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AS GUERRAS NAPOLEÔNICAS E A GUERRA DE MANOBRA PREÂMBULO

AS GUERRAS NAPOLEÔNICAS E

AS GUERRAS NAPOLEÔNICAS E A GUERRA DE MANOBRA PREÂMBULO

Antes de se passar à discussão da aplicação da Guerra de Manobra às Guerras Napoleônicas (ou melhor, em 3 das mais de 50 campanhas realizadas por Napoleão Bo- naparte), julgou-se pertinente e importante destacar algumas das assertivas embutidas no extenso texto anterior e comentá-las sob a ótica de Napoleão. Senão vejamos:

1. Os atricionistas perseguem a vitória pela tentativa de destruir as forças inimigas no campo, com foco na batalha – o evento tático onde as forças são engajadas e destru- ídas.

=> Ao tempo das Guerras Napoleônicas, o objetivo da guerra não era outro senão a destruição do oponente. Sem sombra de dúvida, Napoleão era um atricionista, pois esta era a verdadeira expressão dotrinária militar vigente à época e em todas as suas cam- panhas, está explicitamente perfeitamente caracterizada a vontade de destruir o inimigo.

2. As características da teoria da atrição incluem uma ênfase na superioridade nu- mérica da força e foco na tecnologia e equipamento.

=> Tais características são adequadas às Guerras Napoleônicas, paticularmente a primeira; como resultante, Napoleão costumava preferenciar duas estratégias inerentes à superioridade numérica: a da “inferioridade de forças de Napoleão” (ou estratégia da Po- sição Central) e a da “superioridade de forças de Napoleão (ou estratégia da aproximação indireta).

3. Militares atricionistas concentram-se nas capacidades de suas forças por ocasião do planejamento militar, identificando e selecionando os alvos inimigos mas dando pouca atenção e consideração às capacidades e possibilidades do inimigo. Dessa maneira, eles tendem a ser deficientes no que se relaciona ao apoio de inteligência, as estimativas da performance do inimigo e as predições de suas intenções. Nas cabeças dos atricionistas o inimigo é inanimado e impossibilitado.

=> Napoleão foi primoroso no planejamento de suas campanhas. A farta literatura existente dá conta que Napoleão costumava passar horas, infatigavelmente debruçado sobre a uma fartura de informações a ele disponibilizadas, particularmente por espiões, re- lativas ao inimigo, condições meteorológicas e do terreno e situação política regional e dos futuros oponentes. Sendo ainda um homem afeto à leitura e particularmente dotado de uma inteligência ímpar, sobretudo no que dizia respeito à matemática e à geografia (desde os bancos escolares), Napoleão ainda buscava conhecer muito bem e principalmente, a personalidade dos comandantes inimigos. Vias de regra, seu planejamento era demorado e meticuloso, até que se sentisse perfeitamente satisfeito com os objetivos selecionados para cada campanha e a linha de ação a ser adotada. Contrariamente ao exposto na assertiva acima, Napoleão valorizava e muito a Inteligência, entendendo-a como fator pre- ponderante e essencial à operação a realizar, haja visto a extensiva utilização de espiões.

4. Em contraste com a guerra de atrito, a guerra de manobra intenta destruir a coe- são da força inimiga, afetando sua estabilidade mental, moral e física. Transformar idéias em ações rápidas (velocidade) e em um ritmo (aceleração) que gere paralisia nos níveis

decisórios do inimigo. Uma das características da guerra de manobra é a descentraliza- ção. Para uma força atuar de forma descentralizada, ela deve ser flexível, isto é, ser capaz de rapidamente se adaptar ao ambiente fluido do combate. A rapidez e a velocidade das decisões e ações no tempo e espaço (Manobra), dentro de uma ambiência de grande iniciativa e confiança (Moral), serão os fatores que gerarão a sinergia que assegurará a agilidade dos ciclos decisórios, impondo um ritmo que irá degradar a capacidade sistêmi- ca, moral e mental do inimigo para lidar com o aparente caos reinante.

=> Napoleão foi inovador de certas características que marcaram os seus exércitos. Ele fez com que seu exército aprendesse a “viver com a terra”, assim desobrigando-o de marchar no compasso de um pesado e lento trem logístico, normalmente dependente da tração de vagões de carga puxados por bois, o que agilizou a marcha da tropa combatente. Por outro lado, ele também criou os “Corpos de Exército” o que lhe possibilitou descentrali- zar o comando, marchar por vias paralelas mas concorrentes, servindo-se do apoio mútuo e, ao final, concentrar sua força para sobrepujar o inimigo como, onde e quando ele julgas- se adequado. Mas a combinação destes aspectos garantiu-lhe velocidade e flexibilidade que, em síntese, são os componentes da manobra. No que diz respeito à Moral,Napoleão sempre entendeu a importância do seu soldado, sua peça fundamental para o combate. Suas alocuções anteriores aos combates dão prova do quanto ele valorizava o homem cujo valor e virtude ele normalmente enaltecia; também é prova de tal sentimento, suas “andanças” ao derredor dos bivaques que, vias de regra, terminavam com o grito comum das tropas de “Vive l’empereur”que, segundo alguns autores, era ouvido pelo oponente no campo de batalha, gerando-lhe o temor.

5. O sucesso da implementação da guerra de manobra é dependente do nível de confiança existente em toda a cadeia e estrutura de comando, da liderança e da habi- lidade e competência dos oficiais em vislumbrar soluções criativas para os problemas. Indubi-tavelmente, é necessário uma forte tradição militar, espírito de corpo arraigado e uma educação esmerada na arte militar para aqueles que optam pela guerra de manobra como estilo de combate.

=> Ainda que Napoleão mantivesse seus marechais “a rédea curta”, com raríssimas exceções, o Imperador confiava sem seus grandes comandantes, pois considerava-os hábeis e competentes a ponto de terem sido distinguidos com o famoso ”bastão de ma- rechal” Essa simbiose entre comandante e comandados era a “piece de résistance” das forças de Napoleão e parâmetro mediático para a realização da manobra, sob a ótica em pauta.

6. No nível tático, ao atribuir a tarefa pelo efeito desejado, ou seja, dizer “o que fazer” sem detalhar o “como fazer”, cria-se uma atmosfera de responsabilidade comparti- lhada e coesão pois aumenta-se a proximidade e número de figuras de autoridade, bem como o respeito subjetivo do subordinado em relação à autoridade. É fato, também, que a compreensão dos efeitos desejados dois escalões acima fornece o amálgama que resul- tará em uma convergência de esforços inimaginável.Nesse nível de condução, sobressai a liderança como requisito fundamental para a implementação da guerra de manobra e ficam validadas as mudanças na educação, instrução e adestramento

=> Como consequência da anotação anterior, esse grau de confiança que Napoleão depositava em seus comandantes garantia que a atribuição de tarefas fosse feita pelo efeito desejado, na certeza de que aquilo que fosse implementado em razão do exame de

situação individualizado de cada comandnate, certamente concorreria para o propósito de Napoleão (o efeito desejado maior de uma determinada campanha).

7. A capacidade de engendrar e moldar eventos que favoreçam os interesses do Estado está diretamente relacionada ao entendimento do que seja guerra de manobra no nível político e neste domínio não há limites para a criatividade. Em tempos passados, uma ferramenta dessa arte foi a “política das canhoneiras”. Hoje, à luz dos construtos te- óricos existentes, tal ferramenta é conhecida como dissuasão.

=> Napoleão era mestre nisto. Sua longa experiência combativa de sucessos repe- tidos dotaram o exército napoleônico de uma “fama aguerida aterrorizadora”, que gerou o que hoje chamamos de dissuassão.

8. O exercício da arte na condução do nível operacional se manifesta na correta identificação do(s) Centro(s) de Gravidade do inimigo, centro de seu poder e movimento; nas capacidades críticas que sustentam o CG; na criação e moldagem dos engajamento táticos, batalhas e operações, buscando a geração de oportunidades e transformando capacidades críticas em vulnerabilidades críticas a serem atacadas; cuja seqüência deve ser ordenada e sincronizada dentro dos fatores espaço, tempo e ritmo e convergentes em esforço; condicionadas aos recursos e limitações impostas pela política e com emprego da surpresa de forma a gerar paralisia e incapacidade do CG visualizado, possibilitando alcançar os objetivos operacionais estabelecidos.

=> Ainda que o conceito de Centro de Gravidade (CG) definido por Clausewitz — “[...] um centro de poder e de movimento, de que tudo depende [...] e é contra esse centro de gravidade do inimigo que se deve desferir o golpe concentrado de todas as forças.” — seja posterior à era napoleônica, Napoleão, em sues planejamentos sempre buscava identificá-lo e aplcar sua força militar contra ele. As estratégia da aproximação indireita e da posição central foram instrumentos mediáticos para tal consecução.

Vejamos, então, três campanhas selecionadas que exploram o assunto A CAMPANHA DE ULM-AUSTERLITZ, 1805

(A MANOBRA FRANCESA SUPERA A INTELIGÊNCIA AUSTRO/RUSSA)

A guerra de manobra exige a mautenção do foco sobre o inimigo. O seu objetivo é evitar pontos fortes do inimigo e explorar a sua fraqueza. Uma manobra rápida foi a pedra angular para as táticas durante as guerras napoleônicas, um elemento-chave na derrota de seus inimigos. As funções básicas da guerra de manobra, comando e controle (em apoio à manobra), e inteligência desempenharam papéis fundamentais no seu sucesso durante a campanha de Ulm/Austerlitz, em 1805. A velocidade com que Napoleão mano- brou seu exército, juntamente com um comando e controle “sob rédea curta”e a falta de Ineligência de seu inimigo (percepção situacional), produziram duas vitórias notáveis e impressionantes.

Desde 1803, Napoleão estava se preparando perto de Boulogne sobre o Canal Inglês para o que parecia ser uma invasão da Grã-Bretanha. Embora ele tivesse aban- donado o plano de invasão, ele continuou a ali treinar como se aquilo fosse uma certeza. Espiões franceses apreenderam de um plano realizado pela Terceira Coalition (Áustria, Grã-Bretanha e Rússia) a intenção dela unir forças, avançar a partir de Ulm para o Reno,

e vincular a frente sul alemã à frente com o Norte de Itália. Napoleão continuou a desfilar seus soldados ao longo da costa do Canal e, então, para surpresa de todos, em 25 de agosto de 1805 ordenou a seu exército para marchar para a Europa Central. O despista- mento de Napoleão manteve a atenção britânica voltada para suas próprias costas e con- fundiu os austríacos sobre as suas verdadeiras intenções.Napoleão, pessoalmente, per- maneceu em Boulogne até 3 de setembro, quando ele voltou para Paris. Seu itinerário foi amplamente conhecido, mas a localização real de seu Exército permaneceu em segredo.

Campanha de Ulm-Austerlitz - O Plano da 3ª Coalizão (Estrategia)