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1   FORMAS NÃO JURISDICIONAIS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS 18

1.3   Enfoque Legal – Lei nº 9.307/96 44

1.3.4   Da Sentença Arbitral 69

A sentença arbitral possui efeitos similares àqueles proferidos pelo Estado- juiz, inclusive fazendo coisa julgada material, constituindo, ainda, se condenatória, título executivo judicial. Ao final do procedimento arbitral, o árbitro, ou o tribunal arbitral, chegará à solução do litígio. Esta se materializa por meio da denominada sentença arbitral, a qual, como dito, por força de lei, constitui título executivo judicial.

A sentença arbitral deve ser proferida em um determinado prazo, que pode ser estabelecido pelas partes na convenção de arbitragem. Porém, inexistindo tal fixação, deverá ser proferida no prazo de seis meses, contados da instituição da arbitragem ou substituição do árbitro, sob pena de nulidade (artigo 32, inciso IV, da Lei de Arbitragem).

O artigo 26 da Lei nº 9.307-96 enumera os requisitos da sentença arbitral, quais sejam: o relatório, que conterá o nome das partes e um resumo do litígio; os fundamentos da decisão, onde serão analisadas as questões de fato e de direito, mencionando-se, expressamente, se os árbitros julgaram por equidade; o dispositivo em que os árbitros resolverão as questões que lhes forem submetidas e estabelecerão o prazo para o cumprimento da decisão, se for o caso; e a data e lugar em que foi proferida.

O artigo 27 da Lei de Arbitragem estabelece que a sentença arbitral fixará o “ônus da sucumbência”, isto é, a responsabilidade das partes acerca das custas e despesas com a arbitragem, bem como sobre a verba decorrente de litigância de má-fé, salvo se houver convenção a respeito.

Não há recurso contra a sentença arbitral. Contudo, nos termos do artigo 30 da Lei de Arbitragem, no prazo de cinco dias, a contar do recebimento da notificação ou ciência pessoal que determina a intimação da sentença arbitral às partes, a parte interessada, mediante comunicação à outra parte, poderá solicitar ao árbitro, ou ao tribunal arbitral, a correção de qualquer erro material da sentença arbitral; o esclarecimento de alguma obscuridade, dúvida ou contradição da sentença arbitral; ou o pronunciamento sobre ponto omitido a respeito do qual a decisão deveria

manifestar-se. Além disso, o árbitro, ou o tribunal arbitral, decidirá no prazo de dez dias, aditando a sentença arbitral e notificando as partes na forma do artigo 29.

1.3.4.1 Da Nulidade da Sentença Arbitral – Orientação Jurisprudencial

Apesar da Lei nº 9.307/96 não dispor sobre o cabimento de recursos contra a sentença arbitral, é possível que qualquer dos interessados deduza pretensão perante o Poder Judiciário, visando a declaração de nulidade da decisão proferida ao fim do procedimento arbitral, nas seguintes hipóteses, elencadas pelo artigo 32 da citada lei: haver nulidade do compromisso; ter sido proferida por quem não podia ser árbitro; não contiver os requisitos do artigo 26 dessa lei; ter sido proferida fora dos limites da convenção de arbitragem; não decidir todo o litígio submetido à arbitragem; ser provado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva; ser proferida fora do prazo, respeitado o disposto no artigo 12, inciso III, da lei; e na hipótese de ter sido desrespeitados os princípios de que trata o artigo 21 da lei. (ANEXO 8).

Na verdade, casos de nulidade da sentença arbitral, previstos no artigo 32 da Lei de Arbitragem, não trazem grande inovação em relação ao que já previa o art. 1.100 do Código de Processo Civil, pois o rol constante da lei inclui todas as hipóteses que estavam inseridas no dispositivo revogado do Diploma Processual Civil, apesar de acrescentar outras que aumentam a garantia das partes.

Destarte, a arbitragem consiste no julgamento da contenda por terceiro particular e imparcial, escolhido pelas partes, sendo uma espécie de heterocomposição de conflitos que se desenvolve por um mecanismo mais simplificado e menos formal do que o processo judicial. A sentença proferida pelo juízo arbitral produzirá, entre as partes e seus sucessores, os efeitos da sentença proferida pelos órgãos jurisdicionais e, se de natureza condenatória, constituirá título executivo judicial (art. 31 da Lei no. 9.307/96 e art. 475-N, IV do CPC), sendo plausível, inclusive, a execução de sentença arbitral estrangeira (art. 34 da Lei de Arbitragem).

É possível haver controle judicial sobre a sentença arbitral (arts. 32 e 33 da Lei de Arbitragem); não obstante, tal controle cinge-se a aspectos formais. Não se admite a revisão, pelo Judiciário, do mérito da decisão arbitral, mas apenas a revisão de matérias relativas à validade do procedimento. É em razão dessa aptidão para a produção de coisa julgada material que se diz, conforme anteriormente detalhado, que a arbitragem é verdadeira espécie de jurisdição.

Nos contratos de consumo, é nula de pleno direito cláusula contratual que fixe a arbitragem compulsória (art. 51, inciso VII, do Código de Defesa do Consumidor). O princípio da autonomia privada, nas relações de consumo, é mitigado pelos princípios de igualdade, boa-fé e função social do contrato, em razão da vulnerabilidade do consumidor em face do fornecedor do produto ou serviço, que será obrigado a se sujeitar às cláusulas impostas pelo outro se com ele quiser contratar.

Nos contratos de adesão que não envolvam relações de consumo, entretanto, a convenção de arbitragem só terá validade se a iniciativa de instituí-la couber ao aderente ou, então, se este concordar expressamente com a sua instituição, ou seja, nos termos da lei, por escrito, em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou vista, especialmente, para essa cláusula (artigo 4º, § 2º, Lei n2 9.307/96).

Além do mais, a Lei nº 9.307/96 estabelece que a ação declaratória de nulidade de sentença arbitral seguirá o procedimento comum, consoante previsto no Código de Processo Civil, e terá prazo decadencial de 90 (noventa) dias para a sua propositura, nos termos do seu artigo 33, § 1º, que fixa que a demanda para a decretação de nulidade da sentença arbitral observará o procedimento comum, previsto no Código de Processo Civil, e deverá ser proposta no prazo de até noventa dias após o recebimento da notificação da sentença arbitral ou de seu aditamento. Findo esse prazo, a sentença arbitral torna-se soberana e imutável. (ANEXO 9).

No mesmo diapasão, em comentários à Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307, de 23

de setembro de 1996), Negrão et al64 apresentaram a lição de que a autorização

para que o executado embuta na oposição à execução da sentença arbitral - pedido voltado à decretação da sua nulidade, com fundamento no art. 32 - depende de impugnação a ser apresentada dentro do prazo de 90 dias previsto no § 1º. Ultrapassado esse prazo, tudo o que o executado pode alegar em seu favor fica circunscrito ao rol do CPC 475-L. (ANEXO 10).

A nulidade da sentença arbitral também pode ser arguida durante sua execução judicial, em sede de embargos do devedor, conforme dispõe o artigo 33, § 3º, da Lei de Arbitragem, isto é, a decretação da nulidade da sentença arbitral também poderá ser arguida mediante ação de embargos do devedor, conforme o art. 741 e seguintes do Código de Processo Civil, se houver execução judicial.

Apesar disso, com as alterações do Código de Processo Civil (Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005), principalmente aquelas relacionadas à instituição da fase de cumprimento da sentença, é forçoso reconhecer que o dispositivo acima mencionado merece atualização para que a arguição de nulidade da sentença arbitral, por se tratar de título executivo judicial, seja deduzida no bojo da respectiva impugnação, já que prevista como título executivo judicial no artigo 475-N, inciso IV, do Código de Processo Civil.

Cabe, ainda, sustentar a possibilidade de aplicação do princípio da instrumentalidade das formas e do princípio do não prejuízo (pas de nullité sans

grief) no juízo arbitral. Em outras palavras, não se pode olvidar que no procedimento

arbitral, assim como ocorre no processo civil, meras irregulares ou nulidade relativas possam gerar a nulidade da sentença arbitral. Cabe, então, àquele que se entenda afrontado pelo ato demonstrar efetivo prejuízo para que, desta forma, possa ocorrer a declaração de nulidade da sentença arbitral ou de algum ato que a preceda.

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NEGRÃO, Theotonio; GOUVÊA, José Roberto Ferreira; BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar; FONSECA, João Francisco Naves da. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. 44ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.

Com efeito, vale registrar que o artigo 249, § 1º, segunda parte, do Código de Processo Civil, consagra o princípio do não prejuízo, pois o ato não se repetirá nem se lhe suprirá a falta quando não prejudicar a parte.

A jurisprudência pátria consagra sua existência: “Não é razoável admitir que um vício inocente possa desviar o processo da finalidade para o qual foi concebido: a boa e segura distribuição da prestação jurisdicional” (STJ – 1ª Turma – REsp nº 12172 – Rel. Min. Gomes de Barros, DJU 24.8.1992, p. 12978).

Ademais, com instrumentalidade, o processo judicial é um meio para a aplicação do direito material ao caso concreto, tendo como escopo a atividade jurisdicional que proporcionará a solução e a tutela jurisdicional aos direitos subjetivos substanciais, atingindo, assim, a sua finalidade: a pacificação social.

Tal preceito, com o máximo respeito, também deve ser entendido como aplicável à arbitragem, pois, ainda que não se submeta à apreciação do Estado-juiz, tem como finalidade a solução do litígio e, destarte, a pacificação social.

Por conseguinte, tanto o processo judicial quanto o procedimento arbitral não são um fim em si, mas meios, instrumentos que se mostrarão efetivos quando harmonizarem a atuação do direito material ao caso concreto, tendo, por fim, a realização de uma ordem jurídica justa. No caso concreto, se as provas produzidas atingirem seu objetivo ou sua finalidade, tornando aptas a elucidar e formar a convicção para o julgamento da lide ou da contenda submetida ao juízo arbitral, o processo judicial e procedimento arbitral mostraram-se como instrumentos capazes e efetivos para a declaração do direito material ao caso concreto.

Na verdade, não se mostraria razoável anular atos processuais cujo aproveitamento seja possível, inclusive por ausência de demonstração do prejuízo. Sendo assim, se o processo judicial ou arbitral atingiu a sua finalidade instrumental e efetiva, a formalidade não pode ser obstáculo à atuação do direito material ao caso concreto, valendo dizer que mais vale o conteúdo de um ato do que a sua forma (exegese do artigo 205 do Código de Processo Civil).

Nesse sentido, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Nery65, em comentários ao mencionado artigo, asseveram que o Código de Processo Civil adotou o princípio da instrumentalidade das formas, segundo o qual o que importa é a finalidade do ato e não ele em si mesmo considerado. Em outras palavras, se o ato puder atingir a sua finalidade, ainda que irregular a forma não deverá ser anulada. (ANEXO 11).

Ademais, é possível sustentar que o prejuízo deve ser demonstrado na primeira oportunidade que a parte possui para manifestar-se no processo judicial, como no procedimento arbitral, uma vez que, sendo a irregularidade uma nulidade relativa, não pode ser decretada de ofício pelo Estado-juiz, tampouco pelo árbitro, devendo a parte atingida por tal nulidade alegá-la em sua primeira oportunidade, sob pena de preclusão, conforme dispõe o artigo 245 do Código de Processo Civil. Nesse sentido, Humberto Theodoro Junior observa:

A nulidade relativa deve ser arguida pela parte interessada em sua decretação em primeira oportunidade em que lhe couber falar dos autos, após ato defeituoso, sob pena de preclusão (art. 245), isto é, de perda da faculdade processual de promover a anulação. (ANEXO 12).