PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Roberto Nussinkis Mac Cracken
ARBITRAGEM NO INVESTIMENTO ESTRANGEIRO – SEGURANÇA
JURÍDICA
DOUTORADO EM DIREITO
São Paulo
Roberto Nussinkis Mac Cracken
ARBITRAGEM NO INVESTIMENTO ESTRANGEIRO – SEGURANÇA
JURÍDICA
Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Doutor em Direito, sob a orientação do Professor Doutor Claudio Finkelstein.
SÃO PAULO
Roberto Nussinkis Mac Cracken
ARBITRAGEM NO INVESTIMENTO ESTRANGEIRO – SEGURANÇA
JURÍDICA
Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Doutor em Direito, sob a orientação do Professor Doutor Claudio Finkelstein.
BANCA EXAMINADORA
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Prof. Dr. Claudio Finkelstein (Orientador)
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À minha mãe, Manha, e ao meu
saudoso pai, Sylvio, que, com muito
esforço, paciência e dedicação,
souberam transmitir os melhores
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador, Professor Doutor Livre-Docente Claudio Finkelstein,
brilhante advogado, alentado educador, pessoa de destacada formação
humanística, um dos maiores conhecedores do instituto da arbitragem, por acreditar
na minha tese e na minha capacidade de defendê-la, e pela constante disposição e
paciência.
Aos Professores Doutores Armando Rovai, que passou de meu aluno a
ilustre mestre, e Antônio Márcio Guimarães, destacado e dedicado mestre, pelos
comentários, no exame de qualificação, que me levaram a aperfeiçoar esta tese.
Aos meus colegas de gabinete, por toda a credibilidade e compreensão
durante o desenvolvimento deste trabalho, principalmente aos meus assessores
Marcelo Luís Ferraro, Pedro Gustavo Pimentel, Cristiano Donizeti Ranzani, Ricardo
Toshiake Thihara, Lucas de Abreu Evangelinos e Rodrigo Franco Soares, por toda a
ajuda e diálogos.
À jovem Luísa Quintão, pelas valiosas discussões e disposição.
Ao Professor Cláudio Lembo, com quem tive o destacado privilégio de
conviver por longo período e, especialmente, apreender os melhores valores
profissionais e pessoais.
Aos meus Colegas da Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, Gastão
Toledo de Campos Mello Filho, Manuel Matheus Fontes, Thiers Fernandes Lobo,
Sérgio Rui da Fonseca e Hélio Nogueira, detentores de indiscutível brilho do mais
alto saber jurídico, independência e senso de justiça, o meu agradecimento pelo
apoio e destacada paciência.
Ao meu saudoso pai, Sylvio, exemplo de simplicidade, solidariedade e plena
dedicação à família, que esteve e continua sempre ao meu lado.
À minha mãe, Manha, exemplo de luta e dignidade, que me deu a vida, além
de me proporcionar ao longo desta todas as possibilidades que abriram caminhos
À minha querida Ligia, leal e dedicada companheira, por razões incontáveis,
impossíveis de serem enumeradas, mas, principalmente, pelo imenso amor e
enorme carinho.
Aos meus amados e queridos Gustavo, Bárbara e Beatriz, pela beleza da
A lição é a seguinte: nunca desista,
nunca, nunca, nunca. Em nada.
Grande ou pequeno, importante ou
não. Nunca desista. Nunca se
renda à força, nunca se renda ao
poder aparentemente esmagador
do inimigo.
RESUMO
A arbitragem é uma forma de solução de conflitos que nasce da vontade de
particulares, com capacidade civil plena, que preferem que a pacificação de sua
contenda seja realizada por outro particular, por eles eleitos, de modo a afastar a
burocracia fixada pela jurisdição estatal.
A sua criação, segundo a doutrina, decorre de tempos remotos, inclusive com sua
aplicação na Roma antiga.
Serão abordados neste trabalho desdobramentos relacionados à arbitragem,
especificamente no plano nacional, no que se refere à ampliação de sua utilização,
visando atrair novos investimentos, com a adequada segurança jurídica, bem como
sua materialização por meio de um instrumento contratual.
Analisar-se-ão, também, a extensão dos efeitos da arbitragem e sua forma de
vinculação, o procedimento arbitral estabelecido pela legislação ordinária, bem como
sua aplicação como forma de “meio alternativo” de solução de conflitos nas relações
internacionais.
O principal objetivo da presente tese, em síntese, é demonstrar as vantagens que a
arbitragem pode trazer, traduzindo-se em efetivos benefícios, que serão detalhados
no transcorrer deste estudo, demonstrando um melhor patamar de segurança
jurídica e, em consequência, maior e melhor possibilidade de investimentos
estrangeiros.
ABSTRACT
Arbitration is a dispute resolution method resulting from the will of the parties with full
civil capability that rather settle their conflict by submitting it to another private
individual, elected by them, so they can avoid the bureaucracy established by the
State courts.
Its creation, according to the doctrine, stems from ancient times, including its
application in ancient Rome.
This work will address all developments related to arbitration, more specifically in a
national dimension with regards to the increasing use of arbitration. It aims at
drawing new investments with the appropriate legal certainty, as well as at its
materialization through a contractual instrument.
It will also be analyzed the extent of the arbitration effects and its binding manner, the
arbitration procedure established by ordinary legislation, and its application as an
"alternative means" of dispute resolution in international relations.
In brief, the main purpose of this thesis is to demonstrate the advantages that
arbitration may bring, which can be translated into effective benefits that will be
specifically analyzed in this study, in a way that may demonstrate a higher level of
legal certainty and, consequently, a greater and better possibility of foreign
investments.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ... 12
1 FORMAS NÃO JURISDICIONAIS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS ... 18
1.1 A arbitragem como forma não jurisdicional de solução de conflitos ... 26
1.1.1 Conceito ... 26
1.1.2 Evolução histórica da arbitragem ... 30
1.1.3 Desdobramentos e Classificação da Arbitragem ... 31
1.1.3.1 Arbitragem facultativa e arbitragem obrigatória ... 34
1.1.3.2 Arbitragem formal e informal ... 35
1.1.3.3 Arbitragem de direito e de equidade ... 36
1.1.3.4 Arbitragem ad hoc e institucional ... 37
1.1.3.5 Arbitragem interna e internacional ... 37
1.1.4 Princípios Gerais da Arbitragem ... 37
1.1.4.1 Princípio da autonomia da vontade ... 38
1.1.4.2 Princípio da eleição da lei aplicável ... 38
1.1.4.3 Princípio da eleição da Lex Mercatoria ... 38
1.1.4.4 Princípio do devido processo legal ... 38
1.1.4.5 Princípio do efeito vinculante da cláusula arbitral ... 39
1.1.4.6 Princípio da inevitabilidade dos efeitos da sentença arbitral ... 39
1.1.4.7 Princípio da autonomia da cláusula compromissória ... 39
1.1.4.8 Princípio da Kompetenz-Kompetenz ... 39
1.2 Natureza Jurídica da Arbitragem – Jurisdição – Polêmica ... 39
1.3 Enfoque Legal – Lei nº 9.307/96 ... 44
1.3.1 Desdobramentos sobre os dispositivos legais da Lei de Arbitragem ... 45
1.3.1.1 Limites impostos pela Lei de Arbitragem ... 45
1.3.1.2 Convenção de Arbitragem – Cláusula compromissória e compromisso arbitral – Jurisprudência ... 47
1.3.1.2.1 Constitucionalidade da Arbitragem ... 55
1.3.2 Dos árbitros ... 57
1.3.2.1 Órgão de arbitragem institucional ... 61
1.3.3 Do Procedimento Arbitral (aplicação do princípio da busca da verdade real no procedimento arbitral) ... 64
1.3.4 Da Sentença Arbitral ... 69
1.3.4.1 Da Nulidade da Sentença Arbitral – Orientação Jurisprudencial ... 70
1.3.5 Prescrição e Arbitragem ... 74
1.3.6 Comentários ao Projeto de Lei do Senado Federal – PJ Nº 406/2013 – Alteração da atual Lei de Arbitragem ... 76
1.3.7 Comentários ao Projeto de Lei nº 7.108/2014 ... 81
2 ARBITRAGEM SOB O ASPECTO INTERNACIONAL ... 83
2.1 Aspectos Gerais da Arbitragem Internacional ... 84
2.2 Sentença Arbitral Estrangeira ... 89
2.3 Compromisso de Arbitragem Internacional ... 94
2.4 O Tribunal Arbitral Internacional ... 96
2.5 Procedimento na Arbitragem Internacional ... 97
2.6 Direito Aplicável na Arbitragem Internacional ... 100
3 A SEGURANÇA DA ARBITRAGEM COMERCIAL INTERNACIONAL PARA O INVESTIDOR ESTRANGEIRO ... 107
3.1 Arbitragem Comercial Internacional x Arbitragem Internacional de Investimentos 107 3.1.1 O Brasil e a Arbitragem Internacional de Investimentos ... 110
3.2.1 Procedimento flexível ... 118
3.2.2 Adequação do procedimento para transações internacionais ... 120
3.2.3 Caráter final e vinculante da sentença arbitral ... 121
3.2.4 Fácil execução ... 123
3.2.5 Neutralidade ... 124
3.2.6 Árbitros experts ... 126
3.2.7 Confidencialidade ... 127
3.2.8 Rapidez e custos do processo ... 128
3.3 Segurança e efetividade da arbitragem como meio alternativo de solução de conflitos ... 130
3.3.1 Insegurança jurídica do Judiciário brasileiro ... 132
3.3.2 Risco-Brasil ... 138
3.4 Responsabilidade do árbitro na Arbitragem Comercial Internacional ... 142
3.4.1 Responsabilidade do árbitro na lei brasileira ... 145
4 CONCLUSÃO ... 147
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 160
ANEXOS ... 166
ANEXO – JURISPRUDÊNCIA ... 166
INTRODUÇÃO
O presente estudo apresenta os meios não jurisdicionais de solução de
conflitos: institutos que a doutrina costuma estabelecer como técnicas de solução de
conflitos não jurisdicionais, ou seja, que fazem, às vezes, de jurisdição porque
solucionam conflitos, mas não são jurisdição, principalmente por ser seu tema
central a arbitragem, desde a sua conceituação e evolução histórica até a edição da
lei que regula o tema no Brasil.
Registra-se a tendência de crescimento das formas de solução de conflitos
sem a necessidade de propositura de demanda judicial e questões polêmicas, como
a natureza jurídica da arbitragem, as posições doutrinárias acerca da semelhança da
arbitragem à atividade jurisdicional do Estado-juiz e a similitude da atividade do
árbitro à atividade jurisdicional como forma de pacificação social e aplicação do
direito ao caso concreto.
Discorre-se sobre os princípios gerais da arbitragem. Dentre eles, o princípio
da autonomia da cláusula compromissória ao contrato em que se encontra inserida,
que é de fazer segundo estudo doutrinário, assemelhando-se ao princípio da
autonomia que vigora das regras pertinentes aos títulos de crédito, pois a nulidade
do negócio jurídico não implica na nulidade da cláusula compromissória,
enfatizando, portanto, a obrigação que as partes pactuam, por meio da cláusula
compromissória. Adicionalmente, indica-se que o compromisso arbitral não se
confunde com a cláusula compromissória, uma vez que ele ocorre com a convenção
da arbitragem após a existência do conflito. Em outras palavras, o conflito já se faz
presente, e as partes o submetem à apreciação de árbitros, afastando-se da
apreciação pelo Poder Judiciário. Assim, pelo compromisso arbitral, as partes
convencionam a eleição de árbitros para solucionar um litígio que já se faz presente,
ao passo que a cláusula compromissória é utilizada quando o litígio ainda não se
materializou.
Trata-se da aplicabilidade do princípio da Kompetenz-Kompetenz, segundo o
qual o árbitro deve verificar se possui competência, para a hipótese de haver
Discorre-se sobre a possibilidade de aplicação do princípio da
instrumentalidade das formas no procedimento arbitral, sustentando-se, também, a
aplicação do princípio de que não há nulidade processual sem a demonstração do
prejuízo, ou seja, que meras irregularidades não têm o condão de gerar a nulidade
do procedimento arbitral.
Ressalta-se a aplicação do princípio do venire contra factum proprium nas
relações contratuais que se submetem à solução de seus conflitos pela arbitragem,
caracterizada pela existência de uma conduta inicial, geradora de legítima confiança,
com posterior comportamento contraditório divergente da conduta inicial e que
culmina com um prejuízo, concreto ou potencial, que se extrai dessa contradição.
Portanto, o princípio proíbe a prática de um comportamento contraditório a uma
conduta inicial que teria gerado uma determinada expectativa à outra parte, vedando
a prática de atos incoerentes e que contradizem uma conduta anterior iniciada pela
mesma pessoa e que é capaz de frustrar as legítimas expectativas de terceiros.
Salienta-se a grande divergência doutrinária acerca da natureza jurídica da
arbitragem e, principalmente, se o árbitro exerce poder jurisdicional no caso concreto
e lição doutrinária que sustente a função parajurisdicional da arbitragem. Além disso,
a possibilidade do juízo arbitral decretar a prescrição no caso concreto, pois o
árbitro, muito mais que um mero “juiz privado”, é um pacificador que busca a solução
justa do litígio - nada mais que um anseio do interesse social -, devendo, para tal
fim, aplicar o direito ao caso concreto, sendo esta uma finalidade também verificada
no próprio espírito da Lei de Arbitragem quando estabelece a aplicação de vários
princípios constitucionais, bem como a aplicação de regras legais pelo árbitro para a
solução do conflitos, de modo que pode e deve o árbitro reconhecer e decretar a
prescrição no caso concreto.
Sendo assim, argumenta-se que é indubitável a importância da arbitragem na
resolução dos conflitos hodiernos e, sobretudo, no que diz respeito às controvérsias
humanidade, ocasionadas pelos conflitos armados entre nações, especialmente
aqueles concernentes à Primeira e à Segunda Grande Guerra.
Centra-se na necessidade de utilização da arbitragem, principalmente
considerando-se que, na Idade Contemporânea, novos ventos catalizaram o
processo de globalização, eclodido em remota época e acentuando, assim, conflitos
comerciais entre países sob o predomínio de fictos, entes de natureza transnacional,
e, consequentemente, ocasionando a necessidade de desenvolvimento de novos
métodos de solução de litígios.
Nesse contexto, ao atuar com agentes e normas de distintos países, assim
como ao conceber princípios e regras próprias, argumenta-se a favor da arbitragem,
que ocupa o papel de protagonista como meio de solução de conflitos advindos das
relações comerciais internacionais.
Com efeito, para o propósito desta tese, considera-se internacional a
arbitragem composta por agentes, situados em países distintos, elegendo-se regras
próprias para a solução do conflito específico e observando-se, ainda, as normas de
direito internacional e as leis cogentes locais.
Merece menção, em tal seara, a Lex Mercatoria e os princípios UNIDROIT.
Por Lex Mercatoria, considera-se o conjunto de regras, princípios e instituições,
emanados de diversas fontes, que alicerçam as operações comerciais
internacionais, enquanto que os princípios da UNIDROIT, de ampla aplicação nos
negócios internacionais, foram elaborados com o escopo de mitigar as barreiras
originadas da diversidade de ordenamentos jurídicos.
Destarte, é incontestável a importância da arbitragem nas relações
internacionais que, com regras e instituições próprias, torna-se efetivo instrumento
de pacificação do mundo cada vez mais globalizado.
Em relação aos investimentos financeiros, é possível conceituá-los como a
uma entidade residente em uma economia e uma empresa residente em uma
economia diferente daquela do investidor estrangeiro. E para que ocorram
investimentos de investidores estrangeiros, é necessário haver segurança. Esta
questão é central para este trabalho, que busca identificar como a segurança do
processo de arbitragem comercial internacional pode tornar-se um atrativo para o
investidor estrangeiro no Brasil.
Em relação a essa questão de segurança para os investidores estrangeiros,
esclarece-se, ao longo deste estudo, que o Brasil não integra a lista dos Estados
que participam e que ratificaram a Convenção de Washington, que trata da solução
de disputas por arbitragem internacional de investimentos, envolvendo uma parte
privada e um Estado receptor. Portanto, não é o tipo de arbitragem foco desta tese.
Discorre-se sobre os benefícios da arbitragem comercial internacional como
meio de resolução de conflitos entre um investidor (parte privada) e um receptor
(privado), e sobre como esse método alternativo pode ser a saída para o investidor
estrangeiro que quer aplicar no Brasil, mas não o faz devido às dificuldades e
inseguranças jurídicas existentes no Judiciário brasileiro.
Enfatiza-se, ainda, que as recentes mudanças no cenário internacional de
investimentos revelam que o Brasil deixou de ser um país exclusivamente recebedor
de investimentos para tornar-se, também, um investidor, com empresas nacionais
que adquirem porte de multinacionais, como a Petrobrás, a Vale, a Gerdau e a
Votorantim, entre outras.
Sustenta-se que o pequeno e médio investidores, ao chegarem no exterior,
querem receber o apoio jurídico brasileiro para que possam evitar eventuais conflitos
contra governos internacionais. Ao negar a ratificação desses acordos, o Brasil, por
um lado, tem a seu favor a inexistência de queixas de investidores estrangeiros,
mas, por outro, deixa o capital brasileiro internacional desprotegido.
Por fim, aborda-se que, se, por um lado, acordos internacionais de proteção
investimentos, por outro, a relutância do Brasil em relação a esses acordos
justifica-se pelo fato de o país justifica-ser, tradicionalmente, um receptor de investimentos. Porém,
nos últimos anos, as empresas brasileiras ampliaram a sua atuação no estrangeiro
por verem na internacionalização uma oportunidade e, muitas vezes, uma
necessidade. Essa mudança, portanto, precisa ser reavaliada, e nela entra a
questão da arbitragem.
No cenário global atual, são diversos os motivos pelos quais as empresas
preferem a arbitragem às cortes estatais para a solução de conflitos. Em dimensões
internacionais, tais benefícios podem ser traduzidos, dentre outras vantagens, como
flexibilidade do procedimento arbitral, caráter final e vinculante da sentença arbitral,
possibilidade de adequação das normas às necessidades específicas de cada caso
concreto, neutralidade do tribunal arbitral, expertise dos árbitros, rapidez e
confidencialidade do processo.
Este estudo cumpre demonstrar como a possibilidade de resolução de
conflitos por meio do instituto da arbitragem comercial internacional, revestida das
qualidades mencionadas no parágrafo supra, é uma vantagem atrativa ao
estrangeiro que pretende investir em empresas brasileiras, mas que é desestimulado
pelo que se tratará nesta tese como Risco-Brasil, bem como pelo receio de
submeter suas disputas contratuais ao Judiciário brasileiro.
Esta tese foi dividida em três capítulos e uma conclusão. No primeiro capítulo,
são abordadas as formas não jurisdicionais de solução de conflitos e,
principalmente, o instituto da arbitragem como tal, considerando, inclusive, sua
evolução histórica, desdobramentos, classificações e princípios norteadores, mas,
principalmente, seu reconhecimento no Brasil. No segundo capítulo, é apresentada a
arbitragem sob o aspecto internacional, retratando-se, além das características
específicas do procedimento e tribunal arbitrais internacionais, como são produzidos,
em território brasileiro, os efeitos da arbitragem internacional. No terceiro e último
capítulo, há indicação e explicação dos benefícios e aptidão da arbitragem comercial
internacional para o investidor estrangeiro, bem como demonstração de como essa
no Brasil. Na conclusão, retoma-se, de forma sucinta, o que foi discutido ao longo do
trabalho, mencionando-se a possível contribuição deste estudo, especialmente no
que se refere à segurança jurídica, e a esperança de maior aplicabilidade da
1 FORMAS NÃO JURISDICIONAIS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS
A princípio, convém dispor que, além da arbitragem, costuma-se estabelecer
algumas modalidades de solução de conflitos não jurisdicionais, ou seja, que fazem
às vezes de jurisdição, porque solucionam conflitos, mas não são jurisdição
propriamente dita.
A primeira é a autotutela, por meio da qual um dos conflitantes impõe ao outro
a solução do conflito. Nesse caso, então, a solução é imposta pela força a um dos
conflitantes. É, por assim dizer, conduta ilícita, proibida, como, por exemplo, fazer
justiça com as próprias mãos, o que configura ilícito penal previsto no artigo 345 do
Código Penal.
Tal hipótese remete a tempos bárbaros, primitivos, de solução de conflitos; é
resquício de tempo histórico. Foi quase totalmente abolida, apesar de ainda
existirem espécies de autotutela lícitas, como, por exemplo: guerra, em alguns
casos; greve; desforço incontinenti (reação imediata que o possuidor pode ter diante
de uma violência à sua posse); legítima defesa; possibilidade de a administração
pública executar os próprios atos (poder público impõe uma solução ao particular
que tenha infringido regra administrativa, como estacionar em lugar proibido e,
consequentemente, ter o veículo guinchado).
A segunda modalidade é a autocomposição, que é a solução negocial do
conflito, denominada de “solução altruísta do conflito” ou “Alternative Dispute
Resolution”, por meio da qual os conflitantes chegam à solução do conflito
voluntariamente, e não pela força.
Esta segunda modalidade, a autocomposição, ao contrário da autotutela, é
incentivada, estimulada. Pode ser de duas formas: a) Extrajudicial, quando realizada
fora da esfera jurídica, fora do juízo; e b) Judicial, quando realizada em juízo.
Atualmente, é muito estimulada a solução de conflitos por meio da
consensuais que podem ser feitos pelo cartório, sem, portanto, haver necessidade
de se recorrer ao Judiciário. Um exemplo adicional que pode ser citado refere-se a
qualquer autocomposição extrajudicial que pode ser levada à homologação judicial
para que se torne título executivo judicial (artigo 475-N, inciso V do CPC).
Quando a autocomposição é judicial, ela é dividida em: a) transação: quando
ambos os conflitantes cedem um pouco, fazendo concessões recíprocas; b)
renúncia: quando o autor abdica a sua pretensão em favor do réu; e c)
reconhecimento da procedência do pedido: quando o réu abdica em favor do autor.
A terceira modalidade de solução de conflitos é a mediação, por meio da qual
um terceiro coloca-se entre os conflitantes para tentar fazer com que eles cheguem
à autocomposição. O terceiro tem o papel de facilitador da autocomposição.
Portanto, ele não decide nada; somente auxilia as partes, é interlocutor privilegiado.
Diferentemente da arbitragem, onde o terceiro decide, nesta modalidade o mediador
não pode opinar.
A quarta forma é a solução de conflitos por Tribunais Administrativos, sendo
que, atualmente, há uma série de tribunais administrativos que resolvem
controvérsias no âmbito administrativo. São soluções de conflitos por
heterocomposição, por um terceiro que julga e decide sobre os conflitos. É o tribunal
administrativo que decide a controvérsia. Entretanto, essa decisão não é definitiva,
uma vez que pode ser revista pelo Poder Judiciário.
Por esse motivo, os tribunais administrativos não exercem jurisdição, haja
vista sua atividade poder ser controlada pelo Poder Judiciário. A exemplo, cita-se:
Tribunais de Contas; Tribunais de Contribuintes; Juntas de Multas do Detran;
Tribunal Marítimo; Justiça Desportiva; e Agências Reguladoras – CADE.
A conciliação seria uma forma de exteriorização da vontade dos próprios
envolvidos no litígio para sua solução, sendo que, no direito positivo pátrio, o Código
estabelecer que “é lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio
mediante concessões mútuas”.
A conciliação pode ser: a) Extrajudicial: celebrada fora do processo e sem a
participação do Estado-juiz - entretanto, nada impede que o acordo seja levado à
homologação judicial, passando a ter, portanto, feição de “título executivo judicial”,
ou seja, similar à sentença proferida pelo próprio Estado-juiz (artigo 475-N, inciso V,
do Código de Processo Civil); e b) Judicial: realizada na presença do Estado-juiz,
caracterizando-se como título executivo judicial.
Sobre o tema, Cândido Rangel Dinamarco afirma que, por motivos culturais e
justiça centralizada nas mãos do Estado, seriam os responsáveis por estabelecer o
monopólio estatal da jurisdição. O autor explica que
a absorção estatal do poder de solucionar conflitos interindividuais deu-se mediante a instauração das cognitiones extra ordinem, que ingressaram no sistema processual romano por volta do séc. III DC. Passou-se do sistema conhecido por ordo judiciorum privatorum, em que o julgamento era feito pelo judex, cidadão privado e verdadeiro árbitro, para um sistema em que o próprio proctor passou a instruir o processo e julgar a causa. Esse movimento, que correspondia à afirmação do poder estatal antes insuficiente para impor-se aos particulares com a marca da inevitabilidade (o processo era um contrato entre as partes), foi o grande responsável pelo mito da exclusividade do Estado e da sua jurisdição como meio de solução de conflitos.1
Esse movimento mencionado pelo autor gerou conotações próprias à
jurisdição, principalmente de imperatividade e inevitabilidade, ausentes nos demais
meios de solução de conflitos, inclusive com a legitimidade para o uso da força
física. Como exemplo, cita2 “a atitude corporativista de entidades desportivas que
proíbem e punem as tentativas de solução jurisdicional de conflitos envolvendo
atletas ou associações”. Observa que somente se poderia falar em monopólio ou
exclusividade estatal quanto aos meios de solução de conflitos interindividuais ou
transidindividuais, sendo que melhor seria se não houvesse a necessidade de tutela
alguma sobre as pessoas e que todos cumprissem suas obrigações, sem a
1
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Volume I, 6ª edição. São
Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 121-128. 2
ocorrência de danos ou, sequer, apresentação de pretensão infundadas. Adiciona
que, como esse ideal é utópico, faz-se necessário pacificar as pessoas de forma
eficiente, eliminando-se os conflitos que as envolvem e fazendo justiça.
Cândido Rangel Dinamarco3 assevera que a renúncia ao bem é uma forma de
autocomposição, podendo variar os meios pelos quais o sujeito pode deduzir sua
pretensão ou se submeter à solução de um conflito. Além das soluções
juridicamente legítimas, estão aquelas atividades reunidas nos conceitos de
autocomposição e de heterocomposição, sendo que esses meios de solução de
conflitos podem ser materializados sem que qualquer processo judicial venha a ser
instaurado ou, ainda, durante a sua tramitação, gerando o seu encerramento, seja
de forma extraprocessual ou endoprocessual.
O autor4 observa que existe autocomposição quando os próprios sujeitos
envolvidos no conflito, ou um deles unilateralmente, encontram caminho apto à
pacificação. Explica que a autocomposição pode ocorrer de duas formas:
unilateralmente, nas modalidades de renúncia ou submissão - isto é, aquele que
deduziu uma determinada pretensão renuncia à ela, fazendo cessar o conflito até
então existente e pendente com o seu adversário, e, assim, renuncia a um direito e
determina a extinção do processo, bem como do próprio direito supostamente
existente (CPC, art. 269, inc. V, e art. 794. inc. III); ou unilateralmente, quando
aquele que promove a resistência à pretensão deduzida resolve submeter-se a ela
e, nessa hipótese, reconhece o pedido deduzido e, quando homologado pelo juiz,
determina a extinção do processo sem que haja necessidade de o juiz julgar a causa
(CPC, art. 269, inc. II).
Tais formas de autocomposição unilateral5 mostram-se legítimas, porque de
natureza altruísta, resolvendo-se em atos de disposição de direitos ou interesses, ao
contrário do que ocorre com a autotutela, como espécie egoísta de autocomposição
unilateral, antissocial e incivilizada, razão pela qual, em princípio, a lei proíbe sua
3
Idem, ibidem, p. 121-128. 4
Idem, ibidem, p. 121-128. 5
prática (art. 345, Código Penal - crime de exercício arbitrário das próprias razões).
Todavia, existem casos excepcionados pela própria legislação pátria nos quais a lei
autoriza a autotutela, como, por exemplo, o desforço imediato em conflitos
possessórios (CC. art. 1.210, § 1º), caracterizando, na verdade, atos de preservação
de direitos.
Por sua vez, assevera Cândido Rangel Dinamarco6, a autocomposição
bilateral ocorre com a transação em que há mútuas concessões (CC., art. 840) e,
portanto, participa, ao mesmo tempo, da natureza da renúncia e da submissão.
Cada um dos sujeitos promove, de forma parcial, a disposição de seus próprios
interesses, envolvendo, para tanto, direitos e interesses de natureza patrimonial do
próprio titular, sem projeções significativas sobre outras pessoas ou agrupamentos,
tampouco direitos e interesses de pessoas incapazes ou que atinjam o interesse
público, o que se extrai do artigo 841 do Código Civil. É oportuno registrar que esse
dispositivo legal não possui toda a amplitude que dele se poderia retirar a uma
primeira vista, pois, atendidas certas exigências substanciais e formais, também aos
entes públicos é permitido transigir, como se dá nos termos de ajustamento de
conduta, quando a própria lei admite certas formas de transação em matéria
não-patrimonial, como o acordo para a separação consensual ou para a conversão da
litigiosa em consensual (CPC., Art. 447, par., e art. 1.123), ou, ainda, na
quantificação do valor dos alimentos devidos ao filho.
A autocomposição pode ser espontânea ou induzida. É espontânea quando
parte dos próprios conflitantes, sem a intervenção de um terceiro, ao passo que a
autocomposição induzida ocorre mediante a participação de um terceiro,
denominado de conciliador ou mediador.
Cândido Rangel Dinamarco7 leciona que a palavra composição encontra-se
também embutida nos vocábulos autocomposição e heterocomposição, sendo que,
nesse sentido, citando Francesco Carnelutti, sustenta que “Compor a lide significaria
6
Idem, ibidem, p. 121-128. 7
criar a norma que a resolve. Todavia, o juiz não compõe a lide nesse sentido, ou
seja, ele não cria a norma do litígio: reconhece sua existência e revela os direitos e
obrigações eventualmente emergentes dela no caso concreto (supra, nº 5 - os dois
planos do ordenamento jurídico).”. Argumenta o citado autor que a composição
realizada pelo juiz, a heterocomposição, ou aquela realizada pelos próprios
litigantes, a autocomposição, não proporcionam a fixação, tampouco a criação de
normas, porém produzem resultados práticos e socialmente úteis, de efeitos
concretos, por meio dos quais haveria a atribuição de bens ou a fixação ou vedação
de condutas, com a consequente eliminação do conflito e pacificação do litígio.
Portanto, nessa hipótese, não se estabeleceriam normas para dirimir a contenda,
mas haveria a própria solução concreta do conflito, produzindo, em alguns casos,
em vista da inexistência de preocupação com a aplicação da norma, resultados
melhores que os da jurisdição estatal. Por isso, o autor considera legítimo falar em
meios parajurisdicionais, principalmente aqueles exercidos em juízo arbitral.
A conciliação, outra forma de solução de conflitos, ocorre quando um terceiro,
estranho à contenda, interage entre os litigantes a fim de levá-los à autocomposição.
Quando celebrada antes do processo, com o evidente intuito de evitá-lo, é
denominada de conciliação extraprocessual, e quando ocorre no curso do processo,
de conciliação judicial.
A conciliação extraprocessual é capaz de induzir os litigantes à renúncia, à
submissão ou à transação e, materializada uma dessas hipóteses, pode ser
encaminhada para a homologação judicial, atribuindo-se-lhe eficácia de título
executivo (artigo 57 da Lei nº 9.099/95 e artigo 475-N, inciso V, do Código de
Processo Civil).
Cândido Rangel Dinamarco8 finaliza, asseverando que as vantagens dessas
soluções alternativas consistem, principalmente, em evitar as dificuldades que
dificultam a tutela jurisdicional, isto é, os custos do processo, como, por exemplo:
taxas judiciárias, honorários de advogados, perícias etc.; excessiva duração
8
temporal do processo; formalismo processual (o necessário cumprimento das formas
processuais). Essas vantagens também são indicadas em prol da arbitragem,
referindo-se ao melhor conhecimento do tema por árbitros especializados; ao menor
apego à rigidez da lei para que possa optar pelo juízo de equidade (CPC, art. 1.075,
inc. IV); e a ausência de publicidade a fim de respeitar a privacidade ou os segredos
empresariais.
Cassio Scarpinella Bueno9, por sua vez, ao discorrer sobre os meios
alternativos de solução de conflitos, enfatiza a existência de projeto de lei a
regulamentar a mediação e ressalta a iniciativa do Conselho Superior da
Magistratura do Egrégio Tribunal de Justiça, que editou o Provimento n. 783/2002,
criando o “Plano Piloto de Conciliação em segundo grau de jurisdição”. Conforme
esse plano, tal mediação contará com conciliadores. Estes devem trabalhar sem
remuneração, sendo selecionados entre aposentados do Ministério Público e
Procuradores do Estado, professores universitários e advogados com ampla e
reconhecida experiência. O autor elogia a iniciativa, por considerar que ela “vai ao
encontro dos anseios das vias alternativas de resolução de conflitos”.
A exemplo de Cassio Scarpinella Bueno, que tratou sobre os meios
alternativos de solução de litígios não jurisdicionais, Elpídio Donizetti10, por sua vez,
argumenta que a tutela jurisdicional não constitui o único meio de eliminação de
conflitos. Salienta que a jurisdição seria, ou deveria ser, a última alternativa para a
pacificação social de conflitos, movimentada para a solução da contenda somente
quando em razão da natureza da relação jurídica ou por imposição legal. Para o
autor, o ideal, mas ao mesmo tempo utópico, seria a total desnecessidade de se
impor alguma forma de tutela às pessoas, bem como que todos tivessem a
consciência de cumprir suas obrigações sem causar danos, ou, tampouco, com
deduções de pretensões protelatórias e contrárias ao direito.
9
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil – Teoria Geral do
Direito Processual Civil. Volume 1. São Paulo: Editora Saraiva, 2007, p. 47-49. 10
DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 14ª edição. São Paulo: Editora
Elpídio Donizetti, citando Cândido Rangel Dinamarco, assevera que
(...) melhor seria se não fosse necessária tutela alguma às pessoas, se todos cumprissem suas obrigações e ninguém causasse danos nem se aventurasse em pretensões contrárias ao direito. Como esse ideal é utópico, faz-se necessário pacificar as pessoas de alguma forma eficiente, eliminando os conflitos que as envolvem e fazendo justiça. O processo estatal é um caminho possível, mas outros existem que, se bem ativados, podem ser de muita utilidade. 11
Outro aspecto levantado pelo autor é que a função de pacificar conflitos de
interesses não é uma atribuição exclusiva do Poder Judiciário, pois tal competência
também é estendida a determinados órgãos administrativos, os quais apreciarão
litígios relativos a matérias previamente previstas em lei ou na própria Constituição
Federal. Enfatiza que, apesar de constituir forma de heterocomposição, a decisão
por órgão administrativo não possui definitividade, sujeitando-se, portanto, ao
controle jurisdicional e sustentando, em razão de tal situação, sua mera equivalência
à função jurisdicional. Ilustra esse aspecto com os exemplos: “Um desses órgãos
administrativos é o Tribunal de Contas, órgão auxiliar do Poder Legislativo, com
competência para julgar as contas prestadas pelos administradores públicos (art. 71
da CF);” e “Outro órgão administrativo que exerce função jurisdicional - aqui
entendida como a competência para decidir conflitos - é a Justiça Desportiva (art.
217 da CF), que julgará litígios relacionados à disciplina e competições
desportivas”.12
O autor13 também assevera que, da mesma forma, ocorrerá composição
heterônoma dos conflitos nos casos de atuação das Agências Reguladoras -
entidades autárquicas, responsáveis pela regulação da atividade econômica -, uma
vez que possuem competência para solucionar conflitos decorrentes de atividade
econômica que se sujeite à sua atividade reguladora. Cita, como exemplo, o CADE –
“Conselho Administrativo de Defesa Econômica, autarquia com função judicante
para os conflitos envolvendo inflação à ordem econômica (Lei n2 8.884/94, art. 32)”.
11
Idem, ibidem, p. 30-33. 12
Idem, ibidem, p. 30-33. 13
Neste item, foram abordadas as formas não jurisdicionais de conflitos. A
seguir, apresentar-se-á o tema arbitragem.
1.1 A arbitragem como forma não jurisdicional de solução de conflitos
Nesta parte, será apresentado o tema arbitragem como forma não
jurisdicional de solução de conflitos, abrangendo o conceito da arbitragem, sua
evolução histórica, seus desdobramentos e classificação, bem como os diversos
princípios gerais da arbitragem.
1.1.1 Conceito
A arbitragem é uma das várias formas de solução de conflitos. Caracteriza-se
quando partes capazes elegem um particular, denominado de árbitro, para
solucionar uma controvérsia que envolva direitos disponíveis, proferindo, ao final,
uma sentença arbitral. Esta terá efeitos similares àquela proferida pelo Estado-juiz,
obrigando as partes que a convencionaram.
Em tal contexto, é possível afirmar que a arbitragem é uma forma alternativa
para dirimir ou solucionar contendas, isto é, conflitos entre particulares que
outorgam, por meio de uma cláusula contratual, verdadeiros poderes para que uma
pessoa, ou um grupo de pessoas, possam, sem a necessidade de intervenção
estatal, mas, todavia, assumindo tal feição, ou seja, com a mesma eficácia da
sentença judicial, apreciar conflitos relativos a direitos patrimoniais, disponíveis.
É possível asseverar, da mesma forma, que a arbitragem configura um
mecanismo de natureza privada para a solução de litígios, por intermédio do qual um
terceiro, eleito pelos particulares em conflito, profere uma decisão a ser cumprida
por tais litigantes, tendo, portanto, na realidade, característica de impositividade da
solução arbitral. Diferencia-se, assim, da mediação e da conciliação, pois nestes não
há decisão a ser imposta às partes, uma vez que o mediador, ou conciliador,
dependendo do caso, apenas limita-se a oferecer, sem qualquer poder vinculante,
Carlos Alberto Carmona14 define o conceito de arbitragem como uma forma
alternativa de solução de controvérsias por meio da qual haverá a intervenção de
uma ou mais pessoas (árbitros). Em outras palavras, um juízo arbitral dotado de
poderes em razão de uma convenção privada e, com base nela, proferida sua
decisão no caso concreto, sem intervenção do juízo estatal, decisão essa que terá a
mesma eficácia da sentença judicial. A arbitragem encontra-se à disposição de
quem quer que seja, mas é limitada à solução de conflitos que envolvam direitos
patrimoniais de natureza disponível. Trata-se de meio privado de solução de litígios,
por meio do qual um terceiro, eleito pelos litigantes, impõe uma decisão a ser
cumprida pelas partes.
O autor15 assevera que a característica da impositividade da solução arbitral a
diferencia da mediação e da conciliação, que são meios autocompositivos de
solução de litígios, uma vez que, nestas últimas, não há decisão a ser imposta às
partes pelo mediador ou conciliador, que se limitam à mera sugestão, sem poder
vinculativo. Assim, é possível afirmar que a arbitragem é meio alternativo de solução
de controvérsias, tomando-se como referência o processo estatal - meio
heterocompositivo mais empregado para dirimir conflitos. Enfatiza que Carnelutti
designou a arbitragem como meio que equivale à jurisdição, pois a jurisdição
somente poderia ser exercida pelo Estado, e o juízo arbitral apenas seria
semelhante ao método estatal de composição de lides.
Carlos Alberto Carmona salienta que a denominação "meios alternativos"
encontra-se sob ataque, na medida em que uma visão mais moderna do tema
aponta meios (mais) adequados de solução de litígios, não necessariamente
alternativos, pois, na verdade, é razoável pensar que as controvérsias tendam a ser
resolvidas. Em um primeiro momento, pelas próprias partes interessadas
(negociação, mediação, conciliação) e somente em caso de fracasso desse diálogo
primário (método autocompositivo), os conflitantes recorreriam às fórmulas
heterocompositivas (processo estatal, processo arbitral). Nesse sentido, também
14
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo: Um Comentário à Lei nº 9.307/96. São Paulo:
Editora Atlas. 3ª edição, 2009, p. 31-34. 15
enfatiza que “os métodos verdadeiramente alternativos de solução de controvérsias
seriam os heterocompositivos (o processo, seja estatal, seja arbitral), não os
autocompositivos (negociação, mediação, conciliação)”. Para se evitar tal
contradição, melhor seria a referência a métodos adequados de solução de litígios,
em vez de denominá-los de métodos alternativos.16
O autor17 esclarece que a arbitragem, a conciliação e a mediação não se
confundem, pois a arbitragem tem como finalidade a obtenção de uma solução
apresentada por terceiro imparcial, ao passo que a conciliação e a mediação têm por
fim a celebração de um acordo. Desta forma, quanto à arbitragem, há três variações:
na primeira, os litigantes estabelecem as bases para uma mediação, o que autoriza
o mediador a funcionar como árbitro, inclusive proferindo uma decisão com efeito
vinculante; na segunda, denominada “high-low arbitration”, os litigantes estabelecem
limites para o exercício da autoridade pelo árbitro, o que objetiva reduzir os riscos de
laudo arbitral inaceitável; e na terceira, as partes estabelecem uma arbitragem sem
efeito vinculante, uma vez que, se a decisão mostrar-se razoável aos litigantes, eles
a cumprirão; caso contrário, poderão utilizar a decisão arbitral em suas negociações
futuras.
Ainda nesta mesma linha de considerações, Cassio Scarpinella Bueno18
dispõe que a arbitragem é a forma alternativa de solução de conflitos mais difundida
no direito brasileiro da atualidade e que, com a edição da Lei nº 9.307/1996, houve a
criação de uma lei extravagante de direito processual civil que disciplina a
arbitragem no direito brasileiro. Essa lei somente permite a utilização da arbitragem
por pessoas que possuem capacidade para contratar, e submeterão seus conflitos
contratuais, de natureza patrimonial disponível, à apreciação de um terceiro. O autor
enfatiza, ainda, que
(...) o STJ tem sustentado, corretamente, ser viável a arbitragem para dirimir conflitos que envolvem questões contratuais relacionadas a sociedades de
16
Idem, ibidem, p. 31-34. 17
Idem, ibidem, p. 31-34. 18
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil – Teoria Geral do
economia mista exploradoras de atividade econômica (STJ, 1ª Seção, MS 11.308/DF, rel. Min. Luiz Fux, j.un. 9.4.2008, DJe 19.5.2008). Tanto assim que se no curso da arbitragem surgir alguma questão relativa a direito indisponível que diga respeito à matéria em discussão, o árbitro ou os árbitros terão que aguardar o desfecho daquela pendência perante o Poder Judiciário para proferir sua decisão (art. 25 da Lei n. 9.307/1996).
A arbitragem, portanto, só pode ser constituída por pessoas capazes, aptas
ao exercício de direito e deveres na ordem civil, que podem escolhê-la como forma
de solução de conflitos. Tem por objeto direitos disponíveis, isto é, direitos que
admitem negócios que podem ser objeto de transação.
A opção pela arbitragem é exercício pela autonomia privada, sendo sua fonte
meramente negocial. Por consequência lógica, está intimamente relacionada à
autonomia privada. Por outro lado, é possível a existência de arbitragem trabalhista,
inclusive com previsão constitucional. Atualmente, fala-se em arbitragem no campo
do direito administrativo, desde que prevista em lei, envolvendo pessoa jurídica de
direito público. Parcerias público-privadas, por exemplo, podem ser resolvidas por
arbitragem. Nesse sentido, tramita, atualmente, no Congresso Nacional, o Projeto de
Lei nº 7.108/2014, que altera a Lei de Arbitragem – tema este que será tratado mais
especificamente no item 1.3.7 desta tese.
Por fim, é necessário ressaltar a denominada cláusula arbitral escalonada, por
meio da qual os contratantes celebram o negócio jurídico e nele inserem uma
cláusula, prevendo a solução de eventual conflito, seja por meio de mediação ou de
outro meio alternativo. Caso não seja alcançada uma solução, então será instaurada
a arbitragem. Carmona apresenta a seguinte observação quanto à mencionada
posição doutrinária:
Refiro-me à cláusula arbitral escalonada, segundo a qual as partes avençam que se submeterão a procedimento de mediação (ou de conciliação, conforme seja o caso) e, não chegando a um acordo, instaurarão desde logo a arbitragem.19
19
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo: Um Comentário à Lei nº 9.307/96. 3ª edição.
1.1.2 Evolução histórica da arbitragem
A evolução da história da arbitragem indica que ela é uma das formas de
solução de conflitos mais antigas do mundo, remontando à Antiguidade e à Idade
Média, pois representava um caminho para se evitar um confronto bélico entre
Estados diferentes, conforme observa Luiz Fernando do Vale de Almeida
Guilherme20, em breve histórico da arbitragem. O autor nota, também, que Platão
teria dissertado sobre a existência de juízes eleitos terem o condão de promoverem
proferida uma decisão mais justa.21
No Brasil, apesar de pouco divulgada, a arbitragem é regulada desde os
tempos da colonização portuguesa, sendo que a Constituição Imperial de 1824, em
seu artigo 160, dispunha sobre o Juízo Arbitral. Destaca-se, também, o
Regulamento 737.
O Regulamento 737, também de 1850, exigia o Juízo Arbitral para a solução das causas comerciais em seu art. 411. Já em 1866 a Lei 1.350, de 14 de setembro, revogou os dispositivos que privilegiavam a solução arbitral, criando um verdadeiro desuso sobre a aludida instituição.22
O antigo "juízo arbitral" era pouco utilizado no Brasil, indicando ressalva aos
antigos Juizados de Pequenas Causas, ao passo que o Código Comercial de 1850 –
que estabelecia, em seu artigo 294, a obrigatoriedade de se instaurar a arbitragem
nas contendas entre sócios e sociedades comerciais durante a existência de
sociedade ou companhia, em sua liquidação ou partilha -, em parte ainda vigente,
tinha instituído o juízo arbitral, de forma obrigatória, nos litígios que envolvessem
casos de locação mercantil (artigo 245), bem como nas alusivas à liquidação de
20
GUILHERME, Luiz Fernando do Vale de Almeida. Manual de Arbitragem, 2ª edição. São Paulo:
Editora Método, 2007, p. 34-35.
21 “Que os primeiros juízes sejam aqueles que o demandante e o demandado tenham eleito, a que o
nome de árbitros convém mais que o de juízes; que o mais sagrado dos Tribunais seja aquele em
que as partes tenham criado e eleito de comum acordo.” (Platão, De legibus, Livros 6 e 12, citado na
nota de rodapé no. 12 em: GUILHERME, Luiz Fernando do Vale de Almeida. Manual de Arbitragem.
2ª edição. São Paulo: Editora Método, 2007, p. 34-35). 22
GUILHERME, Luiz Fernando do Vale de Almeida. Manual de Arbitragem. 2ª edição. São Paulo:
sociedade comercial (artigo 294). Todavia, tal obrigatoriedade, prevista no Código
Comercial, foi revogada pela Lei n. 1.350, de 14 de setembro de 1866, tendo sido,
logo após, pelo Decreto n. 3.900, de 26 de junho de 1867, regulamentado o juízo
arbitral facultativo nas causas comerciais.23
Em âmbito internacional, o Brasil aderiu ao Protocolo de Genebra em 1923,
incorporado e reconhecido pelo ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto 21.187, de
22.03.1932. O referido protocolo fixava a validade de compromissos ou cláusulas
compromissórias, por meio das quais as partes litigantes ficavam obrigadas, com o
apoio de um instrumento contratual, em matéria comercial ou outra que poderia ser
submetida à arbitragem, ainda que a arbitragem vinculasse um país de jurisdição
diferente. Além de ter se vinculado ao Protocolo de Genebra, em 1923, e da
instauração dos Códigos de Processo Civil de 1939 e 1973, que adotaram a
possibilidade de solução de litígios pelo Juízo Arbitral, o Brasil aderiu à Convenção
Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional, assinada no Panamá em
1975.24
1.1.3 Desdobramentos e Classificação da Arbitragem
É possível conceituar a arbitragem como uma das várias formas de solução
de conflitos, que se caracteriza quando partes capazes elegem um árbitro, ou um
juízo arbitral, para solucionar controvérsia que envolva direitos disponíveis.
A arbitragem é o acordo de vontades entre pessoas maiores e capazes que,
preferindo não se submeter à decisão judicial, confiam a árbitros a solução de
litígios, desde que relativos a direitos patrimoniais disponíveis.25
As características da arbitragem, consoante arrolado no conceito acima
mencionado, são extraídas do próprio artigo 1º da Lei 9.307, de 23 de setembro de
23
CARNEIRO, Athos Gusmão. Jurisdição e Competência. 18ª edição. São Paulo: Editora Saraiva,
2012, p. 81-82. 24
Idem, ibidem, p. 34-35. 25
GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. 2ª edição. São Paulo:
1996. Dispõe sobre a arbitragem, estabelecendo: “As pessoas capazes de contratar
poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais
disponíveis.” Todavia, não se pode omitir que a arbitragem é instituição que
excepciona o princípio do livre acesso à justiça, também denominado de princípio da
inafastabilidade da jurisdição. Assim sendo, pela arbitragem as partes permitem que
o árbitro promova a “pacificação do conflito”, impondo-lhes a solução que, no seu
juízo, entendem como sendo a mais razoável.
Cláudio Lembo26, ao discorrer sobre o tema, esclarece que oacesso ilimitado
ao Poder Judiciário passou a sofrer mitigação a partir da vigência da Lei Marco
Maciel, que instituiu o juízo arbitral (Lei nº 9.307, de 1996). Com a referida lei,
quando convencionado em instrumento contratual, as partes, evolvendo a questão a
meros direitos disponíveis, renunciariam à solução do conflito pelo Poder Judiciário,
tema esse submetido a uma longa análise do Pretório Excelso, que, ao final, julgou
constitucional a cláusula compromissória que tem o condão de conferir à sentença
arbitral efeitos similares à sentença judicial - inclusive com a atribuição de
irrecorribilidade.
Registre-se, ainda, que, existindo expressa disposição acerca da vinculação
do contrato à arbitragem como forma de solução de conflitos, as partes contratantes,
sob pena de criarem instabilidades à relação jurídica, não podem tentar alegar
ausência de intenção na participação e submissão ao juízo arbitral, sob pena
também de inegável ofensa ao princípio do venire contra factum proprium, ou seja,
ao princípio da vedação de comportamento contraditório.
O referido princípio caracteriza-se pela existência de uma conduta inicial,
geradora de legítima confiança, com posterior comportamento contraditório
divergente da conduta inicial e que culmina com um prejuízo, concreto ou potencial,
extraído dessa contradição. Portanto, o princípio proíbe a prática de um
comportamento contraditório a uma conduta inicial que teria gerado uma
26
LEMBO, Cláudio. A Pessoa - Seus Direitos. 1ª edição. Editora Manole: São Paulo, 2007, p.
nada expectativa à outra parte. Dessa forma, veda a prática de atos incoerentes e
que contradizem uma conduta anterior iniciada pela mesma pessoa, capaz de
frustrar as legítimas expectativas de terceiros.
Ainda sobre o referido princípio, é possível afirmar que ele é a exteriorização
da proibição de comportamento contraditório, pois demonstra que a obrigação deve
ser cumprida e revestida por um comportamento conforme a boa-fé objetiva, o senso
ético esperado de todos. Então, a prática de um comportamento contraditório seria
uma modalidade de abuso de direito, decorrente da violação ao princípio da
confiança que, por sua vez, decorre da boa-fé objetiva (artigo 422 do Código Civil). 27
Nesse sentido, não é admissível, em tal contexto, atentar contra factum
proprium, pois resta clara a proibição de venire contra factum proprium que, na
realidade, protege uma parte contra aquela que pretenda exercer uma posição
jurídica que seja incoerente, ou contraditória, quanto ao comportamento previamente
assumido. Sobre esta questão, vale citar a seguinte explicação de Carlos Alberto
Carmona:
O Colendo Superior Tribunal de Justiça já decidiu, conforme o v. Acórdão, em parte transcrito, proferido em Recurso Especial nº 95.539/SP, de relatoria do Ministro Ruy Rosado de Aguiar, 4ª (Quarta) Turma, julgado em 03.09.1996 e publicado em 14.10.1996, que o direito moderno não contempla o venire contra factum proprium, que se traduz como o exercício de uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente (Menezes Cordeiro, Da Boa-fé no Direito Civil, 11/742).28
O referido v. decisório enfatizou, também, que
Havendo real contradição entre dois comportamentos, significando o segundo quebra injustificada da confiança gerada pela prática do primeiro, em prejuízo da contraparte, não é admissível dar eficácia à conduta posterior (Resposta no. 95539-SP Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar).29
27
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil, Parte Geral e LINDB,
Volume 1, 10ª edição. Editora JusPodivm, 2012, p. 687-688. 28
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo: Um Comentário à Lei nº 9.307/96. 3ª edição.
São Paulo: Editora Atlas, 2009, p. 38-44. 29
Neste item, foram apresentados os desdobramentos da arbitragem; mais
especificamente, como diversos autores discorrem sobre o princípio da arbitragem.
Apresenta-se, como próximo passo, as diversas formas que podem ser utilizadas
para se classificar a arbitragem30 - a saber: facultativa e obrigatória; formal e
informal; de direito e de equidade; ad hoc e institucional; e interna e internacional,
conforme detalhado a seguir.
1.1.3.1 Arbitragem facultativa e arbitragem obrigatória
A arbitragem facultativa ou voluntária é aquela que decorre da vontade das
partes. Vale salientar que o direito positivo somente admite a arbitragem quando
escolhida livremente pelas partes como meio para a solução do conflito. No Brasil,
em regra, a arbitragem é facultativa.
Por sua vez, a arbitragem obrigatória é aquela em que a lei impõe a
instauração da arbitragem como meio para solucionar o conflito, não permitindo às
partes qualquer outro meio.
Tal forma de arbitragem, em tese, não é admitida no ordenamento jurídico
pátrio, conforme exegese do artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de
1988, que dispõe que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito.”, ou seja, o princípio da inafastabilidade de jurisdição proíbe a
arbitragem imposta pela lei.
Entretanto, existe a exceção de conflitos entre agentes da Câmara de
Comercialização de Energia Elétrica – CCEE e a CCEE, que envolverem direitos
disponíveis, nas hipóteses do artigo 58 da Resolução Normativa nº
109/2004-ANEEL. In verbis:
Art. 58. Os Agentes da CCEE e a CCEE deverão dirimir, por intermédio da Câmara de Arbitragem, todos os conflitos que envolvam direitos disponíveis,
30
nos termos da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996, nas seguintes hipóteses:
I – Conflito entre dois ou mais Agentes da CCEE que não envolva assuntos sob a competência direta da ANEEL ou, na hipótese de tratar, já tenha esgotado todas as instâncias administrativas acerca do objeto da questão em tela;
II – Conflito entre um ou mais Agentes da CCEE e a CCEE que não envolva assuntos sob a competência direta da ANEEL ou, na hipótese de tratar, já tenha esgotado todas as instâncias administrativas acerca do objeto da questão em tela; e
III – sem prejuízo do que dispõe cláusula específica nos CCEARs, conflito entre Agentes da CCEE decorrente de Contratos Bilaterais, desde que o fato gerador da divergência decorra dos respectivos contratos ou de Regras e Procedimentos de Comercialização e repercuta sobre as obrigações dos agentes contratantes no âmbito da CCEE.
Parágrafo único. A Convenção Arbitral é parte integrante desta Convenção de Comercialização, bem como obrigatória a todos os agentes da CCEE e à CCEE, conforme disposto nos §§ 5º, 6º e 7º do art. 5º da Lei nº 10.848 , de 2004. (Redação dada pela REN ANEEL 348, de 06.01.2009.)
A Convenção Arbitral a que se refere o parágrafo único supra regulamenta o
procedimento arbitral das hipóteses do artigo 58 e foi homologada pela Resolução
Homologatória nº 531, de 7 de agosto de 2007, da Agência Nacional de Energia
Elétrica – ANEEL.
1.1.3.2 Arbitragem formal e informal
Diz-se que a arbitragem é formal no sentido de que devem ser obedecidas
determinadas regras para sua regular instauração. Cita-se como exemplos:
obediência à forma escrita; discussão apenas sobre direitos patrimoniais
disponíveis; observância do devido processo legal; entre outros.
A arbitragem no Brasil regra-se pelos princípios contratualistas,
principalmente pela função social do contrato, vez que assegura direitos e deveres
como ferramentas de preservação dos interesses dos contratantes e,
principalmente, do interesse social, em busca de uma solução justa à contenda.
A arbitragem informal não se sujeita a qualquer prescrição prevista em lei,