não diretividade, a importância de se analisar tanto o que foi dito quanto o que não foi dito, permitindo descobrir mecanismos sociais ocultos ou latentes e tem como elemento fundamental a espontaneidade (MEINERZ, 2011; CASTRO et al., 2010).

Este tipo de grupo tem um papel relevante não só para os participantes, mas também para o investigador, o qual tem como função a interpretação, a compreensão ou a transformação, a partir das percepções, crenças e significados, proporcionados pelos protagonistas. Weller (2006) avalia que o grupo de discussão é um método de pesquisa que privilegia as interações e uma maior

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inserção do pesquisador no universo dos sujeitos, reduzindo, assim, os riscos de interpretações equivocadas sobre o meio pesquisado.

O papel dos grupos de discussão é trazer elementos do processo de socialização através da produção de discursos, mediados pelo investigador. No processo de análise, o investigador deverá produzir um discurso global que integre os vários discursos analisados.

O objetivo principal do grupo é elaborar, na interação de seus componentes, um discurso social. Busca-se, através desse discurso, numa microssituação artificial, reproduzir elementos de uma macrorrealidade social real. Os indivíduos falam para construir o grupo, fazendo com que o mesmo não seja uma finalidade, mas uma via para compreender algo (MEINERZ, 2011, p. 494).

Castro et al. (2010) apontam que uma das vantagens na utilização dos grupos de discussão é o fato de se produzir dados que dificilmente poderiam ser obtidos por outros meios, visto que os participantes são colocados em situações reais e naturais que permitem a espontaneidade e, graças ao clima permissivo, emergem opiniões, sentimentos, desejos, os quais em situações rigidamente estruturadas não seriam manifestados. As discussões grupais possuem uma alta validade subjetiva e o formato não estruturado das discussões permite ao moderador explorar assuntos não ditos. Além disso, a produção de resultado é ágil, pois vai enriquecendo-se e reorientando-se conforme avança o processo de investigação.

Objeto

Esta pesquisa tem como objeto de estudo o trabalho do profissional da ABS que será analisado a partir da percepção e do discurso das equipes profissionais que atuam neste nível de atenção.

Campo

O campo de atuação desta pesquisa é a rede de ABS da cidade de Campinas/SP, devido à organização da atenção primária no município. Campinas foi pioneira na abertura dos primeiros Centros de Saúde, no final da década de 70, na ampliação da cobertura, na participação da população na formulação das políticas e na inovação de arranjos democráticos de gestão. Organizou a rede básica de saúde no Modelo Paidéia no ano de 2000, com a incorporação do Agente Comunitário de Saúde(ACS) à equipe de saúde, com a proposta do matriciamento, da

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equipe ampliada (incluindo equipe de saúde mental) e acolhimento. Este panorama confere ao município um dos melhores quadros técnicos do Brasil, garantindo um destaque no território nacional e conferindo certo avanço com relação a alguns municípios e programas propostos (TRAPPÉ, 2012).

Uma consideração importante é com relação à organização da rede de saúde do município de Campinas/SP, que apresenta uma rede descentralizada, de forma que a responsabilidade pela administração dos serviços de saúde fica a cargo dos Distritos de Saúde, que são cinco: Norte, Sul, Sudoeste, Noroeste e Leste.

O trabalho de campo teve início após a aprovação da pesquisa pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp e pela Secretaria Municipal de Saúde do município de Campinas2

Sujeitos e técnica de coleta da pesquisa de campo

Os sujeitos desta pesquisa são profissionais que atuam em Centros de Saúde do município, com formação de nível médio, técnico e superior, e que realizam assistência direta ao usuário. Os critérios previamente estabelecidos para participação na pesquisa foram os seguintes: estes profissionais deveriam fazer parte da mesma equipe de referência; estar trabalhando em conjunto há pelo menos um ano; reunir-se em equipe de referência pelo menos quinzenalmente; a equipe deveria contar, minimamente, com os profissionais Médico (Generalista ou Clínico Geral), Enfermeiro, Auxiliar ou Técnico de Enfermagem, Dentista, Auxiliar ou Técnico de Consultório Dentário e Agente Comunitário de Saúde. Além disso, foram consideradas as equipes nas quais todos os profissionais expressassem interesse e desejo em participar do estudo.

Tendo em vista a descentralização administrativa da rede de saúde no município, no projeto de pesquisa optamos por realizar um grupo de discussão com uma equipe de referência de um Centro de Saúde de cada Distrito de Saúde, totalizando cinco grupos de discussão. No entanto, com a entrada em campo surgiram algumas dificuldades que trouxeram alterações às propostas iniciais. A primeira delas refere-se a dois dos critérios de inclusão para participação na pesquisa: a equipe estar trabalhando junta há pelo menos um ano e a composição mínima da equipe de profissionais. Com relação à primeira questão, as equipes contavam com profissionais

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admitidos, pois o município tinha realizado concurso público para médicos e enfermeiros no ano de 2010, com muitos profissionais sendo contratados até 2012. Por este motivo, alterou-se o critério de inclusão, considerando os profissionais da equipe que estivessem trabalhando juntos há, pelo menos, seis meses. Com relação à composição da equipe, uma dificuldade encontrada foi relacionada ao pessoal médico e da odontologia, pois, apesar da existência desses profissionais na unidade de saúde, nem sempre eles participavam das reuniões de equipe e/ou não faziam parte de uma equipe de referência. A alteração no critério de inclusão veio no sentido de buscar equipes que contassem com pelo menos um médico fazendo parte da equipe de referência, mas que não necessariamente tivesse equipe de odontologia.

A segunda dificuldade refere-se à disponibilidade dos profissionais em participarem dos grupos de discussão. Nas tentativas de aproximação com os gestores para levantar o interesse em participar da pesquisa, obteve-se poucas respostas e devolutivas, tanto com relação à possibilidade deles conversarem com suas equipes, quanto em atenderem e retornarem as ligações para uma conversa prévia sobre a pesquisa. Por isso, optou-se por escolher unidades em que houvesse algum contato ou alguma indicação para falar com o coordenador do serviço. No caso, a procura foi por profissionais que apresentassem mais abertura e interesse no trabalho acadêmico. Essa indicação foi dada por trabalhadores da rede de saúde de Campinas e por integrantes do Coletivo de Estudos e Apoio Paideia (do qual a pesquisadora faz parte).

Concomitante a isso, o Coletivo de Estudos estava realizando em cada um dos cinco Distritos de Saúde de Campinas, apresentações do projeto de pesquisa intitulado “Estudo da Estratégia de Apoio Paidéia: investigação sobre Apoio Institucional e Apoio Matricial (Núcleos de Apoio à Saúde da Família – NASF) no SUS”. Nessas reuniões, com Coordenadores Distritais, Apoiadores e Coordenadores de serviços, o objetivo era apresentar este projeto, iniciar uma comunicação com os Gerentes, divulgando que alguns pesquisadores começariam a procurá-los para desenvolverem suas pesquisas. Isso facilitou a entrada em campo.

Com a indicação, inicialmente a pesquisadora fez contato telefônico com os coordenadores de serviço, para explicar a proposta desta pesquisa e perguntar sobre o interesse em contribuir com a mesma. Havendo interesse do Gerente, apresentavam-se os critérios de inclusão, e era avaliado se esta unidade em questão contava com equipes que contemplassem esses critérios e, por fim, solicitava-se ao Gerente apresentar a proposta para a equipe e questionar sobre o interesse e desejo dos profissionais do serviço em participar da pesquisa.

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Nesta etapa do processo de pesquisa, pretendeu-se facilitar que as experiências profissionais fossem explicitadas, assim como as opiniões e ideias sobre a gestão do trabalho coletivo, na tentativa de acolher todas as vozes emergentes em cada grupo. Dessa forma, pensando em favorecer a participação da equipe e proporcionar certa comodidade, a realização dos grupos de discussão aconteceu na própria unidade de saúde na qual a equipe estava vinculada e no mesmo horário da reunião de equipe de referência, para que os trabalhadores não precisassem deslocar-se e pudessem participar do grupo durante seu período de trabalho, tentando não causar prejuízo na sua rotina.

De acordo com a literatura, os encontros devem ter a duração de 1h30 a 2h00 e as considerações sobre o número de participantes nos grupos de discussão não convergem para um número exato, mas os autores consideram que o grupo deve ser suficientemente pequeno para que todos os participantes possam opinar e suficientemente grande para que haja diversidade de opiniões. Nesse sentido, considerando o critério de participação estabelecido nesta pesquisa quanto ao número mínimo de profissionais que façam parte da equipe, visualizamos contar com seis participantes (nas equipes mínimas) chegando a um número de quinze nas equipes ampliadas que contém outras especialidades (Pediatra, Ginecologista, Psicólogo, Terapeuta Ocupacional) e com um número variável de Agentes Comunitários de Saúde e Auxiliares ou Técnicos de Enfermagem.

O mediador do grupo de discussão foi um integrante do Coletivo de Estudos e Apoio Paidéia e a pesquisadora ficou no papel de observadora para anotar questões relevantes, posturas dos participantes ou outros acontecimentos e percepções captadas durante o processo de grupo. Todos os grupos foram gravados e transcritos na íntegra, preservando-se a identidade dos autores nas falas, com a autorização dos mesmos.

Os sujeitos receberam um termo de consentimento livre e esclarecido, constando os objetivos da pesquisa e os procedimentos realizados, a confidencialidade das informações, a privacidade dos sujeitos na divulgação dos resultados da pesquisa, além de apontar a liberdade com relação ao desejo de abandonar a pesquisa a qualquer tempo.

O período da coleta de dados ocorreu durante o mês de maio/2013 a junho/2013, com a realização de dois grupos de discussão. A quantidade de grupos também foi alterada durante o trabalho de campo. Inicialmente foi pensada a realização de cinco grupos de discussão, mas após o segundo grupo realizado optou-se por referendar o trabalho à banca de qualificação para avaliar a saturação dos dados coletados, decidindo pela escolha de dois grupo.

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O primeiro grupo de discussão aconteceu no mês de maio/2013 e o segundo, no mês de junho/2013, com a participação total de dezesseis profissionais da rede básica de saúde. Ambos os grupos tiveram um único encontro, com uma média de uma hora e meia de duração.

Análise e interpretação do material empírico

A metodologia para análise de dados foi embasada por meio da construção de narrativas, tal como proposta por Ricoeur (apud Figueiredo, 2006) e da triangulação de métodos, proposta por Minayo; Assis; Souza (2005).

Para Ricoeur, as narrativas são construções de histórias sobre o agir humano, ou seja, a construção do enredo que dá sentido e coerência aos acontecimentos. Nos grupos de discussão a análise está presente em todo o processo de investigação, desde a seleção dos componentes até a forma como se desenrola a discussão. O produto a ser obtido será um discurso refletido por tudo o que foi notado pelo moderador e observador. A partir daí, passa-se a realizar a análise levando a uma verdadeira interpretação do discurso. Esta análise deverá estar centrada naquilo que chama a atenção do pesquisador dada a sua relevância para o tema do estudo. Por último, os resultados da análise serão apresentados em um informe narrativo, ou seja, a informação elaborada e organizada conceitualmente.

Neste trabalho, após a coleta de todos os dados obtidos nos dois grupos, os discursos dos participantes foram analisados, levando-se em consideração todas as anotações observadas em campo para a construção das narrativas. Dessa forma, assim como sugere Ricoeur, a pesquisadora apresenta as narrativas conforme sua própria interpretação dos discursos.

A escolha pela triangulação de métodos justifica-se pela complexidade dos dados obtidos frente aos estudos sobre a política da AB, os debates de referenciais teóricos que analisam o SUS e em especial a AB, a atribuição de sentido da experiência vivenciada pela pesquisadora, o contexto político do município de Campinas e as narrativas dos grupos sociais que formam a pesquisa.

Este método é uma estratégia de diálogo entre distintas áreas do conhecimento, com a proposição de quantificar dimensões objetivas articuladas com as dimensões subjetivas de interpretação da realidade e de superar a falsa dicotomia entre sujeito e objeto da pesquisa. Este método, baseado na obra “Crítica da Razão Pura”, de Kant, pressupõe que o pesquisador parte de um conhecimento prévio sobre a realidade e, ao experimentá-la viabiliza o entrelaçamento entre

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teoria e prática, atribuindo sentido a partir do contato efetivo com essa realidade (MINAYO; ASSIS; SOUZA, 2005).

Nesta teoria há uma composição entre as dimensões qualitativas e quantitativas do objeto, na perspectiva da interdisciplinaridade, enquanto estratégia para abordagem de objetos complexos. Ou seja, possibilita agregar diversos pontos de vista dos grupos sociais que formam a pesquisa, garantindo a representatividade, a diversidade de posições narradas, a visão de mundo e da realidade dos sujeitos, bem como, a multiplicidade de formulações teóricas utilizadas pelo pesquisador.

Para a exposição dos resultados da pesquisa, organizou-se o texto em quatro capítulos. O Capítulo I apresenta uma discussão sobre a Atenção Básica de Saúde, conceituando este nível de atenção, com base nos estudos já realizados por alguns pesquisadores e na legislação que regulamenta o SUS. A seguir, um levantamento da produção científica a respeito da análise sobre as dificuldades para a efetivação da Atenção Primária à Saúde.

O segundo Capítulo aborda a história da rede básica de saúde no município de Campinas/SP, a partir da década de 1970.

A partir dessa contextualização, no Capítulo III apresentam-se as narrativas elaboradas através dos dois grupos de discussão que fizeram parte da pesquisa de campo. No entanto, considerou-se o discurso das equipes com base nos recursos apontados conceitualmente neste trabalho.

O Capítulo IV apresenta o modelo de Triangulação como método para a construção da análise, partindo das narrativas dos grupos de trabalhadores participantes desta pesquisa numa inter-relação com debates de referenciais teóricos que analisam o SUS e em especial a Atenção Básica, os estudos sobre a política da Atenção Básica, a experiência da pesquisadora e o contexto

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CAPÍTULO I – Atenção Básica de Saúde

No Brasil, as ações e serviços de saúde estão organizados de maneira hierarquizada e regionalizada, constituindo uma rede de serviços que se destinam à atenção e assistência em saúde, visando tanto garantir o atendimento integral à população, quanto evitar a fragmentação das ações em saúde. Essa rede de serviços é dividida, conforme a complexidade, em três níveis de atenção (primário, secundário e terciário). O acesso à população ocorre preferencialmente pela rede básica de saúde (atenção primária) que, assim, é considerada a porta de entrada do sistema de saúde. Os casos de maior complexidade devem ser encaminhados aos serviços especializados, que podem ser organizados de forma municipal ou regional, dependendo do porte e da demanda do município.

A atenção ambulatorial de primeiro nível, Atenção Básica de Saúde, é constituída por Centros de Saúde, Postos de Saúde, Unidades de Saúde da Família ou Unidade Básica de Saúde. Os serviços deste nível de atenção devem estar qualificados para atender e resolver os problemas de saúde mais comuns e prioritários de uma população, ordenando e racionalizando o acesso aos serviços ambulatoriais especializados e hospitalares (GIOVANELLA; MENDONÇA; 2008). A Média Complexidade (nível secundário) vem sendo caracterizada pelos serviços médicos ambulatoriais e de apoio diagnóstico e terapêutico de atenção especializada, com procedimentos especializados de menor valor financeiro (de acordo com as tabelas do SUS). Já a Alta Complexidade, envolve procedimentos de alta tecnologia e/ou alto custo, como os serviços de diagnose, terapia e atenção hospitalar (SOLLA; CHIORO; 2008).

Levando em consideração o objeto de estudo desta pesquisa, ou seja, o trabalho do profissional da Atenção Básica de Saúde, este capítulo destina-se a localizar a atenção primária no escopo da rede de saúde, apresentando a formulação teórica da Atenção Básica de Saúde no Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde. Para tanto, realizamos um estudo dos principais documentos e portarias ministeriais que se referem à Atenção Básica, a partir da década de 1980 até o período atual.

A Atenção Básica de Saúde está definida como o contato preferencial dos usuários com o sistema de saúde e caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde. Seus princípios norteadores são os seguintes:

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universalidade; acessibilidade e coordenação do cuidado; vínculo com a clientela e continuidade do cuidado; integralidade; responsabilização; humanização; equidade; e participação social.

Ao contrário da antiga proposição de caráter exclusivamente centrado na doença, suas ações desenvolvem-se:

(...) por meio do exercício de práticas gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações de territórios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária, considerando a dinamicidade existente no território em que vivem essas populações. Utiliza tecnologias de elevada complexidade e baixa densidade, que devem resolver os problemas de saúde de maior frequência e relevância em seu território. A Atenção Básica considera o sujeito em sua singularidade, na complexidade, na integralidade e na inserção sócio-cultural e busca a promoção de sua saúde, a prevenção e tratamento de doenças e a redução de danos ou de sofrimentos que possam comprometer suas possibilidades de viver de modo saudável (BRASIL, 2006, p. 10).

A estratégia da Atenção Básica busca definir territorialmente os determinantes e condicionantes de saúde das coletividades, tentando evitar as situações de risco e vulnerabilidade, com base na proteção da saúde, prevenção de agravos, redução de danos, resiliência, com objetivo de desenvolver uma atenção integral que impacte na autonomia das pessoas e na situação de saúde, principalmente nas demandas e necessidades de saúde de maior freqüência e relevância em seu território. As tecnologias de cuidado utilizadas são complexas e variadas e apresentam o imperativo ético de que toda demanda, necessidade de saúde ou sofrimento devem ser acolhidos (BRASIL, 2011).

Desta forma, é o local responsável pela organização do cuidado à saúde dos indivíduos, famílias e comunidade e seu papel é, de um lado procurar melhorar a saúde da população e, de outro, proporcionar equidade na distribuição de recursos (STARFIELD, 2002). As políticas atuais definem que a Saúde da Família é a estratégia prioritária para a organização da Atenção Básica, reforçando uma mudança de modelo que se integra a todo o contexto de reorganização do sistema de saúde.

A Atenção Básica está totalmente inscrita na comunidade e a equipe de saúde tem um importante papel de estar vinculada e ser reconhecida como referência do cuidado em saúde para aquela região. A atuação das equipes ocorre nas unidades básicas de saúde, mas também nas residências e na mobilização da comunidade, devendo responsabilizar-se pela atenção à saúde, mas, também, promover a co-responsabilização do cuidado em saúde, através da participação

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social, de forma a garantir a continuidade das ações de saúde e a longitudinalidade do cuidado.

Além disso, a equipe deve assumir o papel de coordenar a rede, tanto entre serviços de saúde, quanto na aproximação com os outros equipamentos sociais, exercendo a intersetorialidade.

O estabelecimento de mecanismos que assegurem acessibilidade e acolhimento pressupõe uma lógica de organização e funcionamento do serviço de saúde, que parte do princípio de que a unidade de saúde deva receber e ouvir todas as pessoas que procuram os seus serviços, de modo universal e sem diferenciações excludentes. O serviço de saúde deve se organizar para assumir sua função central de acolher, escutar e oferecer uma resposta positiva, capaz de resolver a grande maioria dos problemas de saúde da população e/ou de minorar danos e sofrimentos desta, ou ainda se responsabilizar pela resposta, ainda que esta seja ofertada em outros pontos de atenção da rede. A proximidade e a capacidade de acolhimento, vinculação, responsabilização e resolutividade são fundamentais para a efetivação da atenção básica como contato e porta de entrada preferencial da rede de atenção (BRASIL, 2011).

Sendo assim, este nível primário de atenção caracteriza-se por: ser porta de entrada de um sistema hierarquizado e regionalizado de saúde, com acesso universal e contínuo a serviços de saúde de qualidade e resolutivos; ter território definido, com uma população delimitada, sob a sua responsabilidade; intervir sobre os fatores de risco aos quais a comunidade está exposta; prestar assistência integral3, permanente e de qualidade; realizar atividades de educação e promoção da saúde; estabelecer vínculos de compromisso e de co-responsabilidade com a população; estimular a organização das comunidades para exercer o controle social das ações e serviços de saúde; utilizar sistemas de informação para o monitoramento e a tomada de decisões; realizar avaliação e acompanhamento sistemático dos resultados alcançados, como parte do processo de planejamento e programação; atuar de forma intersetorial, por meio de parcerias estabelecidas com diferentes segmentos sociais e institucionais, de forma a intervir em situações que transcendem a especificidade do setor saúde e que têm efeitos determinantes sobre as condições de vida e saúde dos indivíduos-famílias-comunidade (BRASIL, 2006; 2011).

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A PNAB 2011 define a integralidade como sendo a integração de ações programáticas e demanda espontânea; articulação das ações de promoção à saúde, prevenção de agravos, vigilância à saúde, tratamento e reabilitação e manejo das diversas tecnologias de cuidado e de gestão necessárias a estes fins e à ampliação da autonomia dos usuários e coletividades; trabalhando de forma multiprofissional, interdisciplinar e em equipe; realizando a gestão do cuidado integral do usuário e coordenando-o no conjunto da rede de serviços.

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Um fator importante para esta pesquisa é que a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB 2011) cita a necessidade da valorização dos profissionais de saúde por meio do estímulo e do acompanhamento constante de sua formação e capacitação e justifica a importância da equipe na mudança do modelo de saúde. Assim, define que:

A presença de diferentes formações profissionais assim como um alto grau de articulação entre os profissionais é essencial, de forma que não só as ações sejam compartilhadas, mas também tenha lugar um processo interdisciplinar no qual progressivamente os núcleos de competência profissionais específicos vão enriquecendo o campo comum de competências ampliando assim a capacidade de cuidado de toda a equipe. Essa organização pressupõe o deslocamento do processo de trabalho centrado em procedimentos, profissionais para um processo centrado no usuário, onde o cuidado do usuário é o imperativo ético-político que organiza a intervenção técnico-científica (BRASIL, 2011).

Dessa forma, este trabalho pretende analisar como as equipes dos profissionais desses serviços entendem e vivenciam essa política de saúde.

1.1. A Construção da Política Nacional de Atenção Básica no Brasil

A Constituição de 1988 estabelece a saúde como um direito universal, de modo que é dever do Estado, garantir acesso universal e igualitário aos serviços de saúde. O artigo nº. 199 desta Lei estabelece que o SUS deve ser um sistema universal, integrado, público e com direção única em cada esfera de governo. As ações e serviços de saúde executadas pelo SUS deverão ser organizadas de forma regionalizada e hierarquizada em níveis de complexidade crescente (BRASIL, 1988).

Desse modo, a direção do SUS é exercida em âmbito nacional pelo Ministério da Saúde, e em âmbito estadual e municipal pelas respectivas Secretarias de Saúde ou órgão equivalente. Considerando as funções de cada nível de governo, a responsabilidade pela formulação e condução da Política Nacional de Saúde cabe ao governo federal, os estados ficam responsáveis pela administração do conjunto de funções de gestão, coordenação, controle, elaboração e prestação de alguns serviços de saúde, aos municípios cabe o planejamento, a gestão e coordenação do plano municipal de saúde e a execução dos serviços.

As Leis nº 8.080, publicada em 19 de setembro de 1990, e nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, denominadas Leis Orgânicas da Saúde, regulamentam e materializam o SUS, com o intuito

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de garantir atendimento público à saúde para qualquer cidadão e reduzir a desigualdade na assistência à saúde.

A Lei n.º 8.080 “dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da Saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes [...]” (Brasil, 1990, s/p), o que significa, regular as ações e serviços de saúde em todo o território nacional, reafirmando a saúde enquanto um direito fundamental de todo cidadão. Assim, compete ao Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, através da formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos, estabelecendo condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

Já a Lei n.º 8.142 “dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde [...]”, tratando mais especificamente do financiamento do SUS e da participação popular nas políticas públicas de saúde (BRASIL, 1990, s/p).

Desde a década de 1980, período da reforma do sistema de saúde brasileiro, o governo federal baseou-se na regionalização e hierarquização dos serviços de saúde e na descentralização para os municípios, transferindo aos governos locais a gestão dos serviços de saúde. A municipalização prevê que o município seja o responsável pela gestão de todo o sistema de saúde de seu território, tornando-se o responsável imediato, apesar de não ser o único, pelas necessidades de saúde de sua população (BRASIL, 1996; CAMPOS L., 2009).

Como a municipalização estava normatizada na Constituição Federal e na Lei nº 8.080 e algumas ações já vinham sendo tomadas no sentido de descentralização, foram criadas as Normas Operacionais Básicas e as Normas de Assistência à Saúde, na perspectiva de aperfeiçoar as ações do SUS, contribuindo para a implantação e operacionalização da saúde. As Normas Operacionais Básicas (NOB-SUS 01/91, NOB-SUS 01/93 e NOB-SUS 01/96) editadas em 1991, 1993 e 1996, tratam do funcionamento e operacionalização do SUS.

A NOB 01/91 estabeleceu a política de financiamento do SUS, definindo o repasse direto e automático de recursos do fundo nacional para os fundos estaduais e municipais de saúde (BRASIL, 1991). Com isso, redefiniu toda a lógica de financiamento e, consequentemente, de organização do SUS, com vistas à municipalização. Aprovou os consórcios administrativos intermunicipais e definiu o Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA-SUS) para pagamento aos

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