dicionários e enciclopédias de música com ensinamentos os mais variados, mas sem dúvida mais raramente conduzem-nos a uma verdadeira história dessa arte até os nossos dias, em sua maravilhosa trajetória através dos séculos: seus encontros, desenvolvimentos, o surgimento dos homens que não cessam de inventá-la e reinventá-inventá-la.
Quisemos aqui traçar uma história da prática e da estética musicais, de seus instrumentos e regras hoje variáveis, de seus compositores, sobretudo aqueles a quem foram dedicados, em virtude da grandeza de sua genialidade criativa, grandes capítulos.
Mas quisemos igualmente que esta História da música "ocidental" com suas evoluções e mesmo com suas revoluções específicas, não ficasse dissociada da história geral: história política, socioeconómica, cultural e religiosa, preocupando-nos assim em esclarecer as situações sócio-históricas da música ao longo dos séculos.
Destinada a todos os leitores, a todos os apaixonados pela música, os praticantes ou ouvintes, a todos aqueles que querem saber mais, esta história se abre, antes que se comece o seu relato, com um "Léxico musical explicativo", um pouco como se entrega em mãos a chave de uma fábrica.
HISTÓRIA DA
MÜSICA OCIDENTAL
JEAN & BRIGITTE MASSIN
HISTORIA DA
MÚSICA OCIDENTAL
Tradução
Ângela Ramalho Viana Carlos Sussekind Maria Teresa Resende Costa
EDITORA NOVA FRONTEIRA
© Fayard/Messidor - Temps Actuels, 1985 para e d i ç ã o n ã o ilustrada. Direitos de edição da obra em língua portuguesa no Brasil adquiridos pela
EDITORA NOVA FRONTEIRA S.A. Rua Bambina, 25 - Botafogo C E P : 22251-050 - Rio de Janeiro - R J - Brasil
Tel: 537 8770 - Fax: 286 6755 http:://www.novafronteira.com.br
Equipe de p r o d u ç ã o
Leila Name Regina Marques Sofia Sousa e Silva Michelle Chao Mareio Araújo
Edição de originais
Antônio Monteiro Guimarães César Benjamin
í n d i c e o n o m á s t i c o
Isabel Grau Nana Vaz de Castro Pedro de Moura Aragão
Revisão
Ana Lúcia Kronemberger Ângela Pessoa Marcelo Eufrasia
Projeto gráfico e editoração eletrônica
Silvia Negreiros
C I P - B R A S I L . C A T A L O G A Ç Ã O - N A - F O N T E S I N D I C A T O N A C I O N A L D O S E D I T O R E S D E L I V R O S M371h Massin, Jean
História da m ú s i c a ocidental / Jean 8c Brigitte Massin ; t r a d u ç ã o de Maria Teresa Resende Costa, Carlos Sussekind, Angela Ramalho Viana. - Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1997
Tradução de: Histoire de la musique ocidentale I S B N 85-209-0907-8
1. M ú s i c a - História e crítica. I . Massin, Brigitte. I I . T í t u l o .
97-1719. C D D 780.9
C D U 78(091)
SUMÁRIO
SOBRE OS COLABORADORES xiii
PREFÁCIO xvii
Brigitte e Jean Massin
LÉXICO MUSICAL EXPLICATIVO 1 Os instrumentos, a orquestra, as vozes 3
Philippe Beaussant, com a colaboração de Jean-Yves Bosseur e Jean Massin
O solfejo e a harmonia 45
Michèle Reverdy
As formas e os gêneros musicais 63
Philippe Beaussant, com a colaboração de Brigitte e Jean Massin e de Marc Vignal
A notação e a interpretação 99
Jean-Yves Bosseur
Primeira Parte
DAS ORIGENS CRISTÃS AO SÉCULO XIV 123 1. Pensar a música na Idade Média 125
Françoise Ferrand
2. Os primeiros cânticos da Igreja 135 Françoise Ferrand
3. Técnica e notação do canto gregoriano 141
Michel Hugh
4. A liberdade e a brecha: tropos, seqüências, dramas litúrgicos 151
vi Historia da música ocidental
5. A música profana nos séculos XII e XIII 161
Françoise Ferrand
6. A polifonia, desde seus primordios até o fim do século XIII 185
Françoise Ferrand
7. A Ars Nova e Guillaume de Machaut 195
Françoise Ferrand
Segunda Farte
OS SÉCULOS XV E XVI 209 8. A música no século XV 211
Bernard Gagnepain
9. A música no século XVI: Europa do Norte, França, Italia, Espanha 235
Jean-Pierre Ouvrard
10. A música luterana no século XVI 289
Marc Vignal
11. A música inglesa no tempo dos Tudor e dos primeiros Stuart 293
Jean-François Labié
Terceira Parte
O SÉCULO XVII 313 12. Situação sócio-histórica da música no século XVII 315
Ivo Supicic
13. Claudio Monteverdi (1567-1643) 327
Jean-Ives Bosseur
14. As invenções italianas do espírito barroco 341
Philippe Beaussant
15. A música barroca da França "clássica" 359
Philippe Beaussant
16. Heinrich Schütz (1585-1672) 385
Marc Vignal
17. A música alemã entre Schütz e Bach 393 Marc Vignal
18. A música inglesa depois de Cromwell: Henry Purcell 399
Jean-François Labié
Quarta Parte
A PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XVIII 409 19. Situação sócio-histórica da música no século XVIII 411
Ivo Supicic
Sumário vii
20. Antonio Vivaldi (1678-1741) 423
Ivo Supicic
21. Domenico Scarlatti e a música instrumental italiana 433
Stéphane Golãet
22. A música vocal italiana de Pergolesi a Cimarosa 441 Jean-Fançois Labie
23. Johann Sebastian Bach (1685-1750) 453
Philippe Beaussant
24. Georg Friedrich Haendel (1685-1759) 477
Jean-François Labie
25. Jean-PhiHppe Rameau (1683-1764) 493
Philippe Beaussant
26. A Querelle des Boujfons 501
Stéphane Golãet
Quinta Parte
O SÉCULO XVIII: SEGUNDA METADE 507 27. O nascimento de uma nova linguagem musical 509
Marc Vignal
28. A formação de um novo público e suas conseqüências musicais 513
Marc Vignal
29. As novas correntes musicais de 1750 a 1780 525
Marc Vignal
30. Caracterização do "classicismo" vienense 545
Marc Vignal
31. Joseph Haydn (1732-1809) 557
Marc Vignal
32. Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) 567
Brigitte e Jean Massin
33. A música da Revolução Francesa 583
Gérard Gefen
Sexta Parte
NO LIMIAR DO SÉCULO XIX 597 34. Ludwig van Beethoven (1770-1827) 599
Jean Massin
35. Weber e seus contemporâneos germânicos 623
36. Franz Schubert (1797-1828) 631
Brigitte Massin
37. A ópera italiana de Cherubini a Rossini 647
Jean-François Labié
Sétima Parte
OS FILHOS DO SÉCULO 659 38. Situação sócio-histórica da música no século XIX 661
Ivo Supicic
39. A ópera italiana: Donizetti, Bellini, Verdi 673
Jean-François Labié
40. A música francesa: o reinado de Eugène Scribe 689
Stéphane Goldet 41. Hector Berlioz (1803-1869) 699 Brigitte Massin 42. Felix Mendelssohn (1809-1847) 713 Brigitte Massin 43. Robert Schumann (1810-1856) 721 Brigitte Massin 44. Frédéric Chopin (1810-1849) 737 Dominique Bosseur 45. Franz Liszt (1811-1886) 745 Dominique Bosseur 46. Richard Wagner (1813-1883) 757 Dominique Bosseur Oitava Parte
A SEGUNDA METADE DO SÉCULO XLX 771
47. Viena, da valsa à opereta 773
Stéphane Goldet
48. Anton Bruckner (1824-1896) 777
Marc Vignal
49. Johannes Brahms (1833-1897) 783
Stéphane Goldet
50. A música francesa: Offenbach, Gounod e Bizet 793
Stéphane Goldet
51. César Franck, os "franckistas" e Chabrier 805
Gérard Gefen
52. A música russa: de Glinka ao "Grupo dos Cinco" 819
Michèle Reverdy
53. Modest Mussorgski (1839-1881) 825
Michèle Reverdy
54. Piotr Tchaikovski ( 1840-1893) 831
Michèle Reverdy
55. A música tcheca: Smetana, Dvorák 837
Michèle Reverdy
56. Grieg e os músicos escandinavos 843
Stéphane Goldet Nona Parte A VIRADA DO SÉCULO XX 847 57. Hugo Wolf (1860-1903) 849 Stéphane Goldet 58. Gustav Mahler (1860-1911) 857 Marc Vignal 59. Richard Strauss (1864-1949) 869 Stéphane Goldet
60. Dois antigos e um moderno: Reger, Pfitzner, Busoni 879
Stéphane Goldet
61. A ópera italiana: depois de Verdi, Puccini 885
Jean-François Labié
62. Scriabin e seus contemporâneos russos 895
Michèle Reverdy
63. Jean Sibelius (1865-1957) 901
Marc Vignal
64. Claude Debussy (1862-1918) 907
Michèle Reverdy
65. Os contemporâneos franceses de-Debussy 917
Michèle Reverdy
66. Maurice Ravel (1875-1930) , 925
Michèle Reverdy
67. A música espanhola: Albeniz, Granados, Manuel de Falla 933
Michèle Reverdy
68. A música inglesa 939
X Historia da música oádental
Décima Parte
A PRIMEIRA METADE DO SÉCULO X X 945 69. Erik Satie, o "Grupo dos Seis" 947
Michèle Reverdy
70. Janácek, Martinu, Kodály: a Europa Central 957
Michèle Reverdy
71. Bela Bartók (1881-1945) 963
Michèle Reverdy
72. À maneira de preâmbulo à "Escola de Viena": música atonal, dodecafônica,
serial 973 Marc Vignal 73. Arnold Schõnberg (1874-1951) 979 Marc Vignal 74. Alban Berg (1885-1935) 987 Michèle Reverdy 75. Anton Webern (1883-1945) 995 Jean-Yves Bosseur 76. A geração de 1900 na Alemanha 1003 Stéphane Goldet 77. Igor Stravinski (1882-1971).... 1011 Jean-Yves Bosseur 78. Serguei Prokofiev (1891-1953) 1023 Philippe Olivier 79. Dimitri Chostakovitch (1906-1975) 1033 Philippe Olivier
80. Os compositores da América Latina 1043
Michèle Reverdy
81. Charles Ives e seus contemporâneos norte-americanos 1047
Jean-Yves Bosseur
82. Edgar Varèse (1883-1965) 1053
Michèle Reverdy
Décima Primeira Parte
O JAZZ 1063
83. Pode-se dizer o que é o jazz7. 1065
Jacques B. Hess
84. Uma poesia épica coletiva: negro spirituals 1071
Jacques B. Hess
Sumário
85. Máscaras e pilhagens: os minstrels 1077
Jacques B. Hess
86. Um canto de desamparo: o blues 1081
Jacques B. Hess
87. Uma música de salão e de saloon: o ragtime 1087
Jacques B. Hess
88. Das cidades e dos homens: os avatares de uma grande arte 1095
Jacques B. Hess
89. Revoltas e interrogações: o free jazz e agora 1105
Jacques B. Hess
90. Pequena história do rock'n'roll H H
Thierry Châtain
Décima Segunda Parte
A SEGUNDA M E T A D E D O SÉCULO X X • 1123
Brigitte Massin, com contribuições de Jean-Yves Bosseur, Michel Chion, Michèle Reverdy e Marc Vignal
91. Os iniciadores H25
92. A nebulosa de Darmstadt 1143
93. A revolução eletroacústica 1165 94. O grande ateliê europeu H83 95. Os provocadores 1201 96. Prospectiva de um labirinto 1215
SOBRE OS COLABORADORES
Philippe Beaussant
Diretor do Instituto de Música e Dança Antigas, musicólogo, autor de obras sobre Couperin, Rameau e Lully, bem como de romances e ensaios; produtor da Radio-France.
Dominique Bosseur
Doutor em Letras, professor-assistente da Universidade da Córsega; com colabo-rações em diversas obras e revistas consagradas à estética contemporânea.
Jean-Yves Bosseur
Doutor em Letras, professor-pesquisador do Centre National de Recherches Scientifiques [Centro Nacional de Pesquisas Científicas], compositor, co-fundador do grupo Intervalles, autor com D. Bosseur de Révolutions musicales.
Thierry Châtain
Jornalista, colaborador regular da revista Rock and Folk, do Libération e da Année
du Rock. Michel Chion
Compositor, musicólogo, ensaísta, diretor de filmes, crítico da Cahiers du Cinéma, antigo membro do Groupe de Recherches Musicales [Grupo de Pesquisas Musi-cais] do INA, autor de diversos livros sobre a música e o cinema.
Françoise Ferrand
Professor-conferencista da Universidade de Rouen, autor de várias obras e estudos sobre a poesia lírica, a canção e a estética musical da Idade Média e início da Re-nascença.
xiv História da música oádental
Bernard Gagnepain
Professor de história da música pré-clássica e de paleografía musical do Conserva-tório Superior de Música de Paris. Diretor do Seminário Europeu de Música An-tiga (Bruges).
Gérard Gefen
Escritor, produtor da Radio-France, colaborador das revistas Compact e La Lettre
du musicien. Autor de uma obra sobre Wilhelm Furtwangler. Stéphane Goldet
Produtora da France-Musique, colaboradora regular da revista Avant-Scène Opéra. Autora de uma obra consagrada a Hugo Wolf e de outra sobre o Quarteto de cor-das no século XX.
Jacques B. Hess
Responsável pelo curso de história do jazz na UER de Música e Musicología de Paris-Sorbonne (Paris-IVe).
Michel Hugh
Conferencista sobre paleografía musical na Sorbonne, diretor da seção de musico¬ logia do Instituto de Textos.
Jean-François Labié
Historiador da música, especialista em historia da arte barroca, produtor da Radio-France, colaborador regular das revistas Avant-Scène Opéra e Diapason. Publicou uma importante obra dedicada a Haendel.
Philippe Olivier
Crítico musical do Libération, colaborador da Radio-France, autor de La Musique
au quotidien. Jean-Pierre Ouvrard
Professor da Universidade François Rabelais em Tours, autor de muitas obras e artigos sobre a canção francesa polifónica do século XVI, colaborador regular ou ocasional de diversos conjuntos e instituições de música antiga.
Michèle Reverdy
Compositora, professora de análise do Conservatório Superior Nacional de Músi-ca de Paris, produtora da France-Culture, autora de dois livros sobre a obra de Olivier Messiaen.
Sobre os colaboradores xv
Ivan Supicic
Presidente da Sociedade Internacional de Musicología, redator-chefe da
Inter-national Review of the Aesthetics and Sociology of Music, professor da Academia
Musical de Zagreb e professor-associado da Universidade de Ciências Humanas de Strasbourg.
Marc Vignal
Crítico musical, produtor da France-Musique; autor de livros sobre Mahler e Si-belius, autor de uma importante obra sobre Haydn.
PREFÁCIO
Por que e para quem?
Por que senão para satisfazer uma necessidade que de início foi nossa (só existe trabalho válido sob essa condição) e que sabemos ser a necessidade de muitos? A de explorar os oceanos da música e conhecê-los melhor, para neles encontrar ainda mais alegria.
Uma necessidade de todas as épocas: terá algum dia havido, em milênios, uma sociedade humana sem música? No entanto, de maneira mais premente, uma ne-cessidade de nossa época. Por uma razão capital: a arquitetura, a escultura e a pintura requerem o espaço como dado primordial de sua existência; a música re-quer o tempo. Numa só olhadela podemos apreender a totalidade do quadro mais vasto, ou até do conjunto dos afrescos do teto da Capela Sistina (uma apreensão muito insuficiente, é claro, e que pede uma contemplação mais longa, com o exa-me de cada detalhe); mas é impossível que uma só "escutadela" nos forneça a to-talidade da mais breve obra musical que se possa imaginar (um único som só poderia constituir um fato musical no seio de praias de silêncio que o cercassem). "A música por vezes se apossa de mim como um mar", dizia Baudelaire. Como o mar, ela solicita nosso embarque para uma navegação, de curso mais longo ou mais curto. Qualquer música (mesmo circular ou repetitiva) exprime, de certo modo, uma história a que devemos estar atentos do começo ao fim.
Essa duração necessária da atenção explica por que, dentre todos os mundos da arte, o mundo da música não é o mais imediatamente fácil de penetrar em profun-didade. Mas, o fato de a música ser a arte da duração também explica, sem dúvida, por que seu lugar não pára de crescer, nem pára sua necessidade de se afirmar, num universo em que vivemos cada vez mais em função do tempo, dos horários cronometrados e dos relógios de ponto, da duração psicológica e de uma evolução
xvüi História da música ocidental
acelerada da história. Pouco a pouco, já se vão cerca de dois séculos, nossos valores se inverteram, passando do absoluto em si para o relativo, que exige outros tipos de perfeição, do ser imutável para o tornar-se, da fixidez para o movimento, do estático para o dinâmico, da eternidade para a história. O que cada um de nós atualmente sabe é que, mais ainda do que seu corpo, a matéria primordial do homem é seu tempo. Daí nossas angústias e nossas revoltas; daí também nossas aspirações e as novas formas de nossas sensualidades, nossas ternuras e nossas alegrias. Daí a maior necessidade e a maior presença da música hoje em dia: a um só tempo, ela exorciza e transfigura nossa obsessão com o tempo que escoa.
A música está em nossa vida por toda parte (a ponto de, vez por outra, sua presença superar nossa necessidade, nos lugares públicos: quanto mais gostamos de música, mais sentimos necessidade de saborear também o silêncio). Ela vem solicitar-nos através do rádio, da televisão, do cinema, do disco, da fita cassete: uma só exibição da Nona Sinfonia na telinha e um só filme de Bergman sobre
A flauta mágica atingem mais ouvintes e conquistam mais apaixonados, talvez, do
que 180 anos em todos os teatros de ópera e salões de concerto do mundo: o disco ressuscitou para nós centenas de obras-primas, até então reservadas apenas aos "ratos" de biblioteca e aos ratos propriamente ditos, ou, pelo menos, tão-somente ao prazer de uns raros conhecedores. A esse impulso da difusão musical corres-ponde um maior desenvolvimento da atividade e da prática musicais. Os mal-humorados viviam repetindo que a proliferação do disco fonográfico e, mais espe-cificamente, a revolução do long-play condenariam à extinção a espécie dos instrumentistas não profissionais; foi o contrário que se constatou. O mesmo acontecerá, provavelmente, com o disco a laser e o compact disc.
Atendo-nos a isso, o atual avanço da música pareceria estar ainda por demais ligado a motivações socioculturais, se de pronto não acrescentássemos o essencial: a música é uma necessidade do coração e da imaginação e, se é principalmente uma necessidade de nossa época, é porque atende ainda mais às necessidades do coração e da imaginação de nossos contemporâneos. A função sacralizadora da música é algo a que os seres humanos da pré-história já recorriam. Sua função estimulante, nós a conhecemos desde que existem músicas guerreiras. A função erótica da música é encontrada nas festas, nos banquetes e nas bodas de todas as épocas e lugares. Quanto à sua função pacificadora, nós a conhecemos desde os antigos mitos de Orfeu, desarmando as divindades infernais com seu canto, e de Davi, tocando para o rei Saul a fim de acalmar seus acessos de melancolia furiosa. Mas o papel desempenhado pela música em nossa vida vai muito mais longe, quando lhe abrimos nossa mais secreta porta (Beethoven seria o primeiro a pro-clamá-lo com plena consciência): ela é a mediadora que nos reconcilia com nós mesmos, nos dá acesso àquela região íntima, lá no fundo de nós, onde enfim en-contramos nosso eu (consciente e inconsciente, às vezes reconciliados como que por milagre) em plena liberdade.
Prefácio xix
Na medida em que nossa civilização torna-se mais abstrata, mais funcional, mais coletiva, mais programada (por um processo que seria indispensável aprimo-rar, sob diversos aspectos, mas que seria inútil rejeitar, a tal ponto a trajetória global é simultaneamente inelutável e válida), mais experimentamos a necessidade de multiplicar e aprofundar os recursos de nossa fantasia e de nossa singularidade. Uma das maravilhas da música é que ela é o poderoso meio de uma comunhão em cujo seio cada um se sente abençoadamente solitário e único. A sensualidade de uma clarineta ou de um violoncelo, a respiração melódica de um canto, o inespe-rado de uma modulação imprevisível que recria toda a luz da paisagem, o surgi-mento de um ritmo que nos arranca do desgaste de nossos cansaços, o brilho súbito de um timbre ou o suntuoso adensamento de uma complexidade harmô-nica, que nos revelam que ainda não havíamos chegado ao fim de nossa emoção ou nossa alegria — como prescindir de tudo isso?
A música tem o poder, duplo e singular, de nos desligar de todos os entraves externos e de nos ligar a todo o devir do Universo, através de nosso próprio âma-go. Ela não se opõe à nossa civilização; permite-nos viver nela na liberdade, que é sempre preciso reconquistar, de nossas ternuras e nossos sonhos, nossos desejos e nossos ímpetos.
Ora, paradoxalmente, enquanto se multiplicam de maneira prodigiosa a escuta e até a prática da música, muitos de seus amantes, sobretudo entre os apaixonados mais recentes, procuram alguém, não raro em vão, a quem se dirigir para melhor conhecer sua história e suas técnicas. O excesso de erudição douta os desanima, o excesso de facilidade dos apanhados superficiais os deixa famintos. Eles querem partir para a descoberta, mas com que mapas podem orientar-se para empreender a exploração da região encantada onde reina essa sereia, a música, ainda por de-mais desconhecida, embora nos tenha fascinado de passagem? No entanto, quanto mais amamos, mais queremos conhecer, pois pressentimos que, quanto melhor conhecermos, ainda mais profundamente poderemos amar.
Por isso, esperamos que este trabalho não seja inteiramente inútil. "Obra de divulgação?" Sim, se fizerem questão, no sentido que o dicionário Robert confere a essa fórmula: "Adaptar um conjunto de conhecimentos técnicos de maneira a torná-los acessíveis ao leitor não especializado." Mas não esconderemos nossa repulsa por tal expressão e pelo ar de condescendência com que ela é acompa-nhada, quando articulada por bocas elitistas: em "divulgação" persiste o "vulgo", "essa palavra que a língua francesa nos fornece, com tanta felicidade, para expri-mir aquela multidão dotada de inúmeras línguas e pouquíssimas cabeças" (d'Alembert). Pois então, deixemos esse termo para os técnicos culturais que lançam um olhar de cima para baixo sobre a pobre humanidade. Não trabalha-mos para o vulgo, mas para o público mais valioso que há: os que têm fome e sede de conhecer e de amar.
Por que e para quem? — perguntávamos no começo. Desde que destinamos nosso primeiro trabalho em comum aos "beethovemanos leigos" — já se vão hoje trinta anos —, nenhum de nós dois parou de trabalhar na mesma direção. Tanto melhor se, nesse percurso, alguns especialistas também puderam encontrar do que se alimentar; quanto a esse aspecto, a competência e a qualidade de nossos colabo-radores parecem-nos garantir ainda melhor essas provisões. Mas trata-se, antes de mais nada, de nos preocuparmos com os "peões da música" e de não nos dirigir-mos primordialmente aos grandes cavaleiros da equitação musical. Queredirigir-mos ajudar cada um a encontrar as chaves que lhe permitam entrar em sua casa e sen-tir-se enfim à vontade dentro da música.
A quem Franz Schubert optou por dedicar seu Trio em mi bemol? "Aos que nele encontrarem prazer." Que nos permitam oferecer esta História da música
ociden-tal, antes de mais nada, aos que nela encontrarem o caminho de sua alegria.
Uma História da música ocidental. Por que ocidental? Esse adjetivo, natural-mente, não esconde nenhuma segunda intenção política ou ideológica. Se houvés-semos interrompido essa história no século XIX, teríamos falado de música euro-péia; no século XX, porém, a própria música européia tornou-se inseparável das influências que vieram estimulá-la de além-mar, tanto do jazz quanto de um Charles Ives ou um John Cage.
Outras interações se exercem, outras aberturas hoje lhe chegam de muitas das tradições musicais asiáticas e africanas. Duas razões nos fizeram decidir não abordar aqui esses estilos musicais magníficos, que nosso etnocentrismo ingênuo teria ou-trera chamado de "exóticos" e que hoje aprendemos cada vez mais a admirar e amar.
A primeira, que já seria suficiente, é que as dimensões deste livro bem poderiam duplicar-se em função disso, além de se decuplicar o número de colaboradores, a tal ponto os trabalhos etnomusicológicos se particularizam ao se aprofundar.
A segunda é que a maioria dessas tradições musicais apresenta mais uma con-tinuidade do que uma história, pelo menos até seus contatos (benéficos ou malé-ficos?) com a Europa. Ao contrário, desde os primeiros cânticos cristãos até a mú-sica eletroacústica, há uma perpétua sucessão de combates (não sangrentos, mas amiúde encarniçados) entre um musical "antigo" e um "novo" — onde o "novo" nunca demora muito a se tornar o "antigo" de um "novo" mais recente — através do questionamento teórico e da transformação prática das formas e das intenções da composição e da execução musicais. Fora da música "ocidental", dificilmente encontraríamos tamanha abundância, quase permanente, de peripécias tão signi-ficativas, de mutações ou até de revoluções, que, cada qual a seu turno, originaram obras que impuseram a admiração por sua originalidade ainda inédita, e não por sua fidelidade ao venerado ensino dos mestres. Uma história só é possível onde a investigação de uma mudança que se pretende um progresso vence uma tradição que se pretende imemorial.
Um último limite a esclarecer: é comum convencionar-se que a "história" su-cede à "proto-história" a ser datada do surgimento de textos escritos. Por isso é que não se falará aqui da música hebraica, da grega e da romana, embora elas estejam nas origens da música medieval. Pedimos ao leitor, com muita insistência, que não tome esse silêncio como um indício de desprezo: os celtas não tinham literatura escrita quando os latinos já a possuíam, mas ninguém jamais nos fará dizer que a civilização gaulesa era inferior à romana!
Se a geografia não lhe oferecesse a encarnação indispensável, não haveria his-tória, mas tão-somente uma idéia platônica ou uma ficção romanceada da histó-ria. Em contrapartida, o curso da história impõe à geografia inúmeras modifica-ções, que vão desde o cultivo do solo até a urbanização e, vez por outra, ao próprio traçado dos cursos d'água e do litoral. Do mesmo modo, retraçar a história da música exige que falemos daquilo que a condiciona intrínsecamente: seus instru-mentos (dentre os quais a voz não é o menos significativo), suas combinações funcionais (como o solfejo), suas técnicas, suas formas e seus gêneros: em suma, sua gramática e seu vocabulário. Pois a música é uma linguagem, e todos os que se servem dela a entendem assim. "A língua que falo é compreendida no mundo in-teiro", disse orgulhosamente Haydn a Mozart.
Posto que queríamos oferecer este livro, antes de mais nada, aos amantes "lei-gos" da música, fizemos com que a história propriamente dita fosse precedida de um léxico musical comentado, mais ou menos como se faz a "entrega das chaves" de uma fábrica a seu destinatário. O leitor, sobretudo se só tiver abordado a mú-sica através dos discos e do rádio, talvez não o julgue inútil, por nele encontrar prontamente a definição e a explicação dos termos técnicos mais correntes e mais indispensáveis. Ao longo dos capítulos seguintes, os outros termos técnicos que surgirem (muitas vezes em relação a um período histórico mais restrito, como a Idade Média, por exemplo) serão explicados e definidos quando de sua primeira menção.
Tal como a da arquitetura, das artes plásticas ou da literatura, a história da música é indissociável da história geral. Da história política e, mais ainda, da so-cioeconómica, cultural e religiosa. Que a história da música seja indissociável dela, entretanto, não significa que lhe esteja subordinada. Tal como a linguagem e as outras artes, a música perderia qualquer valor específico, qualquer importância intrínseca, se fosse considerada como a superestrutura de tais ou quais infra-estru-turas. Um rio só obedece a suas próprias leis, mas determina seu curso em função das configurações e relevos que encontra. Assim, se ignorássemos tudo o que diz respeito ao luteranismo, um certo aspecto musical de Bach nos escaparia; desco-nhecendo tudo sobre a ascensão da burguesia no fim do século XVIII, a nova lin-guagem musical de Haydn, Mozart, Beethoven e Schubert se nos tornaria parcial-mente inexplicável; ao ignorarmos tudo sobre o impulso romântico da poesia, as
xxii História da música ocidental
intenções expressivas de Berlioz, Schumann, Liszt — e até já as de Beethoven e Schubert — permaneceriam inacessíveis.
Demos, portanto, muita importância ao esclarecimento das sucessivas situa-ções sócio-históricas da música através dos séculos, quer em capítulos especiais, quer no correr dos outros capítulos. Fizemos tanto maior questão de insistir nes-sas ligações quanto mais elas nos fazem apreender melhor a realidade humana da música. Na teologia dos clérigos da Idade Média, a música primordial era a dos anjos: ao 1er os comentários extasiados de algumas pessoas sobre o "angelical" Mozart, tem-se a impressão de ainda estar nessa época. No entanto, a música não nos cai do céu nem de sabe-se lá que inspiração quase divina e desencarnada. Ela é feita por seres humanos que vivem sua vida, e que inventam ou executam com-posições no cerne de uma história em que se acham imersos, querendo ou não, e da qual somente sua genialidade (ou seu talento, pelo menos) consegue emergir, a ponto de nos atingir através das eras. Sempre tendemos, com facilidade, a esque-cer a ganga de suores e cansaços, muitas vezes de decepções e humilhações, de incompreensões e também de encontros fraternos, em cujo bojo se formam os diamantes da música. Por isso é que, se um título excessivamente longo não trou-xesse o risco de ser um desserviço à difusão de nosso trabalho, teríamos preferido intitular este livro de História da música ocidental e de seus músicos.
"Não sei escrever poemas: não sou poeta", escreveu Mozart a seu pai. "Não sei dispor minhas frases de um modo tão artístico que elas disseminem alternada-mente sombra e luz: não sou pintor. Não sei exprimir com gestos e pantomimas minhas idéias e meus sentimentos: não sou bailarino. Mas sei fazê-lo através dos sons: sou músico." E Beethoven: "O que trago no coração precisa sair, e é por isso que escrevo!" Ou ainda, a propósito de sua Missa Solemnis: "Vinda do coração, que ela chegue ao coração!"
As idéias e sentimentos que Mozart exprime através dos sons não são as idéias e os sentimentos de Bach; o que Beethoven traz no coração e que precisa sair não se encontra no coração de Haydn. Quando se fala em expressivo fala-se, necessaria-mente, em individual, e se o faz mais e mais à medida que se acentua a evolução histórica na qual a arte se distingue progressivamente do artesanato, de um lado, e da ciência, do outro. Há que ter um senso estético muito arcaico para gostar em bloco dos artistas de uma época inteira ou de toda uma escola, de preferência a qualquer outra. A galáxia da arte constitui-se de tal maneira que nela só importam as primeiras pessoas do singular, podendo ser largadas de mão as obras sem origi-nalidade, repertoriadas pela erudição, mesmo quando o desgaste da memória e a falta de qualquer documentação condenam uma pessoa singular a nos permanecer anônima, como o escultor das grandes estátuas da catedral de Naumburg.
Descobrir a música — e, neste ponto, o adjetivo talvez não seja um excesso: a música "ocidental" — é, acima de tudo, reconhecer que cada criador não se parece
Prefácio xxiii
com nenhum outro e é insubstituível, quer pelo que nos diz, quer pela maneira como no-lo diz (coisas que, aliás, são uma só).
Posto que a música não é uma entidade abstrata e coletiva, composta e prati-cada por cérebros e mãos intercambiáveis, optamos deliberadamente, nesta histó-ria, por reservar um grande espaço à vida dos músicos. Não é simples a relação entre o que, num outro texto, propusemos chamar de "biografia vivida" e "biogra-fia criadora"; isso se liga fortemente aos dados sócio-históricos e, de maneira ainda mais intensa, às fantasias do inconsciente; mas, seja qual for essa complexidade, parece-nos impossível amar a música, isto é, amar os músicos, sem nada querer saber de sua vida e suas personalidades humanas globais. Ou seja, a importância aqui atribuída às biografias não é imputável à preocupação de distrair o leitor frivolo ou cansado.
Por certo haverá outros leitores, mais resistentes e mais vorazes, que lamenta-rão não encontrar nas páginas seguintes certos nomes, certas listas de obras e cer-tos esclarecimencer-tos instrumentais ou técnicos. Nossa primeira resposta é que os limites necessários de um livro já volumoso exigiam escolhas: porventura causará surpresa, numa "história da literatura ocidental" do mesmo calibre, que não sejam mencionados, ou que sejam simplesmente citados de passagem, autores notórios como Jean-Baptiste Rousseau, tido como o maior poeta do século XVIII, Victor de Laprade, que cedo pertenceu à Academia, enquanto Baudelaire e Nerval nunca fizeram parte dela, ou mesmo Sully Prudhomme, que recebeu um dos primeiros prêmios Nobel de literatura?
Insistimos, todavia, sobretudo num ponto: uma "história" não pode e nem pretende ser um "dicionário" ou uma "enciclopédia". Felizmente, não faltam enci-clopédias nem dicionários de música, alguns recentes e excelentes — senão exaus-tivos, ao menos tendendo assintoticamente à exaustividade. Se muitos de nossos leitores se descobrirem com o apetite aberto para neles ir buscar informações com-plementares, nós nos felicitaremos por isso, como uma prova de que nosso traba-lho não foi em vão.
A verdade é que temos consciência das orientações e inflexões subjetivas que demos a este livro, ao conceber sua arquitetura, calcular as proporções de suas partes e organizar a sucessão de seus capítulos. Ao se proporem um objetivo aná-logo, outros organizadores poderiam, com igual legitimidade, conceber outros iti-nerários, calcular outras proporções e sublinhar outras etapas privilegiadas; reser-var duas vezes mais páginas para Donizetti ou Saint-Saëns, por exemplo, e duas vezes menos para Schubert ou Varèse. Esta História leva nossa marca; reivindica-mos nossa responsabilidade — e não nos declarareivindica-mos culpados.
Do mesmo modo, fazemos ainda mais questão de reivindicar a escolha e subli-nhar a importância da participação dos colaboradores que nos deram a honra e a amizade de nos conceder seu concurso. Elogiá-los seria por demais pretensioso de
nossa parte: a qualidade de seus textos parece-nos bastar para isso, mais ainda do que a eminência de seus títulos.
Foi de propósito que os desejamos numerosos e quisemos que suas contribui-ções fossem, muitas vezes, mais consideráveis que a nossa. Não apenas para garan-tir por toda parte o mais alto nível de competência. Não apenas para evitar, em tantas páginas, a monotonia de uma mesma escrita. Mas também para que nossa inevitável subjetividade fosse temperada pela multiplicidade da subjetividade de-les: a imparcialidade de todos nunca pode ser assegurada senão pelas parcialidades sustentadas de cada um.
Para haver sucesso e coerência nesse tipo de jogo em equipe, era preciso, é claro, zelar pelas articulações entre os capítulos e os ajustes dos acréscimos, dos esclarecimentos ou das alusões. Agradecemos vivamente a todos por se haverem prestado a isso de tão bom grado. Mas era igualmente preciso zelar para que mui-tos pudessem falar de tal ou qual aspecto, cada um dentro de sua perspectiva pró-pria: diversas perspectivas de uma mesma estátua ou um mesmo edifício, vistos por diferentes ângulos, não se contradizem, mas se completam. E o que nos im-portava mais do que tudo era que, ao término da montagem, todos se sentissem na completa liberdade de serem senhores dos textos por eles assumidos através de sua assinatura.
"Uma obra-prima é hospitaleira", dizia Victor Hugo: "Nela entro tirando o cha-péu, e acho belo o rosto de meu anfitrião." Todo o nosso esforço comum consistiu em balizar percursos, dispor esclarecimentos, desbastar acessos a essa hospitalida-de inúmera, para que, entre tantas acolhidas oferecidas, cada um encontre as ami-zades e até os amores que lhe darão mais alegria de viver. A maravilha da música que amamos está em que, por toda parte, em nosso trabalho, nossos trajetos e nossos sonhos — num leito de hospital, que seja, e até entre os muros de um cárcere —, sempre podemos ouvi-la cantar no fundo do coração.
BRIGITTE e JEAN MASSIN
LÉXICO MUSICAL
EXPLICATIVO
3
OS INSTRUMENTOS,
A ORQUESTRA, AS VOZES
OS INSTRUMENTOS DE SOPRO
Neste tipo de instrumento, o som resulta da vibração da coluna de ar contida em
um tubo. Três fatores intervém: o comprimento do tubo, a forma interior (ou
"furo") do tubo e a produção do som. COMPRIMENTO DO TUBO
A vibração do ar contido em toda a extensão do tubo produz um som denomina-do "fundamental". Quandenomina-do se modifica o comprimento denomina-do tubo, são obtidenomina-dos sons de alturas diferentes, o que se faz com recurso a diversos procedimentos: • Justaposição de tubos de diferentes comprimentos (flauta de Pã, órgão). • Abertura de orifícios ao longo do tubo: quando todos os orificios estão tapados,
o tubo produz o som "fundamental"; cada orifício aberto ao longo do tubo, de alto a baixo, equivale a um encurtamento deste.
• Vara (trombone): quando puxada, o tubo é alongado; quando recolhida,
reduz-se o tamanho deste.
• Pistões: sistema complexo de derivações que permite a passagem do ar por redes
de circuitos de maior ou menor comprimento (trómpete, trompa). "FURO"
• Cónico (oboé). • Cilíndrico (flauta).
O comportamento da coluna de ar contida no tubo varia de acordo com a for-ma interior do mesmo. O enrolamento do tubo sobre si mesmo não tem qualquer influência sobre o efeito vibratório.
PRODUÇÃO DO SOM
Talvez seja o mais importante dos três fatores; é o que determina o "timbre" do instrumento. A vibração do ar no tubo é produzida quando o ar que o tista expira entra em choque contra um obstáculo. Desde as origens dos instrumen-tos de sopro, este fenômeno sempre foi produzido de três maneiras, com variantes: 1.0 bisel: o jato de ar expirado bate contra uma fenda talhada em bisel, aí se rompe e separa-se em dois. (Não é o bisel que vibra, mas apenas o ar que contra ele se choca.) Há duas variantes, que determinam dois tipos de flautas:
• a ponta (flauta vertical ou flauta doce, charamela, diversos tipos de tubo de órgão); • a embocadura (flauta transversal ou transversa: neste instrumento, os lábios
do exécutante dirigem o jato de ar sobre a borda do orifício feito no tubo).
2. A palheta: é constituída por uma lâmina feita da madeira de cana, que se põe a
vibrar sob o efeito do ar expirado. A palheta pode ser: • simples, fixada a uma ponta (clarineta);
• dupla, feita de duas lâminas, fixadas contiguamente e que vibram uma contra a outra (oboé).
3. A embocadura: é um pequeno bocal, geralmente metálico, sobre o qual se apli-cam os lábios do instrumentista (trompa, trómpete). Neste caso, são os próprios lábios que fazem o papel de uma palheta dupla.
FURO TUBO PRODUÇÃO DO SOM
cónic o cilíndric o orificio s pistõe s > PALHETA bise l embocadur a cónic o cilíndric o orificio s pistõe s > simples dupl a bise l embocadur a Flauta X X X Oboé Come inglês X X X Fagote Clarineta X X X Saxofone X X X Trómpete X X1 X X Trompa X X1 X X Trombone X X1 X X Tuba X X X Corneto X X X Trompa de caça X X1 Trómpete natural X X1
O trómpete, a trompa e o trombone têm, em quase toda a extensão de seu comprimento, a forma de um cilindro, que se abre progressivamente até o "pavilhão".
Família das flautas
Flauta. Em francês, flûte; em italiano/Zawto; em inglês, flute; em alemão Flõte.
Ins-trumento de tubo cilíndrico, perfurado por vários orifícios, em que a vibração do som é obtida por um "bisel". Há duas famílias, conforme seja o tipo do bisel.
Flauta doce. Flauta inglesa, flauta vertical; em francês, flûte à bec; em inglês, recor-der, em alemão, Blockflõte. O som é produzido por uma ponta provida de um
diminuto orifício que dirige o fio de ar para o bisel, como num apito. As mais antigas flautas desse tipo remontam ao Magdaleniano (10000 a.C). Da Idade Mé-dia até o começo do século XVIII, as flautas doces, sempre de madeira, gozaram de grande popularidade. A literatura para a flauta doce é muito rica até o início do século XVIII, época em que o instrumento começa a ofuscar-se diante da flauta transversa. A família das flautas doces inclui flautas baixo, tenor, alto, soprano e sopranino, todas com oito orifícios.
Flauta transversa ou transversal. Flauta alemã; em francês, flûte traversière; em
alemão, Querflõte. O som é produzido pelos lábios do flautista, que dirigem o jato de ar na direção de um orifício feito lateralmente no tubo, que serve de emboca-dura; o instrumento deve ser colocado transversalmente à boca do instrumentista e mantido em posição horizontal, e disso lhe vem o nome. Flautas deste tipo po-dem ser vistas em alguns baixos-relevos indianos que datam aproximadamente do século II a.C. Menos utilizada que a flauta doce durante a Idade Média e o Renas-cimento, a flauta transversa ou transversal desenvolveu-se sobretudo a partir do século XVII, e no século XVIII praticamente eliminou sua rival. Os primeiros aper-feiçoamentos da flauta transversa devem-se à família Hotteterre (ca. 1700). Aos poucos, foi-lhe sendo acrescentada uma série de chaves. Do início do século XTX em diante, as flautas transversas passaram a ser feitas de metal (mas continuaram fazendo parte da família das "madeiras"!) e foram munidas de chaves e anéis que facilitam o dedilhado. Theobald Bõhm foi, por volta de 1830, o grande artesão responsável pela metamorfose deste instrumento, que é, entre todos os outros, a um só tempo o mais antigo e o que mais transformações sofreu em sua estrutura. (Veremos adiante que, ao contrário da flauta, o violino, por exemplo, é um instru-mento que há séculos se mantém imutável.) O sistema de Bõhm foi, mais tarde, adaptado a outros instrumentos, particularmente ao oboé.
A flauta possui uma sonoridade doce e redonda, ampla no registro grave, pura no médio, luminosa no agudo. É o mais ágil dos instrumentos de sopro.
Flautim ou piccolo. Tem a metade do tamanho da flauta de concerto e toca uma
oitava acima desta, com sonoridade radiosa e penetrante. É o mais agudo dos ins-trumentos de sopro e, ao tocar fortissimo, pode dominar toda a orquestra. Seu nome completo em italiano é flauto piccolo (pequena flauta), sendo designado, nessa língua, apenas como piccolo ou como ottavino.
6 Léxico musical explicativo
Siringe ou Flauta de Pã. Em francês, syrinx. É a flauta de Pã da Grécia antiga,
cons-tituída em geral por nove tubos, desiguais em comprimento, unidos uns aos ou-tros e justapostos horizontalmente em ordem decrescente por tamanho. É tam-bém chamada de flauta mística ou flauta pastoril.
Flajolé. Em francês, flageolet. Pequena flauta doce, com quatro orifícios ñaparte da
frente e dois na de trás, para os polegares.
Família dos oboés
Oboé. Em francês, hautbois; em italiano, oboe; em inglês, oboe; em alemão, Hoboe.
Instrumento de palheta dupla, com tubo cónico provido de orifícios. É muito antigo, conhecido em todo o Oriente, na África e na Antigüidade grega. Na Idade Média, o oboé recebeu na França os nomes de chalumeau (charumela), chalemie,
douçaine (dulcina) e bombarde (bombarda). A bombarda bretã (bombarde bre-tonne) é, pode-se dizer, prima do oboé. Foi na França que este instrumento se
desenvolveu e aperfeiçoou-se: por isso, tomou na Europa o nome francês de
haut-bois ("madeira alta", literalmente), por oposição a groshaut-bois, instrumento grave da
mesma família e ancestral do fagote. Como sucedeu com a flauta, foi um membro da família Hotteterre que, por volta de 1700, aperfeiçoou o oboé e lhe deu suas características modernas; contudo, em meados do século XIX, esse instrumento recebeu, adaptados, certos elementos do mecanismo que Bõhm concebera para a flauta.
O oboé é um instrumento essencialmente melódico: menos ágil que a flauta, tem um caráter pastoril, por vezes melancólico, mas sabe ser também agreste e jovial. O timbre do oboé impõe-se a qualquer massa sonora de que ele faça parte.
Corne inglês. Em inglês, English horn; em alemão Englisches Horn e, às vezes, Alto-boe; em italiano, corno inglese. A antiga designação francesa deste instrumento, hautbois de chasse (ou oboe da caccia em italiano, que daria em português "oboé de
caça"), era mais exata. O nome atual, traduzido do francês cor anglais (literalmente
trompa inglesa), ilude: o instrumento nada tem a ver com a trompa. O corne inglês
é um oboé grave, por sinal absolutamente semelhante em aspecto ao oboé comum. É mais longo (um metro em vez de sessenta centímetros) e termina com uma campana ou pavilhão em forma de bulbo. A sonoridade do corne inglês é doce, nostálgica, um tanto velada e muito expressiva. Com palheta dupla e registro uma quinta abaixo do oboé, um parente do corne inglês é o oboé tenor (em francês,
taille), muito usado em música militar no passado. Esse tipo de oboé grave foi
fabricado na Inglaterra até o século XVIII com o nome de Vaux humane (do latim
vox humana).
Oboé de amor ou oboe d'amore. Em francês, hautbois d'amour; em alemão, Liebes-oboe; em italiano e inglês, oboe d'amore. Instrumento intermediário entre o oboé
Os instrumentos, a orquestra, as vozes 1
e o corne inglês, utilizado no século XVIII. Com relação à origem de seu nome, cf. mais adiante viola d'amore.
Fagote. Em alemão, Fagott, em italiano, fagotto; em francês antigo, fagot,
atualmen-te em francês basson; em inglês, bassoon. Instrumento de palheta dupla, com tubo cónico, que é o baixo da família dos oboés e, de modo geral, do conjunto das madeiras. O fagote deve seu nome ao comprimento de seu tubo (mais de dois metros). O tamanho levou os fabricantes a dobrá-lo, o que fez com que ele tomas-se a forma de duas toras de madeira abraçadas formando um fagot, que em francês significa feixe de lenha. Anteriormente, o fagote chamou-se, em francês, grosbois ("madeira grave") por oposição a hautbois ("madeira alta"). O fagote desenvolveu-se durante o século XVII, quando desenvolveu-se tornou, juntamente com o oboé, parte inte-grante da orquestra. A sonoridade do fagote é poderosa, cheia, sobretudo no grave, bem timbrada, mais velada nos registros médio e agudo. É um admirável baixo para o ensemble da família das madeiras, mas pode também mostrar-se encanta-doramente melancólico em solos.
Contrafagote. Em francês, contrebasson; em italiano, contra fagotto; em inglês, dou-ble bassoon; em alemão, Kontra fagott. Instrumento de palheta dupla e furo cónico.
Soa na oitava grave do fagote e faz, com relação a este, o papel que tem o contra-baixo em relação ao violoncelo.
Cromorno. 1. Em francês, cromóme; em alemão Krumhorn, em italiano, sforta.
Ins-trumento de palheta dupla, parente do oboé, bastante utilizado até o século XVII. A palheta vinha encerrada numa caixa em que o exécutante soprava. O nome cro-morno prende-se ao fato do tubo deste instrumento ter sua parte inferior recurva (em inglês antigo, crump-horn, ou seja, trompa retorcida, literalmente). Os cro-mornos, de timbre suave e anasalado, formavam uma família que ia do soprano ao baixo. 2. Registro de órgão, cujo nome deriva do instrumento acima e que foi utilizado do século XVI ao século XVIII.
Clarineta ou clarinete
Instrumento de palheta simples e furo cilíndrico, cuja origem pode ser atestada desde 2000 anos a.C. no Egito, nas índias, em todo o mundo árabe e na Grécia, onde era conhecido por aulos. Na Idade Média, denominado charamela ou pelo nome francês chalumeau, tinha a palheta encerrada numa caixa onde o exécutante soprava (cf. cromorno). Contrariamente à flauta e ao oboé, a clarineta só começou a desenvolver-se a partir da metade do século XVIII e foi pouco usada até essa data.1 Por volta de 1700, um alemão de Nuremberg, de nome Johan Christoph
Derner, ao pôr a palheta diretamente em contato com a ponta, suprimindo a caixa que a encerrava, criou de fato o instrumento. Vivaldi e Rameau figuram como inovadores, pois foram os primeiros a utilizar a clarineta em sua nova forma. No final do século XVIII, já aperfeiçoada, a clarineta ganhou de Mozart seus foros de nobreza e, no século XIX, o mecanismo concebido por Bõhm para a flauta foi a ela adaptado.
A clarineta é o instrumento que possui maior extensão entre as "madeiras". As particularidades de sua concepção fazem com que tenha uma série de registros especiais e que sua sonoridade altere-se sensivelmente com a altura do som (tessi-tura): charamela (grave), sonoro e caloroso; médio, menos doce, mais desagradá-vel; clarino, luminoso; agudo, brilhante; superagudo, incisivo.
O nome clarineta resulta da sonoridade de seu terceiro registro, que fazia lem-brar a de um pequeno trómpete, o clarino, instrumento de nome italiano usado no século XVIII, no tempo em que a clarineta estava sendo inventada.
A família das clarinetas compreende, além da clarineta comum: no registro agudo, a pequena clarineta ou requinta, e no registro grave, a clarineta alto, a clari-neta baixo ou clarone, e a clariclari-neta contrabaixo, todas essas três com forma seme-lhante à de um saxofone. Há ainda o cor de basset (em francês), corno di basseto (em italiano) ou Bassethorn (em alemão), surgido na Baviera em torno de 1770; este último, pouco empregado hoje em dia, foi usado com freqüência por Mozart, que demonstrou especial predileção por ele, principalmente em suas obras maçô-nicas, e dele se valeu até em seu Requiem.
A clarineta é um instrumento transpositor. Chamam-se assim os instrumentos que, por motivos históricos, fazem soar suas notas diferentemente das que estão escritas na partitura, ou seja, a nota natural e geradora do instrumento soa como o dó notado, que valerá como uma referência para todas as demais. Desde Schõn-berg, Prokofiev e outros, a tendência que prevalece atualmente é a de, cada vez mais, escrever os sons tais como são percebidos pelo ouvido.
Saxofone
Instrumento de palheta simples, furo cónico e construção metálica, o saxofone foi criado pelo belga Adolphe Sax em tomo de 1840. Por sua palheta simples, ele se assemelha à clarineta, e pelo furo cónico, ao oboé, mas o resultado sonoro nada tem a ver com o de qualquer desses dois. Utilizado por Rossini e Berlioz desde sua criação, somente na França o saxofone ganhou lugar nas orquestras, pelo menos até o início do século XX. Mais tarde, a partir de 1920, tornou-se um dos principais instrumentos sofistas da música de jazz. A sonoridade do saxofone é clara e cheia, e sua agilidade pode mostrar-se extraordinária.
Há uma família completa de saxofones: sopranino, soprano, alto, tenor, baríto-no e baixo. É um instrumento transpositor.
Saxhorne. Instrumento dotado de pistões inventado por Adolphe Sax em 1843;
também ele constitui uma família e deve sua popularidade principalmente às ban-das de música (orquestras de metais e percussões que tocam ao ar livre) militares e municipais. Em português é também chamado de fliscorne.
F A M Í L I A D O S S O P R O S
A G U D O flautim soprano
saxofone
M É D I O flauta oboé clarineta saxofone alto
M É D I O G R A V E oboé d'amore
corne inglês
Bassethorn
ou cor de basset
saxofone tenor
B A I X O fagote clarineta baixo saxofone
baixo
Trompa
Em francês, cor, em italiano, corno; em inglês, horn; em alemão, Horn. Instrumento metálico de furo cilindro-cônico, provido de embocadura e pistões. Como indica o nome que se dá em português à versão primitiva desse instrumento, bem como sua designação em francês e em italiano, a trompa tem sua origem em chifres (cornos) e nas presas de elefante (o poema medieval francês La Chanson de Rolland mencio-na o olifante, trombeta de marfim que os cavaleiros, de modo geral, levavam con-sigo) e nas grandes conchas de que era feita; esses materiais são utilizados ainda hoje, sobretudo no Oriente. Se a flauta sempre foi pastoril ou mágica, a trompa era essencialmente guerreira e aristocrática (e ainda o é na Ásia). Seja ela de madeira, terracota ou metal, é encontrada em todas as civilizações (o cornu romano), sempre com a mesma forma cónica que traz desde a origem. Para que tivesse um som mais profundo, o tubo sofreu diversos alongamentos. Se a trompa de caça (cor de chasse) fosse desenrolada teria 4,50m de comprimento; com seu tubo tantas e tantas vezes recurvado, ela apareceu por volta de 1600 na França.
Na trompa natural, quando se modifica a pressão dos lábios sobre a emboca-dura, obtém-se a série dos harmônicos naturais, vale dizer, uma escala sonora mui-to imperfeita e muimui-to incompleta. Mas foi desta maneira que a trompa existiu até o século XLX. E foi só em 1760 que um trompista inaugurou a técnica dos "sons fechados", que permitia produzir uma parte dos semitons intermediários. Para que se pudesse tocar em diferentes tonalidades, passou-se, a partir de 1770, a empregar
roscas que alongavam (ou encurtavam) o tubo de acordo com a necessidade. Em
1813, o alemão Stõlzel teve a idéia de fixar no instrumento pistões que fe-cham ou abrem circuitos de diferentes comprimentos, dotando a trompa de roscas permanentes que lhe permitem abordar todas as notas. Daí o nome da trompa moderna: "trompa cromática de pistões".
10 Léxico musical explicativo
Além de todas as facetas ligadas a suas antigas funções (evocações de caça, de guerra, da floresta e da vida ao ar livre), a trompa tem um vasto campo expressivo — nobre, poético e mesmo sonhador — bem como um papel preciso na orques-tra, onde reforça o registro médio. É um instrumento transpositor.
Trómpete
Em inglês trumpet; em francês trompette; em italiano, tromba; em alemão,
Trompe-te. Instrumento metálico, com furo cilindro-cônico, munido de embocadura e
pis-tões. Tanto a origem do trómpete, como sua estrutura e os problemas que trouxe aos fabricantes são parecidos com os da trompa. Existe desde os mais remotos tempos da Antigüidade, na Ásia, no Egito, na Grécia e em Roma. Como a trompa, está ligado à guerra, mas tinha uso mais cerimonial do que esta. No entanto, parece ter sofrido uma eclipse não experimentada pela trompa; só vamos reencontrá-lo no Ocidente no século XIII, com o nome de "trómpete sarraceno", que faz supor tratar-se de um caso de importação. Reto no início, tornou-se recurvo no sécu-lo XVI e, até o sécusécu-lo XVIII, participou mais do que a trompa da vida musical, ligado a todas as expressões de glória ou manifestações do poder. Assim como a trompa, por volta de 1770 o trompeté recebeu roscas e, aproximadamente em 1815, ganhou seus pistões, tão característicos dele que, em português, também é conhecido como pistão, sobretudo na música popular.
O trómpete não tem a sonoridade da trompa, mas o brilho é uma propriedade sua. Ele é ágil e pode, melhor do que a trompa, executar toda uma sorte de trina-dos, arpejos e cadências ornamentais. No entanto, é capaz de mostrar grande do-çura quando é tocado piano. Também é um instrumento transpositor.
Clarino. Pequeno trómpete de nome italiano bastante usado no século XVIII, com
sonoridade mais aguda, porém mais doce que a do trompeté. Foi provavelmente para este instrumento que Bach escreveu o Concerto de Brandenburgo n° 2.
Cometo
1. Em italiano cornetto; em francês, cornet, em inglês, cometi; em alemão Cornett ou Zink. Instrumento de sopro que esteve em uso até o século XVII. Como o oboé, tinha furo cónico, tubo com orifícios e era de madeira, mas estava provido de uma embocadura, como um trómpete. Com sonoridade doce e clara, foi o instrumento favorito dos italianos no século XVI e no início do século XVII, até o desenvolvi-mento do violino, que o suplantou em seus empregos. Os cornetos estavam agru-pados em família, e os mais longos e graves, por lembrarem a forma da serpente, fizeram com que este nome fosse dado ao baixo do cometo. A serpente — também chamada serpentão — era usada nas igrejas para dobrar a voz dos baixos e, até o século XIX, continuou sendo usada nos meios rurais.
Os instrumentos, a orquestra, as vozes 11
2. Registro de órgão: jogo de mutações compostas que comporta cinco tubos por nota e imita a sonoridade do instrumento acima. O registro, destinado a tocar partes de solo, é um dos mais belos do órgão clássico.
Cometa de pistões. Instrumento provido de embocadura, furo cónico e pistões,
que lembra bastante o trómpete, mas distingue-se deste por ter o furo mais grosso, o tubo mais curto e o pavilhão maior. A sonoridade, um pouco vulgar, está de acordo com as proporções, mas o instrumento é ágil, de fácil emissão, o que expli-ca sua popularidade em todos os orfeões (corais populares mantidos pelas muni-cipalidades ou empresas privadas) no século XIX. De certa forma, caiu em desuso.
Trombone
Em inglês e italiano, Trompone; em alemão Posaune. Instrumento com embocadu-ra, furo cilindro-cônico e vaembocadu-ra, cuja origem é semelhante à da trompa e à do tróm-pete. A "pré-história" deste instrumento pouco difere da do trómpete, e o próprio nome atesta que têm a mesma filiação (tromba, em italiano). Por sinal, o nome alemão do trombone, Posaune, é também uma deformação de buccina, nome la-tino do trómpete. Quanto ao seu antigo nome francês, sacqueboute (em português "sacabuxa"), surgiu de sua semelhança com uma arma de assalto que assim era chamada.
Na origem, o trombone não passava de uma variante grave do trómpete. Mas, enquanto este último se conservava imutável, o trombone, com a invenção da vara no século XV, recebeu um tipo de aperfeiçoamento que o pôs na dianteira. Daí sua importância em toda a música polifónica que se fez do século XV ao século XVII. Johann Sebastian Bach ainda o utilizava para dobrar vozes em seus corais, mas, ao que tudo indica, tratava-se já de um arcaísmo. O trombone viria a reaparecer com Mozart, Beethoven, Schubert e os românticos.
A vara, formada por duas partes que se encaixam, é um recurso que, perrnitin-do facilmente o alongamento ou o encolhimento perrnitin-do tubo, dá ao instrumento uma escala cromática, que se interrompe, porém, no meio do seu registro, pela falta de algumas notas. Mas o manejo da vara é mais difícil que o dos pistões que foram acrescentados à trompa e ao trómpete no século XIX.
O trombone é o instrumento grave dos metais. Sua sonoridade tem um pode-rio e uma majestade que dominam toda a orquestra.
Tuba
Tem o mesmo nome em alemão, inglês, italiano e francês. De furo cónico, com embocadura e pistões, este instrumento grave, cujo nome vem do latim tuba (trómpete), apareceu no século XIX. Aperfeiçoado por Sax, o inventor do saxofo-ne, ele se parece com a trompa, mas o furo é cónico em toda a extensão do tubo. A execução da tuba é relativamente simples, e seu emprego mais habitual é
limi-tado quase só ao papel de baixo da família dos metais, se bem que suas possibili-dades sejam mais variadas.
Bugie. Em alemão, Flügelhorn; em inglês, flugel horn; em francês, bugie; em
ita-liano, fli corno. Instrumento da família da tuba, que atua no registro médio.
Cornamusa ou gaita de foles
Em francês, cornemuse; em inglês, bagpipe; em alemão Sackpfeife; em italiano,
cor-namusa, piva ou zampogna. Instrumento de foles, que se destina a ser tocado ao ar
livre. É constituído por vários tubos com palhetas fixados em um saco, em geral feito de pele de carneiro, que armazena o ar. Um dos tubos destina-se ao sopro do exécutante, os outros (prima e bordões) servem para produzir os sons diversifica-dos pelo escapamento do ar.
Museta. Em francês, musette. Instrumento de foles, de origem francesa, pouco
di-ferente da cornamusa; o tubo da folaria, com embocadura, foi nele substituído por um fole que o tocador aciona com a mão direita. Muito em voga nos séculos XVII e XVIII, foi depois suplantado pelo acordeão. Deu o nome à musette, dança fran-cesa que freqüentemente acompanhava, de caráter pastoril, ritmo variável, sempre em três partes.
Regai
Em francês, régale. Instrumento de foles e teclado, espécie de órgão portátil, com palhetas metálicas e batentes, e de sonoridade rouca, que caiu em desuso no início do século XVIII. Emprestou seu nome a um registro de órgão.
Algumas invenções do início do século XIX
Acordeão. Em alemão, Akkordeon ou Ziehharmonika; em francês, accordéon; em
inglês, accordion; em italiano, fisarmónica. Instrumento portátil dotado de fole e palhetas livres metálicas, cuja ventilação, proporcionada pelo fole controlado ma-nualmente, produz sons que são selecionados pelo acionamento de um teclado. Posteriormente, o acordeão passou a ter dois teclados, o do acompanhamento e o do solo. Foi inventado por um austríaco de nome Demian, que o patenteou em 1829, depois de muitas pesquisas, realizadas em diferentes países, entre as quais as do alemão Friedrich L. Buschmann.
Teve uso mais generalizado na música popular, mas muitos compositores eru-ditos, entre os quais Jean Wiener, que escreveu um Concerto para acordeão, não desdenharam compor para esse instrumento.
Harmônica ou gaita de boca. Em francês, alemão e inglês, harmonica. Pequeno
instrumento de sopro, provido de palhetas livres metálicas, que se toca com a boca. Foi inventado por Friedrich L. Buschmann em 1828, um ano antes do acordeão.
Harmonio ou órgão de sala. Em francês, inglês e alemão, harmonium. Órgão de
palhetas livres, com um ou dois teclados e pequeno número de registros, cuja folaria (se não for elétrico) é acionada através de pedáis. O harmonio foi inventa-do por Alexandre Debain em 1842. Na falta inventa-do órgão, é um instrumento comum nas igrejas, e pode também ser visto em algumas residências, mas distingue-se fundamentalmente do órgão pela ausência de tubos.
O ÓRGÃO
Diz-se que o órgão é o rei dos instrumentos. Decerto é o mais polivalente: é a soma de tudo o que se pode fazer com os instrumentos de sopro. Por outro lado, o órgão é o resultado mais refinado da combinação da ciência empírica com a engenhosi-dade artesanal. Fica-se perplexo quando se constata que, no fim da Iengenhosi-dade Média— numa época em que a "mecânica" não existia, em que a ciência acústica estava por nascer, em que o arado ainda era uma ferramenta primitiva, em que nem o papel nem a imprensa sequer tinham sido imaginados, e em que todos os outros instru-mentos de música estavam em sua infância —, o órgão já possuía todas as carac-terísticas que tem hoje, com toda sua complexidade!
DESCRIÇÃO
Os principais elementos do órgão
1. Afolaría: os pulmões.
2. Os tubos. Não devemos fiar-nos naquilo que vemos: um grande órgão possui, por trás de sua fachada (a mostra) milhares de tubos que medem desde 10,40 me-tros de altura (32 pés) até um centímetro (3/8 de uma polegada). Os tubos acham-se agrupados por famílias, chamadas "registros" ou "jogos", que produzem a exten-são de uma escala cromática completa.
3. Os someiros. São um tipo de caixa que fica entre a folaria e os tubos. Os someiros recebem o "vento" (o ar) e o distribuem por canais alongados, ditos gravuras, onde existem furos destinados a receber, em cada um, o pé de um tubo. Estes furos, se a tecla não for tocada, ficam fechados por válvulas (sopapos).
4. A consola, ou console. É a peça que suporta os teclados ou manuais (estes em nú-mero de um a cinco, ou, mais habitualmente, dois ou três) e a pedaleira.
5. A transmissão: complexo dispositivo mecânico que sai da consola e põe para funcionar três séries de mecanismos: (a) comandos de registros: ao puxar um "re-gistro" (ou seja, acionar determinado puxador, no console) o organista faz passar o. "vento" pela gravura que corresponde a todos os tubos de uma mesma família;