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Desdobramentos e Classificação da Arbitragem 31

1   FORMAS NÃO JURISDICIONAIS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 18

1.1   A arbitragem como forma não jurisdicional de solução de conflitos 26

1.1.3   Desdobramentos e Classificação da Arbitragem 31

É possível conceituar a arbitragem como uma das várias formas de solução de conflitos, que se caracteriza quando partes capazes elegem um árbitro, ou um juízo arbitral, para solucionar controvérsia que envolva direitos disponíveis.

A arbitragem é o acordo de vontades entre pessoas maiores e capazes que, preferindo não se submeter à decisão judicial, confiam a árbitros a solução de

litígios, desde que relativos a direitos patrimoniais disponíveis.25

As características da arbitragem, consoante arrolado no conceito acima mencionado, são extraídas do próprio artigo 1º da Lei 9.307, de 23 de setembro de                                                                                                                          

23

CARNEIRO, Athos Gusmão. Jurisdição e Competência. 18ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 81-82.

24

Idem, ibidem, p. 34-35.

25

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. 2ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 824.

1996. Dispõe sobre a arbitragem, estabelecendo: “As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.” Todavia, não se pode omitir que a arbitragem é instituição que excepciona o princípio do livre acesso à justiça, também denominado de princípio da inafastabilidade da jurisdição. Assim sendo, pela arbitragem as partes permitem que o árbitro promova a “pacificação do conflito”, impondo-lhes a solução que, no seu juízo, entendem como sendo a mais razoável.

Cláudio Lembo26, ao discorrer sobre o tema, esclarece que o acesso ilimitado

ao Poder Judiciário passou a sofrer mitigação a partir da vigência da Lei Marco Maciel, que instituiu o juízo arbitral (Lei nº 9.307, de 1996). Com a referida lei, quando convencionado em instrumento contratual, as partes, evolvendo a questão a meros direitos disponíveis, renunciariam à solução do conflito pelo Poder Judiciário, tema esse submetido a uma longa análise do Pretório Excelso, que, ao final, julgou constitucional a cláusula compromissória que tem o condão de conferir à sentença arbitral efeitos similares à sentença judicial - inclusive com a atribuição de irrecorribilidade.

Registre-se, ainda, que, existindo expressa disposição acerca da vinculação do contrato à arbitragem como forma de solução de conflitos, as partes contratantes, sob pena de criarem instabilidades à relação jurídica, não podem tentar alegar ausência de intenção na participação e submissão ao juízo arbitral, sob pena também de inegável ofensa ao princípio do venire contra factum proprium, ou seja, ao princípio da vedação de comportamento contraditório.

O referido princípio caracteriza-se pela existência de uma conduta inicial, geradora de legítima confiança, com posterior comportamento contraditório divergente da conduta inicial e que culmina com um prejuízo, concreto ou potencial, extraído dessa contradição. Portanto, o princípio proíbe a prática de um comportamento contraditório a uma conduta inicial que teria gerado uma determi-                                                                                                                          

26

LEMBO, Cláudio. A Pessoa - Seus Direitos. 1ª edição. Editora Manole: São Paulo, 2007, p. 208- 209.

nada expectativa à outra parte. Dessa forma, veda a prática de atos incoerentes e que contradizem uma conduta anterior iniciada pela mesma pessoa, capaz de frustrar as legítimas expectativas de terceiros.

Ainda sobre o referido princípio, é possível afirmar que ele é a exteriorização da proibição de comportamento contraditório, pois demonstra que a obrigação deve ser cumprida e revestida por um comportamento conforme a boa-fé objetiva, o senso ético esperado de todos. Então, a prática de um comportamento contraditório seria uma modalidade de abuso de direito, decorrente da violação ao princípio da

confiança que, por sua vez, decorre da boa-fé objetiva (artigo 422 do Código Civil). 27

Nesse sentido, não é admissível, em tal contexto, atentar contra factum

proprium, pois resta clara a proibição de venire contra factum proprium que, na

realidade, protege uma parte contra aquela que pretenda exercer uma posição jurídica que seja incoerente, ou contraditória, quanto ao comportamento previamente assumido. Sobre esta questão, vale citar a seguinte explicação de Carlos Alberto Carmona:

O Colendo Superior Tribunal de Justiça já decidiu, conforme o v. Acórdão, em parte transcrito, proferido em Recurso Especial nº 95.539/SP, de relatoria do Ministro Ruy Rosado de Aguiar, 4ª (Quarta) Turma, julgado em 03.09.1996 e publicado em 14.10.1996, que o direito moderno não contempla o venire contra factum proprium, que se traduz como o exercício de uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente (Menezes Cordeiro, Da Boa-fé no Direito Civil, 11/742).28 O referido v. decisório enfatizou, também, que

Havendo real contradição entre dois comportamentos, significando o segundo quebra injustificada da confiança gerada pela prática do primeiro, em prejuízo da contraparte, não é admissível dar eficácia à conduta posterior (Resposta no. 95539-SP Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar).29

                                                                                                                          27

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil, Parte Geral e LINDB, Volume 1, 10ª edição. Editora JusPodivm, 2012, p. 687-688.

28

CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo: Um Comentário à Lei nº 9.307/96. 3ª edição. São Paulo: Editora Atlas, 2009, p. 38-44.

29

Neste item, foram apresentados os desdobramentos da arbitragem; mais especificamente, como diversos autores discorrem sobre o princípio da arbitragem. Apresenta-se, como próximo passo, as diversas formas que podem ser utilizadas

para se classificar a arbitragem30 - a saber: facultativa e obrigatória; formal e

informal; de direito e de equidade; ad hoc e institucional; e interna e internacional, conforme detalhado a seguir.

1.1.3.1 Arbitragem facultativa e arbitragem obrigatória

A arbitragem facultativa ou voluntária é aquela que decorre da vontade das partes. Vale salientar que o direito positivo somente admite a arbitragem quando escolhida livremente pelas partes como meio para a solução do conflito. No Brasil, em regra, a arbitragem é facultativa.

Por sua vez, a arbitragem obrigatória é aquela em que a lei impõe a instauração da arbitragem como meio para solucionar o conflito, não permitindo às partes qualquer outro meio.

Tal forma de arbitragem, em tese, não é admitida no ordenamento jurídico pátrio, conforme exegese do artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988, que dispõe que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”, ou seja, o princípio da inafastabilidade de jurisdição proíbe a arbitragem imposta pela lei.

Entretanto, existe a exceção de conflitos entre agentes da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE e a CCEE, que envolverem direitos disponíveis, nas hipóteses do artigo 58 da Resolução Normativa nº 109/2004- ANEEL. In verbis:

Art. 58. Os Agentes da CCEE e a CCEE deverão dirimir, por intermédio da Câmara de Arbitragem, todos os conflitos que envolvam direitos disponíveis,

                                                                                                                          30

nos termos da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996, nas seguintes hipóteses:

I – Conflito entre dois ou mais Agentes da CCEE que não envolva assuntos sob a competência direta da ANEEL ou, na hipótese de tratar, já tenha esgotado todas as instâncias administrativas acerca do objeto da questão em tela;

II – Conflito entre um ou mais Agentes da CCEE e a CCEE que não envolva assuntos sob a competência direta da ANEEL ou, na hipótese de tratar, já tenha esgotado todas as instâncias administrativas acerca do objeto da questão em tela; e

III – sem prejuízo do que dispõe cláusula específica nos CCEARs, conflito entre Agentes da CCEE decorrente de Contratos Bilaterais, desde que o fato gerador da divergência decorra dos respectivos contratos ou de Regras e Procedimentos de Comercialização e repercuta sobre as obrigações dos agentes contratantes no âmbito da CCEE.

Parágrafo único. A Convenção Arbitral é parte integrante desta Convenção de Comercialização, bem como obrigatória a todos os agentes da CCEE e à CCEE, conforme disposto nos §§ 5º, 6º e 7º do art. 5º da Lei nº 10.848 , de 2004. (Redação dada pela REN ANEEL 348, de 06.01.2009.)

A Convenção Arbitral a que se refere o parágrafo único supra regulamenta o procedimento arbitral das hipóteses do artigo 58 e foi homologada pela Resolução Homologatória nº 531, de 7 de agosto de 2007, da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL.

1.1.3.2 Arbitragem formal e informal

Diz-se que a arbitragem é formal no sentido de que devem ser obedecidas determinadas regras para sua regular instauração. Cita-se como exemplos: obediência à forma escrita; discussão apenas sobre direitos patrimoniais disponíveis; observância do devido processo legal; entre outros.

A arbitragem no Brasil regra-se pelos princípios contratualistas, principalmente pela função social do contrato, vez que assegura direitos e deveres como ferramentas de preservação dos interesses dos contratantes e, principalmente, do interesse social, em busca de uma solução justa à contenda.

A arbitragem informal não se sujeita a qualquer prescrição prevista em lei, possuindo forma livre e, por consequência, não possuindo todas as garantias

estabelecidas pela legislação extravagante. Podem ser mencionados os exemplos: garantia da coisa julgada; valor de título executivo judicial; entre outros.

1.1.3.3 Arbitragem de direito e de equidade

A classificação dessa arbitragem é baseada no critério utilizado pelo árbitro para dirimir a questão que lhe é apresentada.

A arbitragem de direito é aquela em que o árbitro está vinculada ao direito positivo, ou seja, deve aplicar as regras previstas na lei para a solução de conflitos. A arbitragem por equidade, por outro lado, é aquela em que o árbitro pode utilizar outros meios para a solução de conflitos, podendo, portanto, decidir segundo o seu entendimento e senso de justiça, inclusive aplicando regras por ele formuladas.

Mas, pode o árbitro valer-se da equidade no direito brasileiro?

Acreditamos que a resposta seja positiva, pois, enquanto inexistir mandamento legal hábil a dirimir a controvérsia, competirá ao árbitro aplicar dos meios supletivos, quais sejam, costume, princípios gerais do direito e, ao final, equidade.

Afirma-se que a arbitragem de direito e a arbitragem de equidade são classificadas de acordo com o critério que o árbitro utilizar para resolver o conflito. A primeira, ou seja, a arbitragem de direito, é aquela em que o árbitro resolve a questão com a aplicação do direito positivo, ao passo que a segunda, a arbitragem de equidade, é aquela em que o árbitro decide com o segundo seu entendimento de justiça, isto é, aplicando regras por ele formuladas, cabendo registrar, segundo ensinamento doutrinário que, na hipótese de solução pela equidade, “o árbitro

utilizará a lógica do razoável para decidir com a equidade”.31

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1.1.3.4 Arbitragem ad hoc e institucional

Fala-se em arbitragem “ad hoc” quando as próprias partes estabelecem as regras para a arbitragem, sem a administração de uma instituição arbitral e seu secretariado; contudo, respeitadas as disposições legais. Dessa forma, as partes estabelecem, no contrato, as regras que o árbitro deverá utilizar para resolver a contenda, mas sem deixar de lado as disposições estabelecidas pela legislação vigente.

Do seu turno, a arbitragem institucional é aquela estabelecida por uma instituição em específico, isto é, por tribunais, por cortes arbitrais devidamente registradas e plenamente constituídas.

1.1.3.5 Arbitragem interna e internacional

A Lei de Arbitragem submete-se ao critério territorial para definir a arbitragem em interna e estrangeira.

A arbitragem estrangeira, que será posteriormente abordada neste estudo, de forma mais detalhada, é aquela em que a sentença arbitral foi proferida fora do território brasileiro, ao passo que a arbitragem interna é aquela em que a sentença arbitral foi proferida em território nacional.