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O Mito de Sísifo do bem-estar social na América Latina : capitalismo e welfare state no Brasil e no México

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

DEPARTAMENTO DE ESTUDOS LATINO-AMERICANOS (ELA) PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM

ESTUDOS COMPARADOS SOBRE AS AMÉRICAS

ELIETE GONÇALVES RODRIGUES ALVES

O MITO DE SÍSIFO DO BEM-ESTAR SOCIAL NA AMÉRICA LATINA: capitalismo e welfare state no Brasil e no México

Brasília 2019

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O MITO DE SÍSIFO DO BEM-ESTAR SOCIAL NA AMÉRICA LATINA: capitalismo e welfare state no Brasil e no México

Tese de doutorado apresentada como exigência final à obtenção do título de Doutora em Ciências Sociais no Programa de Estudos Comparados sobre as Américas da Universidade de Brasília.

Orientação: Prof. Dr. Moisés Villamil Ballestro

Brasília 2019

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O MITO DE SÍSIFO DO BEM-ESTAR-SOCIAL NA AMÉRICA LATINA: capitalismo e welfare state no Brasil e no México

Tese de doutorado apresentada como exigência final à obtenção do título de Doutora em Ciências Sociais no Programa de Estudos Comparados sobre as Américas da Universidade de Brasília.

Aprovada em: .

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Moisés Villamil Balestro (Orientador – Universidade de Brasília)

Prof. Dr. Franco de Matos – Universidade de Brasília (membro interno)

Prof. Dr. Luiz Honorato da Silva Júnior – Universidade de Brasília (membro externo)

Profª Dª Mônica Aparecida da Rocha – Universidade do Tocantins (membro externo)

Professor Doutor Camilo Negri – Universidade de Brasília (membro interno)

Brasília 2019

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À minha família amada: vocês sempre me incentivaram a persistir nesta pesquisa. Saibam que o apoio de vocês nos meus projetos, na minha incansável vontade de questionar, de não aceitar a primeira resposta, é muito importante. Sei que foram muitas ausências; por isso, ao encerrar esta etapa, vocês a concluem comigo.

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profissionalismo nas orientações; posso afirmar que foram muitas dificuldades e incertezas, mas nenhuma ficou sem respostas.

Ao Departamento de Estudos Latino-Americanos (ELA) e a toda a nossa equipe de trabalho. À Capes, que me proporcionou bolsa de pesquisa, apoio fundamental para a realização da pesquisa de campo.

Ao professor dr. Clemente Ruíz Durán, por ter me recebido na Universidad Nacional Autónoma de México (UNAM), viabilizando a realização da pesquisa comparada.

Agradeço ainda à equipe de discentes da Facultad de Economía da UNAM, pela acolhida e pelo apoio inconteste nas análises dos dados.

A Luis Fabían Bonilla, também da UNAM. Quantas dicas valiosas você dedicou à minha pesquisa!

Aos meus colegas do ELA (CEPAC), pela oportunidade de amizade, de escuta e de voz. Sou grata pela acolhida, pelo carinho e pelas participações críticas.

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O mundo humano é sempre o produto do amor mundi do homem, um artifício humano cuja potencial imortalidade está sempre sujeita à mortalidade daqueles que o constroem e à natalidade daqueles que vêm viver nele. [...] Não podemos mudar o mundo mudando as pessoas que vivem nele. Se queremos mudar uma instituição, uma organização, uma entidade pública qualquer existente no mundo, tudo que podemos fazer é rever sua constituição, suas leis, seus estatutos e esperar que o resto cuide de si mesmo.

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Esta pesquisa tem como objetivo analisar a relação entre as políticas de geração de emprego, trabalho e renda com a construção e caracterização do welfare state no Brasil e no México, no período de 2005 a 2014. O paradigma de Estado do Bem-Estar Social abordado na tese compreende um sistema de políticas públicas e instituições articuladas que expressam o reconhecimento da responsabilidade pública sobre o bem-estar [social], isto é, de todos. Que se realiza quando há diminuição do seu grau de mercantilização, ou seja, por meio da desmercantilização dos direitos sociais. O welfare state imaginado para a América Latina é aquele que cria condições de pertencimento, de capacidades e oportunidades de agir com equidade. A pesquisa é operacionalizada através do Método Comparado, com abordagem teórica na Variedade de Capitalismo Hierárquico, que dá conformação à Economia de Mercado Hierárquico (Hierarchical Market Economies- HME). A hierarquia é explicada através das relações estabelecidas por empresas tradicionalmente familiares (conglomerados familiares), multinacionais, grupos de negócios diversificados e, oligopólios e; por sua influência no modelo de coordenação corporativa. Diante dessas especificidades, a hierarquia é o elemento-chave/ constructo teórico da Economia de Mercado Hierárquico e, nesse sentido, é a inferência causal e nuclear da pesquisa. O campo teórico-metodológico adotado é o institucionalismo discursivo – ID. A tese foi estruturada com base na pesquisa documental e bibliográfica; como fontes primárias de dados citam-se o Programa Nacional de Financiamiento al Microempresário – PRONAFIM, o Fideicomiso del Programa Nacional de Financiamiento al Microempresário – FINAFIM, o Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado – PNMPO, e o Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT. Para dar conformação à HME, a pesquisa abordou o processo de informalidade do mercado de trabalho. A tese confronta o Mito de Sísifo com as ideias e discursos institucionais de bem-estar social no Brasil e no México; traz a figura do homem absurdo - Sísifo-trabalhador informal, desde o seu desígnio de proletário; e finaliza com a absurdidade do mito do bem-estar social estruturado nas Economias de Mercado Hierárquico.

Palavras-chave: Welfare State. Economias de Mercado Hierárquico. Institucionalismo Discursivo (ID). Informalidade. Proteção Social.

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Esta investigación tiene como objetivo analizar la relación entre las políticas de empleo, trabajo y generación de ingresos con la construcción y caracterización del estado de bienestar en Brasil y México, de 2005 a 2014. El paradigma del estado de bienestar abordado en la tesis comprende un sistema de políticas públicas e instituciones articuladas que expresan el reconocimiento de la responsabilidad pública sobre el bienestar [social], es decir, de todos. Esto se hace cuando hay una disminución en el grado de mercantilización, es decir, a través de la descomodificación de los derechos sociales. El estado de bienestar previsto para América Latina crea condiciones de pertenencia, capacidades y oportunidades para actuar con equidad. La investigación es operacionalizada a través del Método Comparativo, con un enfoque teórico en la Variedad de Capitalismo Jerárquico, que se ajusta a las Economías de Mercado Jerárquico (HME). La jerarquía se explica a través de las relaciones establecidas por empresas tradicionalmente familiares (conglomerados familiares), multinacionales, grupos empresariales diversificados y oligopolios; Por su influencia en el modelo de coordinación corporativa. En vista de estas especificidades, la jerarquía es el elemento / constructo teórico clave de la economía de mercado jerárquica y, en este sentido, es la inferencia causal y nuclear de la investigación. El campo teórico-metodológico adoptado es el institucionalismo discursivo - ID. La tesis se estructuró a partir de investigaciones documentales y bibliográficas; como fuentes principales de datos están el Programa Nacional de Financiamiento de Microempresas (PRONAFIM), el Programa Nacional de Financiamiento de Microfinanzas (FINAFIM), el Programa Nacional de Microcrédito Productivo (PNMPO) y el Fondo de Asistencia a los Trabajadores (FAT). Para dar forma al HME, la investigación abordó el proceso de informalidad en el mercado laboral. La tesis confronta el Mito de Sísifo con las ideas y los discursos institucionales del bienestar social en Brasil y México; y trae la figura del hombre absurdo - trabajador informal de Sísifo, de su diseño proletario; y termina con lo absurdo del mito del bienestar social estructurado en las Economías de Mercado Jerárquico.

Palabras-clave: Welfare State. Economias de Mercado Hierárquico. Institucionalismo Discursivo (ID). Informalidade. Protección Social.

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This research aims at analyzing the relationship between the policies of job, work and income generation with the construction and characterization of the welfare state in Brazil and Mexico, from 2005 to 2014. The welfare state paradigm addressed in the thesis it comprises a system of public policies and articulated institutions that express the recognition of the public responsibility on the [social] welfare, that is, of all. This is done when there is a decrease in the degree of commodification, that is, through the de-commodification of social rights. The welfare state envisioned for Latin America is one that creates conditions of belonging, capabilities and opportunities to act with equity. The research is operationalized through the Comparative Method, with a theoretical approach in the Variety of Hierarchical Capitalism, which conforms to the Hierarchical Market Economies (HME). The hierarchy is explained through the relations established by traditionally familiar companies (family conglomerates), multinationals, diversified business groups and, oligopolies and; for its influence on the corporate coordination model. In view of these specificities, hierarchy is the theoretical key element / construct of the Hierarchical Market Economy and, in this sense, it is the causal and nuclear inference of the research. The theoretical-methodological field adopted is discursive institutionalism - ID. The thesis was structured based on documental and bibliographical research; as primary sources of data are the National Program for Microenterprise Financing (PRONAFIM), the National Microfinance Financing Program (FINAFIM), the National Program for Productive Microcredit (PNMPO) and the Workers' Assistance Fund (FAT). In order to shape the HME, the research addressed the process of informality in the labor market. The thesis confronts the Sisyphus Myth with the ideas and institutional discourses of social welfare in Brazil and Mexico; and brings the figure of the absurd man - informal Sisyphus- worker, from his proletarian design; and ends with the absurdity of the myth of social welfare structured in Hierarchical Market Economies.

Keywords: Welfare State. Economies of the Hierarchical Market. Discursive institutionalism (ID). Informal sector. Social Protection.

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Figura 1 – Bem-estar social e capacidades ... 73

Figura 2 – Atomização do mercado de trabalho ... 138

Figura 3 – Informalidade/unidade econômica ... 163

Figura 4 – Nº de pessoas ocupadas por setor de ocupação informal ... 166

Figura 5 - Pessoas ocupadas no setor informal ... 166

Figura 6 – Esquema das unidades de análise ... 186

Figura 7 – Esquema analítico do bem-estar social nas HMEs ... 186

Figura 8 – Caracterização do mercado de trabalho nas HMEs ... 189

Figura 9 – Esquema de contas individuais – Ahoro y Retiro ... 253

Figura 10 – Arranjo institucional do microcrédito no México ... 284

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Quadro 1 – Discursos de desenvolvimento social ... 70

Quadro 2 – Variedades de capitalismo (VoC) – LME e CME ... 128

Quadro 3 – Variedades de capitalismo (VoC) ... 128

Quadro 4 – Elementos caracterizadores das variedades de capitalismo... 135

Quadro 5 – Esquema analítico da categoria setor informal – CIET/OIT, 1993 ... 159

Quadro 6 – Categorias de análise – Mercado de trabalho nas HMEs ... 188

Quadro 7 – Categorias de análise do paradigma do bem-estar social ... 190

Quadro 8 - Matriz analítica – O conteúdo das ideias e dos discursos/campo de atuação ... 194

Quadro 9 – Relação de entrevistados – México ... 197

Quadro 10 – Reformas previdenciárias – América Latina ... 208

Quadro 11 – Sistemas Solidários na América Latina e no Caribe ... 209

Quadro 12 – Comitê Consultivo e de Vigilância da CONSAR ... 261

Quadro 13 – Recursos acumulados – SIEFORES ... 264

Quadro 14 – Vínculo empresarial das AFORES ... 264

Quadro 15 – Ranking das instituições de microfinanças na América Latina e Caribe ... 279

Quadro 16 – Trajetória das instituições de microcrédito no México ... 283

Quadro 17 – Campo ideacional-discursivo ... 285

Quadro 18 – Discursos e trajetória institucional do microcrédito no México ... 286

Quadro 19 – Desenho institucional do CODEFAT – 2018 ... 307

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Tabela 1 – Índice de higidez – proteção ao emprego ... 150

Tabela 2 – Gastos nas habilidades para o emprego (dólar) ... 152

Tabela 3 – concentração institucional da década de 1930 a 1960 ... 219

Tabela 4 – Cuotas Sociales/LSS/México ... 252

Tabela 5 – Comitê Consultivo da Junta de Governo da CONSAR ... 260

Tabela 6 – Concentração de clientes de microcrédito/ALC ... 278

Tabela 7 – Gastos sociais na América Latina e no Caribe (2005-2014) ... 318

Tabela 8 – PIB per capita – 2005-2014 ... 319

Tabela 9 – Pessoas ocupadas e por contribuição previdenciária (%) ... 321

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Gráfico 1 – Setor formal / informal Brasil ... 173

Gráfico 2 – Trabalhador com carteira assinada (2000-2016) ... 173

Gráfico 3 – População economicamente ativa – 2001-2015 ... 174

Gráfico 4 – População ocupada – 2002-2014... 175

Gráfico 5 – PEA/contribuintes da Previdência Social ... 233

Gráfico 6 – Evolução da carteira/Previdência Privada... 236

Gráfico 7 – Contribuição dos fundos de pensão/PIB/México ... 265

Gráfico 8 – Fundos de Pensão/PIB/grupo latino-americano ... 265

Gráfico 9 – Recursos financeiros/AFORES ... 266

Gráfico 10 – Participação das AFORES/PEA ... 266

Gráfico 11 – PEA/Contribuintes da Previdência Social ... 323

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CME Economia de Mercado Coordenado

HME Economia de Mercado Hierárquico

NME Economia de Rede

STPS Secretaria de Trabajo y Previsión Social

PRONAFIM Programa Nacional de Financiamiento al Microempresario

FINAFIM Fideicomiso del Programa Nacional de Financiamiento al

Microempresario

FOMMUR Fideicomiso del Fondo de Microfinanciamiento a Mujeres

Rurales

PNMPO Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado

FAT Fundo de Amparo ao Trabalhador

CODEFAT Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador

FONDO PYME Fondo de Apoyo para la Micro, Pequeña y Mediana Empresa

PROBASOMI Programa de Banca Social y Microcréditos

FIBASOMI Fideicomiso del Programa de Banca Social y Microcréditos

FOMIN Fondo Multilateral de Inversiones

PROGER Programa de Geração de Emprego Trabalho e Renda

AFORE Administradoras de Fondos para el Retiro

SIEFORE Sociedad de lnversión Especializada en Fondos para el Retiro

CONSAR Comisión Nacional del Sistema de Ahorro para el Retiro

INFONAVIT Instituto do Fundo Nacional da Vivência para os

Trabalhadores

IMSS Instituto Mexicano do Seguro Social

SHCP Secretaría de Hacienda y Crédito Público

ISSTE Instituto de Segurança e Serviços Sociais dos Trabalhadores

do Estado

CTM Confederación de Trabajadores de México

CROC Confederación Revolucionaria de Obreros y Campesinos

CROM Confederación Regional Obrera Mexicana

CONCAMIN Confederación de Cámaras Industriales de los Estados

Unidos Mexicanos

CONCANACO SERVYTUR Confederación de Cámaras Nacionales de Comercio, Servicios y Turismo

COPARMEX Confederación Patronal de la República Mexicana

AMIS Asociación Mexicana de Instituciones de Seguros

AMIB Asociación Mexicana de Instituciones Bursátiles

MEI Microempreendedor Individual

OECD Organização para a Cooperação e Desenvolvimento

Económico

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1 TRAJETÓRIAS HISTÓRICAS DO WELFARE STATE ... 30

1.1 O welfare state e o institucionalismo histórico ... 30

1.2 Narrativas heurísticas possíveis – o conteúdo do welfare state ... 36

1.2.1 Ideias históricas de bem-estar social ... 38

1.2.2 A base formativa do welfare state: ideias de proteção social ... 41

1.2.3 A experiência alemã – o modelo do contrato ... 46

1.2.4 A Aliança Red-Green – modelo sueco de negociação da classe trabalhadora48 1.2.5 O New Deal – bem-estar social e crise econômica de 1929... 50

1.2.6 O modelo do status – a proposta evolucionista de cidadania ... 52

1.3 A expansão do welfare state ... 53

1.4 Esquemas analíticos e inovações conceituais ... 56

1.5 Discursos de bem-estar social – novos paradigmas ... 61

1.5.1 Desenvolvimento social, capacidades e bem-estar social ... 68

1.6 Ideias e discursos de bem-estar social no Brasil e no México ... 74

1.7 Considerações ... 84

2 WELFARE STATE E CAPITALISMO HIERÁRQUICO ... 89

2.1 Variedades de Capitalismo – VoC ... 89

2.1.1 Limitações e vantagens na aplicação da VoC ... 110

2.1.2 Considerações sobre a VoC ... 116

2.1.3 Mercado de trabalho nas variedades de capitalismo... 118

2.2 A hierarquia como constructo teórico-metodológico da HME ... 122

2.3 Elementos-chave do capitalismo hierárquico ... 131

2.3.1 O mercado de trabalho na HME ... 138

2.3.2 Configurações duais: a informalidade no México ... 165

2.3.3 Configurações duais: a informalidade no Brasil ... 167

2.3.4 A informalidade em números: contar para quê? ... 170

2.4 Considerações ... 175

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SUMÁRIO

3.1.1 O mercado de trabalho como constructo analítico das HMEs ... 187

3.2 Procedimentos da metodologia comparada ... 191

3.2.1 As formas das ideias e as estruturas do campo discursivo ... 192

4 ELEMENTOS DO WELFARE STATE NAS HMEs ... 203

4.1 Seguridade Social na América Latina e no Caribe ... 203

4.2 O paradigma da Previdência Social na América Latina e no Caribe ... 204

4.2.1 1 Benefícios de Prestação Continuada – BPC na América Latina e no Caribe209 4.3 A trajetória e as dualidades na seguridade social no Brasil ... 211

4.4 Previdência Social no Brasil: variedades de sistemas ... 229

4.4.1 A previdência privada complementar no Brasil ... 231

4.5 Seguridade Social no México: mudanças na trajetória ... 237

4.5.1 A mercadorização da seguridade social – o papel dos fundos de pensão .. 250

4.5.2 Sistema tripartite e o poder das corporações ... 253

4.5.3 Sistema del Ahorro y Retiro – SAR: estrutura privatizada ... 259

4.5.4 AFORES e SIEFORES: A nova face da Previdência Social no México ... 262

4.6 Considerações ... 269

5 POLÍTICAS ATIVAS DE EMPREGO... 272

5.1 Como promover a geração de emprego, trabalho e renda ... 272

5.2 Programas de microcrédito e discursividades institucionais ... 273

5.2.1 O microcrédito na América Latina ... 276

5.3 Microcrédito no Brasil e no México e fundos de custeio ... 280

5.3.1 O PRONAFIM e os fundos de fideicomissos... 281

5.3.2 O fideicomisso como modelo de fundo de desenvolvimento social ... 291

5.3.3 Os fundos de fideicomissos na lei mexicana ... 292

5.3.4 O conceito de fideicomisso como instituto de desenvolvimento ... 294

5.3.5 O Fundo de Amparo ao Trabalhador ... 301

5.4 Considerações ... 309

6 COMPARANDO AS DUAS ECONOMIAS ... 317

(17)

SUMÁRIO

REFERÊNCIAS ... 355 APÊNDICES ... 401

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INTRODUÇÃO

“[…] Deixo Sísifo na base da montanha! As pessoas sempre reencontram seu fardo. Mas Sísifo ensina a fidelidade superior que nega os deuses e ergue as rochas. [...] A própria luta para chegar ao cume basta para encher o coração de um homem. É preciso imaginar Sísifo feliz”

(CAMUS, 2010, p. 124).

O título desta pesquisa estabelece uma correlação com a obra do escritor franco-argelino Albert Camus O mito de Sísifo, publicada em 1942, ensaio que acabou abrindo espaço para uma teorização da absurdidade do mundo. Com base nos elementos da narrativa, buscamos também um despertar consciente sobre o processo de construção e de caracterização do welfare state nas economias de mercado hierárquico, especificamente Brasil e México, no período de 2005 a 2014.

Os elementos que definem o mito de Sísifo como tal são os seguintes: o castigo ao trabalho de rotina, como uma árdua tarefa dos homens comuns e, portanto, não condizente com a posição dos deuses; a consciência de Sísifo diante de sua condição, levando-o a refletir sobre a infinitude de seu castigo, que é estar fadado a recomeçar e jamais terminar seu trabalho; a submissão da sua condição de proletário ao desígnio dos deuses, dando conformação ao homem absurdo; e a própria absurdidade, que surge do despertar da sua consciência.

O homem absurdo representado por Sísifo é dotado de consciência crítica sobre sua condição, logo, o inconformismo é uma forma de (re)significar o próprio Sísifo. A desconstrução de Sísifo-deus para o homem absurdo dá-se a cada vez que ele executa a tarefa de rolar a pedra montanha abaixo. E a lucidez de sua condição é a percepção de ser escravo de seu trabalho humano. O sentido do mito de Sísifo decorre da maneira como ele combina seu desígnio de proletário com o reverso necessário, um preço a pagar pelo despertar da sua consciência de jamais dar por cumprida a sua pena (trabalho) e que se renova a cada incompletude de seus atos.

O ir e vir da pedra representa pequenos recortes dos momentos de consciência. A estranheza no mito surge quando o personagem se vê espelhado em seus atos – assim, pressupõe-se ter Sísifo lampejos de consciência. E, ao contrário do que imaginava, o seu castigo não se conforma pelo trabalho que lhe é imposto, mas pela percepção da consciência sobre o

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castigo. A absurdidade como elemento constitutivo do mito decorre da tomada de consciência e da falta de sentido de seus atos ou do sentido absurdo que sua condição subalterna lhe impõe. A consciência, no entanto, não é vista como um ato instantâneo, mas como um processo gradativo, o que dá sentido ao mito. Portanto, o ponto de partida de cada rolagem da pedra é sempre uma unidade dotada de significação, essencial à modelagem do homem absurdo. O homem, inconformado com o controle dos deuses, acaba resignado com o desígnio indescritível da sua consciência, dando forma ao homem absurdo, provido de consciência crítica.

Enquanto cumpre a pena de trabalho forçado imposta pelos deuses, representada pela obrigação de rolar a pedra do pé ao topo da montanha todos os dias, Sísifo gradativamente desperta em sua condição de operário (proletário dos deuses), a ponto de se perceber não mais como homem, mas como a própria pedra. Ou seja, o que está a rolar, a cada recomeço, não é a pedra em si, mas o próprio Sísifo, clímax do mito, a consciência do absurdo.

O fio condutor que nos guia pela metáfora do mito de Sísifo é o da consciência crítica, que surge, gradativamente, pelo inconformismo ante a condição do homem proletário e de seu desígnio de submissão não apenas aos deuses, mas à sua consciência. Segundo Camus (2010), o absurdo nasce de uma comparação, de uma confrontação. A provocação do autor nos leva a estabelecer uma comparação entre as ideias e dos discursos de bem-estar social do Brasil e do México e a obra ensaística.

Assim sendo, delimitamos os recortes estruturais do ensaio a fim de confrontá-los com o processo de estruturação do welfare state: “O raciocínio absurdo” versus as ideias e os discursos de um welfare state nas Economias de Mercado Hierárquico (Hierarchical Market Economies – HMEs). “O homem absurdo” versus a figura de Sísifo na condição de operário/trabalhador do nosso cotidiano em busca de clareza sobre sua condição; porém, mais preocupado com a descrição sistêmica das estruturas do que em resolver os problemas cotidianos. A “criação absurda” versus o paradigma de welfare state. “O mito de Sísifo” versus os sistemas de bem-estar social estruturados nas HMEs (as ideias e os discursos sobre as políticas de geração de emprego, trabalho e renda). E a “absurdidade do mundo” versus os programas de microcrédito produtivo confrontados com a baixa ou inexiste complementaridade das políticas públicas adotadas nas HMEs para resolver o problema da informalidade do trabalho e da economia.

Os processos de industrialização e/ou modernização das economias são referência e ponto de partida para as explicações sobre o surgimento do welfare state, a “criação absurda” do mundo moderno. Seja na Europa Ocidental, seja na América do Norte, onde se concentram os países desenvolvidos (países centrais, para a abordagem centro-periferia) ou nas demais

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economias políticas, o Estado desenvolvimentista parece preceder o campo de conformação das ideias de bem-estar social, guardadas as peculiaridades históricas de cada país e/ou região geopolítica.

Essa característica pode ser vista, por exemplo, nas origens do Estado do bem-estar social de Bismarck, de final do século XIX, e também nos modelos mais modernos. Vejamos que, após a grande depressão de 1929, a urgência por respostas para a crise econômica e social surge com o keynesianismo, que traz de volta as discussões sobre a importância do papel Estado na intervenção e na expansão da economia. O keynesianismo, basicamente, apontou para direções opostas às ideias liberais da economia: intervenção com políticas públicas focadas na defesa dos direitos sociais, como saúde, educação e emprego, basicamente, estabelecendo um novo acordo social (um New Deal); e aumento de gastos em políticas sociais e infraestruturas básicas, política de preços e de salários.

Pierson (2006a, 2006b) afirma que os países não desenvolvidos iniciaram seus processos de estruturação dos welfare states simultaneamente aos processos de desenvolvimento. No Brasil e no México, o welfare state surgiu com caráter de regular a organização dos trabalhadores assalariados dos setores modernos da economia e, da mesma forma, com os projetos de desenvolvimento econômico em andamento. O México, já apresentava industrialização mais acelerada, e o Brasil se encontrava em fase inicial, mas ambos estavam ocupados com o crescimento econômico da indústria e com os ajustes nas legislações trabalhistas e na organização sindical e da classe operária. Ou seja, na origem dos Estados de bem-estar social, as políticas sociais passaram a integrar os projetos de desenvolvimento econômico, e não o inverso, multidimensionando as funções dos Estados e exigindo atenção mais contundente em políticas sociais.

Dessa forma, a concepção da pesquisa é que o que se denominou de welfare state (Estado provedor ou Estado de bem-estar social), do final do século XIX para o XX, foi, sobretudo, um amplo processo de organização do aparato público como medida de urgência e necessidade, principalmente em razão das instabilidades econômicas e sociais dos contextos históricos das economias de mercado. As economias políticas que avançaram nas estruturas de bem-estar social, consolidando os elementos nucleares (Seguridade Social, gasto social público em educação, saúde, emprego, etc.), e que possuem uma integração afinada entre as dimensões social e econômica deram conformação a diferentes modelos ou tipologias de welfare state. Países que inovaram em seus modelos, por exemplo, conectando as políticas sociais e econômicas como estratégia de emancipação do cidadão (crescimento econômico com

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desenvolvimento social), acresceram novas funcionalidades e concepções para o Estado do bem-estar social, para além da questão da proteção social.

Assim, vale a máxima de que o welfare state está em constante dinamização, reinventa- se ou é reinventado à medida que as sociedades avançam em seus processos de desenvolvimento e crescimento econômico, em função de novas ou velhas demandas sociais. Isso posto, é possível que o que tem sido qualificado como crise do welfare seja, em tese, a organicidade das estruturas em busca da adequação institucional e de uma viabilidade operacional – uma absurdidade da qual tomaremos consciência a partir das altas taxas de exclusão e desigualdade social.

A definição de Welfare State envolve assim a escolha de unidades capazes de entendê- lo desde o aspecto quantitativo, que engloba um conjunto de variáveis descritivas; mas, sobretudo, de variáveis que possam também expressar o seu potencial qualitativo. Essas unidades constitutivas podem ser divididas tendo como referencial a finalidade que uma economia política define e estabelece para o EBES e, também, a partir dos mecanismos ou instrumentos que são utilizados para a consecução do bem-estar social.

A dificuldade inicial da pesquisa foi estabelecer um conceito de Welfare State que realce o processo de organização do EBES nas HMEs. Os aspectos escolhidos para caracterizar e ilustrar o Welfare State são a conformação de políticas públicas centrais, como as destinadas à aposentadoria; e, também, os programas que enfocam a informalidade como um problema prevalente no Brasil e no México. Tais políticas tem como objetivo promover a inclusão social e produtiva da população pobre, com potencial para empreender. São assim meios utilizados nessas economias políticas para avançar nas ideias de igualdade social.

Nesse sentido, além dos elementos - gastos sociais e políticas sociais, que de modo geral caracterizam os processos de organização do EBES, a pesquisa tem como debate instrumentos que sobretudo tem como público-alvo a categoria – informalidade do mercado de trabalho e da economia, os quais levaram à implementação de arranjos institucionais específicos nas HMEs, como os programas de microcrédito produtivo.

As variáveis independentes trabalhadas na pesquisa foram agrupadas e classificadas sob dois aspectos: como políticas de geração de emprego, trabalho e renda, portanto instrumentos de inclusão social e produtiva do cidadão através dos programas de microcrédito produtivo. E, como mecanismos de expansão dos direitos sociais, ou políticas que podem afetar positivamente as estruturas de Welfare State nas Economias de Mercado Hierárquico. Temos assim as políticas ativas de emprego como meio, e a inclusão social e produtiva, e a expansão dos direitos sociais como finalidade precípua do Estado de Bem-Estar Social.

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O gasto social é mencionado na tese para ilustrar o comprometimento das HMEs com o processo de construção do EBES; ou seja, o engajamento dos governos com as políticas sociais. Nosso lugar de fala entende o gasto social como um dos elementos do Welfare State, porém, não no sentido de variável-chave, uma vez que as economias políticas podem investir recursos em políticas sociais que, sobretudo, aprofundam a desigualdade existente, sem avançar na segurança social esperada (ESPING-ANDERSEN, 1990).

Ao delimitar os programas de microcrédito produtivo como instrumentos de inclusão social e produtiva, a proposta da pesquisa não se limita apenas à existência ou não desses programas nos países pesquisados. A tese observa os discursos institucionais que performam os critérios de elegibilidade da população-alvo, a participação de atores privados nos programas, e as contrapartidas dos governos com investimentos financeiros para apoiar instituições e entidades privadas, bem como apoiar o capital humano e social necessários ao desenvolvimento desses programas.

No que diz respeito aos regimes de previdência social, a pesquisa discute os processos de privatização da previdência, como um dos indicadores de desmonte das estruturas de bem- estar social na América Latina. Entende que a inclusão de atores privados na Previdência Social pode caracterizar estratégia de retração do Welfare State, ao tempo em que se contrapõe aos discursos institucionais de expansão dos direitos sociais e de igualdade social.

No mesmo sentido, o Welfare State pode ser caracterizado de acordo com o grau de mercadorização (ou mercantilização) dos direitos sociais, tendo em vista a implementação de arranjos institucionais focalizados na dimensão econômica. A contrário senso, a desmercadorização ocorreria quando a prestação de um serviço é vista como uma questão de direito ou quando uma pessoa pode se manter sem depender do mercado. Temos assim que a mera presença da previdência ou da assistência social não leva necessariamente a uma desmercadorização significativa dos indivíduos à dependência do mercado. Por exemplo, quando os benefícios são poucos, e/ou associados a algum tipo de estigma social, o sistema tende a exigir maior participação no mercado de trabalho (mercadorização). Com isso, o Welfare State confronta se caracteriza mais pela inserção do cidadão no mercado de trabalho (variável dependente do grau de inserção do trabalhador no mercado de trabalho formal) do que pela independência do cidadão dos mecanismos da economia (ESPING-ANDERSEN, 1985). Um confronto que busca evidências empíricas da relação que as políticas de geração de emprego, trabalho e renda estabelecem com o processo de construção e caracterização do Welfare State no Brasil e no México. Ao tempo em que fornece elementos para uma comparação entre a absurdidade do mito do bem-estar social, paradigma construído desde a

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concepção européia (Europa Central), para o mito do bem-estar social nas Economias de Mercado Hierárquico latino-americanas, produto desta concepção, e que levou à sistematização da proteção social nessas economias políticas.

Na América Latina, o Brasil foi pioneiro na construção do sistema de proteção social, e a década de 1920 é promissora para o bem-estar, sobretudo dos trabalhadores. O México iniciou a organização sistemática da proteção social apenas na década de 1940; porém, com elementos esparsos de bem-estar social que remontam ao início do século XX. De modo geral, na América Latina, a hegemonia do seguro social e a vinculação ao trabalho formal sempre predominaram nas ideias e nos discursos institucionais de bem-estar social.

Dada a concepção dinâmica e as diferentes trajetórias e funcionalidades que as economias de mercado de modo geral adotaram para o welfare state, a proposta da tese é investigar a trajetória histórica do Estado de bem-estar social (EBES) do Brasil e do México numa perspectiva comparada.

A pergunta de pesquisa é a seguinte: Qual a relação das políticas de geração de emprego, trabalho e renda na construção e na caracterização do welfare state no Brasil e México, no período de 2005 a 2014? A formulação da pergunta aponta para uma inquietação que tem a ver com a trajetória histórica do welfare state na América Latina: primeiro, como os discursos e as ideias de bem-estar social integraram as estruturas do EBES brasileiro e mexicano e como se organizaram em torno do bem-estar social. Ainda, que concepção as ideias e os discursos de bem-estar social adotam para o enfrentamento de problemas sociais históricos desses países, como a informalidade do trabalho e do setor informal da economia.

O objetivo geral da pesquisa é entender a relação das políticas de geração de emprego, trabalho e renda com a construção e a caracterização do welfare state no contexto das Economias de Mercado Hierárquico.

Os objetivos específicos da tese são os seguintes: a) identificar elementos que explicam e caracterizam o processo de informalidade no Brasil e no México; b) analisar, com base no método comparado, os discursos institucionais sobre a proteção social na construção e na caracterização do welfare state no Brasil e no México; c) verificar a relação entre os discursos institucionais de formulação das políticas públicas de geração de emprego, trabalho e renda, no período de 2005 a 2014, com o processo de construção e caracterização do welfare state no Brasil e no México.

As categorias de análise delimitadas na tese estão intrinsecamente vinculada aos estudos das variedades de capitalismo (VoC), de Hall e Soskice (2001). E, nesse sentido, adotamos a

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abordagem teórica de Ben Ross Schneider (2009; 2013) sobre a variedade de capitalismo praticada nos países subdesenvolvidos, o capitalismo hierárquico.

A VoC conforma para a política comparada um campo de investigação no qual se pode eleger, entre as inferências possíveis, aquelas que mais se aproximam e se relacionam com a institucionalização dos sistemas de bem-estar social na América Latina. Por exemplo, nos sistemas de proteção social do México e do Brasil, as complementaridades institucionais negativas podem indicar a influência do capitalismo hierárquico e de seu modo de produção na estruturação dos modelos de proteção social, ou seja, podem indicar a relação das HMEs com as ideias de bem-estar social.

Estudos comparados sobre a trajetória da expansão dos direitos de cidadania civil- político-sociais abordados por Marshal (1965, 1967, 2002) em processos de desenvolvimento são indicativos de diferentes padrões de construção do welfare state. Em estudos comparativos sobre o Brasil, Santos (1987) e Carvalho (2002) sugerem que a inversão na ordem estrutural da cidadania pode inibir a generalização das liberdades individuais e contribuir para um padrão de Estado centralizado. Nesse sentido, a ordem dos fatores importa nas análises de casos, explicam os autores. Nessa perspectiva, a VoC nos possibilita estudar a relação das políticas ativas de emprego, com a construção do welfare state no Brasil e no México, ao introduzir em sua abordagem um conjunto de variáveis comparáveis e particulares para esses países, pensadas na concepção de dimensões diferentes, porém interconectadas. Essas caracteterísticas teriam criado uma nova diversidade de capitalismo.

A hipótese levantada foi na tese foi a seguinte: a economia de mercado hierárquico, com suas complementaridades institucionais (negativas ou não), ajuda a explicar as limitações das políticas sociais na configuração de um Estado de bem-estar social.

Para estudar as economias políticas latino-americanas e de outros países não desenvolvidos, Schneider (2009, 2013) definiu uma tipologia própria, com base em elementos que justificam uma abordagem distinta daquela utilizada na VoC, para os países desenvolvidos. Segundo o autor, os processos de desenvolvimento entre os países da América do Norte e da Europa e os países latino-americanos se deram com especificidades próprias e em momentos distintos. Tais descontinuidades pedem uma abordagem a partir de outras variáveis, além e/ou diferentes das utilizadas por Hall e Soskice (2001) no estudo das Economias de Mercado Coordenado (CME) e das Economias de Mercado Liberal (LME).

Com base na variedade de capitalismo hierárquico, estudamos o Brasil e o México sob o enfoque das Economias de Mercado Hierárquico. As estruturas de mercado nas HMEs são caracterizadas pela presença de grupos de negócios diversificados (GND) e forte presença de

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empresas multinacionais (EMNs). Em regra, os GNDs são grupos de empresas tradicionalmente familiares que atuam em diversos ramos e setores da economia. A governança corporativa tende a ser influenciada pelos interesses do grupo familiar.

Nessas economias de mercado, as complementaridades institucionais tendem a ser quase sempre inexistentes ou, então, muito baixas. O mercado de trabalho é, caracteristicamente, segmentado entre dois setores, um formal e um informal, com taxas de informalidade expressivamente altas. As habilidades, a capacitação e o treinamento da mão de obra são considerados baixos, ou seja, pouco se investe no sistema vocacional de qualificação e aprimoramento profissional. Nas relações industriais (entre trabalhadores e empresa), os sindicatos são fracos, com pouca atuação no chão de fábrica.

Outro ponto destacado por Schneider (2013) tem a ver com as interferências dos grupos de poder político (grupos de interesse) nas instituições. Com base nesses elementos e no estudo empírico no México, no Brasil, na Argentina e na Colômbia, o autor entende que o capitalismo hierárquico nas HMEs é resiliente.

O marco teórico de operacionalização desta pesquisa é o institucionalismo discursivo (ID) (SCHMIDT, 2008), abordagem que analisa as ideias e os discursos institucionais no âmbito de políticas públicas, a partir de documentos e entrevistas institucionais, enfim, conteúdos que possam corroborar a hipótese levantada ou refutá-la, auxiliando na resposta à pergunta de pesquisa. A abordagem institucional-discursiva entende os discursos como práticas institucionais. Para o ID, o campo discursivo é o território de realização ou materialização dos discursos. Os discursos institucionais podem ser de natureza coordenativa, produzidos por atores políticos, empreendedores políticos, que se articulam para apresentar as ideias, os objetivos e a visão de políticas, os problemas e os conflitos em torno do desenho das políticas. Podem, também, ser comunicativos, aqueles que dialogam com as dimensões externas para comunicar a atuação política e apresentar a política pública.

Para trabalhar os discursos institucionais que alcançam a informalidade do trabalho e da economia, selecionamos o Programa de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), adotado no Brasil, e o Programa Nacional de Financiamiento al Microempresario (PRONAFIM), no México. Ambos são do campo das políticas de geração de emprego, trabalho e renda e compõem a estrutura das políticas ativas de emprego. São formulados com objetivo geral de atuar nas demandas da população de baixa renda (população pobre) no processo de inclusão produtiva e inclusão social por meio dos micronegócios.

Os discursos institucionais dos programas de microcrédito produtivo motivam a formalização dos microempreendimentos a fim de favorecer a emancipação do cidadão por

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meio da geração de renda, além de acenar para a geração e a ocupação de postos de trabalho. As unidades comparativas dos programas de microcrédito produtivo são as seguintes: arranjos institucionais dos fundos de custeio PRONAFIM, o Fideicomiso del Programa Nacional de Financiamiento al Microempresario (FINAFIM) e os arranjos institucionais do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Os discursos institucionais dão corpo ao homem absurdo de Camus (2010) e têm na figura de Sísifo a sua expressão: Sísifo está em busca de clareza sobre sua condição, porém se preocupa mais com a descrição sistêmica da superestrutura (mito) do que em resolver os problemas cotidianos, que são a pobreza e a informalidade.

A categoria analítica do Sistema de Seguridade Social são os arranjos institucionais da Previdência Social e a correlação de suas estruturas com os paradigmas da formalidade e da informalidade no mundo do trabalho.

A categoria analítica informalidade foi analisada na pesquisa a partir de uma contextualização histórica do fenômeno e como recorte ou demanda a ser atendida pelos programas de microcrédito. A empiria nos forneceu uma visão mais, de modo que apontamos a informalidade como um processo de territorialidade do fenômeno. Os territórios ocupados pelos trabalhadores informais são a rua, o metrô, as praças, espaços de representações sociais infinitas nos quais os ambulantes/callejeros se contorcem, ora se esbarram, ora não, em busca do melhor cliente e da melhor oportunidade. As falas dos sujeitos conferem elementos de apoderamento e expressão do fenômeno; algumas delas foram coletadas nas entrevistas, por exemplo: Comprale! Comprale! Es diez, se paga diez! Entre um vagão e outro do metrô, assim se constrói a jornada de um callejero no México; não é diferente no Brasil.

Os informais que atuam no ambiente doméstico – empregadas domésticas, jardineiros, motoristas, pessoas da limpeza – também receberam, mesmo que de forma menos aprofundada, um enfoque na pesquisa. Quando possível, apontamos em depoimentos e falas coletadas em campo os questionamentos dos trabalhadores em condição de informalidade, em busca de um espaço de reconhecimento e cidadania.

A condição de informalidade (do trabalho e da economia) também pode também ser comparada ao homem absurdo. Consciente da condição de operário/trabalhador, o cotidiano de Sísifo é o trabalho; assim, é escravo de si mesmo e do sistema de proteção social, cujo paradgma da formalidade não lhe contempla. Isso porque o modelo de capitalismo que é alimentado pelo trabalho do homem absurdo, o capitalismo hierárquico, não prevê um sistema de inclusão social e de proteção social eficiente para o trabalhador informal. A consciência não é suficiente para libertar este homem porque ele não está inserido na cadeia produtiva do capital.

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Conforme aponta Schneider (2013), o mercado de trabalho nas HMEs é marcado pela segmentação entre um setor informal amplo e um setor formal. Colocada como elemento caracterizador das HMEs, permite-nos problematizar, na pesquisa, o alcance dos direitos sociais do mundo do trabalho e correlacionar as políticas de geração de emprego, trabalho e renda com as ideias de welfare state no Brasil e no México.

A absurdidade do mundo pode ser confrontada com as complementaridades institucionais nas HMEs (negativas ou não). O paradigma da informalidade do trabalho e da economia é muldimensional, significa que engloda diversas situações, atores e demandas; da mesma forma quando correlacionamos a informalidade com a pobreza. É certo que nem todo trabalhador informal é pobre, mas os postos de trabalho mais propícios a receber os pobres são aqueles criados no setor informal. Da mesma forma, nem todos os pobres possuem perfil empreendedor; porém, grande parte está na informalidade por questões de sobrevivência. A absurdidade do mundo está na baixa correlação e integração das políticas públicas, na complementaridade institucional negativa.

Outro ponto analisado é a resiliência do capitalismo hierárquico na América Latina. Ela é explicada, também, pela influência dos grandes grupos de poder econômico nas instituições públicas e pela presença de empresas familiares, um dos locus dos quais é extraído o constructo teórico da abordagem das HMEs, a hierarquia, categoria analítica que dá conformação à variedade de capitalismo hierárquico, portanto, é o núcleo caracterizador das HMEs.

Abordamos a presença de grupos de negócios diversificados e os desdobramentos da hierarquia nas relações industriais, na afetação em termos de especialização de mercado, as interferências na conformação e na força dos sindicatos e na duração do contrato de trabalho, além do modelo de governança corporativa.

Apresentamos um debate, não muito aprofundado, sobre as deficiências do sistema vocacional de qualificação no âmbito das políticas ativas de emprego (conceito mais abrangente) sem estabelecermos pontos comparativos, apenas indicativos da presença ou não de sistema próprio de qualificação profissional da força de trabalho.

A comparação nos permite reforçar o argumento de que, apesar das semelhanças identificadas nos processos históricos de desenvolvimento do Brasil e do México, essas economias abrigam diferenças que realçam a diversidade das instituições de bem-estar social. A partir da VoC, desenhamos o campo comparativo entre as economias capitalistas no qual a economia de mercado hierárquico é posta em evidência, tendo em vista os elementos que a diferenciam das demais tipologias.

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Partimos, assim, de uma sistematização dos elementos distintivos, utilizados na construção da variedade de capitalismo hierárquico, para uma delimitação necessária e instrumental da tese. São abordadas variáveis do contexto do mercado de trabalho que afetam as ideias de bem-estar social: presença de sindicatos fracos e uma baixa densidade sindical; postos de trabalho de curto prazo; forte regulação do mercado de trabalho formal; presença de expressivo setor informal na economia; baixo grau de investimento nas habilidades do trabalhador, conduzindo a uma baixa qualidade dos empregos.

A tese está dividida em seis capítulos. O capítulo 1 apresenta as trajetórias históricas do welfare state, a abordagem do institucionalismo histórico e narrativas heurísticas possíveis para o conteúdo do welfare state. Sintetizamos as ideias históricas de bem-estar social, a base formativa do welfare state e as ideias de proteção social; trazemos as experiências seminais de modelos de welfare state. Falamos sobre os períodos históricos de expansão do welfare state e de seus esquemas analíticos e inovações conceituais em termos de bem-estar social. Trabalhamos os discursos de bem-estar social a partir de novos paradigmas e novas ideias de bem-estar social. Contextualizamos os discursos sobre desenvolvimento social, capacidades e bem-estar social. Por fim, o capítulo apresenta um apanhado histórico sobre ideias e discursos de bem-estar social no Brasil e no México.

No capítulo 2, descrevemos como será realizada a comparação entre Brasil e México, situados como categorias maiores e mais amplas do conteúdo analítico e quais categorias de análise serão adotadas para confrontar as realidades desses países em termos de mercado de trabalho e informalidade. Também descrevemos a síntese da pesquisa, delimitada a partir dos objetivos geral e específicos, a pergunta de pesquisa, a hipótese levantada e os procedimentos metodológicos utilizados para comparar. É um capítulo de conteúdo explicativo e descritivo que tem como finalidade descrever o método comparado, justificar a sua escolha para a tese e apresentar as unidades da comparação que servem de proxy para a comparação dos elementos de welfare state. No capítulo, esclarecemos que os dois países selecionados são situados, na tese, como economias de mercado hierárquico, abordagem teórica da pesquisa. Esses elementos são trabalhados desde um contexto dos discursos e das ideias de bem-estar social, e justificamos a abordagem teórica do institucionalismo discursivo na pesquisa. Por fim, o capítulo traz a delimitação do problema social escolhido para ser desenvolvido na tese: o processo de informalidade no trabalho e na economia e as políticas de geração de emprego, trabalho e renda. O capítulo 3 introduz as ideias de welfare state a partir do contexto do capitalismo hierárquico. Trabalhamos a abordagem teórica da pesquisa, a Variedades de Capitalismo (VoC), para, a partir dela, apresentar o elemento-chave, a hierarquia como constructo teórico-

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metodológico da varieade de capitalismo hierárquico, a Economia de Mercado Hierárquico (HME). O capítulo é organizado com base nos elementos delimitados como características do capitalismo hierárquico praticado no Brasil e no México. Discorremos sobre mercado de trabalho na HME; as configurações da informalidade no México e no Brasil; e a informalidade em números, momento em que nos valemos de uma breve analíse descritiva sem, contudo, aprofundarmos as relações estatísticas, já que nosso propósito não é uma abordagem focada em números. No entanto, não precindimos dos dados agregados, por necessidade de reforçar a construção das variáveis utilizadas na comparação.

No capítulo 4, discorremos sobre os elementos do welfare state nas HMEs. Iniciamos por uma contextualização mais ampla da Seguridade Social na América Latina e no Caribe e do paradigma da Previdência Social na região para, então, alcançarmos a abordagem da trajetória da Seguridade Social e da Previdência Social no Brasil e no México. Trabalhamos a questão da mercadorização da Seguridade Social e o papel dos fundos de pensão e o Sistema tripartite. Descrevemos as estruturas previdenciárias adotadas no Brasil e no México e suas trajetórias.

No capítulo 5, trazemos os discursos sobre as políticas ativas de emprego, como promover a geração de emprego, trabalho e renda, os programas de microcrédito e as discursividades institucionais. Abordamos o microcrédito na América Latina, mais especificamente no Brasil e no México, e mostramos um estudo mais detalhado sobre os fundos de custeio desses programas: os fundos de fideicomissos e o Fundo de Amparo ao Trabalhador. O capítulo 6 apresenta a comparação entre Brasil e México e os dados trabalhados na pesquisa. Comparamos as trajetórias históricas dessas economias a partir das semelhanças encontradas para, então, enfatizar as diferentes detectadas nas estruturas de bem-estar social construídas nesses países.

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1 TRAJETÓRIAS HISTÓRICAS DO WELFARE STATE

1.1 O welfare state e o institucionalismo histórico

O institucionalismo histórico é definido como uma das variedades de institucionalismo, ao lado do institucionalismo da escolha racional e do institucionalismo sociológico (HALL; TAYLOR, 2001). Essas vertentes teóricas adensam os estudos das políticas comparadas na década de 1990, especialmente, pela mudança de foco das pesquisas mais recentes, do society- centered para o policy-centered (SKOCPOL, 1985). Os institucionalistas históricos, tanto quanto os das demais vertentes institucionalistas, estão interessados nas regularidades da política ao longo do tempo. Contudo, para a vertente histórica, os estudos tendem a enfatizar os processos históricos sob a ordem do equilíbrio.

A maioria das pesquisas sobre os determinantes das políticas sociais até a década de 1990 baseava-se nos fatores socioeconômicos, com o Estado interpretado apenas como encarregado pela burocracia pública, focado na formulação e na implementação de políticas públicas. A partir de 1990, estruturas internas e subjacentes do Estado emergiram como campos de investigação científica, como os projetos de governo. O poder governamental do Estado e a responsabilidade deste com a continuidade de programas e ações indicavam o comprometimento deste com as ideias de bem-estar social. As macroteorias, basicamente, fundamentaram os estudos de políticas comparadas sobre o papel dos Estados na dinâmica das políticas sociais e, portanto, na expansão do welfare state, principalmente nas décadas de 1950 e 1960. A maioria dos argumentos, caracterizados como society-centered, estava focada na lógica subjacente ao industrialismo; nas respostas do Estado ao modo de reprodução do capitalismo avançado; na contribuição dos processos políticos e democráticos para a criação dos programas sociais e a expansão dos gastos sociais. Os estudos comparados também estiveram atentos à influência da economia mundial, dos padrões de competição geopolítica e dos processos de modelagem cultural transnacional nas políticas sociais (SKOCPOL; AMENTA, 1986).

O society-centered reúne as perspectivas pluralistas e estrutural-funcionalistas que foram predominantes na Ciência Política e na Sociologia nos Estados Unidos entre 1950 e 1960 e que perduraram nas décadas seguintes, até a mudança de paradigma dos estudos de políticas

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comparadas contemporâneos, que têm preferido as abordagens polity-centered, próprias das teorias de médio alcance (SCOKPOL, 1985), das quais trataremos nesta pesquisa1.

Implica dizer aqui que não desmerecemos os argumentos das teorias de longo alcance. Ocorre que a diferenciação entre Estado e sociedade como marca distintiva e dicotômica, metodologicamente não nos permite alcançar a densidade das estruturas internas de um corpo institucional complexo, como o welfare state, com influência sobre as capacidades de ação dos atores sociais que lhe dão forma, ao mesmo tempo em que também é influenciado por esses atores. Scokpol defende (1985) que, para explicar as mudanças sociais e políticas de contextos nacionais em relação a contextos históricos mundiais, é preciso trazer o Estado de volta ao centro das estratégias de análise – “bringing the State back in” – e respeitar a historicidade inerente às estruturas sociais e políticas.

Para esta tese, interessa a construção histórica dessas capacidades de agir – em termos de modelagem das instituições – e as lógicas que configuram a constituição socioestatal com base na autonomia e que influenciaram historicamente a construção e a caracterização do welfare state, desde o século XIX aos nossos dias, sob a forma de um conjunto de políticas sociais que se expandiu, institucional e ideologicamente, para além da modelagem das políticas sociais. Sob esse especto, aceitamos a ressignificação do welfare state desde a perspectiva da autonomia e da capacidade de atuar, como propõe o institucionalismo histórico, como estratégia metodológica para rediscutir as abordagens do papel do Estado como o ator societal que é (SCOKPOL, 1985).

A justificativa para uso das abordagens polity-centered, próprias das teorias de médio alcance, tem lastro na construção histórica das capacidades dos atores estatais para promover ajustes institucionais e, também, para definir as preferências dos atores societais (SKOCPOL, 1992). A polity-centered permite ao Estado delimitar áreas de atuação e promove um encaixe institucional em termos de políticas públicas, ou seja, o Estado aplica recursos públicos centrado em demandas específicas. Em outras palavras, a autora destaca a importância de se compreenderem os mecanismos de ajustes, tendo como referência o Estado como um ator

1 Nas décadas de 1950 e 1960, na Ciência Política, prevaleceram os estudos “society-centered”. Com Theda

Skocpol (1985), o Estado voltou ao centro dos debates da Ciência Política. A política era entendida como uma “soma vetorial” de pressões de grupo ou como os resultados das tendências sociais de longo prazo. Lemos (2009) explica que a sequência histórica democratização/burocratização é fundamental na análise proposta pelos neoinstitucionalistas, cujas abordagens migraram, recentemente, para a estrutura político-institucional, deslocando-se de uma perspectiva state-centred para uma polity-centred. Na primeira, os “órgãos administrativos do Estado” são o foco central da análise; na segunda, as burocracias passam a ser tanto as indicadas quanto as eleitas; a formação histórica do Estado nacional se torna imprescindível; as formas históricas de interação entre a estrutura estatal e as instituições políticas são consideradas; e estuda-se como as estruturas condicionam o comportamento dos grupos envolvidos na formulação de políticas. Nesse sentido, destacam-se os trabalhos de Orloff, Weir e Skocpol (1988).

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societal ativo e as instituições burocráticas como elementos interacionais e relacioniais na formulação das políticas sociais e, portanto, na caracteriazação dos welfare states.

Como pressupostos teóricos, o neoinstitucionalismo histórico afasta-se das macrointerpretações que tentam explicar as políticas de welfare state sob aspectos gerais. De modo que a influência da trajetória da path dependence no projeto de construção e caracterização do welfare state é conditio sine qua non de um modelo de análise comparada fundado no institucionalismo histórico e complementa a abordagem institucional discursiva apresentada na tese. Assim sendo, o welfare state, estruturado em torno das social policies, representa um conjunto de instituições que têm sob sua responsabilidade o bem-estar social (KERSTENETZKY, 2012). Porém, não custa lembrar que o bem-estar social, enquanto conceito histórico, possui particularidades que moldam previamente sua definição, logo, guarda relação com o contexto no qual se conforma. Daí a importância de questionar a que ideia de bem-estar social nos referimos nos determinantes do welfare state e, por conseguinte, na formulação das políticas sociais.

A ideia de bem-estar social encontra-se integrada à história particular de cada país, sendo que sua conformação se dá no contexto histórico – um recorte do tempo, do espaço e dos processos sociais e políticos, dos quais se extraem as variáveis específicas de explicação de uma determinada forma de desenvolvimento dos sistemas de proteção social. Para Skocpol (1985), as políticas sociais devem ser investigadas com base em períodos de tempo precisos e em sintonia com processos que se desdobram ao longo do tempo. Para a autora, inequivocamente as abordagens históricas são determinantes para compreender as origens das políticas sociais. Resta, assim, delimitar as variáveis-chave da análise.

Para o institucionalismo histórico, não existe uma variável mais importante que a outra, uma vez que, para a modelagem de pesquisa, importa o foco relacional entre as variáveis eleitas e o posicionamento das instituições do Estado, conduzido ao centro dos debates – estratégia do polity-centered. O arranjo preciso está justamente na história da formação das instituições e dos atores estatais e na posição que estes assumem em relação aos ambientes econômicos, sociais e políticos desde uma trajetória histórica (MARQUES, 1997). Para o polity-centered, metodologicamente, tratamos do papel das burocracias públicas na formulação das políticas sociais e, em consequência, as capacidades e a autonomia desses atores emergem para o campo analítico como pressupostos da análise.

Nessa abordagem, as burocracias públicas assumem papel de liderança, sendo que as capacidades estatais são medidas pelo insulamento (isolamento) burocrático; já os recursos de poder das burocracias derivam do processo de formação do Estado. Dessa forma, justifica-se a

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necessidade da contextualização histórica como pressuposto analítico. As implicações teórico- analíticas nesse ponto se debruçam, sobretudo, na relação de poder engendrado na capacidade e na autonomia desses atores societais que, por sua vez, interferem sobremaneira na formulação das políticas de bem-estar social. Um fato interessante é que as políticas sociais previamente estabelecidas afetam a ação política subsequente2 (SKOCPOL, 1985). Se a lógica assim

permanecer, em razão de equilíbrio dos processos hsitóricos, assim permanecerá o campo de provisão social, ou não.

Para Skocpol (1985), a autonomia decorre de uma relação de poder das burocracias estatais no sentido de formular e perseguir objetivos próprios. Na concepção de Evans (1995), a autonomia – embedded Autonomy3 – se dá desde uma sólida estrutura burocrática, sendo que o grau de autonomia tem lastro nas circunstâncias históricas, e não a partir de um pacto social entre capital e Estado. Como pressuposto, é fato que as burocracias influenciam a formação e o desenvolvimento dos interesses e das modalidades de ação de grupos da sociedade civil.

A autonomia dos Estados – atores societais – os condicionam à necessiadade de dispor de capacidade para realizar suas metas políticas. O desdobramento do arranjo autonomia versus capacidade tem reflexos importantes para as políticas sociais. Por exemplo: as políticas sociais formuladas não corresponderão, necessariamente, às demandas de proteção social das agendas políticas. Em outras palavras, não existe um paralelismo entre estados de coisa e as demandas que integram as agendas políticas e destas com as políticas sociais formuladas, ao contrário do que se imagina.

Arretche (1995) explica que a sequência histórica em que as capacidades dos Estados e as autonomias se desenvolvem condiciona a natureza das burocracias. Nesse sentido, ressalta a autora, recuperar historicamente essa relação é fundamental para explicar a natureza das instituições. Ela acrescenta ainda que as identidades, os objetivos e as capacidades dos grupos sociais que interferem na formulação das políticas também são condicionados pelas estruturas estatais e impactuam nas políticas sociais.

Dados os pressupostos autonomia e capacidade enquanto constructos analíticos, precisamos ainda considerar a necessidade de se conhecer como os Estados impactuam no

2 Sobre a formação do welfare state britânico, ver Bureaucracy and Innovation in British Welfare Policy 1870-

1945, de Roger Davidson and Rodney Lowe. Uma das características das políticas de bem-estar modernas da

Inglaterra foram as influências do Relatório Webb (1909) nas ideias de bem-estar social que integraram o Plano Beveridge (1942).

3 “A ‘autonomia inserida’ é o inverso da dominação absolutista incoerente do Estado predatório e constitui a chave

organizacional para a eficácia do Estado desenvolvimentista. Essa autonomia depende de uma combinação aparentemente contraditória entre isolamento burocrático weberiano e inserção intensa na estrutura social circundante. A forma de se obter tal combinação depende, é claro, tanto do caráter historicamente determinado do aparelho de Estado como da estrutura social na qual está inserida” (EVANS, 1995, p. 125, tradução nossa).

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conteúdo e no funcionamento da política social. Ou seja, saber como os Estados influenciam a formulação e a implementação das políticas é tão importante quanto verificar suas “capacidades” para implementar metas oficiais. Isso implica estabelecer condições para identificar a oposição real ou o potencial de grupos sociais poderosos e saber como esses atores se posicionam diante de situações socioeconômicas persistentes (SKOCPOL, 1985) no processo de formulação das políticas de bem-estar social.

Delineados os principais pontos para uma abordagem com base no institucionalismo histórico, passamos a explorar a relevância da abordagem histórica para a tese. A autonomia e a capacidade são situadas nesta pesquisa como conceitos históricos, o que implica dizer que acompanham as mudanças temporais nas trajetórias e na dinâmica das políticas sociais e, por consequência, no welfare state. Considerando que as ações estatais mudam com o tempo, da mesma forma que as capacidades das organizações passam por transformações, obviamente, esses dois conceitos acompanham as trajetórias históricas das instituições das quais ganham conformação. Nesse entendimento, Skocpol (1985) explica que todo o potencial do conceito de autonomia somente poderá ser realizado em estudos verdadeiramente históricos, sensíveis às variações estruturais e às mudanças conjunturais no contexto de determinadas políticas.

A autonomia das burocracias4 e as capacidades estatais são variáveis que devem ser

consideradas na análise histórico-institucional. Skocpol (1992, p. 8, tradução nossa), explica que “são como atores tentando realizar metas políticas”. Por assim dizer, suas definições se fazem pela situação histórica e pelas potencialidades estruturais do Estado em realizar as metas propostas institucionalmente, ou seja, as metas oficiais. No mesmo sentido, Arretche (1995, p. 58) complementa que “é na formação do Estado nacional que se definem as capacidades estatais e o grau de autonomia do Estado”.

Em observação anterior, assumimos a posiçao de welfare state como um corpo político autônomo, dinâmico, que se realiza em razão de um contexto histórico. Passamos por uma teorização conceitual extraída dos manuais de políticas comparadas, da Sociologia econômica, de corpos acadêmicos. Sem chegar a uma definição fechada, aceitamos a lógica enunciativa da ciência política. Sobretudo, não pontuamos essa tarefa como dificuldade de formulação de um conceito preciso, mas ao respeito às especificidades inerentes ao objeto analisado. Por isso, afirmamos que o welfare state não é, realiza-se5.

4 Tentativas recentes de neomarxistas e (do que pode ser chamado) de neopluralistas para teorizar em termos gerais

sobre “autonomia de Estado” não ofereceram conceitos ou hipóteses explicativas suficientemente ricas para abranger os argumentos e os achados de vários estudos históricos comparativos.

5

Abordagens históricas comparativas de poucos casos podem ser consultadas nos trabalhos de Esping-Andersen (1985, 1991) e Orloff (1993).

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