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Estratégias e Táticas de Napoleão Bonaparte

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ESTRATÉGIAS E TÁTICAS DE

NAPOLEÃO BONAPARTE

Organizado por

Sergio Murilo de Castro Victorazzo

2015

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ESTRATÉGIAS E TÁTICAS DE

NAPOLEÃO BONAPARTE

Organizado por

Sergio Murilo de Castro Victorazzo

2015

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SUMÁRIO

Prefácio – Política, estratégia e estratégias militares dominantes 7

Introdução – Níveis de aplicação do Poder Militar

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PARTE I – ESTRATÉGIAS E TÁTICAS DE NAPOLEÃO BONAPARTE

Capítulo 1 – Introdução

21

Capítulo 2 – As estratégias de Napoleão

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Capítulo 3 – As táticas de Napoleão

46

Capítulo 4 – De Jomini e Clausewitz sobre Napoleão

47

Capítulo 5 – O Estado-Maior de Napoleão

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Capítulo 6 – Erros, falhas e derrotas de Napoleão

52

Capítulo 7 – Rapidez de movimentos e concentração de tropas – A

organi-zação e o emprego dos Corpos de Exército

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Capítulo 8 – A moral das tropas de Napoleão

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Capítulo 9 – As maiores e mais sangrentas batalhas de Napoleão 61

PARTE II – CONSIDERAÇÕES BÁSICAS SOBRE ESTRATÉGIA E A

GUERRA DE MANOBRA

65

PARTE III – AS GUERRAS NAPOLEÔNICAS E A GUERRA DE

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PREFÁCIO

POLÍTICA, ESTRATÉGIA E ESTRATÉGIAS MILITARES DOMINANTES

1

POLÍTICA E ESTRATÉGIA

Segundo Maurice Duverger, a política, para uns, é a ciência do Estado, enquanto, para outros, é a ciência do poder. Esta dicotomia, para nós, não existe de forma nítida. O poder é inerente ao Estado, tanto assim que o Estado inexiste sem o poder.

Buscando conceitos entre os nossos pensadores da ciência política ou da ciência do Estado, encontramos que Themistocles Cavalcanti diz que a “Ciência Política trata dos fenômenos que se enquadram na organização, na estrutura, no funcionamento do Estado e no exercício do poder”.

A estratégia é uma decorrência da política, razão por que, para conceituá-la, deve-mos, antes, conceituar a política. Esta é a arte ou ciência de governar. É a concepção de como governar o Estado. A estratégia é a arte de executar a política. Compreende a ação, ou as ações necessárias para alcan¬çar os objetivos da política. Resumindo, diríamos: política é a concepção de governo e estratégia é a ação decorrente desta concepção. Política é o que fazer; estratégia, como fazer.

Neste quadro de conceitos, vamos incluir a geopolítica e a geoestratégia. A primeira é uma parte da ciência política inspirada nas realidades geográficas do Estado. A geoes-tratégia é a esgeoes-tratégia aplicada às áreas privilegiadas pela geopolítica (às áreas conside-radas críticas).

Sendo a estratégia a aplicação de uma política, haverá uma estratégia para cada política geral (nacional), económica, psicossocial e militar. Sendo a guerra, segundo con-ceito de inúmeros autores, a política impulsionada na busca de seus objetivos por meios violentos (Montesquieu, Rousseau, Clausewitz, ]omini, Mahan, Mackinder, Lenine), a es-tratégia militar é a arte de conduzir a guerra.

Considerando a estratégia decorrência de uma concepção política, as¬sim a com-preendendo, podemos afirmar que a política escolhe objetivos para atender aos interesses do Estado (ou da aliança de Estados), e a estratégia seleciona meios e estabelece priori-dades para alcançar estes objetivos.

Houve época em que se fazia confusão sobre a relação de interdependência entre política e estratégia. Desde o início do século XIX essa confusão não é mais aceitável. Senão, vejamos o pensamento dos principais mestres da estratégia. Não há dúvida de que foram Clausewitz no século XIX, Liddell Hart e Beauffre no século XX. O primeiro teve como campo de observação as inovações trazidas ao campo da estratégia pela Revolu-ção Francesa e as guerras napoleônicas. Sua genialidade está em ter sabido sintetizar e traduzir em ideias gerais as constantes estratégias produzidas por essa época de ino¬va-ções no campo de guerra; inovaino¬va-ções relacionadas muito mais ao âmbito das transforma-ções políticas e à genialidade de Bonaparte do que à evolução da técnica de produção de engenhos bélicos.

Liddell Hart, participante da I Grande Guerra e da II Guerra Mundial, retirou, das observações colhidas nos campos de batalha desses dois conflitos maiores, os ensina-mentos que soube traduzir numa doutrina estratégica lógica e coerente.

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nova e terrível arma -a bomba atômica, a arma nuclear.

Desejando apoiar o nosso conceito inicial de que a estratégia é uma decorrência da política, vamos alinhar alguns pensamentos destes três clássicos da estratégia.

• Clausewitz -”A guerra é a continuação da política por outros meios.” • Liddell Hart -”A melhor estratégia é aquela que atende ao objetivo político por meio de hábeis demonstrações de força, pela mobilidade, eventualmente sem travar a batalha.”

• General Beauffre -”A guerra total é concebida em nível de política gover-namental, que fixa os domínios das estratégias militar, política, econômica e diplomática.”

Assim estabelecidos os campos doutrinários da política e da estraté¬gia moderna, baseados no pensamento dos três mestres que mais se distinguiram no estudo da estra-tégia nestes últimos ZOO anos, faremos algumas considerações que nos darão uma visão mais ampla do campo de estudo da estratégia militar contemporânea.

Desde o início observamos que a palavra estratégia, de origem grega -estratego era o general grego comandante de exércitos -, do ponto de vista semântico vem evoluindo através dos tempos. Antes do século XVIII, esta palavra se referia, sempre, á arte dos generais, tinha um sentido puramente militar.

A partir da Revolução Francesa de 1793 e das campanhas napoleónicas que se seguiram, as guerras que até então eram objeto de decisões fechadas de gabinetes e dependentes da capacidade dos tesouros reais em contratar exércitos mercenários, for-mados muitas vezes por profissionais estrangeiros, transformaram-se em guerras nacio-nais, com o povo em armas e a participação de toda a nação. Esta transformação política e social levou Clausewitz a escrever: “As coisas mudaram com a eclosão da Revolução Francesa...”

Uma nova força que ninguém antes poderia imaginar fez sua aparição em 1793. A guerra repentinamente transformou-se numa preocupação do povo inteiro, e de um povo de 30 milhões de habitantes referindo-se â França. A participação do povo na guerra fez entrar a nação inteira em um jogo que, antes, era objeto de preocupação apenas do gabi-nete e de exércitos mercenários. Desde aí, deixou de haver limites para a guerra. Anteci-pava Clausewitz os conceitos de guerra total que, 100 anos mais tarde, foram teorizados pelo general alemão Ludendorf.

A guerra nacional, envolvendo a nação inteira na sorte de conflitos bélicos, produziu uma generalização do conceito de estratégia que, de arte de conduzir as batalhas, passou a ser a arte ou ciência de conduzir a nação para a vitória. É o próprio C1ausewitz quem antecipa esta evolução do conceito de estratégia quando escreve:

A guerra não mais pertence ao domínio das artes ou das ciências, mas se relaciona com a existência social. Ela é um conflito entre grandes interesses decididos pelo derra-mamento de sangue. Parece-se mais com a política.

Destes pensamentos de Clausewitz, que viveu alguns anos na Rússia imperial, onde teve uma cátedra de professor em ciência política e estratégia, Lenine extraiu o seu conceito de guerra permanente. Parafraseando Clausewitz, Lenine escreveu sua célebre frase de que “a política é a continuação da guerra por outros meios”. Como o próprio

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Clau-sewitz previra, no futuro haveria, além da estratégia militar, estratégias correspondentes aos campos de generalização do conflito bélico-político, económico, social e outros. No pensamento militar moderno predominam três escolas principais sobre a estratégia:

• estratégia de ação direta; • estratégia de ação indireta; • estratégia de dissuasão.

Cada uma dessas escolas tem o seu pensador principal. Clausewitz é o preconiza-dor da primeira, Liddell Hart, da segunda, e o general Beauffre, da terceira.

Embora Clausewitz tenha falecido em 1831, Liddell Hart, em 1970 e o general Be-auffre, em 1975, distanciados no tempo de um século e meio, as ideias de Clausewitz continuam atuais e, em grande parte, foram adotadas pelo grande pensador contemporâ-neo Raymond Aron. A este respeito vale aqui reproduzirmos o conceito do militar francês, coronel Guy Doly, profes¬sor da Escola de Guerra, no seu livro Strategie France “Fora do acontecimento extraordinário que constituiu o aparecimento da arma nuclear em 1945, nada, realmente, de novo aconteceu no campo da estratégia.”

Segundo Karl von Clausewitz, no seu livro clássico Da guerra, “o objetivo político da guerra é destruir as forças militares do inimigo e conquistar

• o seu território”. Como estratégia militar para alcançar este objetivo político • o escritor alemão prescreve -”travar a batalha, não há outro meio”. Como princípio estratégico do pensamento de Clausewitz encontrou: “Concentrar as forças e lançá-las contra a massa principal do inimigo, de sorte a chegar a decisão pela batalha, se possível em uma só ação e um só momento”. É a chamada estratégia de ação direta, contra as for-ças principais do inimigo (o seu centro de gravidade), realizando, se passivel, a surpresa estratégica. Estudando as campanhas de Napoleão, Clausewitz seleciona, como fatores de surpresa estratégica, a mobilidade, a velocidade, as ações diversionárias e a divulga-ção de informações falsas, visando a iludir o inimigo sobre o ponto de aplicadivulga-ção do golpe decisivo.

Analisando a aplicação dos princípios estratégicos de Clausewitz na guerra contem-porânea, o coronel Guy Doly, já citado, argumenta que no quadro do conflito militar moder-no, entre as superpotências e as grandes potências, o chamado conflito Leste-Oeste, em que se confrontarão as forças da Otan e do Pacto de Varsóvia, o objetivo de destruição das forças inimi¬gas e ocupação de seu território, buscando o seu centro de gravidade, não parece mais real, porque isto imporá um preço excessivo que nenhum dos contendo-res tem condições de pagar. Vamos ver, quando analisarmos a estratégia de ação direta, esta impossibilidade com os meios bélicos atuais que possuem ambos os lados rivais, de se chegar a uma destruição maciça, como defende Clausewitz, sem incorrer no risco certo da destruição mútua. A resposta será tão violenta e mortífera como o ataque.

Fora do quadro do conflito Leste-Oeste, nas guerras locais e regionais, na chamada guerra convencional, poderemos, até certo ponto, considerar válidos os princípios estraté-gicos clausewitzianos, desde que um dos lados seja capaz de concentrar superioridade de meios e aplicá-los de surpresa no centro de gravidade dos dispositivos de forças inimigas. Passaremos agora a analisar as ideias principais de outro clássico da estratégia, o inglês LiddeIl Hart, que, ao contrário de Clausewitz, é o defensor da chamada estratégia de ação indireta, uma variante da estratégia de ação direta.

Liddel Hart foi o primeiro autor a integrar os conhecimentos das duas guerras (de 1914-1918 e de 1939-1945). Os dois fatores que mais influíram nas operações terrestres

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nesses dois conflitos e vieram a influir na estratégia contemporânea foram o emprego do avião e do carro de combate, emprego experimental na I Grande Guerra e maciço na II Guerra Mundial. Dessas inovações da tecnologia e da indústria bélica, o escritor inglês ti-rou duas conclusões estratégicas: da importância da aproximação indireta e da mobilidade na manobra estratégica.

A I Guerra Mundial, de que LiddeIl Hart foi testemunha, fora um massacre de qua-se quatro anos numa guerra imobilizada de trincheiras. Morreram milhões de homens de ambos os lados. A chegada de meio milhão de norte-americanos, em 1917, comandados pelo general Pershing, conseguiu desequilibrar o impasse estratégico, dando superiorida-de superiorida-de meios aos aliados e obrigando os alemães superiorida-de Guilherme n, o Kaiser, a procurar um armistício.

A I Guerra Mundial (1914-1918) marcou os primeiros ensaios de emprego da tele-grafia, dos submarinos, do carro de combate e do avião. Estes dois últimos, ainda rudi-mentares, de reduzido peso e raio de ação, não foram instrumentos suficientes a alterar o impasse de equilíbrio estratégico que imobilizara as frentes. [Mas, o desenvolvimento da tecnologia na fabricação de aviões e carros de combate mudou O ambiente estratégico da ]] Guerra Mun¬dial, iniciada propriamente com a invasão da Polônia em 1939. A blit-zkrieg alemã contra a França composta por enorme massa de carros blindados, apoiada por densas nuvens de aviões de combate, abriu o quadro estratégico característico desse conflito mundial.

A II Guerra Mundial caracterizou-se como uma guerra de movimen¬to. A ideia de imobilizar as frentes de combate nas fronteiras, por meio das posições superfortificadas, as famosas linhas Siegfried (alemã) e Maginot (francesa), revelou-se vã ilusão estratégica e desperdício. Em toda parte, no Pacífico, no Atlântico, na África do Norte, no continente europeu, o que caracterizou a guerra foram os movimentos estratégicos de grande enver-gadura, como as operações anfíbias na invasão do norte da África, da Sicília, do sul da França e da Normandia, reunindo imensa massa de meios marítimos, aéreos e terrestres, e, também, as operações dos Exércitos no norte da África e na Europa. Nenhuma barreira física ou humana foi capaz de conter, por muito tempo, o poder de choque das massas de blindados, seguidas de forças motorizadas e apoiadas pela aviação de acompanhamento ao combate e de bombardeio. A observação aérea e a mobilidade facultavam a realização da surpresa estratégica sobre um flanco ou retaguarda.

Este quadro de guerra de 1939-1945 enriqueceu os conhecimentos estratégicos de Liddell Hart, que se tornou o principal analista e escritor militar de sua época. Sobreviveu por 25 anos ao final da última Guerra Mundial e durante esse período acompanhou, aten-tamente, o vertiginoso desenvolvi¬mento da tecnologia militar e sua aplicação no campo da estratégia. Produziu vários livros sobre a estratégia militar, até a sua morte.

Na síntese de suas apreciações no pós-guerra de 1939-1945, Liddell Hart oferece--nos suas conclusões que contrariam os princípios fundamentais da estratégia da ação direta de Clausewitz que, como vimos, preconizava “atacar com superioridade de forças e a violência máxima a massa principal das forças inimigas, procurando, para esta ação, a surpresa estratégica”.

Liddell Hart, no seu livro sobre estratégia, editado em 1954, contraria o pensamento de Clausewitz e propõe como nova estratégia a ação indireta, que pode ser assim tradu-zida:

A estratégia mais conveniente é a que permite conduzir a batalha da maneira mais vantajosa e muitas dessas condições vantajosas, se aplicadas, poderão conduzir ao

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de-sequilíbrio das forças do inimigo com um mínimo de combate; em síntese, a estratégia perfeita será obter a decisão pela derrota do inimigo e sua rendição sem combate.

A estratégia de ação indireta, assim exposta, procura tirar o máximo proveito da mobilidade, da velocidade e da surpresa oferecidas pela tecnologia militar moderna para desequilibrar a estrutura do dispositivo inimigo.

E, numa quase obsessão de virtuosidade estratégica, imagina, até, derrotar as for-ças militares inimigas pela simples manobra estratégica.

É interessante observar-se neste ponto de nossas considerações que Lenine, um discípulo de Clausewitz em assuntos estratégicos, colocando o seu ingrediente político-re-volucionário na estratégia, já havia escrito:

A melhor estratégia consiste em retardar o inicio das operações militares até que a desagregação moral do inimigo nos permita, facilmente, desferir-lhe o golpe mortal.

No conceito de Lenine encontra-se a semente da chamada “guerra revolucionária”, que será objeto de nossa atenção em seguida, e que visa a minar o moral do inimigo, “atuando essencialmente sob sua mente, através da propaganda, dos atos de terrorismo e de intimação”.

É interessante se notar, também, que os conceitos estratégicos de ação indireta de Liddell Hart tiveram como precursores o chinês Sun Tzu (500 anos antes de Cristo) e seus discípulos contemporâneos Mao Tsé-tung e o general vietnamita Giap.

Vale a pena, aqui, reconstituirmos a influência de Sun Tzu e de Mao Tsé-tung, o primeiro precursor e o segundo grande mestre da estratégia de ação indireta.

O clássico de Sun Tzu, A arte da guerra, foi escrito nos últimos anos do século VI antes de Cristo. Consta que o autor o ofereceu ao rei Ho-Iu, da dinastia Wu. Sua difusão no Ocidente deve-se ao padre Amiot, um jesuíta missionário em Pequim. A tradução do padre Amiot foi divulgada em Paris em 1712. Assim, podemos dizer que a teoria estratégi-ca de Sun Tzu é inteiramente diversa do pensamento estratégico de Clausewitz, que teve predominante influencia na Europa a partir dos anos do lançamento de sua obra clássica Vom Kriege, 1832, até hoje.

Sun Tzu considerava a guerra “um assunto de vital importância para o Estado”, exi-gindo, por isto, acurado estudo e análise. Ele nos oferece a primeira tentativa conhecida de formular uma doutrina estratégica, baseada em planejamento e em princípios de con-duta das operações. Acredita que um estrategista deve ser capaz de submeter as forças inimigas sem engajá-las na batalha, de ocupar as suas cidades sem necessidade de um cerco destruidor e de derrubar seu governo sem batalhas sangrentas.

Sun Tzu estava convencido de que a estratégia envolve uma habilidade manobreira mais do que o choque de forças. A superioridade numérica, por si só, não representava vantagem. Considerava Sun Tzu que os fatores morais, intelectuais e circunstanciais são mais importantes no confronto de Exércitos do que os fatores da força física e aconselha-va os reis e comandan¬tes a não se iludirem com a superioridade física de seu poder mili-tar. O escritor militar chinês não concebia a guerra em termos de massacre e destruição; o verdadeiro objetivo estratégico, dizia, é conquistar o território e as forças inimigas intactas, ou tão intactas quanto possível.

Acreditava Sun Tzu que o planejamento estratégico meticuloso, baseado na infor-mação correta sobre o inimigo, era fator que contribuía para uma decisão militar rápida. Sempre levava em conta os efeitos da guerra sobre a economia, e, indubitavelmente, foi o primeiro a observar a inflação dos preços inevitável durante as guerras. Afirmava: “Nenhum país é beneficiado pela guerra prolongada”. Preocupava-se com os problemas

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logísticos de apoio ao Exército.

Sobre as qualidades de um bom general, dizia: “Boa moral, emocionalmente sere-no, controlado de atitudes, conhecedor da influencia dos fatores, do terreno e das con-dições climáticas sobre a manobra estratégica”. Antes da abertura das hostilidades, Sun Tzu aconselhava o lançamento de atividades clandestinas no interior do país inimigo, espalhando boatos falsos e informações contraditórias.

Os princípios de guerra revolucionária nós os encontramos, inicialmente, na con-cepção de Sun Tzu. Como vimos, O estrategista chinês - o mais antigo mestre da estra-tégia de ação indireta -aconselhava a, antes do início das atividades bélicas, e, também, durante as mesmas, infiltrar-se no interior do país inimigo, espalhando boatos falsos e informações contraditórias, buscando enfraquecer o seu moral e a sua vontade de resistir. É a ação sobre a mente do inimigo.

Mao Tsé-tung foi o principal discípulo de Sun Tzu. Nascido em 1893, Mao Tsé-tung foi absorvido pelas ideias políticas de Marx e Engels, ainda muito jovem, quando assis-tente da biblioteca da Universidade de Pequim. Em 1920, era já um comunista acaba-do. Desde este momento lançou-se à grande missão de sua vida -criar uma nova China baseada nas ideias políticas de Marx e Engels. Crescendo na hierarquia do comunismo chinês, Mao Tsé-tung tornou-se, ao mesmo tempo, um teórico da guerra revolucionária e um general combatente incansável na luta contra as forças do Exército Nacionalista de Chiang Kai-chek.

Mao Tsé-tung, partindo dos conceitos básicos de Sun Tzu, desenvolveu uma es-tratégia, uma tática e uma logística para a guerra. Suas teorias impressionaram Lenine e foram incorporadas pelos soviéticos, que as utilizam como um dos mais eficazes instru-mentos de agressão aos países que pretendem conquistar ou neutralizar no quadro do conflito mundial. Atualmente, vemos a guerra revolucionária em pleno desenvolvimento, particularmente no Afeganistão e na América Central.

Em um dos seus livros, em 1937, disse Mao Tsé-tung: “A primeira lei da guerra é preservar nossas forças e destruir as forças do inimigo”. Do ponto de vista estratégico, Mao concebeu esta forma de guerra como passando por fases sucessivas, através das quais ela vai aumentando sua área de influência e o grau de submissão da nação atacada. A primeira fase é dedicada à organização, consolidação e preservação de uma base regional. A segunda fase visa à progressiva expansão dessa base. A terceira fase é a fase da decisão, quando a destruição e a conquista da nação são objetivadas.

Quanto às táticas que Mao Tsé-tung aconselha, acompanhando essas três fases da manobra estratégica da guerra revolucionária, destacaremos: a primeira fase (de organi-zação, consolidação, preservação de uma base regional) compreendendo:

• escolher o local para a base em região isolada e de difícil acesso;

• organizar um centro de treinamento de voluntários, agitadores e propagandistas; • espalhar propagandistas entre a população próxima à base, a fim de persuadir e convencer os habitantes, transformando-os em adeptos da causa revolucionária;

• em consequência, criar em volta de cada base um cinturão protetor de simpatizan-tes em condições de assegurar o recrutamento de homens, a colheita de informações e o suprimento de alimentos.

O processo a desenvolver nessa fase é essencialmente conspiratório, clandestino, metódico e progressivo. As operações militares só são admitidas eventual e esporadica-mente.

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Na segunda fase (de expansão da base), a ação direta assume um papel cada vez mais relevante. As práticas mais usadas são:

• atos de sabotagem e terrorismo;

• sequestros de colaboracionistas e reacionários;

• ataques de surpresa a postos isolados da política ou do Exército e apro¬priação de armas e recursos logísticos.

o objetivo procurado nessa fase, além da expansão da área de influencia peia pro-paganda, o terror e a intimidação, é a apropriação de armas, explosivos, dinheiro, material de saúde e equipamentos de comunicação. As ações são praticadas por guerrilhas que vão se tornando cada vez mais ades¬tradas e mais bem-equipadas.

Os habitantes das áreas envolvidas são submetidos a constante propa¬ganda para aderirem à causa revolucionária e darem à mesma as características do movimento de massa.

A terceira fase (fase da decisão, ou destruição do inimigo), como se vê, dependerá do êxito alcançado nas fases anteriores. A teoria de Mao Tsé-tung, para esta fase, prevê que as guerrilhas já consolidadas se integrem num Exército revolucionário capaz de desa-fiar o inimigo (as forças do Estado) em combates do estilo guerra convencional. Esta fase deve ser prolongada por negociações, com postura de ameaça militar, durante as quais as forças revolucionárias aproveitam para melhorar suas posições (nas campos militar, políti-co, social e económico). Durante as negociações, pouca ou nenhuma concessão deve ser esperada do comando das forças revolucionárias, cujo único objetivo é criar pelo cansaço, pelo jogo de impasses sucessivos, melhores condições para garantir sua unidade e garan-tir o processo vitorioso de sua causa.

O sucesso da “guerra de guerrilhas”, como usualmente é chamada a guerra revo-lucionária, a partir da segunda fase, depende, essencialmente, da montagem de uma boa rede de informações que assegure sempre, às forças revolucionárias, conhecimento pre-ciso sobre as atividades e possibilidades das forças governamentais e lhes permita tirar a máxima vantagem das ações de surpresa.

No tocante à logística das guerrilhas, é o próprio Mao quem diz, em sua teoria, que a “guerrilha não tem retaguarda”. Seus suprimentos devem ser retirados da própria área envolvida. O inimigo deve ser a principal fonte de recursos em armas, equipamento e mu-nição. Ele mesmo escreveu em certa ocasião:

Eu tenho pedidos de suprimentos aos arsenais de Londres assim como aos de Hanyang e, o que é mais importante, esses pedidos nos são entregues pelas unidades de transportes do inimigo que assaltamos.

O pior é que não se tratava de uma brincadeira de Mao, mas de uma crua verda-de. Vários comboios de armas e de suprimentos destinados ao Exército nacionalista de Chiang Kai-chek caíram inteiros em mãos das forças de Mao, vítimas de ataques de sur-presa, muitas vezes em conivência com elementos nacionalistas adesistas.

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INTRODUÇÃO

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NÍVEIS DE APLICAÇÃO DO PODER MILITAR

Três são os níveis em que são planejadas,executadas e controladas as ações mili-tares: o estratégico, o tático e o operacional. Os dois primeiros são explicitamente mencio-nados e descritos na doutrina militar das forças armadas brasileras; já o terceiro, o nível operacional, ainda que não mencionado na nossa doutrina, é reconhecido tacitamente. Vale dizer que em outros países, como ns Estados Unidos, ponhr exemplo, o campo ope-racional é amplamente reconhecido.

ESTRATÉGIA1

Entendida na antiguidade como a “arte do general”, restrita ao campo de batalha, a palavra estratégia teve seu significado ampliado ao longo do tempo.

Partindo da noção clássica militar, que perdurou por séculos, o campo semântico do vocábulo alargou-se quando, no século XVII, a guerra passou de limitada a nacional, mobilizando, nesse caso, toda a nação. De nacional passou, já no século XX, a total, quando deixou de ser realizada apenas pela expressão militar e começou a envolver a totalidade da nação. A seguir, assumiu dimensão global, com a II GUERRA MUNDIAL. Posteriormente, quando o homem atingiu o espaço sideral e começou a explorá-lo, tomou a dimensão planetária.

Deve ser ressaltado que, após a II GUERRA MUNDIAL, o campo de ação da es-tratégia estendeu-se também aos períodos de paz, ou seja, que as nações passaram a adotar estratégias nas relações internacionais e no planejamento governamental, quando ultrapassou o campo da segurança e passou a ser empregado no desenvolvimento. Nos anos subseqüentes, o vocábulo adquiriu amplo e diversificado uso quando atingiu a totali-dade dos segmentos da societotali-dade, mormente ligado à ciência da administração, e popu-larizou-se com significado muitas vezes diferente daquele original, de luta entre vontades opostas.

O campo semântico da “estratégia” alargou-se de tal forma que a palavra passou a necessitar de adjetivação. Surgiram então a grande estratégia na NGLATERRA, a estraté-gia total na FRANÇA, e a estratéestraté-gia nacional nos EUA e no BRASIL, como expressões que caracterizavam uma estratégia maior, que coordenava todo o esforço da nação e subor-dinava a “arte do general” para vencer a guerra. A estratégia foi igualmente acrescida do adjetivo “militar” quando referente às Forças Armadas e do “operacional” quando limitada ao teatro de operações.

A estratégia saiu, ao longo da história, dos limites dos teatros de operações e in-vadiu todas as atividades de governo e de produção de um país, mesmo na paz. Foi-se modificando mediante etapas nítidas, cada qual com abrangência crescente, incorporando características de cada época.

Assim, chega-se ao conceito de estratégia, como sendo, a arte de preparar e aplicar o poder para, superando óbices de toda ordem, alcançar os objetivos fixados pela política.

No conceito de estratégia fica evidenciada a subordinação da estratégia à política, em que a política define “o que fazer”, e a estratégia define “o como fazer” e a necessida-de necessida-de adjetivação da palavra estratégia, para compreensão real do seu significado e dos níveis a que se refere.

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O estudo da estratégia importa, no seu relacionamento, com outros conceitos além da política e do poder, tais como conflitos, tempo, espaço, cenários, centros de poder e planejamento. A compreensão do moderno conceito de estratégia refere-se ao preparo e à aplicação de meios, parcelados ou globalizados, para atendimento dos objetivos fixados pela política.

Clausewitz em sua obra “On War” assim se manifesta:2

Strategy is the employment of the battle to gain the end of the war; it must therefore give an aim to the whole military action, which must be in accordance with the object of the war; in other words, strategy forms the plan of the war, and to the said aim it links the series of acts which are to lead to the same, that is to say, it makes the plans for the separate campaigns, and regulates the combats to be fought in each. As these are all things which to a great extent can only be determined on conjectures, some of which turn out incorrect, while a number of other arrangements pertaining to details cannot be made at all beforehand, it follows, as a matter of course, that strategy must go with the army to the field in order to arrange particulars on the spot, and to make the modifications in the general plan which incessantly become necessary in war. Strategy can therefore never take its hand from the work for a moment.”

NIVEL OPERACIONAL

Do exposto, verifica-se que a estratégia é inerente aos objetivos formulados por uma politica nacional, enquanto que a estrategia, quando limitada a um teatro de opera-ções, é rotulada como operacional, isto é, ela pertence a um nível operacional.

NÍVEL TÁTICO

Costuma-se muito, por força do hábito, confundir-se o nível tático com o operacio-nal, uma vez que ambos convivem em um teatro de operações. O campo tático diz respei-to ao “como” serão, efetivamente, realizadas as operações referentes às decisões ao nível operacional. Diz ele respeito ao emprego das armas e dos serviços, sendo totalmente dependente da experiência e características dos comandantes das unidades, tendo como “farol”, a metodologia embutida nos manuais doutrinários de organização em emprego das armas e serviços.

Estas considerações foram feitas à título de um embasamento àquilo que se pre-tende abordar, o seja, as estratégiaa e as taticas usadas por Napoleão Bonaparte, o que, evidentemente requer outras considerações prelimnares que passarei, então, a apresetar.

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PARTE I

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ESTRATÉGIAS E TÁTICAS EMPREGADAS POR NAPOLEÃO BONAPARTE

“Ler repetidamente as campanhas de Alexandre, Hannibal, César, Gustavo, Turenne e Frederic, o grande. Esta é a única maneira de se tornar um grande general...” - Napoleão Bonaparte

SUMÁRIO

Capítulo 1. Introdução

Capítulo 2. A estratégia de Napoleão

=> As estratégias favoritas de Napoleão Bonaparte => Campanhas de Ulm-Austerlitz em 1805

=> Campanha de Jena-Auerstadt em 1806

=> Rapidez dos movimentos e concentração de tropas Capítulo 3. As táticas de Napoleão

Capítulo 4. Jomini e Clausewitz sobre Napoleão Capítulo 5. O Estado-Maior de Napoleão

Capítulo 6. Erros, falhas e derrotas de Napoleão

Capítulo 7. Rapidez de movimentos e concentração de tropas.. Capítulo 8. Moral das tropas de Napoleão.

Capítulo 9. As maiores e mais sangrentas batalhas de Napoleão Bonaparte.

“A tática é a arte de usar tropas nas batalhas; estratégia é a arte de usar as batalhas para vencer a guerra “ - Carl von Clausewitz

CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO

A grandeza de Napoleão como soldado foi evidente e, praticamente, desde o início de sua notável carreira. Foram vitória seguidas, umas após as outras, por mais de uma década. No entanto, se nessas batalhas a genialidade de Napoleão era óbvia, seus méto-dos, no entanto, não o eram.

Napoleão contrariava todos os princípios que orientavam a condução das opera-ções, bem como o emprego das técnicas doutrinárias que balizavam a implementação daqueles princípios. “Como resultado, antes mesmo da realização de suas ambições, ele chegou ao seu destino final, e aos comentaristas militares foi atribuída a difícil tarefa de explicar seus modos de guerrear.” (-Albert Nofi)

Embora Napoleão tenha desempenhado um papel importante na história e no de-senvolvimento da arte militar, como soldado, ele não era nenhum grande inovador. “Ele não confiava em novas idéias. Sua genialidade era essencialmente prática, e seus con-ceitos militares evoluíram a partir de estudos aprofundados dos brilhantes comandantes que o antecederam, particularmente, Frederico o Grande. Ele fez o máximo uso das idéias de seus antecessores e admirou as suas vidas.” (Chandler - p “Dicionário das guerras napoleônicas”)

De acordo com Loraine Petre, descendente de uma família aristocrática inglesa e historiador militar, a genialidade de Napoleão não era a de um criador. Mas, na verdade,

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ele fez algumas reformas práticas ou inovações na arte militar. Seu talento pautava-se, isso sim, na habilidade de saber se posicionar nas áreas estratégicas e administrativas da guerra. Napoleão tinha a capacidade de visualizar com grande clareza uma situação mi-litar, e confrontá-la para determinar a linha de ação mais aceitável (custo-benefício) a ser empreendida. Ele podia conceber, com facilidade, a maioria das possíveis soluções a um problema, avaliá-las e, em seguida, executá-las, fazendo pleno uso das habilidades con-sideráveis do Exército francês, por ele reformado. Ele desenvolveu um estilo estratégico agressivo, baseado nas propostas de Bourcet. E ele usou a República como um modelo, em sua habilidade para explorar os recursos finais da França, com frequência estampando caras novas aos exércitos que estavam à beira de um desastre. Assim, a genialidade de Napoleão ficou marcada pelo modo como ele via as maneiras em que todas as inovações do final do século XVIII poderiam ser orquestradas em um sistema militar praticamente invencível.

Napoleão é conhecido como um grande estrategista e um gênio militar do seu tem-po. Ele conquistou, praticamente, toda a Europa e deu a todos a possibilidade de uma boa corrida pelo dinheiro. Suas campanhas constituíram o repositório básico da educação militar em todo o mundo ocidental e, para muitos, o pensamento militar atual, ainda é influenciado pelo grande francês. Em academias militares de todo o mundo, incluindo-se a famosa West Point (EUA), aos alunos foi ensinada a língua francesa para que fossem capazes de ler livros sobre a estratégia e as táticas usadas por Napoleão. A maioria dos generais europeus e da Guerra Civil copiou os métodos de Napoleão que resultaram em vários sucessos. Wellington disse: “Eu costumava dizer dele (Napoleão) que a sua presen-ça em campo fazia a diferenpresen-ça de 40.000 homens” .

Mesmo nos anos de derrota, Napoleão provou ser um comandante hábil, imagina-tivo e imprevisível. “Seus inimigos não podiam competir com suas habilidades pessoais, nem com as de seus exércitos. Suas vitórias deveram-se mais à superioridade numérica, do que ao talento de seus impressionantes generais.” (-Loraine Petre). O sucesso no cam-po e o saber acam-poiar uma facção cam-política, bem no momento certo, o levaram ao generalato com apenas 24 anos de idade e ao comando do Exército da Itália, com 26.

Poucos comandantes, antes dele ou desde então, lutaram guerras e batalhas sob as mais variadas condições de clima, terreno e condições meteorológicas, e contra uma maior variedade de inimigos do que o Imperador francês. Seu entendimento sobre a guer-ra em massa e seu sucesso em criar, organizar e equipar exércitos massivos revolucionou a conduta da guerra e marcou a origem da guerra moderna... O General Sir Archibald P. Wavell escreveu: “se você descobrir como... [Bonaparte] inspirou um exército de maltra-pilhos, amotinados e famintos, e os fez lutar como eles o fizeram, e como ele dominou e controlou generais mais velhos e mais experientes do que ele, você, então, terá aprendido alguma coisa.” Desde 1796, quando Bonaparte assumiu seu primeiro comando militar independente, até 1809, Napoleão exibiu um surpreendente halo de invencibilidade em batalha e uma igualmente espantosa capacidade de usar esse sucesso do campo de bata-lha para obrigar os seus inimigos a conceder-lhe seus objetivos políticos. Um deslumbrado Clausewitz tinha boa razão por chamar Napoleão de “Deus da guerra”.

John Elting, Coronel do Exército dos EUA, perguntou por que, nesta época de ar-mas nucleares e mísseis guiados, deveria o aluno de assuntos militares estar preocupado com as campanhas de Napoleão? Uma resposta simples seria: para o fundo histórico ou profissional. Mas há mais razões mais imperiosas. ... Gigantescas operações de enormes forças, tais como as que foram realizadas na Segunda Guerra Mundial, já não são

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viá-veis. A dispersão das forças e de suas instalações logísticas passou a ser essencial para se evitar acidentes terríveis e a destruição em massa. ... O sucesso total em operações militares terrestres será um dependente dos sucessos táticos das unidades básicas, in-dividualmente agregadas, ainda que operem, virtualmente, independentes. Tais unidades básicas devem ter tamanho moderado, serem altamente móveis, compactas e poderosa-mente armadas, e, ainda, auto-sustentáveis e bravapoderosa-mente conduzidas — precisapoderosa-mente os atributos que caracterizaram uma típica força napoleônica.

Napoleão foi um dos principais defensores da guerra móvel, do tipo que é necessá-ria em uma época de possível guerra nuclear. Não importa se as armas nucleares sejam ou não usadas, mas a mera ameaça representada pela sua existência dita uma consequente reorganização das forças e modificação de suas táticas. Não há nenhuma garantia de que os conselhos de Napoleão sejam adotados literalmente; “é o princípio de que, quando os raios estão disponíveis, eles devem ser usados no lugar do canhão de guerra.”... A condu-ta da guerra é uma arte baseada em conceitos fundamencondu-tais eternos que permaneceram válidos, independentemente dos meios prevalecentes e dos métodos de combate.

Além disso, embora as armas e as táticas tenham mudado continuamente, em sin-tonia com o progresso tecnológico, o elemento controlador básico da guerra — o homem — permaneceu relativamente constante... O imperador sugeria que, primeiro, deve-se procurar memorizar todos os detalhes das campanhas de grandes capitães de guerras passadas (Alexandre, Aníbal, Cesar, Gustavo, Turenne e Frederico, o Grande). Não há duas batalhas ou campanhas exatamente semelhantes. Muitos fatores flutuantes exercem suas influências: tempo e terreno, condições táticas, armas, meios de transporte, treina-mento, moral e liderança. A natureza específica de todos esses fatores é pertinente em um estudo militar, mas o assunto de suma importância é a habilidade com que o líder exercita os meios disponíveis e explora a vitória, ou, inversamente, como através de inépcia, do jul-gamento pobre ou de outras deficiências e de oportunidades perdidas chega-se à derrota.

“Ninguém deve imaginar que os chefes são iguais nos exércitos.

Os generais ofensivos são raros entre nós; eu conheço muito poucos, e, no entanto, é apenas a estes ... que um destacamento pode ser

confiado “ — Frederico, o Grande.

CAPÍTULO 2

AS ESTRATÉGIAS DE NAPOLEÃO

“ Existem na Europa muitos bons generais,

mas eles vêem muitas coisas ao mesmo tempo.” — Napoleão

Nos séculos XVI e XVII e, também, grande parte do XVIII, a conduta da guerra era bastante formal e estilizada. A guerra limitada por objetivos também limitados era a regra. A guerra era “o esporte dos reis”, cuidadosamente calculado e projetado para garantir ganhos relativamente modestos, e a custos mínimos. Os exércitos haviam adquirido trens logísticos longos e desajeitados. A arte das fortificações crescera a níveis notáveis, resul-tando na proliferação de lugares fortificados para a defesa e para a proteção das linhas de abastecimento vulneráveis, e na necessidade de arrastar as armas para a realização de cercos pesados. Os exércitos, no entanto, eram pouco hábeis, necessitando de longos anos de treinamento e de uma meticulosa e cara manutenção em proveito do seu

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desen-volvimento.

Jogadas estratégicas eram incomuns. Os cercos haviam se tornado a norma. “Wa-shington, Marlborough, Príncipe Eugene, e Frederico, o Grande da Prússia, todos sabiam realizar uma batalha quando fosse necessário. Mas mesmo estes comandantes, excep-cionalmente capazes, fizeram pouco, relativa e raramente.” (Loraine Petre).

“Ao nível da estratégia, Napoleão não tinha nenhum competidor de relevo

contem-porâneo. Para fazer uso máximo de uma mobilidade superior e dar motivação aos seus exércitos, ele desenvolveu dois sistemas principais estratégicos. Quando enfrentava um inimigo em superioridade numérica, a ‘estratégia da posição central’era empregada para dividir o inimigo em partes separadas, a fim de que cada uma delas pudesse ser elimina-da, cada uma por vez, fazendo uso de uma manobra hábil, para que os franceses ganhas-sem uma superioridade numérica local em ações sucessivas, e ganhas-sempre manobrando a reserva nos momentos e lugares críticos. ... Inversamente, quando o inimigo era numeri-camente inferior aos franceses, Napoleão, frequentemente, empregava uma ‘manobra de envolvimento’ - fixando a atenção do inimigo com um destacamento, enquanto o grosso do exército atacava as linhas hostis de comunicações para romper as ligações do inimigo com suas bases. ... Em determinadas ocasiões, Napoleão fundia as características destas duas estratégias clássicas.” (Chandler - “Dicionário das guerras napoleônicas”).

Antes de cada campanha Napoleão considerava todas as opções (linhas de ação) possíveis. O Imperador escreveu: “não há nenhum homem mais pusilânime do que eu, quando estou a planejar uma campanha. Eu, propositadamente, exagero todos os peri-gos e todas as calamidades que as circunstâncias possam tornar possíveis. Fico em um estado completamente doloroso de agitação. Isso, no entanto, não me impede de olhar, muito sereno, em frente da minha comitiva; eu fico como uma garota solteira trabalhando com uma criança”.

Nos meses e semanas anteriores às operações ele já dava início à coleta de infor-mações. Além de ler um grande número e variedade de livros sobre o inimigo e o Teatro de Guerra, ele estudava copiosos volumes de relatórios de Inteligência encaminhados pelos agentes que ele tinha espalhado por toda a Europa. Ele, em paralelo, prosseguia no estudo da história política do país considerado, a situação das suas contas, o estado das estradas e pontes, os relatórios sobre os políticos e generais e, até mesmo, estudava os padrões locais de estocagem de alimentos e sua distribuição.

Napoleão usava 5 princípios simples para guiar o desenvolvimento de seus planos operacionais projetados, para acelerar a realização da vitória:

1º) O principal objetivo é a destruição dos exércitos do inimigo (ou seu exército principal) que, uma vez atingido, torna todos os demais problemas de fácil resolução. Se o inimigo não quiser arriscar uma batalha, ele pode ser forçado a realizá-la, ameaçando a sua cidade capital.

2º) Todas as forças devem se concentrar na tarefa de alcançar o objetivo.

3º) As operações devem ser projetadas para surpreender e confundir o inimigo. Sempre, deverá ser buscada a iniciativa, para impor a sua vontade sobre o inimigo.

4º) Todo esforço deve ser desenvolvido para render um inimigo indefeso através da separação de suas linhas de abastecimento, comunicações e retirada. O movimento favorito deverá compreender o envolvimento de um dos flancos do exército do inimigo e ameaçar sua retaguarda e suas linhas de comunicações, forçando-o ou a retrair, apressa-damente, ou voltar e lutar em desvantagem.

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evitar a surpresa.

As táticas do exército de Napoleão resultaram de um casamento forçado do Exérci-to Real com a improvisação da Guerra Revolucionária. Em suas batalhas, assim como em suas campanhas, Napoleão dependia da velocidade, da massa e da manobra agressiva: normalmente ele atacava uma ala de um exército hostil, de preferência aquela mais perto de suas comunicações. Apenas em Austerlitz ele realmente foi obrigado a ficar na defen-siva a fim de atrair seus inimigos para uma armadilha.

Seu exército deslocava-se com seus diferentes corpos dentro de uma distância de reforço mutuo. Na vanguarda seguia uma cortina de provida pela cavalaria ligeira, com a missão de cobrir o avanço do exército e localizar e estabelecer o contato com o inimigo. Dragões ou lanceiros poderiam endurecer tal cortina. Depois que o contato com o nimigo fosse estabelecido, a guarda avançada aproveitava a posição mais favorável disponí-vel, esforçando-se para fixar o inimigo e para formar um pivô de manobra para o exército na parte traseira. En-quanto a guarda avançada se desgastava, as unidades frescas entravam em ação nos flancos. Atrás da infanta-ria leve, a artilhainfanta-ria leve movia-se agressivamente para a frente e, então, a verdadeira luta começava.

Nos deslocamentos do exército, Napoleão cos-tumava dar preferência à chamada formação “bataillon carré” (batalhões em quadrados). Havia várias combina-ções desta formação. A cavalaria ligeira seguia à frente, identificava e localizava o inimgo e, então, reportava de volta para o Quartel-General (QG), para Napoleão ou seu Che-fe-de-Estado-Maior as posições das tropas inimigas. Tão logo o Imperador as plotasse no mapa, ele ordenava que um ou ambos seus comandantes de ala engajassem a força inimiga mais próxima. A reserva era constituída da cavalaria pesada e de Guarda Imperial. Todas as tropas marchavam dentro de uma sistância de apoio mútuo. As alas consistiam de um ou dois Corpos de Exército (CEx) cada.

Estratégias favoritas de Napoleão. - Estratégia da Aproximação Indireta; e - Estratégia da Posição Central.

Antes de se prosseguir e abordar as duas estratégias preferidas de Napoleão, vale a apresentação de considerações a respeito das escola sobre asestratégias ditas “estra-tégias militares dominantes”

Dos pensamentos de Clausewitz, que viveu alguns anos na Rússia imperial, onde teve uma cátedra de professor em ciência política e estratégia, Lenine extraiu o seu con-ceito de guerra permanente. Parafraseando Clausewitz, Lenine escreveu sua célebre fra-se de que “a política é a continuação da guerra por outros meios”. Como o próprio Clau-sewitz previra, no futuro haveria, além da estratégia militar, estratégias correspondentes aos campos de generalização do conflito bélico-político, econômico, social e outros. No pensamento militar moderno predominam três escolas principais sobre a estratégia:

=> estratégia de ação direta; => estratégia de ação indireta; e

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=> estratégia de dissuasão.

Cada uma dessas escolas tem o seu pensador principal. Clausewitz é o preconi-zador da primeira, Liddell Hart, da segunda, e o general Beauffre, da terceira. Tendo em vista o objetivo deste trabalho, abordaremos, tão somente as estratégias de ação direta e de ação indireta.

ESTRATEGIA DE AÇÃO DIRETA

O principal mérito de Carl von Clausewitz, nos 40 anos em que serviu em vários exércitos e em várias guerras, de 1792 a 1831, foi o de participar e de meditar sobre as duas guerras que marcaram o “timing point” da estratégia militar - as guerras da Revolu-ção Francesa, que finalizaram com o surgimento do império napoleónico e as guerras do império.

Iniciando sua carreira no Exército prussiano, no regimento do príncipe Ferdinando, aos 12 anos, no posto de suboficial (gefreiter corporal), não conheceu, até morrer como general em 1831, outra profissão senão a militar. Em 1801, admitido na Escola Geral de Guerra, foi aluno, comandado e devotado admirador de Gerhard ]ohann Scharnhorst, o famoso reformador, chefe do Estado-Maior e organizador do Exército prussiano. Em 1811 Clausewitz pós seus serviços à disposição do império russo em luta contra a desastrada invasão napoleónica. Antes, havia servido no Exército austríaco.

Quando na Escola Geral de Guerra, sob a orientação do general Schnarnhorst, Clausewitz familiarizou-se com as principais obras sobre estratégia militar de sua época; estudava-se, então, em particular, as teorias e as campanhas militares de Frederico II da Prússia e as chamadas guerras da Revolução, as que precederam e que sucederam a queda da monarquia francesa até a campanha napoleónica na Itália.

Durante sua estada na Rússia, servindo no Exército do czar Alexandre, participou da luta contra a invasão das tropas napoleónicas (1811-1812). Regressando da Rússia, Clausewitz voltou ao Exército prussiano, servindo sob as ordens do general Blücher, quan-do participou das campanhas de 1813, 1814 e 1815. Com o Exército de Blücher participou da Batalha de Waterloo, quando Napoleão foi derrotado pelos exércitos inglês e prussiano. Após Waterloo, começou, para Clausewitz, a época da meditação. Colocou sua es-pada na bainha. Em 1818 foi nomeado diretor da Escola Geral de Guerra. No ano seguinte foi promovido a general. Permaneceu na direção dessa escola até sua morte, em 1831. Durante esse período de estudo e meditação, escreveu sua obra principal, Vom Kriege (Da guerra), que haveria de imortalizá-lo como pensador militar.

Vom Kriege, lançado em 1832, um ano após sua morte, por sua viúva, Marie von Clausewitz, é, hoje, um dos principais clássicos da estratégia militar.

Contemporaneamente, o maior analista de Clausewitz foi o recém-falecido soció-logo francês Raymond Aron. Compara Aron a projeção de Vom Kriege com a Guerra do Peloponeso, escrita por Tucídides.

Dois temas principais tornaram Vom Kriege famosa. O tema político-filosófico que oferece uma nova interpretação do fenômeno da guerra. Há autores que tentam encontrar, em Maquiavel, a origem do pensamento político de Clausewitz sobre a guerra. Lembram esses autores que Maquiavel, em O príncipe, 300 anos antes, havia escrito invocando as mesmas críticas à guerra de então, que compuseram o pensamento político-militar do autor de Da guerra; Maquiavel criticava os exércitos mercenários, a mediocridade dos co-nhecimentos dos generais sobre o emprego de suas forças na batalha e a falta de espírito combatente das tropas.

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Todas estas críticas, antecipadas pela genialidade do autor de O príncipe, tornaram--se evidentes quando da criação de exércitos nacionais, resultado do conceito de “povo em armas”, oriundo da Revolução Francesa, mostrando à sociedade a obsolescência dos exércitos mercenários, cujos alto custo e interesse pecuniário eram responsáveis pelo seu pequeno efetivo, seu mau emprego e o pouco entusiasmo dos combatentes. Maquiavel criticava os exércitos mercenários, porém não tinha a visão dos exércitos nacionais, do povo em armas, que foi a substância do pensamento de Clausewitz. Em suma, o que Clausewitz captou com precisão na sua obra foi que o conceito de povo em armas deu nova alma aos exércitos, tornou seu recrutamento fácil e, em consequência, seus efetivos maiores; os combatentes lutavam pela pátria e não mais pelo rei e por um salário de mer-cenário. Esta nova força, o exército nacional, foi o instrumento que Napoleão Bonaparte soube manejar de maneira invencível, por um quarto de século. Alterou o conceito poiítico, moral e operacional da guerra. Clausewitz recolheu estas lições e as traduziu na obra Vom Kriege.

O pensamento político de Clausewitz sobre a guerra pode ser resumido na sua cé-lebre frase -”A guerra é a continuação da política por outros meios”.

Nesta frase o autor de Vom Kriege conceitua a permanência da política e a transito-riedade da guerra, um meio utilizado pela política, “um ato de violência para obrigar nosso

oponente a submeter-se à nossa vontade”.

Estudando Clausewitz, o líder revolucionário soviético Lenine resolveu se utilizar da frase do escritor prussiano e dar-lhe uma nova versão revolucionária, dizendo: “A política

é a continuação da guerra por outros meios”. Nessa inversão, Lenine retira da doutrina

marxista o conceito filosófico sociológico da revolução permanente, da luta permanente e, por aproximação, da guerra permanente.

Mas, passemos aos ensinamentos de Clausewitz no campo da estratégia militar. Procurou-se extrair das campanhas napoleônicas os princípios e a conduta estratégica.

Alguns trechos de Vom Kriege, uma obra profunda, rica em descobrimentos inter-pretativos, sintetizam os grandes traços da estratégia militar do seu autor.

Diz Clausewitz:

A destruição da força militar do inimigo é o principal princípio de guerra e o caminho direto para atingir o objetivo da guerra. Esta destruição da força militar do inimigo deve ser executada, essencialmente, por meio da batalha. Somente grandes batalhas podem traduzir grandes resultados. Os resultados serão mais efetivos quando a decisão puder ser obtida através de uma única e grande batalha.

Somente uma grande batalha comandada diretamente pelo general em chefe inspi-rará maior confiança no chefe e nos seus subordinados.

Extrai-se, desses conceitos, que o princípio fundamental da estratégia militar

de Clausewitz é a destruição da força militar do inimigo. A conduta estratégica ideal

é a busca do centro de gravidade de suas forças e, numa só e única batalha decisiva, destruí-Ias.

Diz o autor que o princípio de destruição pode ser procurado por outros meios, havendo, em circunstancias favoráveis, interesse em destruir forças secundárias do ini-migo quando causem efeitos desproporcionalmente grandes para o êxito das operações, particularmente quando se trata de se travar uma batalha pela conquista de objetivos geográficos em posições-chave.

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Destaca o autor prussiano a importância da manobra, da capacidade de concen-tração rápida, das fintas de diversão sobre o inimigo para obter a surpresa e aplicar, com a maioria das forças, o golpe decisivo sobre o centro da gravidade do dispositivo inimigo.

Em sua obra, diz o escritor militar prussiano:

A destruição das forças militares do inimigo é, na realidade, o objetivo de todos os combates; mas outros objetivos devem ser considerados, e estes objetivos podem, algu-mas vezes, ser predominantes; devemos, deveras, levar em conta uma distinção entre aqueles objetivos em que a destruição das forças militares do inimigo é principal daqueles em que esta é uma aspiração futura. A destruição da força Inimiga, a conquista de uma posição ou a conquista de alguns objetivos podem ser o motivo principal para a batalha e, em alguns casos, pode-se considerar, apenas, a conquista de um desses objetivos, ou de vários juntos, a principal razão para a batalha.

Na conceituação acima, Ciausewitz procura não perder de vista que, mesmo haven-do necessidade de travar batalhas para a conquista de objetivos secundários, a mente haven-do comandante em chefe não deve se afastar da meta de atacar o objetivo principal, o centro de gravidade do dispositivo inimigo, visando à destruição de suas forças.

Antes da sua obra clássica, Vom Kriege, Clausewitz, aos 24 anos de idade, escre-veu um livro de reconhecido valor profissional, “A estratégia de 1804”, testemunha de seu espírito maduro e seus já sólidos conhecimentos da arte militar. É interessante observar--se que, nessa obra, antecipa a discussão que haveria de inspirar toda a sua produção intelectual posterior: a da relação entre a politica e a guerra. Sem dúvida, dois estamentos do pensamento de Clausewitz trouxeram sua presença viva, ao pensamento político e es-tratégico da atualidade: sua concepção de batalha decisiva pela ação direta buscando a destruição das forças militares do inimigo e o seu conceito de que “a guerra é a política

conduzida por meios violentos”.

Sua concepção de ação direta, hoje com novas roupagens, revive plena na estraté-gia de guerra nuclear. Seu conceito colocando a política e a guerra num mesmo contexto, com o domínio da primeira sobre a segunda, que apaixonou o pensamento de Lenine, que nele buscou uma justificativa para a sua idéia de revolução permanente, irradiou-se pelas academias e institutos de todo o mundo.

Na atualidade, em face da extensão e das projeções dramáticas da guerra nuclear, tornou-se fato inquestionável que o domínio da guerra deverá caber ao poder político.

É interessante observar-se que esta predominância do político sobre o militar, na concepção e em particular durante os conflitos armados, foi questão polémica por ocasião da I Grande Guerra, caracterizada principalmente nos desentendimentos entre o presiden-te Clemenceau e o general Joffre. Atribui-se a Clemenceau a expressão “A guerra

tornou--se assunto muito grave para ser tratado somente pelos militares”. O general Joffre teria

respondido: “A guerra é assunto muito grave para ser dirigida por civis”. Assistimos aos desdobramentos dessa polémica, no momento mesmo das decisões, durante os conflitos militares da Coreia, entre o presidente Truman e o general MacArthur e durante a Guerra do Vietnã entre o presidente Nixon e o general Westmoreland.

Na era nuclear que estamos vivendo, com a dimensão total da guerra envolvendo a nação ou as alianças como um todo, sacrificando igualmente frentes e retaguarda, não há mais dúvida de que a direção da guerra, as decisões mais altas, deve caber ao poder político.

No tocante à guerra nuclear, seu maior teórico, o general Beauffre, considera que ”a

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Reitera sua tese sobre a importância da destruição das forças inimigas, colocan-do-a como principal objetivo da estratégia ofensiva ou defensiva. A fixação do espírito de Clausewitz no objetivo principal de destruir a força principal do inimigo pela batalha deu--lhe o título de patrono da tese conhecida por estratégia de ação direta, contra a qual se contrapõem os teóricos da tese da estratégia de ação indireta.

Cabe, aqui, repetirmos o general Beauffre, quando diz:

A dissuasão nuclear, paralisando o conflito bélico, deixa uma margem muito estreita para a ação estratégica: aquela que é aproveitada pela estratégia soviética sobre a comu-nidade mundial. A ação política e econômica, a atualização de movimentos revolucionários e mesmo conflitos locais procuram escapar à paralisia imposta pela dissuasão nuclear.

ESTRATÉGIA DE AÇÀO INDIRETA

Para o general Beauffre (“lntrodllction a ia stratégie”), a estratégia de ação indireta representa, hoje, uma diversão bélica que substitui a guerra total, tornada impraticável desde o aparecimento da arma nuclear. Diz o mesmo autor que “a estratégia de ação indi-reta é o complemento e, de certa forma, o antídoto da estratégia nuclear”.

O coronel Guy Doly (Strategic France Europe) procura fazer uma distinção entre a estratégia de ação indireta e a chamada estratégia de aproximação indireta, tantas vezes referida por Liddell Hart. A primeira, de ação indireta, seria a antiquíssima estratégia do es-critor militar chinês Sun Tzu, de busca da vitória puramente pela surpresa, pelas manobras diversionárias, visando à desagregação psicológica, evitando o choque, ou a batalha com as forças principais do inimigo. A segunda, de aproximação indireta, utiliza-se preponde-rantemente da manobra, da surpresa, da diversão, mas não exclui a ideia subjacente da busca da decisão pela batalha.

Esses pensamentos de clássicos da estratégia militar nos levam a considerar que, em termos de objetivo militar, a principal diferença entre os conceitos de estratégia de

ação direta de Clausewitz e de ação ou de aproximação indireta consiste em que a primeira busca a destruição e a segunda, a submissão das forças inimigas. Na

estra-tégia de destruição predomina a batalha; na de submissão predomina a manobra.

Estendendo-nos um pouco mais sobre a concepção da estratégia de ação indireta, que teve como primeiro teórico o chinês Sun Tzu e como seguidores contemporâneos Mao Tsé-tung e Giap, veremos que esta também se difere da teoria de aproximação indireta de Liddell Hart, particularmente pelas razões descritas a seguir:

=> Sun Tzu confia mais na desagregação moral do inimigo do que na sua desar-ticulação tática e estratégica por força de ações de surpresa, manobras diversionárias, envolvimento de flancos e retaguarda. Em consequência, a estratégia do escritor militar chinês não leva em conta o fator tempo; sua manobra é prolongada, â espera dos efeitos de desagregação psicológica e moral do adversário.

=> Liddell Hart não abandona, completamente, a idéia de Clausewitz de concluir a ação estratégica através de uma batalha. O que pretende, no fundo de sua concepção, é travar a batalha contra um inimigo enfraquecido.

Inicialmente, vamos apresentar as ideias do pai da estratégia da ação indireta, o es-critor militar chinês Sun Tzu, que viveu no século V a.c. Depois, voltaremos aos conceitos de LiddeIl Hart, que absorveu a essência das ideias do estrategista chinês e adaptou-a ao pensamento militar moderno.

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da guerra”, de Sun Tzu, cuja primeira tradução conhecida no Ocidente data de 1772, feita pelo padre jesuíta francês Amiot, missionário em Pequim. A tradução da obra para o francês pelo padre Amiot despertou grande interesse na Europa. Até o fim do século XVIlI apareceram quatro traduções para o idioma russo e uma para o alemão. Em 1910 surgiu a tradução para o inglês de Leonel Giles. Há informações de que Napoleão Bonaparte, na sua juventude de tenente ou capitão, tenha lido a obra de Sun Tzu.

O livro de Sun Tzu é uma obra de meditação e de conceitos muito ao estilo chinês. Começa o autor fazendo considerações sobre a guerra como assunto de importância vital para o Estado. Como tal, a guerra deve ser objeto de profunda análise e planejamento pelos dirigentes do Estado.

Inaugurou, assim, Sun Tzu, há cerca de 2500 anos, a grande polêmica dos nossos dias: a guerra ê da responsabilidade maior dos estadistas ou dos generais?

Nos seus escritos o autor chinês preocupa-se menos com técnicas e táticas opera-cionais para se concentrar num sistema normativo, estabelecendo regras gerais capazes de conduzir as guerras à vitória final. Ele considera o bom estrategista aquele que é capaz de derrotar o exército inimigo sem atacá-lo, de ocupar cidades inimigas sem destruir os seus bens, de ocupar seu território sem necessidade de choques sangrentos.

Sun Tzu defende a tese de que a batalha deve ser vencida muito mais pela manobra do que pejo choque armado. Como vemos, este conceito é antípoda do clássico princípio de Clausewitz, que tanta influência teve no pensamento estratégico militar do Ocidente nos últimos 200 anos.

O autor chinês afirma que a superioridade em efetivos somente não garante a vi-tória militar. Ressalta como fatores importantes: inteligência dos chefes, moral da tropa e as circunstâncias. Procura realçar que o general não deve confiar demasiado na superio-ridade física do poder militar. Sun Tzu não concebe a guerra em termos de carnificina e destruição; prefere a vitória preservando tudo intacto, o mais intacto possível, as forças inimigas e os bens do seu território. Este, diz, o verdadeiro objetivo da estratégia.

Sun Tzu é o pioneiro da crença na importância da informação estratégica e no planejamento nela concebido. Afirma que o planejamento baseado no conhecimento pro-fundo do inimigo contribui, decisivamente, para acelerar a decisão militar. Leva em alta consideração os efeitos da guerra sobre a economia da nação inimiga e faz sábias consi-derações sobre os efeitos morais danosos a que é submetida a nação levada a um conflito bélico prolongado. Essa deterioração moral favorece aquele que tem condições de resistir por mais tempo.

Referindo-se às qualidades de um bom general, o escritor chinês enumera: inteire-za moral, controle emocional e competência profissional, além de capacidade de organiinteire-za- organiza-ção, agilidade manobreira, controle dos subordinados, conhecimento do terreno e aptidão para avaliar as circunstâncias provocadas pelos fenômenos naturais.

Para Sun Tzu o Exército é o instrumento destinado a desferir o golpe sobre o inimigo previamente enfraquecido. Antes das hostilidades militares devem agir os agentes secre-tos destinados a aprofundar os divisionismos ou rivalidades que sempre semeiam as for-ças inimigas e a realizar vários tipos de atividades clandestinas. Entre as missões desses agentes infiltrados o general chinês arrola: boatos falsos, informações desorientadoras, campanha de desmoralização contra chefes e oficiais inimigos acusando-os de corrupção; enfim, todas as artimanhas destinadas a exacerbar a discórdia e a desconfiança nas filei-ras inimigas e desmoralizar suas forças perante sua população.

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profunda e enorme influência no pensamento militar da China e do Japão. Contemporane-amente, através do seu maior discípulo e divulgador, Mao Tsé-tung, as ideias de Sun Tzu vêm tornaram-se cada vez mais conhecidas no Ocidente. Como vimos, os russos, pela via de suas províncias mongólicas e tártaras, vinham recebendo, há vários séculos, a in-fluência do pensamento estratégico chinês; após a revolução bolchevista e a aproximação ideológica da extita União Soviética e da China, as idéias de Sun Tzu, misturadas com o tempero marxista-leninista de Mao Tsé-tung, passaram a ter grande influência no proces-so da revolução mundial comunista. Para fins de aplicação na subversão comunista, que deve preceder a conquista do poder, os soviéticos prepararam um manual de práticas revolucionárias que dominou a estratégia de subversão, na África ou na América Central, conhecida como “a linha de Yenan”.

Após este resumido histórico sobre o estrategista maior da ação indireta, vamos reproduzir aqui algumas de suas concepções mais conhecidas, mas nem sempre corre-tamente citadas.

Somente quando todos os recursos de pressão moral e psicológica estiverem esgo-tados, e o inimigo ainda possa apresentar resistência militar, deve ser usado o recurso de buscar a decisão pelas armas.

Neste caso deve ser procurada a decisão => no mais curto prazo;

=> com o menor custo de vidas e de material; e => infligindo ao inimigo o menor número de perdas.

Geralmente, na guerra, a melhor política é conquistar o país inimigo intacto; destruí--lo é pior. Capturar o Exército inimigo é melhor do que destruídestruí--lo. Obter uma centena de vitórias através de uma centena de batalhas não representa a melhor estratégia; vencer o inimigo sem a necessidade de combater significa a melhor estratégia. A administração de grandes efetivos e materiais pode se tornar tão fácil como a administração de pequenos efetivos e materiais; é uma questão de organização. Geralmente, quem escolhe o campo da batalha leva vantagens; quem chega depois ao campo de batalha e entra em combate leva desvantagens. Por isto, os generais atilados conduzem o inimigo ao campo de bata-lha que escolheram e rejeitam os escolhidos pelo inimigo. Não será oferecendo algumas vantagens ao inimigo que o faremos atuar de acordo com a nossa vontade, mas, sim, fustigando-o incessantemente.

Há estradas que não devem ser utilizadas, tropas que não devem ser atacadas, cidades que não devem ser assaltadas e regiões que não devem ser disputadas. Não há nada mais difícil do que a arte da manobra. O mais difícil na manobra é fazer da direção enganosa a mais direta e transformar esta desvantagem em vantagem. Assim, marche por uma direção indireta, iludindo-o com estratagemas em outras direções. É preciso saber fazer o jogo da aproximação direta e da indireta. Quando transpuser um rio deve ime-diatamente ocupar posições a distância do mesmo. O terreno deve ser classificado de acordo com a sua natureza e seu aproveitamento operacional como acessível, favorável a infiltrações, neutro, fechado, acidentado e distante. Quando a tropa debanda, insubordi-na-se, fracassa, entra em colap¬so, em desordem ou foge, a culpa é do general. Nenhum desses desastres pode ser atribuído a causas naturais. Quando as tropas são valorosas e os oficiais fracos, o resultado é a insubordinação: quando os oficiais são valentes e as tropas fracas, o resultado é o fracasso.

Referências

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