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Tecnologias na sala de aula de matemática: resistência e mudanças na formação continuada de professores

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TECNOLOGIAS NA SALA DE

AULA DE MATEMÁTICA:

RESISTÊNCIA E MUDANÇAS NA

FORMAÇÃO CONTINUADA DE

PROFESSORES

TERESINHA FUMI KAWASAKI

Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Educação

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TERESINHA FUMI KAWASAKI

TECNOLOGIAS NA SALA DE

AULA DE MATEMÁTICA:

RESISTÊNCIA E MUDANÇAS NA

FORMAÇÃO CONTINUADA DE

PROFESSORES

Tese apresentada ao Curso de Doutorado do Programa de Pós Graduação Conhecimento e Inclusão Social da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Educação.

Orientadora: Professora Márcia Maria Fusaro Pinto

Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Educação

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TECNOLOGIAS NA SALA DE AULA DE MATEMÁTICA:

RESISTÊNCIA E MUDANÇAS NA FORMAÇÃO CONTINUADA DE

PROFESSORES

TERESINHA FUMI KAWASAKI

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, em 12 de dezembro de 2008, e aprovada pela banca examinadora composta pelos seguintes professores:

Titulares:

Profa. Dra. Márcia Maria Fusaro Pinto – UFMG - Orientadora

Prof. Dr. José Carlos Libâneo – Universidade Católica de Goiás – Examinador

Profa. Dra. Ana Cristina Ferreira – UFOP – Examinadora

Profa Dra. Maria Manuela Martins Soares David – UFMG – Examinadora

Profa. Dra. Silvania Souza do Nascimento – UFMG – Examinadora

Suplentes:

Profa. Dra. Vanessa Sena Tomaz – COLTEC – UFMG – Examinadora

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AGRADECIMENTOS

À professora Márcia Maria Fusaro Pinto por sua valiosa orientação, companheirismo e colaboração nessa experiência arriscada de discutir a resistência do professor quando de fato desejamos falar de mudança.

Aos membros da banca de qualificação – Professora Jussara de Loiola Araújo, Professora Ana Cristina Ferreira e Professor José Carlos Libâneo – por suas cuidadosas leituras e sugestões apresentadas.

À FAPEMIG pelo auxílio financeiro que possibilitou a realização deste trabalho. Ao professor Oto Neri Borges por sua leitura do projeto de pesquisa e sugestões.

Aos professores do Programa de Pós Graduação da FaE/UFMG. À Rose em nome de toda a secretaria do Programa.

Agradecimento especial a todos os professores que participaram do projeto de extensão universitária “Novas Tecnologias e Educação Matemática na Formação Continuada dos Professores de Matemática”, por suas participações, por me permitirem realizar esta pesquisa, por compartilhar com o grupo, sua sabedoria, suas experiências e suas vidas. À Ana Paula, bolsista de nosso projeto de extensão que foi muito além de suas funções, por suas organizadas notas de nossas reuniões.

Às professoras Jussara de Loiola Araújo e Márcia Maria Fusaro Pinto pela persistência num trabalho colaborativo repleto de conflitos e desacordos que, hoje sabemos, foram as forças motrizes para o desenvolvimento de muitas atividades em conjunto. Jussara, obrigada por ter me adotado quando a Márcia estava em Warwick.

Aos integrantes do GEPEMNT, não tenho palavras que expressem todo o carinho e gratidão que sinto por cada um deles. Obrigada Felipe, Luiz Ricardo, Luiz Luz, Joicy, Cristian, Patrícia, Cláudia, Ana Regina, Bruna Karla, Bruna Cordeiro, Daniel, Fernanda, Paola, Jakeline, Juliana, Karina, Lorena, Francisco, Lucas, Gislene e Diva, pela colaboração, pelos debates e descobertas (por exemplo, que a soma de nossas ações individuais não expressam todo o trabalho realizado e conquistas do grupo). Às professoras Jussara e Márcia pela coordenação do grupo. Ao professor Ângelo. Aos professores David Tall e Marcelo Borba, laços acadêmicos estabelecidos através das atividades do grupo. Ao Wander Lopes da Silva e à diretoria do ICEx/UFMG, pelo apoio ao Projeto de Extensão “Novas Tecnologias e Educação Matemática na Formação Continuada do Professor de Matemática”.

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vi

Aos integrantes do grupo de estudos de Teoria da Atividade, principalmente à Vanessa, por ter, junto comigo, levado a idéia para frente. Obrigada Marinês, Manuela, Diva, Marisa, Márcia, Jussara, Eduardo e Dale.

Ao Chico e Cristina Ferreira por me colocarem em contato com os professores da especialização. A Sylvie por abrir algumas passagens.

Aos amigos que fiz na organização do X EBRAPEM (Belo Horizonte, 2005). Valeu Alex, Airton, Vanessa, Penha, Nora, Priscila e Celeste.

Ao Airton, companheiro de orientação, colega de turma e amigo.

Aos meus novos amigos da EAD. Simone e Dan, obrigada pela compreensão. Joicy, obrigada pelos inúmeros ‘deixa que eu faço’. Gislene, obrigada. Aos tutores e alunos da EAD, obrigada pelo carinho. Estes são valentes!

À Mônica pela leitura e sugestões em momentos críticos do desenvolvimento deste trabalho. À Mônica e Regina, companheiras de representação estudantil, colegas de turma e amigas.

Aos meus Xamãs Dra. Kátia Feldmann e Dr.Eduardo Filgueiras, porque ninguém é de ferro. À Sharon Moon que me ensinou uma Yoga que se chama Power. Namaste!

À minha amiga Rachel, que canceriana como eu dividimos intuição e percepções semelhantes do mundo. Aos meus amigos latinos de Austin, por ensinarem-me a Bailar, porque bailar é preciso...

Aos amigos de uma vida Maricy e Claudinho, pela presença constante apesar da distância, à Clarissa – a única pessoa a quem eu pediria o Haikai que me presenteou. Margarida e Marquinhos, companheiros.

À dona Heloísa que nos deu abrigo em nossa volta ao Brasil, dando-me a chance de conhecer uma mulher admirável, forte e corajosa. Ao meu cunhado Nilo e família, sempre presentes em nossas vidas, agradeço-os em nome dos irmãos, irmãs, cunhados, cunhadas, sobrinhas e sobrinhos. Enfim, de uma família em BH.

À minha irmã Sumi, pelos conflitos teóricos-apostólicos-romanos, porque discutimos muito e de tudo um pouco.

À minha sobrinha Anita porque sem ela a minha vida não seria a mesma.

Às minhas irmãs Tamy e Rumy, corajosas e talentosas artistas-professoras-malabaristas da vida e da escola pública. Agradeço-lhes de coração por estarem presentes nos espaços em que estive ausente.

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RESUMO

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viii

ABSTRACT

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ix

LISTA DE QUADROS E FIGURAS

Quadro 1: Mapa da participação de formandos e formadores na FC, 2004-2006. 65

Quadro 2: Síntese das ações da FC através dos anos. 87

Quadro 3: Representação do comportamento humano produtivo nos três

níveis – atividade, ação e operação 108

Quadro 4: Perfil dos professores Marco, Verônica e Lúcia no ano de 2005. 123 Quadro 5: Atividade 1 do roteiro de trabalho distribuído aos alunos de

Marco no dia da oficina. 128

Quadro 6: Algumas questões da folha de trabalho distribuído por Lúcia para

os seus alunos. 135

Quadro 7: Elementos destacados nas oficinas de Marco, Lúcia e Verônica

Página 148

Quadro 8: Ações em um mesmo espaço de tempo X Ações em um mesmo

espaço físico. 152

Quadro 9: As contradições estruturais. 164

Figura 1: esquema formulado a partir de descrição de Leont’ev (1981, p.42) 101

Figura 2: Ato Complexo (Ação mediada) 102

Figura 3:o triângulo como foi cristalizado na TA 104

Figura 4: A estrutura do sistema-atividade 109

Figura 5: Uma imagem estilizada de um sistema atividade em rede e em

movimento 113

Figura 6: Snapshot do MathSolid 137

Figura 7:A atividade de FC representada na representação triangular

proposta por Engeström. 150

Figura 8: O encontro das atividades 151

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x

SUMÁRIO

Preâmbulo 1

Introdução 4

A pesquisa e suas questões 10

Organização e Estrutura da Tese 12

Capítulo 1: D’onqo vim e Onqo tô 14

1.1Uma matemática que aprendi e que também ensinei 15

1.2As NTICs no ensino de Cálculo: desenvolvendo uma perspectiva 16 1.3No projeto ENIBAM/ProTem-CC: desenvolvendo aplicativos e

também as minhas concepções sobre os processos de ensinar e aprender matemática

22

1.4No GEPEMNT: estudando, pesquisando a Educação Matemática e as novas tecnologias – reorganizando a nossa forma de pensar o computador

25

1.4.1 Desenvolvimento de oficinas: nossos ambientes de

aprendizagem computacionais 27

1.4.2 Concepção e desenvolvimento coletivo um software

matemático 31

1.5Onqo tô 35

Capítulo 2: As tecnologias na educação matemática: um panorama geral

dos acontecimentos 36

2.1Políticas educacionais brasileiras e as TICs 36

2.2TICs e a Educação Matemática – Como? E para que? 40

2.3Professores de matemática e as TICs 50

2.4 Finalizando este capítulo 54

Capítulo 3: A formação continuada como contexto para a pesquisa e a

opção metodológica para a coleta de dados 56

3.1O projeto de extensão universitária: “Novas tecnologias e educação matemática na formação continuada de professores de matemática”

56

3.1.1 Uma nota sobre a natureza da proposta de formação

(11)

xi

3.2A opção metodológica deste estudo 59

3.2.1 Observação participante e sujeitos de pesquisa 62

3.2.2 A coleta de dados 63

3.3Descrição (em linhas gerais) das atividades desenvolvidas na Formação Continuada de Professores de Matemática através dos anos 2004, 2005 e 2006

64

3.3.1 As atividades no ano de 2004 67

3.3.2 As atividades no ano de 2005 73

3.3.3 As atividades no ano de 2006 81

3.4Uma síntese dos fatos: de 2004 a 2007 85

Capítulo 4: O que nos referencia teoricamente? 89

4.1Introduzindo a Teoria Histórico-Cultural da Atividade 95

4.2As bases filosóficas da Teoria da Atividade 97

4.3As gerações da Teoria da Atividade 100

4.3.1 A primeira geração: o conceito de mediação e Vigotski 101

4.3.2 A segunda geração: a estrutura da atividade e Leontiev 105

4.3.3 A terceira geração: novos desenvolvimentos 109

4.4Os princípios da TA (segundo Engeström), um quadro teórico

para análise da pesquisa 112

4.4.1 Contexto e unidade de análise 112

4.4.2 Multivocalidade do sistema-atividade 114

4.4.3 A historicidade da atividade humana 114

4.4.2 Contradições internas como fonte de mudança 115

4.4.3 A aprendizagem expansiva 116

4.5Dialogando com a Teoria da Atividade 117

Capítulo 5: As oficinas de Marco, Lúcia e Verônica 121

5.1Marco, Lúcia e Verônica 122

5.2As oficinas 125

5.2.1 As oficinas de Marco 125

5.2.2 A oficina de Lúcia 132

5.2.3 As oficinas de Verônica 139

(12)

xii

5.4Encaminhamentos para a análise dos dados 146

Capítulo 6: Quando a atividade da formação continuada encontra a

atividade pedagógica do professor de matemática 148

6.1O triângulo de Engeström: uma forma de apresentar os dados 148

6.2Para dentro e para fora da atividade 150

6.3Distúrbios, conflitos e tensões nas oficinas: sintomas ou causas das

contradições nas atividades em questão? 152

6.3.1 Percepções sobre os artefatos 153

A. O computador: artefato mediador ou objeto? O caso da

folha de trabalho 154

B. O computador: artefato mediador ou objeto? O caso do “encantamento”

155

6.3.2 Percepções sobre a relação artefato objeto da atividade. 158

A. A Régua e o Compasso de Marco: por uma geometria estática ou dinâmica?

158

Objetosestáticos com potencial para investigação 159 Objetos dinâmicos com potencial para investigação 160 6.3.3 Compreensões sobre os limites e potencialidade da ação

Compreensões sobre os limites e potencialidade da atividade 162 A. A ação ‘organizar oficinas’ é situada em uma atividade 162

B. A ação ‘organizar oficinas’ é situada em outra atividade 163 6.4Sintomas ou causas das contradições? De que contradições

falamos? 164

A. Atividade: ENSINAR matemática 164

B. Atividade: ensinar MATEMÁTICA com computador 164 C. Contradições internas da atividade de FC 166

Considerações finais 168

Verônica, um caso para estudo? 168

Finalizando 170

Reorganização da atividade de FC 171

Resistência – uma forma de reorganizar 173

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(14)

1

A cada final de ano, os relatos da Professora Verônica1 nos seminários de nosso grupo de estudos e pesquisa, sempre nos tocam. Como não ser cativada pela história daquela professora que há 25 anos leciona matemática em escola pública do Estado e, desafiando inúmeras adversidades que encontrou, incorporou o uso do computador em sua aula para ensinar matemática? Lembrando ainda que, no início de sua participação em nossa formação2, no ano de 2005, essa professora nem utilizava o email! A uma pergunta da formadora Jussara sobre quem utilizava email normalmente e em meio a numerosos ‘eu!’, ‘eu uso!’, ela respondeu de forma contundente:

Verônica: “Eu não! Vou trazer a Luisa [apontando para a sua filha, que, na reunião daquele dia, estava presente] sempre comigo porque (...) [risos, muitos risos]; aí, ela [referindo-se à Luisa] faz a parte de apoio [sussurro: secretaria]”.

(Excerto 1, reunião de 11/06/2005)

Pois é, observamos indícios de mudanças na professora. Ela participou da nossa formação, que se constituiu no contexto desta pesquisa, por três anos em seguida e, nesse período, repetiu a experiência de uso do computador em suas aulas por mais quatro oportunidades. Cada relato seu, nos seminários de final de ano, entusiasmava a todos que a ouviam. Alguns colegas me diziam... ‘Por que não fazer um estudo de caso?’

Seria Verônica um caso para estudo? Teria a professora Verônica, ‘mudado’3 de fato?

1 Cada sujeito desta pesquisa foi consultado sobre um nome pelo qual gostaria de ser aqui referido. Em

alguns casos, professores optaram pelo seu próprio nome.

2 Refiro-me à formação continuada de professores de matemática, contexto em que desenvolvi esta pesquisa. 3 Como parte de um projeto que visa o desenvolvimento profissional de seus participantes, a mudança do

(15)

2

Na referida formação, ao propormos o uso do computador em salas de aula de matemática, discutíamos também sobre possibilidades de mudança da prática de ensino (e/ou aprendizagem) desta disciplina: de uma (possível) abordagem tradicional – com ênfase na transmissão de conhecimentos, seguidos de exercícios e prática4 – a uma abordagem investigativa – com ênfase na exploração do objeto matemático pelo grupo formado por alunos e professor(a).

Teria Verônica, incorporado a investigação em sua prática?

Algumas de suas falas (em fases mais avançadas deste processo de formação continuada) nos dão indícios que não. Além disso, ainda em sua primeira fala no grupo, ela nos deixa claro de que usualmente busca incorporar novos elementos em sua prática com o intuito de atrair, de chamar a atenção de seu aluno:

Verônica: “Meu nome é Verônica, eu já sou veterana na área de educação. Pelo menos... Todo dia, minha filha, todo ano tem que buscar uma fonte nova prá poder beber água porque a mudança é muito rápida e a gente tem que correr atrás desta mudança. Então... Eu acho que nestes 25 anos eu não passei nem um ano sem fazer alguma coisa prá buscar outras... Outras alternativas de atingir o... para atingir o aluno, prá ver se ele consegue adquirir um pouquinho mais de conhecimento, apesar de que eu acho que a bagagem dele é maior do que a minha então eu tenho que ir atrás...”

(Excerto 2, reunião de 11/06/2005, grifo meu)

Nesse depoimento, Verônica relata-nos a sua busca constante por ‘alternativas para atingir o seu aluno’. Ao considerarmos esse fato, podemos admitir que talvez Verônica não tenha mesmo ‘mudado’.

Poderíamos então afirmar que Verônica ‘resistiu’ à mudança, supostamente decorrente desta formação continuada?

Esta hipótese gera alguns protestos e, eu mesma, reluto em aceitar esta idéia. Não creio ser justo afirmar que Verônica não ‘mudou’ e que ela ‘resistiu’ à mudança. Parece-me ainda mais inadequado, como pesquisadora e formadora, ‘decidir’ e afirmar categoricamente entre posturas tão antagônicas.

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3

Depois de muita reflexão, creio que, na realidade, Verônica e seus colegas viveram conosco momentos em que muitas escolhas foram feitas e, nem sempre, as escolhas foram coerentes como, achávamos, tinham que ser. Hoje percebo que tais escolhas fazem mais sentido se outras histórias vividas fora daquela formação são levadas em conta.

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4

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INTRODUÇÃO

Apesar do evidente avanço tecnológico nos últimos anos e da presença desta tecnologia em várias esferas da atividade humana, inúmeros trabalhos (ver, por exemplo, LYNCH, 2003; CUBAN, 2001, FROTA e BORGES, 2004) relatam, como não bem sucedida, a implementação de tecnologias computacionais de forma efetiva no ambiente escolar. De maneira geral, a incorporação de tecnologias computacionais no trabalho em sala de aula5 parece pressupor uma relação direta com a expectativa de transformação qualitativa no campo da educação. Dessa forma, apesar de ampla (ou maior) presença numérica (em termos relativos) de computadores nas escolas do ensino básico, muito se questiona sobre mudanças (ou não) que a presença tecnológica tem acarretado nos processos educacionais.

Por exemplo, Lynch (2003) e Cuban (2001) discutem o fato de que, ainda hoje – após pelo menos vinte anos de empreendimento nessa área, tais transformações/mudanças no campo da educação não são tão evidentes como foram, um dia, anunciadas. Lynch (ibidem) menciona que, há pelo menos duas décadas, a integração do computador no ambiente escolar tem sido uma das prioridades das políticas educacionais na maioria dos países desenvolvidos. Do ponto de vista desses autores que analisaram a inserção das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) nas escolas da Austrália (LYNCH, 2003) e EUA (CUBAN, 2001), apesar de todos os esforços governamentais dos diferentes países as propaladas mudanças não ocorreram.

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5

campo da educação não aconteceram (LYNCH, 2003). Em sua análise desta situação, a autora considera que as grandes expectativas de mudança em torno do uso da tecnologia na educação não se viabilizarão enquanto permanecer a crença ingênua – assim denominada pela própria autora – na tecnologia como um ‘produto’ (vs. ‘processo’) e a noção simplificada de professores como ‘recipientes’ de uma inovação pedagógica. Ela defende que entendamos a presença da tecnologia em um ‘processo’ (vs. ‘produto’) de interação do homem com o artefato tecnológico. Mais adiante aprofundaremos esta discussão.

Cuban, em seu controverso6 livro Oversold and underused – Computers in the classroom, afirma que os dados de sua pesquisa em duas escolas do Vale do Silício7, Califórnia, EUA, mostraram que melhoras acadêmicas significativas decorrentes do uso dos computadores não são claramente visíveis no desempenho dos alunos dessas escolas. Em entrevista concedida à Judy Salpeter, editora da Revista Eletrônica Technology & Learning (http://www.techlearning.com/db_area/archives/TL/062000/archives/cuban.php), no dia 25 de junho de 2000, Larry Cuban afirma que uma falha encontra-se no fato de que poucas pesquisas desenvolvidas, até então, avaliam o potencial e as implicações reais do uso do computador em sala de aula.

Buscando responder à questão: “em que medida é real o avanço da América Latina em termos de e-ducação?”, Brunner (2004, p. 57) destaca a escassez de dados a esse respeito nos países latino americanos, principalmente de dados comparáveis em nível internacional. Segundo o autor “os governos medem seu grau de sintonia com a sociedade da informação baseando-se no número de escolas conectadas e na proporção de computadores por alunos” (2004, p.17). No entanto, no que se refere ao ‘uso efetivo’ dos meios digitais existentes nas escolas, a informação é muito pequena e é fortemente “baseada em estudos etnográficos isolados ou na observação de especialistas docentes e alunos” (p.62).

5 Sabemos que aqui no Brasil, normalmente computadores não são instalados em salas de aula. Assim, ao

utilizar a expressão ‘computador em sala de aula’ refiro-me a ocasiões em que o professor traz o uso do computador para a sua aula, seja para uma sala de aula comum ou para laboratórios de informática.

6 Larry Cuban, professor da área de Educação, da Universidade de Standford, Califórnia, EUA, escreveu

trabalhos nos quais discute que o uso de tecnologias computacionais nas escolas K12 dos EUA teve um impacto limitado na qualidade de ensino e aprendizagem dessas escolas. Tal postura tem gerado debates polêmicos sobre este tema.

7 O Vale do Silício – theSiliconValley – é uma região, localizada ao sul da Baia de São Francisco, no norte

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6

No Brasil, Frota e Borges (2004), em seu estudo com professores de matemática da escola básica e seus perfis de entendimentos sobre o uso de tecnologias na Educação Matemática, consideram que avanços no uso da tecnologia na educação básica – “fortemente presente no discurso educacional oficial” (p.1) – são pequenos e incipientes. Mesmo com o aumento do uso do computador, por parte do professor, em tarefas tais como preparação de aulas (e.g. editores de texto), ou como mídia de transmissão (e.g. power point), outras pesquisas feitas no Brasil também questionam a adoção, de fato, das tecnologias computacionais em sala de aula (ARRUDA, 2002; GAZIRE, 2003; ROCHA FILHO, 2006).

Neste cenário, um destaque é dado ao papel do professor para o sucesso (ou não) da política de inserção do computador nos processos de ensino e aprendizagem. Assim, políticas governamentais e muitos projetos relacionados à inserção de Novas Tecnologias da Informação e Comunicação (NTICs) em processos educacionais, no Brasil e no exterior, colocam o seu foco na formação do professor, principalmente a do professor em serviço.

Dessa forma, no Brasil, como em muitos outros países, iniciativas em grande escala – a nível nacional – governamentais ou não, têm sido implementadas para capacitar professores na adoção das telemáticas em suas práticas docentes (por exemplo: ProInfo8, TVEscola9). Em tais iniciativas, devido a este papel de destaque dado ao professor, é possível inferir que este é considerado (ou visto como) ‘o’ agente das mudanças das práticas pedagógicas, supostamente, decorrentes da incorporação de tecnologias computacionais nas salas de aula. Podemos ler nas diretrizes do ProInfo:

“O sucesso deste Programa depende fundamentalmente da capacitação dos recursos humanos… Capacitar para o trabalho com novas tecnologias de informática e telecomunicações não significa apenas preparar o indivíduo para um novo trabalho docente. Significa, de fato, prepará-lo para o ingresso em uma nova cultura, apoiada em tecnologia que suporta e integra processos de interação e comunicação.” (BRASIL, 1997, p.7, grifo meu)

ou seja, uma área rica em termos de informática, sendo assim, uma local onde a integração de computadores no sistema educacional parece ser o mais provável.

8 Programa Nacional de Informática na Educação (ProInfo), programa educacional criado pelo Ministério da

Educação e Desportos (MEC), em 1997, para promover o uso pedagógico das Tecnologias de Informática e Comunicações (TICs) na Rede Pública de Ensino Fundamental e Médio.

9 A TV Escola é um canal de televisão do MEC, criado em 1996. Tem por objetivo, através da divulgação de

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7

Independentemente de concordar com essa análise, mas por considerar o professor ‘um’ dos agentes que pode contribuir para a mudança qualitativa dos processos educacionais, pesquisas recentes com (e sobre) grupos de formação continuada e/ou desenvolvimento profissional10 de professores de matemática, com objetivos variados e não necessariamente visando a implementação da tecnologia computacional, têm mostrado resultados significativos no que diz respeito à mudança da prática pedagógica quando estes grupos se organizam configurando trabalhos com referência na formação de um professor reflexivo e com componente colaborativo (CANCIAN, 2001; COSTA, 2004; FERREIRA, 2003; FIORENTINI, 2004; PENTEADO, 1999; SARAIVA E PONTE, 2003).

Dentre esses, Penteado (1999), Cancian (2001) e Costa (2004) relatam pesquisas em contextos em que foram desenvolvidas ações colaborativas visando à inserção do computador nas práticas docentes dos professores de matemática. Esses autores relatam que, de modo geral, a colaboração estabelecida entre participantes do grupo teve um papel de primordial importância e que foram observados movimentos, por parte dos professores, em direção ao uso das tecnologias computacionais em suas aulas de matemática. Ainda, segundo estes autores, tais propostas de formação continuada não se limitaram à experiência de inserção do computador na prática docente, mas preocuparam-se, principalmente, com a formação de um professor que refletisse criticamente sobre as possíveis implicações dessa ação, tais como: as mudanças nos modos de ensinar e nas concepções dos modos de aprender, a reformulação do currículo, o questionamento da cultura docente vigente, o trânsito pelas ‘zonas de risco11’ (BORBA e PENTEADO, 2001), a reorganização do contexto da sala de aula.

10 Fiorentini e Nacarato (2005, p.8) constatam que, na literatura do campo da educação, são várias as

denominações utilizadas para se referir ao processo de formação de professores em serviço: aperfeiçoamento, treinamento, reciclagem, formação permanente, formação continuada, educação contínua, desenvolvimento profissional. Sendo as duas últimas, denominações mais recentes que se alinham a propostas de formação que partem da prática cotidiana dos professores, para problematização, reflexão e busca por soluções pensadas de forma colaborativa. Neste texto entende-se desenvolvimento profissional assim como descrito por estes autores.

11 Penteado e Borba (2001) fazem referência às ‘zona de conforto’ e ‘zona de risco’. De acordo com esses

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8

Ao longo dos últimos cinco anos, tenho também atuado como formadora em programas12 de formação continuada de professores de matemática e trabalhado em parceria com professores que, em geral, têm a intenção explícita de utilizar tecnologias computacionais em suas salas de aula. Como em Cancian (2001), Costa (2004) e Penteado (1999), a colaboração estabelecida entre os formadores e formandos, participantes destes programas de formação continuada incentivou alguns professores a experienciar a inserção do computador em, pelo menos, uma de suas aulas. Em nossa avaliação, muitas dessas experiências foram consideradas bem sucedidas. Entretanto, observei também que, embora esses professores tenham vivenciado a experiência efetiva na utilização do computador em sala de aula, uma ‘segunda’ experiência demorava a acontecer, ou jamais acontecia. Mudanças em suas práticas pedagógicas não eram perceptíveis. Tal observação parece corroborar uma tese comum sobre a resistência do professor a inovações tecnológicas e/ou pedagógicas, ou a mudanças.

De fato, inúmeros trabalhos e estudos teóricos sobre a relação do profissional e inovações tecnológicas (ATTIE, 2003; DEMETRIADIS et al., 2003; EWICK & SILBEY, 2002; FIGUEIREDO, 2004; GAUDIO, 2006; KAPITELININ & NARDI, 2006; NORTON, McROBBIE & COOPER, 2000; RAJAGOPALAN, 2002; SUCHMAN & BISHOP, 2000) citam como um dos obstáculos ao sucesso dessa empreitada, a resistência do profissional às inovações tecnológicas. Porém, será que esta tese explica os fatos que aconteceram na participação dos professores nos processos de formação continuada que tomei parte? Recordo que muitos deles nos procuram com a sua intenção declarada de inserir o computador em sua prática docente.

É fato que, apesar de relatos de experimentos bem sucedidos sobre experiências de uso de tecnologias da informática em salas de aula, e apesar das iniciativas governamentais, não podemos afirmar que tecnologias tenham sido incorporadas no dia-a-dia das escolas do ensino básico no Brasil de forma efetiva, como vislumbrado nos objetivos dos projetos propostos, governamentais ou não. Entretanto,

Seria correto afirmar que tal insucesso decorre da resistência do professor ao uso de novas tecnologias em sala de aula?

12 Especialização para professores de matemática (DMat/ICEx/UFMG) e Projeto de Extensão Universitária

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9

As propostas de capacitação, ou mesmo as propostas com componente colaborativo e com foco na formação do professor reflexivo, embora não explicitem a tese de que o professor resiste, propõem seu processo de formação como uma forma de superação das dificuldades e de uma eventual/suposta resistência. Não excluo em tal avaliação, o projeto de formação continuada que se constituiu como contexto desta investigação. Esta reflexão não nos surpreende, uma vez que as propostas de formação provavelmente foram formuladas a partir de estudos e experiências relativamente bem sucedidas, no olhar daquele que as propõem (o formador). Por outro lado, pergunto:

O sucesso de tal empreitada diz respeito à superação da resistência do professor ao uso de novas tecnologias?

E mais,

A resistência pode ser vista como obstáculo a ser removido, superado, ou um olhar mais cuidadoso (de lupa) dar-nos-ia outras sugestões de como agir?

Creio que, muitas vezes, a bem sucedida experiência de formação – entendida, de forma generalizada, como a mudança do professor – leva-nos a crer que obstáculos e resistências possam ser removidos a partir de uma forma ou técnica de trabalhar; muitas vezes, deixando de compreender as origens e os porquês das dificuldades e/ou resistências, assumidas tacitamente na elaboração do projeto.

Neste sentido, escolho concluir esta seção, citando Almeida (2008) que, em recente publicação, faz um balanço sobre a introdução das tecnologias computacionais na Educação brasileira:

“Portanto, as práticas avançam, tropeçam, contornam obstáculos e traçam trajetórias singulares, mas apesar da crescente quantidade de equipamentos colocados nas escolas, da articulação triádica entre equipamentos, conexão e desenvolvimento profissional de educadores observada tanto nos países mais ricos como nos mais pobres, a concretização das ações se mostra aquém dos objetivos, metas, desejos e utopias do discurso humanista, da prática crítico-reflexiva, do compromisso ético e solidário.” (p.125)

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10

projetos de formação, considero que estas podem ser observadas como conquistas individuais (do sujeito) e claramente locais. Uma vez que este é o âmbito de nosso trabalho de pesquisa, fica aqui mais uma questão:

Como podemos relacionar resultados de estudos locais sobre a inserção do computador, na prática docente do professor, tidos como bem sucedidos às estatísticas sobre o insucesso da implementação do uso do computador nos processos educacionais?

A pesquisa e as suas questões

Neste texto, relato a pesquisa que realizei em contexto de uma formação continuada de professores de matemática que têm como proposta incorporar o uso do computador em sua prática docente. Esta formação acontece no âmbito do Programa de Extensão para Professores da Escola Básica, desenvolvido por professores e alunos do Departamento de Matemática (DMat), do Instituto de Ciências Exatas (ICEx) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Nesse contexto, propus olhar para o trabalho colaborativo entre formadores e formandos, buscando inicialmente entender possíveis mudanças do sujeito em sua participação neste processo. Em processos de formação continuada, no olhar do formador, situações de mudanças parecem ser fáceis de capturar. A mudança do professor seria uma conseqüência quase que direta do processo de formação que o formador propõe. Entretanto, observações iniciais chamaram também a minha atenção para manifestação, por parte de alguns participantes13, de sinais de resistência14 na implementação, de fato, de uma atividade matemática em que se incorporava o uso do computador em sala de aula. Ressalto ainda que, nesse projeto, os professores de matemática unem-se ao grupo de forma voluntária; e em geral, esses professores declaram ter a intenção explícita de utilizar tecnologias computacionais em suas salas de aula. Dessa forma, tais professores parecem não resistir a inovações tecnológicas (ou pedagógicas) apriori.

Assim, ao longo desta investigação, deparei-me inúmeras vezes com situações de mudança e de resistência do professor de matemática (talvez à mudança); resistência, muitas vezes,

13 Em meu olhar, como formadora-pesquisadora que fortemente crê no processo de formação proposto, o

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11

por ele não explicitada, ainda sim presente (ou percebida pelos formadores) ao implementar efetivamente o uso do computador em sua aula.

Tenho como pressuposto que tal resistência não é um simples ‘ser contra’ o uso do computador em processos educacionais de matemática. Creio que há nuances a serem discutidas entre resistir e não resistir ao uso de computadores em suas salas de aula. Dessa forma, nesta investigação, em que o contexto é a formação continuada de professores que têm como objetivo (pelos professores explicitado) a inserção de tecnologias computacionais em suas salas de aula, questiono:

Neste cenário, professores resistem de fato? Se resistem, a quê resistem? A mudança do professor significa a superação de uma resistência? De quê resistência falamos?

Ao resistir o professor ‘diz não’ à mudança?

Estas questões nortearam minha coleta de dados. Em minhas reflexões com os dados já coletados, no entanto, percebi que ‘ao olhar para a mudança, enxergava a resistência’ e, na contramão, percebi que ‘ao olhar para a resistência, eu enxergava a mudança’; os dados revelavam-me que o sujeito da mudança, era também o sujeito da resistência. Tal observação desestabilizou um olhar que procurava por um entendimento isolado (e polarizado) sobre mudança e/ou resistência do professor.

Na análise de dados, passei então à busca por uma compreensão mais cuidadosa de possíveis relações existentes entre mudança e resistência do sujeito desta pesquisa, e a questão que passou a orientar a análise dos dados foi:

Como se relacionam mudança e resistência (talvez, até mesmo à mudança) no sujeito em uma atividade de formação continuada de professores de matemática, que têm como objetivo declarado incorporar o uso do computador em sua prática docente?

A Teoria da Atividade (TA) proveu-me as novas lentes que me possibilitaram esta mudança de olhar.

14 Uma pergunta natural, decorrente desta afirmação, é ‘resistência à que?’. Confesso que não sei. Os estudos

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12 Organização e estrutura da tese

No Capítulo 1, faço o resgate de parte de minha história com a matemática, como estudante, como professora e educadora. Descrevo também como passei a me interessar e a trabalhar com novas tecnologias no contexto de ensino de matemática. Ao final, falo sobre minhas experiências com trabalhos coletivos e meu envolvimento com o GEPEMNT – Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Matemática e Novas Tecnologias. No contexto desse grupo, se origina o projeto da Formação Continuada que se torna foco desta pesquisa.

No Capítulo 2, descrevo e faço uma breve análise de alguns fatos, que julgo, importantes dentro do debate das temáticas envolvidas nesta investigação: Novas Tecnologias Computacionais, Educação Matemática e Formação Continuada de Professores de Matemática.

No Capítulo 3, apresento o projeto de extensão universitária “Novas Tecnologias e Educação Matemática na Formação Continuada de Professores de Matemática”, suas metas e estratégias de trabalho; discuto a metodologia de pesquisa e coleta de dados desta investigação; e, ao final, faço uma descrição, em linhas gerais, das atividades da Formação durante os anos de 2004, 2005 e 2006.

O Capítulo4 expõe e explica a Teoria da Atividade como referencial teórico para a análise desta pesquisa e o processo pelo qual se deu essa escolha.

No Capítulo 5, faço o resgate das ações de um trio de professores – Marco, Verônica e Lúcia – em atividade da formação continuada. Por meio da observação das tensões sentidas na ação de organizar oficinas incorporando o uso do computador em suas salas de aulas, busco por possíveis contradições internas da atividade de formação.

No Capítulo 6, analiso possíveis contradições dos dados partindo das situações de conflitos, distúrbios e tensões das oficinas de Marco, Lúcia e Verônica.

No capítulo final, deixo as minhas considerações finais.

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13

objetivo de dar início ao diálogo com o leitor. O da Clarissa resultou de nossos

bate-papos e troca de emails. Foi por ela escrito, respondendo a um pedido meu. Seu

busca retratar a minha compreensão atual sobre uma possível relação existente entre mudança e resistência. Em meu entendimento atual, mudanças ocorrem, mas estas dependem do objeto em transformação: da sua constituição, da sua disposição, do seu lugar no espaço e no tempo, enfim, da sua natureza. De outro modo, mudanças podem não ser perceptíveis ao nosso olhar, no tempo determinado por uma investigação.

No caso desta pesquisa, esta idéia, a de uma relação existente entre mudança e resistência, emerge de minhas observações, especificamente, em grupos de formação continuada de professores que têm como proposta incorporar inovações tecnológicas no ambiente escolar, e dos estudos teóricos sobre o fenômeno que foi freqüentemente denominado como resistência (ATTIE, 2003; DEMETRIADIS et al., 2003; EWICK & SILBEY, 2002; FIGUEIREDO, 2004; KAPITELININ & NARDI, 2006; NORTON, McROBBIE & COOPER, 2000; RAJAGOPALAN, 2002; SUCHMAN & BISHOP, 2000).

15 “O Haikai é uma pequena poesia com métrica e molde orientais, surgida no século XVI, muito difundida

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14 Capítulo 1

D’ONQO VIM E ONQO TÔ16

Morando há pelo menos sete anos em Belo Horizonte, aprendi muitas mineirices e ‘apreendi’ uma série delas. Devo dizer que a fala do mineiro é peculiar. Quando aqui cheguei, pouco intindia – como diz a Márcia, minha orientadora – desse mineirês... Constantemente, via-me solicitando aos mineiros que repetissem o que me diziam. Simplesmente, não conseguia entendê-los! Hoje, com certo orgulho, posso dizer que os entendo e acho que não existem frases mais adequadas, desse jeito mineirês de falar, para intitular este segmento: D’onqo vim – corruptela mineira para “De onde que eu vim?” – e Onqo tô - idem para "Onde é que eu estou?”. Minha idéia neste capítulo é fazer uma reflexão de minha trajetória como estudante e profissional do campo da matemática, pois nela é possível localizar sementes dos questionamentos que deram origem a esta investigação e o lugar de onde esta pesquisadora vos fala.

Nesta reflexão, busco enfatizar a dinâmica de (trans)formação de minha percepção sobre a matemática (sua natureza, seu ensino e sua aprendizagem) e sobre o uso e o papel dos computadores no contexto da Educação Matemática. Busco também resgatar como se deu o desenvolvimento de minha consciência sobre papel do trabalho coletivo e, posteriormente, colaborativo, principalmente, nas oportunidades que tive para pensar, planejar e desenvolver aplicativos em colaboração com outras pessoas (professores, alunos e educadores matemáticos). Espero ao final deste trabalho, através da análise e da reflexão, poder dizer Pr’onqo vô – modo mineiro de dizer “Para onde é que eu vou”.

Os próximos segmentos foram organizados, em grande parte, na seqüência cronológica dos fatos: da aluna que gostava de matemática e que se tornou professora de matemática, do meu interesse pela adoção das tecnologias computacionais em processos de ensinar e aprender matemática, de minha inserção em grupos de estudos e pesquisa sobre o tema e, finalmente, de minha atuação como formadora (e pesquisadora) junto aos professores de matemática.

16 No ano de 2005, a tradicional companhia de dança mineira O Corpo, em comemoração aos seus trinta anos

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15

1.1Uma matemática que aprendi e que também ensinei

Muitos daqueles que escolhem estudar matemática no ensino superior são integrantes de um grupo seleto de alunos que foram considerados ‘bons’17 alunos nos ensinos fundamental e médio; ou, como diziam os nossos pais e também tios e avós ‘meninos e meninas muito inteligentes!’. Assim, durante a minha vida escolar até o final do ensino médio, fui considerada uma aluna ‘inteligente. Para tanto, devido ao status quo da matemática no ranking das matérias escolares, bastava nela ser bem sucedida. Nessa época era incompreensível para mim que, com professores tão ‘bons’, colegas meus pudessem ‘não aprender’ a tal matemática. Até o final do ensino médio, achava-a fácil e em minha opinião tudo era uma questão de ‘lógica’. Jamais pensei que, em alguma etapa de minha vida, viria a questionar esta ‘lógica’ que, um dia, achei ‘tão lógica’. Ou seja, aprender matemática parecia-me algo natural até então.

Já como aluna do bacharelado e da licenciatura em matemática18, tal história não se repetiu. Eu, até então uma ‘boa’ aluna de matemática, não fui muito diferente da grande maioria dos alunos de ciências exatas, que no ciclo básico enfrentava problemas sérios de incompatibilidade com o ensino massivo19 e de massa20 tão comum nos ciclos básicos.

Nessa época, a pouca atenção dada aos modos de ensinar21 Cálculos e Físicas – as eternas e tão (‘mal’)ditas disciplinas dos cursos de graduação da área de ciências exatas – passaram

estou’. Com músicas compostas por Caetano Veloso, este espetáculo levou para o cenário nacional esse jeito mineiro de falar, !

17 ‘Bom aluno, meninos e meninas ‘inteligentes’ são atributos dados por grupos de pessoas. Sendo assim,

tais atributos dependem de valores sociais, morais, entre outros, dos grupos de pessoas que a atribuem. Ou seja, um ‘bom’ aluno de matemática pode ser considerado bom em um contexto e não tão bom em outro. Neste capítulo, optei por destacar tais atributos entre aspas ‘ ’. No caso aqui descrito, os atributos do aluno ‘bom’ ou ‘mal’ dependiam exclusivamente de suas notas escolares. Ou seja, o aluno ‘bom’ era o aluno ‘nota 10’.

18 Sou graduada pelos cursos de matemática (licenciatura) e matemática aplicada (bacharelado) da

Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP/SP).

19 A disciplina Cálculo é conhecida por sua excessiva carga de matéria.

20 Vinda de um ensino de segundo grau em que as salas de aula tinham no máximo 40 alunos, foi para mim

um choque, e creio que para muitos outros alunos, ter aulas em auditórios ou em galpões (como eram chamados), com cerca de 60-80 alunos.

21Na época, eu não tinha ciência da ‘problemática’ do ensino de Cálculo – Cálculo Diferencial e Integral. Só

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a me indignar. Tal indignação reforçou a convicção por minha ‘vocação’ (que acreditava ser) ‘natural’ para ser professora de matemática e aproximei-me dos estudos e dos professores que se preocupavam com os modos de ensinar a matemática22.

Atuei como professora da escola básica antes mesmo de ter me graduado. Assim, meio estudante e meio professora, preocupavam-me sempre as estratégias para ensinar bem a matemática e em não repetir o ‘fiasco’, ao meu modo de ver, do tradicional ensino de Cálculo. Talvez, por ter sido razoavelmente bem sucedida nesse intento, acreditava que uma boa estratégia de ensino despertaria e atrairia meus alunos para ‘estudar’ e ‘apreciar’ a ‘bela’ matemática. Enfim, na época tinha a crença de que aprender matemática dependia em grande parte de um ‘bom professor’; e na minha concepção, para ser um ‘bom professor’ bastava ser organizado, claro, e saber motivar os alunos com ‘boas’ estratégias. Na época, não questionava metodologias de ensino e, nunca, o conteúdo a ser lecionado.

Como poderão ver, a seguir, as chamadas Novas Tecnologias de Informação e Comunicação (NTICs23), só passaram a fazer parte de minha vida, mais tarde, quando então fui aluna do programa de pós-graduação no Departamento de Matemática, da Universidade do Texas em Austin (UT), Texas.

1.2As NTICs no ensino de Cálculo: desenvolvendo uma perspectiva

Àquela época, jamais imaginaria que algum dia fosse programar ou trabalhar com computadores. Nos anos em que fui aluna da graduação, algumas disciplinas exigiam do aluno, desenvolver pequenos programas nas linguagens de programação Fortran, Pascal, C. Nunca apreciei essa tarefa e sempre fiz o estritamente necessário24 para ‘passar’ nessas disciplinas. Talvez isto possa ser justificado pelo fato de que naquela época, no Brasil, o acesso a computadores era bastante difícil – eram raríssimos os alunos que tinham o seu próprio PC (Personal Computer). Enquanto alunos, dependíamos exclusivamente do bom funcionamento de um distante25 laboratório de computadores, que podíamos freqüentar

22 Na época, os professores Eduardo Sebastiani e Marineusa Gazzeta.

23 Naquela época ‘Novas’, hoje em dia, apesar da constante renovação, nem tanto assim, portanto passarei a

denominá-las em certos momentos como TICs – Tecnologias da Informação e Comunicação.

24 As notas finais dessas disciplinas (relacionadas à informática), em geral, computavam as notas de provas e

as de programação. Pelo fato de eu não apreciar esta última tarefa, nela me engajava somente no caso em que as notas das provas fossem insuficientes para ‘passar’.

25Até o funcionamento pleno do prédio novo do Instituto de Matemática, Estatística e Ciências da

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17

somente com hora marcada. A respeito disso, o telefone era outro artefato26 raro em casa de estudantes. Dessa forma, somente aficionados pelas novas tecnologias venciam todos esses obstáculos; e estes tinham acesso garantido aos computadores, pois poucos alunos se dispunham a encarar tais dificuldades.

Como aluna do programa de pós-graduação do Departamento de Matemática na Universidade do Texas (UT), porém, esta relação (ou falta de) com o computador mudou. Ali tínhamos acesso a computadores muito mais facilmente27, tanto para aquisição28 de seu próprio PC como para acesso de uso na própria universidade. Em quase todo o campus universitário, encontrávamos um laboratório de informática em que podíamos entrar e utilizar um computador ou até mesmo vários, dependendo da disponibilidade. Também foi lá que tive o primeiro contato com a WWW (The WorldWideWeb), ou a Rede Mundial de Computadores, mais popularmente chamada de Internet. Confesso que fui facilmente seduzida pela facilidade e pela acessibilidade que passei a ter ao mundo das informações quase que instantâneas. Longe do Brasil, tinha as notícias do que aqui acontecia, muitas vezes, até mais rapidamente do que meus familiares, então, no Brasil.

Foi também por meio da internet que tive acesso a inúmeros projetos de ensino de matemática em que tecnologias computacionais eram incorporadas. Tais projetos, particularmente as propostas para o ensino de Cálculo, despertaram a minha curiosidade em relação ao uso pedagógico do computador. Isto porque, simultaneamente, enquanto aluna do programa de pós-graduação do Departamento de Matemática da UT, onde fui aluna até 199729, desenvolvia a atividade extra curricular como Assistente de Professor (AP) – ‘teaching assistant30 (TA)’ – nas disciplinas Cálculo Diferencial e Integral I, II e

os alunos, cujo modo principal de translado eram o ‘a pé’ ou a bicicleta, tais barracões ficavam em locais de acesso considerado, por nós alunos, muito difícil; tínhamos que enfrentar uma longa ‘subida’ para chegar ao local – popularmente chamado de ‘o morro dos ventos uivantes’- ou aguardar um demorado ônibus circular do campus.

26Esta informação é para os representantes das gerações mais novas. Pode ser difícil acreditar, mas a

popularização do telefone domiciliar, e hoje, o telefone móvel no Brasil, aconteceu somente na década de 90.

27 Apesar de ter sérias restrições às razões políticas, econômicas e sociais que viabilizam o famoso ‘american

wayof life’, restringirei no momento apenas à descrição dos fatos.

28 Nos EUA, existeminúmeras promoções de vendas de materiais informáticos (hardware e software) a

preços mais baixos quando o uso é educacional.

29 Fui aluna do Programa de Pós-Graduação do Departamento de Matemática da Universidade do Texas em

Austin do início de 1992 até o início de 1997. Posteriormente, fiz estágio, como ‘engineeringassistant’, neste mesmo departamento (1997-1999), quando passei a desenvolver aplicativos em Java para ensino e aprendizagem de Cálculo.

30 No ensino superior de muitas universidades americanas, os cursos básicos são divididos em aulas teóricas –

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18

III, ofertadas por esse mesmo departamento. Como AP, ministrava sessões de discussão e resolução de exercícios e nelas deparei-me com meus alunos tendo as mesmas dificuldades que tive enquanto aluna de Cálculo, no Brasil. Entendia que, de um modo geral, essas dificuldades estavam relacionadas ao entendimento/compreensão de conceitos teóricos básicos (e fundamentais) do Cálculo31. A partir dessa experiência e também daquelas vivenciadas como aluna, constatei que tais dificuldades não eram fatos incomuns nas salas de aula de Cálculo.

Na realidade, a disciplina ‘Cálculo I’ é conhecida por seu alto índice de reprovação e evasão, tanto no Brasil (LOPES, 1999) como nos EUA (SMITH, 1994). Há controvérsias a respeito das razões para tal fracasso. De um lado, muitos professores citam a aprendizagem deficiente, por parte de seus alunos, da matemática ensinada nos ensinos médio e fundamental. Ou seja, para esses professores, muitos de seus alunos chegam ‘despreparados’ para aprender Cálculo no ensino superior. De outro, pesquisas acadêmicas apontam obstáculos no ensino do Cálculo em si e não somente na falta de preparo do aluno. Tradicionalmente, nas aulas dessa disciplina, o conteúdo matemático é trabalhado por meio da transmissão oral, auxiliada pelas mídias ‘quadro-negro/giz’ e impressa (FRANCHI, 1993; SMITH, 1994), e, priorizando um tratamento simbólico-algébrico da disciplina. É senso comum e resultado de pesquisa (ver, por exemplo, TALL, 1991) que tal tratamento na introdução de conceitos como derivada, integral e limite de uma função podem dificultar a compreensão dos mesmos. Em minha opinião, esta abordagem não contempla a idéia de movimento e/ou variação dinâmica que caracterizam as funções. Em livros didáticos, as representações gráficas, para ilustrar os conceitos e as aplicações em contextos dinâmicos, não os capturam e nos dão impressão de representações de objetos estáticos, inanimados.

professores titulares e dirigidas a um público estudantil grande (aproximadamente 120 alunos), de modo geral, em um auditório. Nas aulas práticas, esse público é dividido em grupos menores e participam de sessões de discussão e resolução de exercícios, duas ou três vezes por semana (dependendo da carga horária), que são administrados por Teaching Assistants (TA – aluno de pós-graduação que para desempenhar essa atividade recebe uma bolsa de trabalho do departamento e o benefício do valor da mensalidade escolar significativamente reduzido).

31 As sessões de discussão e resolução de exercícios eram organizadas de modo a complementar as ‘aulas

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19

Retomando o período em que estudei nos EUA, vivi, no mundo acadêmico, um clima de reflexão e expectativa de mudança a partir de um movimento que ficou conhecido como a Reforma do Cálculo32. Murphy (?1996), em sua análise histórica, conta-nos que a Reforma do Cálculo veio a reboque da publicação Principles and Standards for Mathematics Education, do Conselho Nacional dos Professores de Matemática33 (NCMT), no final da década de oitenta. O autor nos diz que esta publicação foi uma resposta à apatia e ao insucesso acadêmico dos alunos nas aulas de matemática das escolas do ensino médio34. A Reforma do Cálculo veio como um prosseguimento natural da publicação dos Standards, com o objetivo de repensar o ensino do Cálculo Diferencial e Integral no ensino superior, que apresentava problemas semelhantes aos do ensino de matemática no ensino médio. Vários projetos foram propostos em resposta a esse movimento. Apesar da discussão quase sempre polêmica sobre o uso (ou não) da informática educacional, eram raras as propostas que não incorporavam o uso de calculadoras gráficas e do computador no processo de ensino e aprendizagem do Cálculo.

Um consenso, entre os educadores que aderiram ao movimento da Reforma do Cálculo, é o de que, em contraponto à ênfase quase que exclusiva dada ao tratamento simbólico-algébrico presente no ensino tradicional de Cálculo, “(…) alunos devem constantemente experienciar os conceitos [matemáticos] do cálculo em sua rica interação entre as suas formas simbólica, numérica e gráfica”35 (SMITH, 1993). Para muitos autores, as novas tecnologias possibilitam36 tal experiência: a do aluno experimentar conceitos matemáticos em interaçãocom seus objetos virtualmente representados nas formas algébrica, numérica e gráfica; para eles, na observação do objeto matemático virtual, o aluno visualiza a interatividade existente entre as suas diferentes representações. A interação com o objeto matemático virtual refere-se à interação com o usuário, e esta acontece pelo fato de que alguns software oferecem ao usuário a possibilidade de alterar, deslocar e rotacionar o objeto matemático em questão – ao arrasto do mouse, ao clique de algum botão, etc. Já a interatividade entre as diferentes representações refere-se à interação que ocorre na tela,

32 The Calculus Reform

33 The National Council of Mathematics Teacher (NCMT) 34 HighSchool no sistema escolar americano.

35"(…) students must constantly experience calculus concepts in a rich interplay of symbolic, numerical and

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entre os objetos virtuais, e esta pode acontecer no momento em que o usuário manipula algebricamente uma equação matemática, gerando alterações simultâneas, portanto, nas representações gráfica e numérica (ou vice-versa). Existem ainda software que simulam uma seqüência de interações gerando a possibilidade de visualizar uma animação sobre um objeto matemático.

Do meu ponto de vista, diga-se de passagem ‘otimista’ daquela época, muitas das propostas – ao incorporar o uso do computador – apresentavam uma forma alternativa para abordar o ensino dos conceitos do Cálculo. Com isso, tinha a expectativa de que tal abordagem pudesse complementar e ‘melhorar’ as ‘tradicionais’ aulas de Cálculo e, quem sabe, minimizar os problemas enfrentados pelos nossos alunos nessa disciplina. Viver este momento, a euforia e o acesso fácil a computadores que tínhamos naquele departamento, somados às possibilidades que eu percebia em criar ambientes virtuais para o ensino de Cálculo, constituíram as razões pelas quais me aventurei pelo mundo da programação37 de computadores. Sem dominar uma linguagem computacional por completo, fui, aos poucos, aprendendo e desenvolvendo alguns aplicativos na linguagem de programação Java38 – denominados na linguagem técnica por applets. Estes foram organizados e inseridos nas páginas WEB de Cálculo – Topics of Integral and Differential Calculus39, sendo este o meu primeiro trabalho relacionando a utilização de recursos computacionais ao ensino de Cálculo. Por conta desse trabalho, passei a experienciar a interação com usuários, em geral, grupo constituído por professores e alunos da disciplina Cálculo, matemáticos e interessados em programação de software educacional. Acredito que esta interação teve

36 Hoje em dia, acredito que tal possibilidade existe, porém, ela não é garantida somente com o uso do

computador. Também não existe a garantia de superioridade do ensino de matemática ao poder visualizar um objeto matemático.

37 Até então, minha experiência com uso e programação de computadores era mínima. Disse aventurar, pois

naquela época, tinha experiência mínima na arte de programar computadores. Para aprender melhor, contei com a ajuda de professores e colegas do Departamento de Matemática da UT. A programação foi feita nas linguagens de computadores C, C++, TCl/Tk e Java.

38 A escolha da linguagem Java – uma tecnologia desenvolvida pela SunMicroSystems - se deu pelo fato de

que programas gerados nessa linguagem podem, teoricamente, ser executados em qualquer plataforma computacional (Windows, MacOS, Linux). Podem também, diferentemente de várias outras linguagens de programação, ser incorporados em páginas WEB. Os aplicativos gerados nessa linguagem para este último fim foram batizados como applets. Na época, applets podiam ser executados por qualquer browser popular (e.g.; Netscape, InternetExplorer – a partir de algumas versões). Entretanto, no meio do que ficou conhecido como a guerra dos browsers - ‘the browser wars’ –, o Internet Explorer passou a executar tais applets somente com a instalação de um ‘plugin’. Mesmo assim, os applets continuam sendo populares e utilizados até os dias de hoje e até mesmo por grandes empresas (e.g.; salvo engano de minha parte, o teclado virtual para digitar a senha de acesso a uma conta no Banco do Brasil é (julho/2007) um applet).

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21

papel fundamental em minha atuação como programadora a partir daquele momento. Na época, recebi inúmeros e-mails de alunos e professores/usuários, de vários locais dos EUA, com diversas sugestões e muito incentivo, dando origem a constante troca de emails. Não há dúvida de que o acesso que tive a materiais, disponibilizados na WEB – por exemplo, propostas de ensino, páginas web de Cálculo – teve e continua tendo um papel fundamental no desenvolvimento de novas idéias. Contudo, no que diz respeito a insights didáticos, pode-se dizer que esse foi um trabalho que desenvolvi individualmente40. Naquele momento, a programação e design dos applets aconteceram de forma bastante intuitiva, referenciando-me, na maior parte das vezes em minha prática docente, minha imaginação e sugestões ocasionais dos alunos e professores-usuários. Na época, como já mencionei, meu objetivo principal ao incorporar o computador em processos de ensino e aprendizagem foi o de produzir um material didático complementar, para tentar ‘melhorar’ o desempenho dos alunos nas aulas de Cálculo. Meu conhecimento e contato com o debate sobre diferentes concepções de ensino e aprendizagem de matemática eram superficiais e, porque não dizer, inconsistentes. Intuitivamente, tinha a crença de que o sucesso da aprendizagem decorreria de uma forma ‘correta’ – logicamente, supondo a sua existência – de ensinar do professor, articulada a uma ‘disposição’ de aprender do aluno.

Vale ressaltar que existem hoje, visões alternativas à expectativa de ‘melhorar’ o ensino de matemática em decorrência do potencial da tecnologia computacional per se. Tal expectativa parece assumir a existência de um traçado único no processo de aprender matemática e o computador seria um mero ‘catalisador’ desta aprendizagem. No caso do ensino de geometria euclidiana, por exemplo, Laborde e Capponi41 (1994, apud LAGRANGE, ARTIGUE, LABORDE & TROUCHE, 2003) mostram como a interação com o software de geometria dinâmica dá ao estudante um entendimento das limitações/regras de construção do objeto geométrico, mecânica (através da manipulação) e visualmente. Entretanto, essa compreensão não é a esperada ‘conceptualização geométrica’, mas uma possibilidade nova em direção a essa conceptualização. No caso, a teoria (a ser conceptualizada) pode explicar ou modelar as propriedades visuais e mecânicas da geometria dinâmica que o aluno experimentou.

40 No que diz respeito a questões técnicas, tive valoroso apoio dos professores Willian F. Schelter, então meu

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22

Sem ter (ainda) estes questionamentos em mente, retornei ao Brasil em março de 1999. A partir de outubro daquele ano, participei de um projeto em que passei a desenvolver aplicativos em cooperação com outros profissionais – incluindo nesse grupo, educadores matemáticos. Dessa vez, referenciamos especificamente em concepções de ensino e aprendizagem de matemática.

No próximo segmento, faço uma descrição dessa participação, das atividades nelas desenvolvidas e de como a incorporação de alguns aspectos teóricos ajudou-me no processo de re-elaboração de minhas próprias percepções sobre ensino e aprendizagem.

1.3No projeto ENIBAM/ProTem-CC42: desenvolvendo aplicativos e também as minhas concepções sobre os processos de ensinar e aprender matemática

Entre outubro de 1999 e início de 2002, participei43 do projeto ENIBAM/ProTem-CC/CNPq (1999) que integrou professores do Departamento de Matemática do Instituto de Ciências Exatas (DMat/ICEx) e da Faculdade de Educação (FaE), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e professores do Departamento de Matemática da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Esse projeto teve por objetivos especificar, sistematizar, desenvolver e avaliar ferramentas computacionais destinadas a compor materiais de ensino a serem utilizados na formação básica em Matemática e na de alunos de primeiro ano do ensino superior em diversos cursos das áreas tecnológicas, bem como na formação de estudantes de Licenciatura em Matemática. Localmente, o ENIBAM-UFMG44 foi coordenado pela professora Márcia Maria Fusaro Pinto (DMat/ICEx). Como produção material, o projeto local (UFMG) propôs desenvolver appletssoftware-aplicativos na linguagem Java – a serem utilizados como recursos visuais, dinâmicos e interativos no processo de ensino/aprendizagem de conceitos básicos de Cálculo Diferencial e Integral. Este projeto recebeu também o apoio logístico que possibilitou criar um laboratório de computadores (o ProTem45) onde os projetos foram desenvolvidos.

41 LABORDE, Colete & CAPPONI, B. Cabri-géometre, constituant d’un milieu pour l’apprentissage de la

notion de figure géometrique. RechercheenDidatiquedesMathématiques, 14, 165-210, 1994.

42 Ensino Informatizado de Tópicos Básicos de Matemática/Programa Temático Multiinstitucional em

Ciência da Computação.

43 Como bolsista DTI (Desenvolvimento Tecnológico e Industrial) do CNPq.

44 Aqui, refiro-me às atividades, dentro do Projeto ENIBAM/ProTeM-CC/CNPq, desenvolvidas no

Departamento de Matemática da UFMG, coordenado localmente pela Professora Márcia Maria Fusaro Pinto.

45 Hoje, o ProTem funciona para fins de ensino e sedia as atividades de nosso grupo de estudos, o GEPEMNT

Imagem

Figura 1: esquema formulado a partir de descrição de Leont’ev (1981, p.42) Influência sobre o
Figura 3: o triângulo como foi cristalizado na TA
Figura 4: A estrutura do sistema-atividade  humana (Engeström, 1987, p.78)
Figura 5 :  Uma imagem estilizada de um sistema atividade em rede e  em movimento
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