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Representações sociais de juventudes pobres para psicólogos/as que atuam no sistema único da assistência social

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Academic year: 2021

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Vladya Tatyane Pereira de Lira

Representações Sociais de

juventudes pobres para

psicólogos/as que atuam no

Sistema Único da Assistência

Social

Recife, 2013

Universidade Federal de Pernambuco

Programa de Pós-graduação em Psicologia

Centro de Filosofia e Ciências Humanas Curso de Mestrado em Psicologia

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VLADYA TATYANE PEREIRA DE LIRA

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE JUVENTUDES POBRES PARA PSICÓLOGOS/AS QUE ATUAM NO SISTEMA ÚNICO DA ASSISTÊNCIA SOCIAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia.

Orientadora: Profª. Drª. Fatima Maria Leite Cruz

RECIFE 2013

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VLADYA TATYANE PEREIRA DE LIRA

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE JUVENTUDES POBRES PARA PSICÓLOGOS/AS QUE ATUAM NO SISTEMA ÚNICO DA ASSISTÊNCIA SOCIAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia. Aprovada em: _____/____/_____

Comissão Examinadora:

Profª. Drª. Fatima Maria Leite Cruz – UFPE 1° Examinador/Presidente

Prof. Dr. Aurino Lima Ferreira – UFPE 2° Examinador

Profª. Drª. Jaileila de Araújo Menezes – UFPE 3° Examinador

Profª. Drª. Maria de Fátima Santos – UFPE Suplente interna

Prof. Dr. Alexandre Simão de Freitas – UFPE Suplente externo

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Catalogação na fonte

Bibliotecária Maria do Carmo de Paiva CRB-4 1291

L768r Lira, Vladya Tatyane Pereira de.

Representações sociais de juventudes pobres para psicólogos/as que atuam no Sistema Único da Assistência Social / Vladya Tatyane Pereira de Lira. – Recife: O autor, 2013.

136 f. : il. ; 30 cm.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Fátima Maria Leite Cruz.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Pernambuco, CFCH. Pós-Graduação em Psicologia, 2013.

Inclui referências e anexos.

1. Psicologia. 2. Representações sociais. 3. Juventude. 4. Pobreza. 5. Psicólogos. 6. Assistência Social. I. Cruz, Fátima Maria Leite (Orientadora). II. Título.

150 CDD (22. ed.) UFPE (CFCH2013-113)

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Este trabalho é dedicado sobretudo a todos/as jovens invisibilizados/as em nossa sociedade e que são excluídos/as do direito de viver sua própria vida.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a DEUS por ter possibilitado a Vida e a oportunidade de sonhar e poder concretizar meus sonhos.

A minha família, representada pelo meu pai, pela minha mãe, meus/minhas irmãos/ãs em especial a Keylla, meus/minhas tios/tias, meu avô, minha avó e minha tia-mãe Suely e madrinha Lidia, sem o apoio e compreensão de vocês nada disso seria possível.

Ao meu querido amigo Emmanuel Andrade que apesar do pouco tempo de encontro na vida fez muita diferença para essa construção, meu muito obrigada, não seria possível sem você. Amigas da vida e da Academia: Suely Emília, por ter sido minha primeira referência para trilhar esse caminho; Jesus pelas escutas, Fernanda Siqueira pela disponibilidade em ajudar, Manu Malta e Eliana Almeida pelo cuidado que teve comigo e compreensão, enfim a todas amigas da Academia que contribuíram com suas palavras de força e incentivo.

Pessoas que sem seu acolhimento, atenção, incentivo, compromisso e dedicação não seria possível chegar até aqui: Fernanda Sardelli, Vera Lúcia e Vanessa Benevides sem palavras, obrigada. A Ilcélia pelo seu carinho e acolhimento e por ter sido junto a Socorro as primeiras a sonhar essa história comigo; Dani Rabello, Cybeli e Heleno, meu e minhas companheiro/as de mestrado, não esquecerei nenhum dos nossos momentos de alegria, choro, medo e realização a cada conquista, a cada superação.

Rodrigo Ferreira, obrigada pela sua contribuição e aos/as amigos/as Renato Brito, José Maria Bacelar, Priscila e Deni, pelas palavras de incentivo nos momentos mais difíceis. As minhas monitoras: Brena, Silvana, Deyne e Regina que acompanharam todo o processo de pesquisa e a João pela sua disponibilidade em nos atender e orientar durante todo o mestrado. E Vera Lúcia você não seria possível chegar ao fim, sua contribuição fez toda diferença.

As minhas mestres Jaileila Menezes, Karla Galvão e Fátima Santos e aos colegas do trabalho em Vitória, em especial Andreza, sem a sua disponibilidade em me ajudar, também não seria possível. Claudine, Jéssica, Elaine, Emmanuelle, Patrícia, Cynthia, Bruna e Dani Marinho obrigada por estarem junto de mim durante todo o processo de construção, o apoio de vocês e compreensão foram fundamentais para eu chegar até aqui.

E por fim agradeço a minha orientadora Fatima Cruz por me receber como sua orientanda, por acreditar no meu potencial e pela atenção despendida durante a construção dessa pesquisa.

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RESUMO

Analisamos, nesta pesquisa, as representações sociais da juventude pobre por psicólogos/as que atuam no Sistema Único da Assistência Social (SUAS) em Recife e Região Metropolitana do Recife (RMR) e prestam serviços a jovens. A complexidade do tema se destaca por sua ambiguidade, imprecisão e pelo seu caráter historicamente construído, o que provocou uma pluralidade conceitual e no âmbito da Psicologia. Como objetivos: identificamos os sentidos compartilhados de juventudes e juventudes pobres pelos/pelas psicólogos/as que atuam nos serviços para jovem no SUAS; analisamos os componentes curriculares relacionados ao Desenvolvimento e concepções de juventudes presentes nos cursos de Psicologia em Recife e RMR; e relacionamos as representações de juventudes dos/das psicólogos/as participantes com a sua formação acadêmica. Adotamos como referencial teórico-metodológico a Abordagem Estrutural das representações sociais de Abric, a qual nos possibilitou identificar o conteúdo das representações sociais de juventudes e sua estrutura. No método, qualitativo e plurimetodológico, realizamos na fase 1 a análise documental das matrizes dos componentes curriculares de 07 cursos de Psicologia de Recife e RMR referentes às concepções de juventudes nos ementários de 1980 a 2012; na fase 2, aplicamos 61 questionários de Associação livre com os termos indutores juventude e juventude pobre, seguidos da hierarquização das palavras e um questionário sociodemográfico para identificar o perfil profissional dos/das participantes; e na fase 3, um grupo focal cuja escolha dos/das participantes teve como critério a atuação profissional exclusivamente junto aos/as jovens pobres. Os resultados: na 1ª fase, a temática da juventude é majoritariamente discutida nos cursos analisados tendo como base os pressupostos da Psicanálise e/ou marcador biológico. Na 2ª fase, os resultados corroboram os achados da 1ª, e no termo indutor juventude pobre foram realçadas as faltas e as vulnerabilidades; no grupo focal, os/as psicólogos/as expressam o sentido de falta social e econômica, no entanto, responsabilizam o próprio jovem por sua condição social justificada como decorrência da desestrutura familiar.

Palavra-chave: Representações sociais. Juventude pobre. Formação de psicólogos. Atuação

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ABSTRACT

We analyse in this research project, the social representation from youth by psychologists that act on “Sistema Único da Assistência Social (SUAS)” in Recife and its metropolitan mesoregion of Recife and rend services to the young. The complexity of this theme is highlighted by its ambiguity, imprecision and by its character historically built, which provoked a conceptual plurality and on psychology ambit. As objectives: we identified the shared senses of youth and poor youth by psychologists that rend services to youngsters on SUAS; we also analyzed the curricular components related to development and conceptions of youth present on Psychology course in Recife and neighborhood; and related the youth representation from the participants psychologists and theirs academic background. We adopted as referential methodological-theorical the Structural Approach from Abric social representation, which permitted identify the content of youth social representation and its structure. In the method, qualitative and plurimethodological, we achieved in this first stage the documental analysis from the curricular component matrix of 07 psychology courses in Recife and its mesoregion referring to youth conceptions registered in the memorandum book between 1980 and 2012; in the second stage, 61 inquiries were applied from free Association using the inductor term youth and poor youth, followed by the words in order of hierarchizing and a social demographic questionnaire to identify the professional profile from participants; and in the third stage, a focal group which the participants choice had as criteria the professional actuation exclusively towards the poor youth. The results: in the first stage, the youth set of themes is mostly discussed on the analyzed courses having as base the the Psychoanalysis pretext and/or biological marker. In the second stage, the results confirmed the datum achieved in the first stage, and the inductor term poor youth the lack and vulnerabilities were highlighted; in the focal group, the psychologists showed their sense of social and economic lack, howeverm, they blame the young himself/herself for his/her social condition justified as consequence of familiar disruption.

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LISTA DE TABELAS

Quadro 1. Instituições convocadas para pesquisa ... 61 Quadro 2. Os programas sociais que participaram da pesquisa ... 63 Quadro 3. Informações sobre as instituições pesquisadas e que foram avaliadas no período de 1980 a 1990 ... 74 Quadro 4. Informações sobre as instituições pesquisadas e que foram avaliadas no período de 1991 a 2000 ... 79 Quadro 5. Informações sobre as instituições pesquisadas e que foram avaliadas no período de 2001 a 2012.2. ... 81 Quadro 6. Principais conteúdos teóricos e práticos do curso de Psicologia utilizados pelos/pelas psicólogos/as na sua prática profissional junto a jovens... 91 Quadro 7. Palavras associadas ao termo indutor Juventude por frequência e ordem média de evocação ... 94 Quadro 8. Palavras associadas à Juventude Pobre por ordem de frequência e ordem média de evocação ... 96 Quadro 9. Associação livre e Hierarquização das palavras por termo indutor ... 100 Quadro 10. Classe temática, categorias e subcategorias geradas no grupo focal ... 102

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABEP – Associação Brasileira de Ensino em Psicologia

CENTRO POP – Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua CJ – Centro da Juventude

CNAS – Conselho Nacional da Assistência Social CRAS – Centro de Referência da Assistência Social

CREAS – Centro de Referência Especializado da Assistência Social CREPOP – Centro de Referência de Psicologia e Políticas Públicas DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais

IASC – Instituto de Assistência Social e Cidadania LA – Liberdade Assistida

LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social

PAIFI – Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos PNAS – Política Nacional da Assistência Social

PSB – Proteção Social Básica

PSC – Prestação de Serviços à Comunidade PSE – Proteção Social Especial

RMR – Região Metropolitana do Recife SUAS – Sistema Único da Assistência Social

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 12

2 AS PERSPECTIVAS QUE PERPASSAM A FORMAÇÃO DE PSICOLÓGOS/AS .... 20

2.1 A Psicologia no Brasil ... 20

2.2 Formação em Psicologia ... 25

2.3 Psicologia e Políticas Públicas da Assistência Social ... 29

3 JUVENTUDES E JUVENTUDES POBRES: CONCEPÇÕES, PREDOMINÂNCIAS E TENSÕES ... 36

3.1 Conceituando: adolescência e Juventude ... 36

3.2 Juventudes Pobres ... 42

4. A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS – TRS ... 45

4.1 A TRS ... 45

4.2 A construção das representações sociais ... 51

4.3 Abordagens em TRS ... 52

4.4 A Abordagem Estrutural de Abric ... 53

5. O MÉTODO ... 57

5.1 Construção dos dados ... 59

5.2 Questionário sociodemográfico e o perfil dos/das profissionais em atuação no SUAS . 64 5.3 Questionário de Associação Livre e Hierarquização das Palavras: Juventude e Juventude Pobre ... 64

5.4 Grupo Focal ... 67

5.5 Procedimentos de Análise ... 67

5.5.1 Fase 1: Análise documental ... 68

5.5.2 Fase 2: Questionários de associação livre ... 70

5.5.3 Fase 3: Grupo Focal ... 70

6. ANÁLISES E RESULTADOS ... 72

6.1 Análise documental: as matrizes curriculares dos cursos de Psicologia e os componentes curriculares relativos ao Desenvolvimento Humano ... 72

6.1.1 Período de 1980 a 1990: concepção de juventude negativa, sofrida e patologizada 73 6.1.2 Período de 1991 a 2000 – forte influencia da Psicanálise: concepção de juventude ainda inatista, universal e a-histórica ... 78

(12)

6.1.3 Período de 2001 a 2012: permanência de concepções anteriores e avanços com uma

referência a diversidade, pluralidade e perspectiva política das juventudes. ... 80

6.2 Análise dos questionários sociodemográficos e do Perfil Profissional ... 89

6.3 Análise dos questionários de associação livre e hierarquização de palavras ... 93

6.3.1 Palavras associadas ao termo indutor Juventude... 94

6.3.2 Palavras associadas à expressão indutora Juventude pobre ... 96

6.4 Análise do Grupo Focal : o que os/as profissionais de Psicologia que atuam no SUAS dizem acerca dos/das jovens pobres ... 99

6.4.1 Adolescência e juventude: a dificuldade inicial na definição ... 100

6.4.2 Representações de Juventude e Juventude Pobre ... 102

6.4.3 Classe temática: Juventude naturalizada ... 103

6.4.4 Classe temática: Juventude pobre ... 105

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 110

8. REFERÊNCIAS ... 110

ANEXOS ... 124

ANEXO A -TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ... 124

ANEXO B – CARTA DE ANUÊNCIA: CREAS – JABOATÃO DOS GUARARPES ... 126

ANEXO C – CARTA DE ANUÊNCIA : CRAS – OLINDA ... 127

ANEXO D– CARTA DE ANUÊNCIA: CRAS – JABOATÃO DOS GUARARAPES ... 128

ANEXO E – CARTA DE ANUÊNCIA: IASC - RECIFE ... 129

ANEXO F – CARTA DE ANUÊNCIA: CREAS – OLINDA ... 130

ANEXO G – QUESTIONÁRIO SOCIODEMOGRAFICO E DO PERFIL PROFISSIONAL ... 131

ANEXO H – ROTEIRO DO QUESTIONÁRIO ASSOCIAÇÃO LIVRE ... 133

TERMO INDUTORES: JUVENTUDE e JUVENTUDE POBRE ... 133

ANEXO I ... 134

GRÁFICOS 1: SEXO ... 134

GRÁFICOS 2: IDADE ... 134

GRÁFICO 3: IES ... 135

GRÁFICO 4: DESDE QUANDO TRABALHA COM JOVENS ... 135

GRÁFICO 5: POSSUIR PÓS-GRADUAÇÃO ... 136

GRÁFICO 6: ESTUDOS NA GRADUAÇÃO CONTRIBUIRAM PARA SUA ATUAÇÃO COM JOVENS... 136

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1 INTRODUÇÃO

Nesta pesquisa buscamos compreender as representações sociais de juventudes por psicólogos/as que atuam no Sistema Único da Assistência Social – SUAS - e prestam serviços aos jovens em Recife e Região Metropolitana do Recife - RMR. Essa temática é complexa e controversa, pois não se tem um conceito unívoco de juventude, por razões tanto históricas, quanto sociais e culturais, o que desencadeia uma pluralidade conceitual e de compreensão sobre essa categoria no âmbito da Psicologia.

O interesse pela temática surgiu da experiência profissional da autora como docente do curso de graduação em Psicologia, bem como pela sua atuação enquanto psicóloga junto aos/as jovens pobres no Centro da Juventude (CJ) que fazem parte do Programa Vida Nova1

do Governo Estadual e, também, das discussões atuais sobre esse grupo social. Naquele trabalho com as juventudes de periferia, parecia que a graduação em Psicologia que havia cursado não atendiam nas disciplinas cursadas a realidade social e o universo de vida desses/dessas jovens vinculados/as ao CJ. Durante a formação inicial já se percebia que as discussões acadêmicas pareciam “presas” a critérios biológicos, com incorporação de saberes da área de saúde, jurídica e outras; aos cronológicos, com a descrição de um padrão típico de ser jovem que, muitas vezes, patologizava o sujeito que se estudava.

Dentro desse contexto de inquietações é que surgiu nosso problema de pesquisa e passamos a nos interrogar como vem sendo discutida a temática da juventude nos cursos de graduação em Psicologia? Diante da diversidade de juventudes e suas configurações, em diferentes contextos, quais as concepções de juventudes compartilhadas pelos/pelas psicólogos/as que prestam serviço aos jovens pobres? Será uma visão negativista, patológica, a partir da pertença social do/da jovem? Haverá caracteres de tradição da psicologia nas suas primeiras aproximações acerca do desenvolvimento? Existiriam sentidos idealizados em relação ao ser jovem entre os psicólogos (as) que atendem jovens pobres?

Nesta pesquisa a juventude foi considerada uma construção social “a partir de necessidades sociais e econômicas e de características que vão se construindo no processo”

1 O Programa Vida Nova, do Governo do Estado de Pernambuco tem como fundamento a garantia de direitos às

famílias e indivíduos em situações de risco e vulnerabilidade social e pessoal, através dos serviços e ações/intervenções especializadas com foco na proteção social especial de média e alta complexidade, necessárias ao atendimento das determinações da Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS nº 8742 de 07/12/93, da Política Nacional de Assistência Social – PNAS e Norma Operacional Básica do Sistema Único da Assistência Social – NOB/SUAS. Nele está inserido o Centro da Juventude, que atende jovens de dezesseis a vinte e nove anos, e promove ações de Proteção Social Especial de Média Complexidade através de ações socioassistenciais e educativas, objetivando o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, bem como a qualificação profissional e inserção no mundo do trabalho. Disponível em: http://200.238.107.83/web/sedsdh/vida-nova. Acessado em 14 de maio de 2012.

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(OZELLA, 2002, p.23). Nesta perspectiva, a juventude é vista como uma criação simbólica, gerada no interior dos diversos grupos sociais, utilizada na demarcação de atitudes e comportamentos a ela atribuídos, e desta forma, estaria vinculada ao reconhecimento pessoal do sujeito como possuidor ou não destas qualidades (GROPPO, 2000). Considera-se, ainda, a influência de gênero, etnia, bem como os contextos sociais, econômicos e culturais, nos quais a juventude está inserida, dentre outros elementos (GROPPO, 2000; OZELLA, 2002; DAYRELL, 2003; NOVAIS, 2006; SCOTT et al., 2002).

Em decorrência dessa evidente pluralidade conceitual acerca da juventude, nesta pesquisa adotaremos a nomenclatura juventudes como sugeridas por Rezende (1989), uma vez que existem vários contextos, os quais os/as jovens brasileiros/as vivem suas vidas.

Pretendíamos compreender a formação inicial dos/das psicólogos/as acerca da temática da juventude e quais as concepções e os sentidos de juventudes apresentados por esses/essas profissionais que trabalham no SUAS, no atendimento aos/as jovens pobres.

Queremos esclarecer que o termo jovem pobre é utilizado nesta pesquisa não focado apenas nas condições socioeconômicas, mas referenciada em Silva Júnior (2011) que relaciona a “condição social, cultural, geográfica e de representação simbólica” vivenciada por estes jovens de formas diferentes em relação às outras classes sociais (p.26). Por essas razões, eles acabam enfrentando cotidianamente “situações de exclusão no acesso às oportunidades e direitos colocados como iguais para todos na sociedade” (p.26).

Neste sentindo, acreditamos que a situação socioeconômica não diz respeito a uma natureza de ser jovem pobre, mas sim “uma condição na qual ele está imerso – a despeito da sua vontade – ao compartilhar com outros grupos de indivíduos” de uma mesma realidade social (SILVA JÚNIOR, 2011, p.26).

Coimbra e Nascimento (2005) trazem que em nossa sociedade, majoritariamente, a categoria juventude vem sendo discutida dentro de uma perspectiva naturalizante, universalista e patológica que anuncia uma forma de ser jovem homogênea, na qual os aspectos econômicos, sociais, políticos e culturais são desconsiderados e/ou colocados em segundo plano. Tal perspectiva também considera que os/as jovens são dotados de “qualidades” e “defeitos” inerentes a esse período da vida que os/as levam a serem considerados/as como seres tipicamente cheios de vigor e entusiasmo, mas também com forte “impulsividade, rebeldia, agressividade, alegria, introspecção, timidez, dentre outros, passam a ser sinônimos daquilo que é próprio de sua natureza” (s/n.).

Tais visões são compartilhadas por teóricos e profissionais da área da Psicologia como traz Ozella (2003). Esse autor realizou uma revisão crítica sobre a concepção de adolescência

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vigente na Psicologia no Brasil, desde meados dos anos 80. Pode-se observar uma cristalização de significados que permeiam o discurso, tanto dos/das profissionais de Psicologia, quanto por teóricos sobre a referida temática até os dias atuais. Tais discursos compartilhados estão relacionados a uma concepção de adolescente descrita como naturalizante, universalista e patologizante.

No final dos anos 1990, o referido autor realizou uma pesquisa com psicólogos/as que atuavam diretamente com adolescentes, tanto no âmbito privado como no público e pôde perceber que muitos/as deles/delas2 descreviam a adolescência como uma etapa da vida,

caracterizada como turbulenta e confusa, além de descreverem comportamentos considerados típicos do/da jovem como agressividade, impulsividade. Ainda em seus discursos traziam que a adolescência é um momento da vida que faz parte do percurso “normal” do ser humano, ou seja, é algo inerente a ele.

Esses discursos ainda estão presentes na Psicologia e foram constatados em pesquisa realizada por Paixão (2008), no período de janeiro de 2005 a junho de 2008, na análise de artigos completos no Scielo-Brasil relacionados à temática da adolescência produzidos na área da Psicologia. Nesse estudo relata que é recorrente a ideia de adolescência como um período de crise, transformação do corpo, descobertas sexuais e descrição de comportamentos considerados típicos dos/das adolescentes como: rebeldia, irresponsabilidade, imaturidade e instabilidade.

Na pesquisa realizada por Espíndula e Santos (2004) sobre representações sociais de adolescentes em conflito com a lei sob a ótica dos assistentes de desenvolvimento social de adolescentes, em medidas socioeducativas de internação, encontraram a concepção de adolescente ora positivo como período bom e importante da vida concebido como uma etapa de transição, fase inicial da produtividade, marcada pelo trabalho e a preparação para o futuro, ora mostraram o lado negativo como um período da vida difícil e conflituoso, representado pela falta de limites por parte dos pais para conter o determinismo biológico: a agressividade, que foi representada naturalizada e fonte das dificuldades e problemas como, se fosse um marcador intrínseco a esse momento da vida.

2 Foram entrevistados/as 51 profissionais, mas apenas 46 entrevistas foram analisadas. Desses/dessas 46

profissionais, 30 consideram a juventude como etapa da vida (recorte no tempo típico de uma certa idade), desses 24 consideram-na como inerente, ou seja, faz parte do processo natural do ser humano). Os/as profissionais entrevistados atuavam: 15 na área de Re-educação (FEBEM, SOS-Criança, instituições e Mov. Nacional de Meninos e Meninas de Rua); 8 em escolas da rede pública e privada; 9 em hospitais da rede pública e privada, postos de saúde, ambulatórios; 5 consultório particular; 2 serviços de inserção do jovem no trabalho e por fim 12 que trabalhavam na área jurídica.

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Almeida e Cunha (2003) chegaram a resultados semelhantes ao entrevistarem 60 professores/as que trabalhavam junto aos/as adolescentes em uma escola em Brasília. Tal estudo constatou que esses/essas profissionais também têm uma concepção de adolescência como um período da vida transitório e de preparação para a vida adulta. Ainda apresentam que a adolescência é marcada por um momento de descobertas e conflitos existenciais. Segundo os referidos autores estas concepções seriam justificadas a partir de um discurso de cunho mais científico e psicologizante, produzido no âmbito das ciências psicológicas, ao tratar o/a adolescente como um sujeito em fase de transição e em busca de uma identidade (ESPÍNDULA e SANTOS, 2004; ALMEIDA e CUNHA, 2003)

Essa noção de adolescência vigente na Psicologia emerge vinculada à lógica desenvolvimentista, a qual considera que todos passam pelo período da adolescência de forma obrigatória e similar (COIMBRA, BOCCO e NASCIMENTO, 2005). Diversos autores/as têm, mais recentemente, criticado essa visão sobre a adolescência instituída nos estudos psicológicos, pois acreditam que ela acaba criando um modelo de ser adolescente restrito, estático, homogeneizado e naturalizante fundamentado predominantemente nos aspectos biológicos e psicológicos. Tal visão universalizante, biologizante e a-histórica nega ou relega ao segundo plano os contextos sociais, econômicos e culturais que circunscrevem os/as adolescentes, e dessa forma, não consegue fazer uma leitura das diversas formas de ser jovem (COIMBRA e NASCIMENTO, 2005; OZELLA, 2002, 2003; BOCK, 2007; GONZÁLES e GUARESCHI, 2010).

Ozella e Aguiar (2008) trazem que tais concepções compartilhadas sobre adolescência cumprem um papel ideológico de camuflar a realidade, as contradições sociais, as verdadeiras mediações que constituem tal fenômeno.

Nessa pesquisa buscamos superar essas visões por tanto tempo predominantes na compreensão do fenômeno da juventude e adotamos um olhar sócio-histórico, o qual considera esse período da vida como uma criação histórica do ser humano enquanto representação, fato social e psicológico.

No Brasil, a partir da década de 90 do século passado, é que, efetivamente, a temática da juventude ganha o “status” de preocupação política, na medida em que crescia o número de jovens em processo de exclusão ou privados de direitos em decorrência de fatores econômicos (SPOSITO e CORRANO, 2003).

Até os anos de 1960, a visibilidade da juventude no Brasil ficou restrita aos/as jovens escolarizados de classe média, situação que segundo Abramo (2005) condensava o significado da condição juvenil: o debate se dirigia, então, para o papel que os/as jovens (principalmente

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por intermédio dos movimentos estudantis, da contracultura e do engajamento em partidos políticos de esquerda) jogavam na continuidade ou transformação do sistema cultural e político que recebiam como herança.

A juventude só passou a ter visibilidade, para além dos setores de classe média e em outra direção, ou ainda para além dos adolescentes em risco, com a “descoberta” de que os problemas de vulnerabilidade e risco não terminavam aos 18 anos e sim são intensificados a partir dessa idade (ABRAMO, 2005). Só nos anos 1990 com a redemocratização do país e a construção de uma sociedade de direitos e os avanços recentes em função do Estatuto da Criança e do Adolescente, as políticas públicas passaram a contemplar os brasileiros com idade a partir dos 18 anos. Anteriormente, a partir dessa faixa etária, todos passavam a integrar o grupo de adultos/as, com acesso às políticas universais, sem qualquer reconhecimento às suas particularidades.

Neste novo contexto social com a intensa participação dos movimentos sociais emergiram as discussões sobre as juventudes que foram fomentadas pelos noticiários que passaram a denunciar os problemas vividos pelos/pelas jovens tais como: problemas de saúde vinculados a certos tipos de comportamentos de risco, como gravidez precoce, o uso abusivo de drogas, as várias doenças sexualmente transmissíveis e em especial, a AIDS; o envolvimento dos/das jovens com a violência, como vítimas e/ou autores, e sua relação com a criminalidade e o narcotráfico, a alta taxa de homicídio entre jovens do sexo masculino de 18 a 25 anos de idade (ABRAMO, 2005).

Ainda segundo a autora referida acima a visibilidade da temática da juventude também surgiu inicialmente a partir do aparecimento de novos atores juvenis, em grande parte oriundos dos setores populares como os punks, nos anos 1970, até os diversos grupos ligados ao hip-hop na atualidade. Esses grupos com sua origem social, linguagens próprias, novos rostos e formas de atuação puderam dar visibilidade à questão da condição juvenil, não, mais atrelada aquela imagem das gerações juvenis precedentes, e para as quais não havia nem mesmo formulações no plano das políticas públicas. Essas juventudes puderam colocar questões que as afetavam e preocupavam. Por essas duas vertentes começaram a ser demandadas propostas e executados algumas ações e projetos para esses segmentos, agora sob o termo “juventude” que expressa uma nova concepção.

Podemos dizer que é considerável o esforço que vem sendo investido no debate acadêmico sobre essa categoria social. Observa-se uma grande produção de pesquisas e de

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conhecimento em volta da juventude3. Nas produções de conhecimento circula um discurso de

“preocupação” com relação os/as jovens no tocante à sua integração na ordem social, envolvendo questões relacionadas ao trabalho, educação, protagonismo juvenil, violência e a constituição familiar. Observa-se, ainda, que outros setores da sociedade também têm investido na discussão sobre juventudes contemporâneas, o que vem resultando em diversos modos de intervenção junto a essa categoria. Por um lado, em face da sociedade de consumo que explora este novo segmento, e por outro, como construção de políticas públicas pensadas e/ou executadas, sobretudo, por organizações da sociedade civil como ONGS e OSCIPS4.

Um exemplo é o Conselho Nacional de Juventude (CONJUVE)5, criado em agosto de

2005, que é o resultado de um olhar para esse segmento da população e vem provocando uma discussão no que diz respeito às demandas e preocupações dessa fase da vida.

No âmbito das políticas públicas do Estado brasileiro a juventude passa a ser vista como uma categoria social que dramatiza a segregação urbana e demanda a elaboração de políticas públicas para este contingente de jovens (COSTA e MENEZES, 2009).

A partir destas referências analisamos a temática da juventude a partir da abordagem da Teoria das Representações sociais. Essa teoria que foi lançada por Serge Moscovici, está interessada nos fenômenos sociais e busca compreender os saberes produzidos na,e pela, vida cotidiana.

A preocupação da Teoria da Representação social é compreender como “pessoas comuns, comunidades e instituições produzem saberes sobre si mesmas, sobre outros e sobre a multidão de objetos sociais que lhes são relevantes” (JOVCHELOVITCH, 2008, p.87). De acordo com Santos (2005), o objeto das Representações Sociais (RS) necessariamente tem como característica ser polissêmico, ou seja, passível de uma multiplicidade de sentidos, presente nas comunicações e práticas sociais do grupo.

Acreditamos que o nosso objeto de pesquisa é passível de ser estudado por essa teoria em decorrência da visibilidade da juventude no contexto atual sendo discutida tanto pelos

3 Ver produções de pesquisas da UNESCO, Instituto Cidadania, Instituto Akatu, Ação Educativa, Projeto

Juventude, Observatório da Juventude, entre outros, nos sites www.unesco.org.br; www.icidadania.org.br;www.akatu.org.br; www.açãoeducativa.org.br; www.projetojuventude.org.br; www.uff.br/observatoriojovem - acesso em 23 de maio 2012.

4 Organização não-governamental e organização da sociedade civil de interesse público.

5 CONJUVE- é uma forma de controle social da Política Nacional de Juventude do Governo Federal, o qual

funciona como um espaço de comunicação entre a sociedade civil, o governo e a juventude brasileira. É um órgão consultivo que visa assessorar o governo na formulação de ações e promover estudos e pesquisas sobre a realidade da população jovem. O Conselho é formado por representantes do poder público e da sociedade civil. Disponível em: http://www.juventude.gov.br/conselho / http://www.secretariageral.gov.br/Juventude.

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meios de comunicação, jurídicos e educacionais, dentre outros, e por ser um foco das políticas públicas, ordenamentos legais e nas conversações do cotidiano. Dessa forma, trata-se de um fenômeno polimorfo que assume diferentes formas e significados de acordo com cada contexto social, tendo, assim, importância para a coletividade.

Consideramos que essa abordagem teórica para os/as psicólogos/as reveste-se de importância por permitir a interdisciplinaridade com diversos campos de saberes, como a Psicologia, a Sociologia e a área Médica (MENANDO et al., 2010), pois a temática da juventude é polêmica pela sua diversidade e contextualização histórica, política, econômica, social e está sempre passando por transformações.

Dessa forma essa pesquisa teve como objetivo geral compreender as representações sociais de juventudes por psicólogos/as que atuam junto aos jovens pobres no SUAS e relacionar os sentidos compartilhados com a formação acadêmica em Psicologia destes profissionais. Como objetivos específicos: a) identificar os sentidos compartilhados nas representações sociais de juventudes e juventudes pobres pelos/pelas psicólogos/as que atuam nos serviços para jovens pobres, b) analisar os componentes das matrizes curriculares de concepção sobre juventudes nas disciplinas Psicologia do Desenvolvimento presentes nos cursos de Psicologia e RMR e c) relacionar as representações sociais de juventudes dos/das psicólogos/as que atuam junto aos jovens pobres e sua formação acadêmica.

A pesquisa está dividida em seis capítulos, sendo três capítulos teóricos, um capítulo sobre o método, outro sobre a análise dos dados e o último referente às considerações finais. O primeiro capítulo, teórico, discute a História da Psicologia no Brasil, expõe a visão de ser humano que tem influenciado tanto a formação quanto a prática profissional em Psicologia, em seguida apresentamos a relação entre Psicologia e Políticas Públicas da Assistência Social. No segundo é situado o debate acerca das concepções de juventudes e em destaque a perspectiva mais contemporânea. No terceiro capítulo, aborda-se a TRS, seu surgimento e principais conceitos; como são construídas as representações sociais e a proposta de abordagens teóricas que compõem a teoria, com realce na Teoria Estrutural do Núcleo Central de Abric, adotada nesta pesquisa.

O quarto capítulo referente ao método apresenta a proposta de uma pesquisa qualitativa, plurimetodológica, a qual se caracteriza por uma variedade de possibilidades de investigação; define o procedimento adotado na construção dos dados, o universo da pesquisa e, por fim, a descrição dos procedimentos de análise de dados.

Em relação ao quarto capítulo, o da análise dos dados, ficou dividido segundo as etapas de investigação: na primeira apresenta a análise das matrizes curriculares dos cursos de

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Psicologia; na segunda a caracterização do perfil profissional dos/das psicólogos/as participantes da pesquisa; a terceira parte, a análise dos questionários de associação livre e hierarquização de palavras; na quarta, a análise referente ao grupo focal realizado com os/as psicólogos/as que atuam exclusivamente com jovens no Sistema Único da Assistência Social. Por fim, o capítulo das considerações finais, no qual apresentamos a importância dos principais achados, relacionando-os aos objetivos dessa pesquisa e realçamos a importância dos resultados encontrados para a formação em Psicologia e para os diversos profissionais de Psicologia que atuam junto às juventudes.

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2 AS PERSPECTIVAS QUE PERPASSAM A FORMAÇÃO DE PSICOLÓGOS/AS

Discutiremos no decorrer deste capítulo dois pontos que consideramos importantes da história da Psicologia no Brasil e que estão diretamente ligados com a presente pesquisa. De um lado, as diferentes perspectivas acerca do desenvolvimento humano, as quais tem influenciado a prática profissional e a formação acadêmica do/a psicólogo/a. Do outro, abordaremos a relação entre Psicologia e Políticas Públicas, examinando particularmente os campos de atuação do/da psicólogo/a na Política de Assistência Social.

2.1 A Psicologia no Brasil

A Psicologia no Brasil esteve tradicionalmente voltada para os interesses da classe dominante brasileira e tem se desenvolvido como uma ciência e uma profissão para o controle, a categorização e a diferenciação dos indivíduos. As preocupações que a direcionaram, desde o início, foram centradas na ideia de encontrar a pessoa certa para o lugar certo, contribuindo, assim, para a melhor organização do processo produtivo e, para aumentar o lucro do capital. Sua institucionalização foi possível graças à tecnologia que ela trazia em seu bojo, condizente com o projeto de modernização da época. Essa tecnologia consistia fundamentalmente no uso dos testes psicológicos, os quais, de forma objetiva e técnica, contribuíam com a otimização do processo produtivo e modernização do país. Ao/a psicólogo/a cabia a tarefa de formular e propor processos de seleção de pessoal e orientação profissional. Nas escolas o papel era trabalhar com os testes, com intuito de “formar classes mais homogêneas e preparar melhor as crianças e os/as jovens para o mercado de trabalho” (BOCK, 2010, p.247).

Em 1962, a Psicologia foi definitivamente institucionalizada, através da Lei 4119, que regulamentou a profissão no país. Nos anos que se seguem, cursos de Psicologia proliferaram, associações profissionais e científicas, campos de trabalho foram surgindo e a Psicologia se desenvolvia com vigor. Bock (1999) chama atenção para o fato de que a prática psicológica nesse período estava voltada para uma visão de ser humano simplificada e ahistórica, na qual o aspecto social era, na maior parte das vezes, relegado a segundo ou último plano.

Desde Wundt, vive-se o desafio de superar, na Psicologia, as inúmeras dicotomias entre objetividade e subjetividade; entre interno e externo; entre natural e histórico; objeto e sujeito; razão e emoção; indivíduo e sociedade. Isso nos tem impedido de compreender o ser

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humano de outra maneira que não seja a de naturalizar seu desenvolvimento e seu mundo psicológico (BOCK, 1999; NASCIMENTO et al., 2006).

Em razão dessa visão dicotômica, temos explicado o movimento do mundo psicológico como endógeno, gerado por si mesmo. Segundo Bock (1999), esta tradição naturalizante do fenômeno psicológico nos encaminhou para uma perspectiva de profissão que sempre compreendeu a intervenção como curativa, remediativa, terapêutica. A implicação mais imediata de tal situação é a adoção acrítica do modelo médico de intervenção.

Macedo (1984, p.13) chamou o modelo de atuação que advém dessas concepções de "clínico tradicional", um modelo no qual as atividades básicas dos/das psicólogos/as são o diagnóstico, a terapia, o aconselhamento e o exame psicotécnico.

Na publicação da sua tese de doutorado6, Bock (2004) relata que encontrou, em

questionário aplicado a 44 psicólogos (as), muitas definições para o fenômeno psicológico que corroboram essa instabilidade conceitual, marcada pelas dicotomias sem síntese e sem resolução em perspectiva. Na expressão dela, o fenômeno psicológico ora era visto como:

[...] processo, ora como estrutura, ora manifestação, ora relação, ora é conteúdo, ora é distúrbio, ora experiência. É interno, mas em relação com o externo. É biológico, é psíquico e é social; é agente e é resultado; é fenômeno humano, relacionado ao que denominamos “eu” (p.5).

Com todas essas denominações, o fenômeno psicológico aparece descolado da realidade na qual o indivíduo se insere e mais ainda, do próprio indivíduo que o abriga. Embora se perceba neste tipo de discurso a existência de um meio, de um locus original percebe-se, sobretudo, que este locus é genérico, às vezes é social, às vezes físico. Esse meio influencia o indivíduo, mas também aqui a influência é genérica. A consequência é, mais uma vez, a naturalização do fenômeno psicológico. Algo que lá está como possibilidade, quando nascemos; algo que deverá ser fertilizado por afeto, estimulações adequadas e boas condições de vida, mas que lá está, pronto para desabrochar, como reconhece finalmente a autora (BOCK, 2004, p.2).

Para Bock (1997), o fenômeno psicológico está transformado, no discurso dos/das psicólogos/as a partir da perspectiva exposta, em uma entidade que atormenta, restringe, possibilita, enriquece, movimenta-se, desenvolve-se; uma entidade que tem vocação, destino, percurso, uma realização a cumprir, entendidos como mecanismos universais que caracterizam, assim, esse fenômeno.

6

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Diante desse contexto, a visão de ser humano não está conceituada a partir de uma perspectiva histórica. Essa visão de natureza humana dotada de uma essência universal e abstrata, é que faria dele um ser humano. Essa noção de indivíduo é carregada de uma visão de que ele é um ser dotado de possibilidades de controlar, garantir, responsabilizar-se pelo seu próprio processo de individualização, pensado de forma separada da sua condição de vida (BOCK, 1997; COIMBRA et al. 2005; COIMBRA e NASCIMENTO, 2005; COIMBRA e LEITÃO, 2003).

Essas concepções refletem diretamente na prática profissional, que é vista como uma técnica, isto é, contém um saber (métodos, técnicas e teorias) que auxiliam o desenvolvimento do ser humano, deslocado da sua condição social. O sofrimento psíquico é tratado como igual para todos/as, ricos e pobres (BOCK, 1999; COIMBRA e LEITÃO, 2003). Não há classes sociais, não há horizonte de transformação, não há luta de classes. Muitas vezes, a prática contribui para responsabilizar os sujeitos por seus sucessos e fracassos, como sinaliza Bock (2004):

[...] temos pensado e defendido condições de vida como canteiro apropriado ou não para o desabrochar de potencialidades; temos acreditado e contribuído para classificar e diferenciar pessoas pelas suas características e dinâmicas psicológicas; temos criado ou contribuído para reforçar padrões de conduta, que interessam à sociedade manter, como conduta necessária ao “bom desenvolvimento das pessoas (p.7).

Neste sentido a Psicologia tem reforçado formas de vida e de desenvolvimento das elites como padrão de normalidade e de saúde, contribuindo para a construção de programas de recuperação e assistência àqueles que não “conseguem” se desenvolver nesta direção, transformando o diferente, o “fora do padrão dominante” em anormal (BOCK, 2004; FERREIRA et al., s.d.).

Nessa esteira a Psicologia acabou por adotar, por muito tempo, a visão de individuo da ideologia liberal, a qual propaga, fortalece, coloca em destaque, robustece teórica e empiricamente o individualismo. O liberalismo considera que os indivíduos possuem características e atributos que se configuram de modo particular, determinando seu lugar social, seu sucesso ou fracasso na sociedade. Cada indivíduo é um ser moral que possui direitos inalienáveis, derivados de sua própria humanidade. Dotado de potencialidades, é livre para desenvolvê-las, não é concebido como ser social, e sim, como possuidor de direitos naturais e de propriedades universais (BOCK, 1997; COIMBRA et al., 2005).

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Neste sentido, positivismo e liberalismo fertilizaram-se reciprocamente, com seus conceitos abstratos e universais de neutralidade, objetividade, progresso, ordem e desenvolvimento, coesão e moral. O indivíduo foi alçado à categoria de pensamento, entregando-o aos cuidados da psicologia do ajustamento e da adaptação, que o estudou de forma isolada das condições materiais da sociedade (BOCK, 1997; COIMBRA e LEITÃO, 2003).

É neste cenário que a Psicologia desenvolveu seu trabalho sob a orientação liberal e positivista, produzindo uma naturalização do sujeito, isto é, concebendo-o a partir da noção de natureza humana; um sujeito apriorístico, que tem seu desenvolvimento previsto pela sua própria condição de ser humano. Dessa forma a psique passou a ser tratada como se tivesse uma vida interior própria, devendo ser cuidada e conhecida (BOCK, 1997; COIMBRA e LEITÃO, 2003).

No entanto, paralelo a essa forma de compreender o sujeito, dentro da Psicologia emergiu uma corrente mais crítica, que discute em outras bases a inseparabilidade entre o sujeito e o seu contexto social, histórico, político e cultural. Uma das suas principais representantes, Silva Lane, defende a chamada visão sócio-histórica do sujeito e afirma que “o ser humano traz consigo uma dimensão que não pode ser descartada, que é a sua condição social e histórica, sob o risco de termos uma visão distorcida (ideológica) de seu comportamento” (LANE, 1994, p.12).

Essa visão constrói a perspectiva da Psicologia Sócio-Histórica, que considera o ser humano como um sujeito ativo, social e histórico. Essa corrente teórica defende a ideia de um sujeito ativo que constrói a própria existência e interfere nos rumos da sua história, seja no nível do indivíduo, seja a história da humanidade. Nesta perspectiva, a história individual não pode ser concebida fora da história do coletivo (GONÇALES, 2010).

Neste sentido, essas novas visões acreditam que para identificarmos a dimensão subjetiva, devemos atentar para os aspectos psicológicos que fazem desse individuo, neste momento histórico, o sujeito histórico. Tratam da forma como os sujeitos registraram “o mundo em que vivem e sua experiência nesse mundo; como orientam sua ação nele; como produzem produtos materiais e espirituais; como apresentam esses produtos aos outros homens e os utilizam” (GONÇALVES, 2010, p.25).

É dentro desse cenário que surge ao longo da década de 70 até meados da década de 1980 uma psicologia comprometida com a transformação social do país. A preocupação dessa época foi o desenvolvimento de atividades e tarefas que possibilitassem colocar a psicologia a serviço das classes populares. O esforço em pauta tratava, como afirma Quinta de Freitas

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(2010) “de descaracterizar a psicologia como uma profissão elitista e que havia feito alianças com a burguesia” (p.62).

Com isso surge um processo novo de discussão sobre os modelos de atuação psicológica, realizado por algumas gestões do Conselho Federal de Psicologia e Conselhos Regionais, Associações e Sindicatos da categoria em vários pontos do país e o Movimento Nacional de Saúde Mental, pois sentiam a necessidade de rever os conhecimentos, obtidos nos cursos de Psicologia, para poder efetivamente prestar o serviço à população (BOCK, 1997; CASTELO BRANCO, 1998).

Assim, nesse momento, o desafio da Psicologia se relacionou não só a expansão da sua prática para um maior número de pessoas de diferentes classes sociais como também na elaboração de novos recursos em sua formação e de novas possibilidades de atuação profissional, que implicassem na construção de uma prática ético-política (ROMAGNOLI, 2006).

Dentro desse cenário nasce a clínica social como prática que se pretende realizar de forma ampla, envolvida com a construção de novas formas de atuação. No entanto, ela não se refere somente ao atendimento das camadas pobres da população, nem diz respeito apenas a esses novos espaços de atuação dos/das psicólogos/as, mas sim a “clínica de qualquer lugar, de qualquer público, que insiste em combater a massificação, cada vez mais presente, e buscar ainda mais a invenção, na singularidade de cada cliente, na particularidade de cada inserção profissional” (MOREIRA et al., 2007, p. 619).

Assim, esse novo contexto passa a exigir do/da psicólogo/a não só um novo olhar sobre os aspectos políticos, econômicos, culturais, sociais e éticos que atravessam o indivíduo, mas também de uma intervenção implicada politicamente cuja preocupação é com a construção de uma nova sociedade.

Desta forma, o/a profissional lidaria com a diversidade de sujeitos, nos diversos campos de atuação que se abriram, reinventando a prática psi a cada momento (NASCIMENTO et al., 2006).

Segundo as referidas autoras, a prática em Psicologia não precisa, necessariamente, estar fundamentada numa fórmula, podendo acontecer por meio de qualquer atividade que seja necessária em um determinado momento. Para elas, isso não significa um fazer sem referência, sem critério ou sem direção, e sim, um trabalho que se apoia em um saber que vai se fazendo no coletivo da própria prática.

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Para isso acontecer, a clínica psicológica se caracterizaria, como traz Figueiredo (1996), não pelo espaço em que é realizada – o consultório -, mas pela qualidade da escuta e da acolhida do excluído do discurso.

Tem o mesmo sentido a afirmação forte e concisa de Dutra (2006) quando afirma que:

não importa em que lugar ou espaço o ato clínico aconteça, seja no âmbito privado ou público, numa relação diádica, grupal ou coletiva. Este será sempre um fazer psicológico que se pautará em concepções teóricas e metodológicas que refletirão essa postura diante do sofrimento ou fenômeno psicológico que se coloca diante dele. Melhor dizendo, o ato clínico se pautará muito mais por uma ética do que por referenciais teóricos fechados (p.384).

.

Isso significa, como afirmam ainda Moreira et al. (2007) que a escuta clínica refere-se mais a uma postura ética e política diante do ser humano, capaz de proporcionar a este libertação e potencialização. Esta afirmação é fortemente corroborada por Nascimento et al. (2006) quando afirmam que qualquer intervenção por mais insignificante que pareça é um fazer político, pois provoca transformação.

Dessa forma, acreditamos que o fazer da psicologia não está apenas em acolher sujeitos e formas de ser, mas também em produzir “subjetividades, reforçando ou questionando, favorecendo ou constrangendo, em constante interferência com o plano político” (NASCIMENTO et al., 2006, p.18).

É este, o cenário onde discutiremos como vem sendo realizada a formação para psicólogos/as em Recife. Será que os espaços de formação inicial têm preparado os/as psicólogos/as para assumirem uma postura crítica, questionadora e responsável pela transformação social do seu país? A formação tem possibilitado novas formas de atuação psi? Esses são alguns questionamentos que buscaremos discutir nos parágrafos que se seguem.

2.2 Formação em Psicologia

A formação para Psicólogos/as no Brasil é marcada por constâncias em relação aos documentos oficiais que nortearam o seu percurso. Desde a criação do currículo mínimo para a formação do/da Psicólogo/a em 1962, por meio do parecer n. 403/62 do Conselho Federal de Educação (CFE), só houve alteração no currículo dos cursos de Psicologia quarenta e dois anos depois, em 2004, com as novas Diretrizes Curriculares que orientam a formação dos/das psicólogos/as atualmente.

No entanto, durante todo esse período ocorreram diversos debates e negociações entre o Estado e associações das mais diversas em Psicologia e entre elas, com o objetivo de propor

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reformas curriculares para aproximar a formação do/da psicólogo/a com a realidade social brasileira.

Assim, temos como marco desses debates o I Encontro de Coordenadores de curso de Formação de Psicólogos/as, que culminou com a Carta de Serra Negra em 1992, importante documento sobre a formação profissional do/da psicólogo/a brasileiro/a (BERNARDES, 2004).

Uma das diretrizes que surgiram dessas reflexões estavam relacionadas à ideia de uma formação generalista, como forma de rejeitar o especialismo psi e a intensa hegemonia da clínica, considerada um modelo limitado de atuação profissional (CARTA DE SERRA NEGRA, 1992).

Outro marco na história da formação dos/as profissionais em Psicologia ocorreu em 1995, quando o Ministério da Educação (MEC) institui uma comissão de Especialistas em ensino de Psicologia a fim de reestruturar os currículos em substituição ao currículo mínimo de psicologia estabelecido por meio do parecer n. 403/62 (YAMAMOTHO, 2000).

Antes de propor uma reestruturação dos currículos dos cursos de Psicologia, a comissão de especialista7 analisou documentos advindos de três fontes básicas: instituições

formadoras, das pesquisas realizadas pelo CFP através de sua Câmara de Educação e Formação Profissional e das teses relativas à formação profissional sugeridas pela categoria e aprovadas no Congresso Constituinte da Psicologia em 1994, e constatou que os cursos de formação em Psicologia não apresentavam unanimidade de posições congruentes. Havia sempre perspectivas diversas quanto ao entendimento dos enunciados e, especialmente, no peso e forma de concretizar alguns desses enunciados que a priori, são expostos utilizando termos comuns ou similares.

Após essas constatações, a comissão em 1999, após três anos de discussões, apresenta uma minuta de resolução com as diretrizes curriculares para Psicologia (YAMAMOTO, 2000). Contudo, só em 2004, que o documento referente as novas diretrizes curriculares para os cursos de Psicologia foi homologado pelo Ministro da Educação por meio da resolução nº. 8 de 7 maio de 2004 (BRASIL, 2004).

Lisboa e Barbosa (2009) relatam que essas novas Diretrizes Curriculares Nacionais têm norteado até os dias atuais os cursos de formação em psicologia e a grosso modo permanecem iguais a minuta de 1999.

7Para maiores informações:

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As novas DCN entraram em vigor no ano de 2006 e elas trazem que a identidade do curso de Psicologia no país deve ser conferida através de um núcleo comum de formação, definido por um conjunto de competências, habilidades e conhecimento (ART. 6º, DCN EM PSICOLOGIA). Esse núcleo comum estabeleceria “uma base homogênea para a formação em Psicologia no país e uma capacitação básica para lidar com os conteúdos da Psicologia enquanto campo de conhecimento e de atuação” (ART. 7º, DCN EM PSICOLOGIA).

As diretrizes propõem ainda que os currículos de Psicologia sejam compostos por ênfases curriculares. Essas ênfases são definidas em seu artigo 10º como “um conjunto delimitado e articulado de competências e habilidades que configuram oportunidades de concentração de estudos e estágios em algum domínio da Psicologia”, mas isso, como traz o referido documento não caracterizaria uma especialização na área.

Dentro dessa proposta, cada instituição deverá oferecer no mínimo duas ênfases curriculares e o/a discente poderá optar por uma delas, a qual desenvolverá seu estágio curricular (ART. 11, PARÁGRAFOS 3° E 4°, DCN DE PSICOLOGIA, 2004).

As ênfases propostas estão relacionadas a seis áreas de atuação do/da psicólogo/a são elas: a) Psicologia e processos de investigação científica; b) Psicologia e processos educativos; c) Psicologia e processos de gestão; d) Psicologia processos de prevenção e promoção da saúde; e) Psicologia processos clínicos e f) Psicologia processos de avaliação diagnóstica.

Essas ênfases como todo o curso de Psicologia deverá assegurar alguns princípios e compromisso como descrito no Art. 3º, são eles:

a) Construção e desenvolvimento do conhecimento científico em psicologia; b) Compreensão dos múltiplos referenciais que buscam apreender a amplitude do fenômeno psicológico em suas interfaces com os fenômenos biológicos e sociais; c) Reconhecimento da diversidade de perspectivas necessárias para a compreensão do ser humano e incentivo à interlocução com campos do conhecimento que permitam a apreensão da complexidade e multideterminação do fenômeno psicológico; d) Compreensão crítica dos fenômenos sociais, econômicos, culturais e políticos do país, fundamentais ao exercício da cidadania e da profissão; e) Atuação em diferentes contextos considerando as necessidades sociais, os direitos humanos, tendo em vista a promoção da qualidade de vida dos indivíduos, grupos, organizações e comunidades; f) Respeito à ética nas relações com clientes e usuários, com colegas, com o público e na produção e divulgação de pesquisas, trabalhos e informações da área da Psicologia e g) Aprimoramento e capacitação contínuos (CNE/CES, 5/2011).

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Esses princípios e compromissos dotariam os/as profissionais dos conhecimentos necessários para seu o exercício profissional.

Percebemos um nítido avanço entre as novas DCN para os cursos de Psicologia em relação ao currículo mínimo proposto no ano de 1962, pois as novas diretrizes apresentam que tipo de profissional pretende-se formar, o que se espera das instituições formadoras bem como quais são as habilidades e competências que devem ser desenvolvidas no decorrer da formação caminhando, sobretudo, a perspectiva crítica e sócio-histórica dos sujeitos e dos grupos.

Apesar de todos esses avanços, diversos autores assinalam que a formação em Psicologia ainda está fundamentada no paradigma clínico e hegemônico e não tem apresentado nada ou quase nada em relação ao campo das políticas públicas (BERNARDES, 2006; GODIN et al., 2010).

Ainda destacam que apesar de boa parcela dos/das psicólogos/as, atualmente, trabalharem em serviços de saúde mental, ambulatórios, hospitais, abrigos, assistência social e etc., há uma predominância de atuação dos/das psicólogos na área clinica, como demonstrou a pesquisa nacional de caracterização dos/das psicólogos/as brasileiros (MOURÃO e PANTOJA, 2010). Tais resultados corroboram com as pesquisas de Melo (1975) e Bastos (1988), as quais constatam a predominância de atuação psi no campo clínico quando comparada as outras áreas.

Para Bastos (1988) essa predominância dos/das psicólogos/as no âmbito clínico deve estar relacionada a uma realização mais plena do ideal de atuação psicológica, algo que se constrói durante o processo de formação profissional8.

Essas questões também podem estar pautadas por uma dominância das produções no campo psi fundamentadas numa formação especialista e tecnicista e que perseguem homogeneizações e seguranças ilusórias perante a multideterminação da realidade (MOREIRA et al., 2007).

Dessa forma podemos dizer que os cursos de Psicologia têm se caracterizado ao longo dos anos por não possibilitarem, muitas vezes, aos/as discentes o conhecimento dos aspectos sociais - históricos, políticos e ideológicos - que determinam sua prática e a realidade em que atuam. Para Dimenstein (2000), a Psicologia que é ensinada nas nossas universidades tem a pretensão de ser apolítica, neutra, e justo por isto está embebida da ideologia dominante e conservadora das relações sociais. Assim, é uma Psicologia:

8 Para maior aprofundamento sobre o tema: PRAÇA; K.B.D. & NOVAES, H.G.V. A representação social do

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Ingênua e ineficaz que a universidade termina promovendo, porque psicologizante e a-crítica dos modelos importados, o que leva a um distanciamento do social e uma aproximação ainda maior do aluno às idéias e valores hegemônicos da ideologia individualista que ele carrega, pois oriundo das classes médias urbanas (p.104).

Para Moreira et al. (2007) a ênfase na formação de especialistas traz, como consequência imediata, a cisão entre conhecimento e engajamento social e defendem uma formação acadêmica articulada com o seu efeito no campo social, mediante o desenvolvimento crítico de nossas práticas, indispensável sobretudo, nesse momento em que outros espaços de atuação foram conquistados e já se encontram sedimentados.

Assim, é unânime que a formação em Psicologia precisa contemplar conhecimentos sobre as áreas emergentes, incluindo a produção de pesquisas aplicadas e um posicionamento crítico em relação às práticas tradicionais e uma formação comprometida com a transformação social (NASCIMENTO et al., 2006).

A seguir discutiremos a relação entre a Psicologia e as Políticas Públicas mais especificamente as políticas públicas da Assistência Social. Outra questão que será levantada refere-se às reflexões acerca do/da profissional de Psicologia apropriar-se desse novo espaço de atuação, bem como entender seu papel dentro desse contexto.

2.3 Psicologia e Políticas Públicas da Assistência Social

Antes de iniciar a discussão sobre a relação entre a Psicologia e as políticas públicas da Assistência Social e o papel do/da psicólogo/as queremos contextualizar como essas políticas emergiram no cenário brasileiro, qual seu objetivo, seu público-alvo e programas oferecidos.

Neste sentido é importante destacar que a Assistência Social no Brasil é bem recente enquanto uma Política de Seguridade Social não contributiva, como direito do/da Cidadão/ã e dever do Estado em garantir o atendimento às necessidades básicas para as pessoas que dela necessitam. Anteriormente a essa Política, a Assistência Social era caracterizada como ações de caridade, filantropia e solidariedade, realizadas, principalmente, pelas práticas religiosas. Esse modelo assistencialista não possibilitava a emergência de um sujeito de direito e acabava por manter a condição de subalternidade aos/as que a ela recorriam além de não promover a autonomia.

Até o final da década de 1980, o Estado não tinha nenhuma ação para atender as necessidades dos/das despossuídos/as, foi somente com os avanços obtidos com a Constituição Federal de 1988 e com a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS de 1993,

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que a Assistência, em 2004, começa a ser considerada como uma Política de Seguridade Social configurando o triângulo juntamente com a saúde e a previdência.

Assim, Política Nacional da Assistência (PNAS, 2004) passa a ser reconhecida legalmente enquanto política pública, “devendo garantir direitos e promover a cidadania de amplos os segmentos da população, que amargam, pela produção e acirramento das desigualdades sociais, o lugar de excluídos” (CREPOP, 2008, p.10).

A partir da aprovação do Conselho Nacional da Assistência Social (CNAS, 2003) e das diretrizes estabelecidas pela LOAS (1993), a Política Nacional de Assistência Social passa a ser estabelecida por meio do Sistema Único de Assistência Social (SUAS, 2005).

Dentro da PNAS, a família é considerada a unidade central da sociedade, pois é por meio dela que o sujeito se fortalece como cidadão/cidadã. Norteado por esse entendimento, as ações planejadas pelo SUAS têm o intuito de propor soluções para as famílias, no entanto não é qualquer e toda família que são foco de sua intervenção. As famílias e/ou sujeitos atendidos pelo SUAS estão desprovidos dos mínimos sociais necessários para sua sobrevivência e apresentam vínculos familiares e comunitários fragilizados ou rompidos e que necessitam de atenção para o fortalecimento desses vínculos ou para preservação de sua integridade (PNAS, 2004).

Neste contexto as propostas de intervenções do SUAS se dão a partir de duas grandes estruturas articuladas entre si: a Proteção Social Básica (PSB) e a Proteção Social Especial (PSE) que se divide em Média complexidade e em Alta Complexidade.

A proteção social básica, segundo as PNAS (2004), tem como objetivos:

Prevenir situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. Destina-se à população que vive em situação de vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação (ausência de renda, precário ou nulo acesso aos serviços públicos, dentre outros) e ou fragilização de vínculos afetivos – relacionais e de pertencimento social (discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiências, dentre outras) (PNAS, 2004, p.27).

Os/as usuárias da proteção básica são as famílias, seus membros e indivíduos que se encontram em situação de vulnerabilidade social. Os serviços oferecidos para esses sujeitos são diretamente executados pelos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) que são espaços físicos localizados estrategicamente em áreas de pobreza, prestando atendimento socioassistencial, articulando os serviços disponíveis em cada localidade e potencializando a rede de proteção social básica. Ele abrange a um total de até 1.000 famílias/ano (PNAS, 2004).

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As atividades desenvolvidas nesses espaços estão relacionadas à acolhida dos/das usuários/as que podem ser crianças, adolescentes, jovens, adultos/as e idosos/as; acompanhamento das famílias desses indivíduos bem como a proteção próativa, ou seja, dá apoio às famílias e indivíduos na garantia dos seus direitos de cidadania, com ênfase no direito à convivência familiar e comunitária (PNAS, 2004).

Enquanto a proteção básica executa ações voltadas para “vigilância social, prevenção de situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições e do fortalecimento de vínculos familiares e comunitários” (CREPOP, 2008, p.12), a proteção social especial ocupa-se com situações mais complexas que estão relacionadas a famílias e indivíduos que tiveram seus direitos violados ou ameaçados por meio da: violência física ou psicológica, violência e abuso sexual, exploração do trabalho infantil, discriminações sociais, abandono, rompimento ou fragilização familiar etc. (CREPOP, 2013). Assim, a Proteção Social Especial, segundo a PNAS (2004) é:

[...] uma modalidade de atendimento assistencial destinada a famílias e indivíduos que se encontram em situação de risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos físicos e/ou psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas socioeducativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre outras (p.28).

A PSE de média complexidade caracteriza-se como serviço especializado que necessita de uma maior estrutura técnica e operativa para lidar com os invíduos em situação de risco pessoal e social, por terem seus direitos violados. Em decorrência do agravamento dessas situações, faz-se necessário um “acompanhamento especializado, individualizado, continuado e articulado com a rede (BRASIL, 2011, p.20).

Os serviços ofertados dentro dessa proteção são executados por duas unidades de referência: o Centro de Referência Especializado da Assistência Social (CREAS) e o Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP). Ambos são unidades públicas e estatais, porém a abrangência do CREAS é municipal e regional, enquanto a do Centro POP é só municipal (BRASIL, 2011).

Os serviços socioassistencias oferecidos pela PSE de média complexidade incluem segundo a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais (2009): a) Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI); b) Serviço Especializado em Abordagem Social; c) Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida (LA), e de Prestação de Serviços à Comunidade

Referências

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