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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO AGROAMBIENTAL NÍVEL MESTRADO FLAVIA DONINI ROSSITO

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE DIREITO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO AGROAMBIENTAL NÍVEL MESTRADO

FLAVIA DONINI ROSSITO

ELEMENTOS JURÍDICOS DA POLÍTICA AGRÍCOLA NO BRASIL

CUIABÁ 2015

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FLAVIA DONINI ROSSITO

ELEMENTOS JURÍDICOS DA POLÍTICA AGRÍCOLA NO BRASIL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito Agroambiental, na área de Direito Agrário, oferecido pela Universidade Federal de Mato Grosso, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Direito.

Orientação: Professor Doutor Marcos Prado de Albuquerque

CUIABÁ 2015

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Ficha catalográfica elaborada automaticamente de acordo com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).

Permitida a reprodução parcial ou total, desde que citada a fonte. R835e Rossito, Flavia Donini.

Elementos jurídicos da política agrícola no Brasil / Flavia Donini Rossito. -- 2015

131 f. ; 30 cm.

Orientador: Marcos Prado de Albuquerque.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Mato Grosso, Faculdade de Direito, Programa de Pós-Graduação em Direito Agroambiental, Cuiabá, 2015.

Inclui bibliografia.

1. Direito Agrário. 2. Política Pública. 3. Política Agrícola. 4. Controle Judicial. I. Título.

(5)

Ao meu orientador Professor Marcos Prado de Albuquerque, pois este trabalho só poderia ser dedicado a alguém que o idealizou e o construiu junto comigo, preocupou-se e incentivou-me em inúmeras reuniões de orientação, que em sua carreira acadêmica se dedicou à pesquisa dos instrumentos da política agrícola. Obrigada por me apresentar de forma apaixonante ao Direito Agrário, por ter acreditado em mim até nos momentos em que eu mesma havia deixado de acreditar.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço aos meus pais, Maria Alice e Nelson, pelo apoio afetivo, emocional e material. A toda minha família, minhas primas e amigas que tiveram paciência e souberam entender minha ausência em muitos momentos importantes, que viveram junto comigo o meu sonho de cursar o Mestrado em Direito Agroambiental na UFMT.

Agradeço a minha avó Maria, pelo exemplo de honestidade e amor ao próximo. Aos professores Marcos Prado, Teodoro Irigaray, Patrick Ayala, Valerio Mazzuoli, Saul Tibaldi, Carla Reita, Bismarck Duarte, Marcelo Theodoro, Saulo Rodrigues, Fernando Dantas e Marluce Silva pela dedicação e ensinamentos compartilhados conosco durante todo o curso de Mestrado. Um agradecimento especial às professoras Carmen Lúcia e Joana Carolina e ao Professor Pierre Girard, por trazerem contribuições de outras ciências, mostrando que a transdisciplinaridade é necessária para que se possa compreender o Direito Agrário e o Ambiental.

Obrigada aos Professores Saul Tibaldi e Saulo Rodrigues por terem participado da minha Banca de Qualificação, pelas dicas que contribuíram com o amadurecimento do presente trabalho acadêmico.

Agradeço aos meus amigos de turma Daniela, Larah, Rafaela, Cristiane, Ludmila, Rosane, Luize, Luana, Juliana, Joaquim, Diogo, Edilson, Adriano e Gladstone pelo companheirismo, pelas inúmeras caronas, pela amizade. Vocês sempre terão um lugar especial em meu coração. Sentirei muita saudade.

Agradeço à Secretária do Mestrado, principalmente ao Gabriel pelo apoio durante todo o curso, pela paciência e prontidão no auxílio aos mestrandos.

Agradeço à Professora Angela Cassia Costaldello que me aceitou como aluna em disciplina isolada na UFPR, pelos ensinamentos, pelo carinho, pela preocupação e orientação nos caminhos a serem escolhidos. Também da UFPR, agradeço aos Professores Rodrigo Kanayama e Fabrício Tomio.

Muitíssimo obrigada ao Professor José Antônio Peres Gediel, por ter sido uma espécie de orientador espiritual, como assim se autodenominou uma vez em tom de brincadeira. Obrigada pela orientação, pelo carinho, pela preocupação, por me aceitar em seus grupos de estudos na UFPR.

Aos colegas que fiz na UFPR, em especial ao Dioleno e ao Roberto de Paula por dividirem tanto comigo, pela amizade.

Agradeço ao Professor Fabiano Mello, da Rede de Ensino LFG, pelo incentivo no início de tudo, pela atenção desde o primeiro dia que lhe pedi ajuda para estudar para o processo seletivo do Mestrado da UFMT. Obrigada por ter sido um anjo em minha vida.

Agradeço à Professora Elisabete Maniglia por gentil e prontamente ter aceitado o convite para compor minha Banca de Defesa da dissertação. Obrigada pelas críticas e dicas construtivas que somaram a presente pesquisa.

Ah, não poderia me esquecer de agradecer aos animais do zoológico da UFMT, que me faziam companhia nas caminhadas, principalmente nos solitários dias de domingo. Ao bioma cerrado que me ensinou o poder de resistência e adaptação às adversidades da vida. Aos cajueiros que perfumam os meses mais secos e quentes em Cuiabá, que mostram que a vida pode ser doce até nos momentos mais difíceis. Só sei que desta terra, dos amigos que aqui fiz, da UFMT, do bolo de queijo, do bolo de arroz, do doce de caju e do perfume dos cajueiros, sentirei imensa saudade. Espero sempre retornar e que esta despedida seja apenas um até breve.

(7)

Se ao cultor do direito civil denominamos civilista, ao estudioso do direito penal, penalista, ao jurista do direito constitucional, constitucionalista – ao que se dedica e se especializa no estudo do direito agrário, denominamos agrarista.

(8)

RESUMO

O estudo visa compreender a política agrícola como um importante instituto jurídico do Direito Agrário. Para o presente trabalho acadêmico, é com base na configuração da política pública que os elementos jurídicos da política agrícola são constituídos. Adota-se a política agrária como gênero, sendo a política agrícola uma de suas espécies, conforme diálogo estabelecido com a teoria da política agrária de Antonino Carlos Vivanco.O presente trabalho também tem por objetivo estudar os contornos de uma nova ordem constitucional na formação de uma política agrícola contemporânea, que deverá estar atenta não só à economia rural, mas também às adversidades postas pela diversidade fundiária e cultural que se apresentam no âmbito rural brasileiro. Estudam-se o planejamento, a execução e o controle da política agrícola como processos juridicamente regulados. A política agrícola, como atuação do Estado na economia rural, poderá ser controlada de forma interna pela Administração Pública ou de forma externa pelo controle judicial e pelo controle social.

(9)

ABSTRACT

The study aims to understand the agricultural policy with an important legal institute of agrarian law. For the present academic study is on the basis in the public policy that the legal elements of agricultural policy are made. Is taken the agrarian policy as gender and the agricultural policy as its kind as dialogue with the theory of agrarian policy of Antonino Carlos Vivanco. This study also aims to study the contours of a new constitutional orderin the formation of a contemporary agricultural policy which should be attentive not only to the rural economy, but also the adversities imposed by land and cultural diversity within the rural in the Brazil. Are studied the planning, the implementation and the control of the agricultural policy as processes governed by the law. The agricultural policy as the State action rural economy can be controlled internally by the public administration and externally by judicial control and by social control.

(10)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...9

1 DIREITO E POLÍTICA PÚBLICA ...12

1.1 A POLÍTICA PÚBLICA COMO INSTITUTO JURÍDICO ...18

1.2 A POLÍTICA PÚBLICA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ...28

1.2.1 A atuação do Estado no domínio econômico e social por meio de políticas públicas ...29

1.2.2 Política pública e planejamento ...34

1.2.3 Planejamento, execução e avaliação da política pública ...39

2 POLÍTICA AGRÁRIA NO BRASIL ...43

2.1 A POLÍTICA AGRÁRIA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ...47

2.2 A POLÍTICA AGRÁRIA NA DOUTRINA BRASILEIRA: UM DIÁLOGO COM A TEORIA SOBRE POLÍTICA AGRÁRIA DE ANTONINO CARLOS VIVANCO ...53

3 POLÍTICA AGRÍCOLA ...68

3.1 A POLÍTICA AGRÍCOLA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ...75

3.2 A POLÍTICA AGRÍCOLA COMO INSTITUTO JURÍDICO ...77

3.2.1 Natureza jurídica da política agrícola ...78

3.2.2 Conceito de política agrícola ...80

3.3 PLANEJAMENTO E EXECUÇÃO DA POLÍTICA AGRÍCOLA ...83

3.4 POLÍTICA AGRÍCOLA CONTEMPORÂNEA ...89

3.4.1 Política agrícola e agricultura familiar...92

3.4.2 Política agrícola para os povos indígenas e populações tradicionais ...99

3.5 POLÍTICA AGRÍCOLA E A PROTEÇÃO DOS RECURSOS NATURAIS ...105

4 CONTROLE E JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA AGRÍCOLA ...108

4.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS FORMAS DE CONTROLE DA POLÍTICA AGRÍCOLA ...108

4.2 O CONTROLE DA POLÍTICA AGRÍCOLA PELO PODER JUDICIÁRIO ...110

CONCLUSÃO ...120

(11)

INTRODUÇÃO

A política pública é instituto desenvolvido e estudado pela ciência política, mas vem ganhando espaço entre os estudiosos e aplicadores do Direito. Com a constitucionalização de diretrizes que norteiam a formulação e a implementação de políticas públicas no Brasil, o estudioso e aplicador do Direito encontra-se frente a desafios para classificar a política pública como instituto jurídico, bem como de regulamentar juridicamente seu processo de planejamento, de execução e de controle.

É com base na configuração jurídica da política pública que o presente trabalho acadêmico visa estudar a política agrícola, esta, por sua vez, como atuação estatal no âmbito da economia rural. A política agrícola constitui importante instituto jurídico do Direito Agrário e tem como objetivo fomentar o desenvolvimento da atividade agrária e possibilitar o desenvolvimento social, econômico e cultural do homem na terra.

Conforme explicam Oswaldo Opitz e Silvia Opitz, a política agrícola em sua trajetória histórico-jurídica antecedeu a reforma agrária e até mesmo o próprio Direito agrário no Brasil. Os autores citam como exemplos do início da regulamentação da política agrícola, ou seja, da relação entre Direito e política agrícola, os institutos do açúcar, álcool e café1. Em relação à economia cafeeira no Brasil, destaca-se o Convênio de Taubaté de 1906, acordo assinado entre os Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro como instrumento jurídico que nasceu para valorização da economia cafeeira por meio de políticas agrícolas.

Mas foi somente em 1964, com a edição da Lei nº 4.504, ora denominada Estatuto da Terra, que a política agrícola ganha força no sistema jurídico brasileiro. O Estatuto da Terra surge com o objetivo de fomentar a política agrícola e viabilizar a reforma agrária.

Entretanto, a temática sobre política agrícola, apesar de sua trajetória histórica, é pouco discutida pela doutrina brasileira, esta, por sua vez, ainda apresenta de forma obscura as diferenças terminológicas entre a política agrária, a política agrícola, a política fundiária e a reforma agrária.

Na tentativa de compreender a política agrária como gênero e a política agrícola como uma de suas espécies, o presente trabalho estabelece um diálogo com a teoria sobre a política agrária apresentada pelo agrarista argentino Antonino Carlos Vivanco. A escolha

1

OPITZ, Oswaldo; OPITZ, Silvia C. B. Direito da economia agrária: interpretação e aplicação econômica das leis agrárias brasileiras, em vigor. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971. p. 12.

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deste marco teórico se deu por conta da influência da obra de Vivanco na literatura jurídica formada no Direito Agrário brasileiro, bem como por ter sido o autor a desenvolver uma teoria específica para a política agrária.

O objetivo é analisar o contexto jurídico no qual se insere a política agrícola, tanto no âmbito constitucional quanto legal, identificando como uma política agrícola é planejada, executada e controlada no Brasil.

Quanto à metodologia, considerando o tipo de pesquisa, o presente trabalho adota o método da pesquisa bibliográfica, partindo da análise de dados secundários, ou seja, já desenvolvidos por outros pesquisadores.

Em dados momentos, o trabalho também trilha os caminhos da pesquisa documental ao se socorrer de fontes primárias, com a verificação do arcabouço legislativo sobre a política agrícola no Brasil. Uma minuciosa análise das leis que tratam do assunto é necessária para possibilitar o melhor entendimento do conteúdo da política agrícola.

O estudo e a interpretação das leis pelo estudioso do Direito devem estar pautados nas regras da hermenêutica jurídica. Portanto, o presente trabalho será realizado com base nas regras hermenêuticas para a interpretação das normas constitucionais e das leis, cuja finalidade é garantir um resultado juridicamente científico.

Para tanto, a presente pesquisa acadêmica foi dividida em quatro partes.

Iniciam-se os estudos pela relação do Direito com a política pública e como esta foi transposta da ciência política e passou a interessar ao estudo da ciência do Direito, passando a figurar como instituto jurídico.

Identifica-se o modelo de Estado sob o qual surgiu o interesse jurídico sobre a política pública como instrumento de realização dos direitos sociais, culturais e econômicos e se esta política permanece mesmo com a alteração do modelo de Estado.

Analisa-se a atuação do Estado por meio de políticas públicas, identificando as regras para seu planejamento, execução e controle, bem como tais funções são dividas entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Em seguida, passa-se ao estudo da política agrária no Brasil, como política pública setorial, voltada a questões que envolvem tanto o setor da economia rural quanto o acesso à terra como princípio de justiça social. Nesse segundo momento, dedica-se ao estudo da organização da política agrária na Constituição Federal de 1988. Mas é no diálogo da literatura jurídica brasileira com a teoria sobre a política agrária de Vivanco que se encontra a base para a adoção da política agrária como gênero e a política agrícola como uma de suas espécies.

(13)

Desta forma, utiliza-se a teoria sobre a política agrária de Antonino Carlos Vivanco como ponto de partida para a contextualização da política agrícola como espécie da política agrária.

Em um terceiro momento, dedica-se ao estudo específico da política agrícola como importante instituto jurídico inserido no bojo do Direito Agrário.

Analisa-se os elementos jurídicos que compõem a política agrícola, o conceito legal dado pelo Estatuto da Terra em 1964, bem como se este conceito legal permanece atual diante das mudanças sociais, econômicas e, principalmente jurídicas pelas quais o Brasil passou nesses cinquenta anos que sucederam a edição do Estatuto da Terra. É neste momento que se analisa a possibilidade de uma releitura do conceito legal de política agrícola, dada pelo artigo 1º, § 2º, do Estatuto da Terra, a partir da Constituição Federal de 1988.

Busca-se fazer uma leitura do que se pode chamar de política agrícola contemporânea, que tem sua base na Constituição Federal de 1988.

É preciso analisar o contexto histórico das revoluções tecnológicas no campo brasileiro, contexto este sobre o qual foi fundamentado e editado o Estatuto da Terra. Entretanto, a realidade imposta pelo ordenamento jurídico hoje exige uma interpretação conforme a Constituição Federal de 1988, que reconheceu a diversidade sociocultural, respeitando o desenvolvimento social, econômico e cultural de diferentes grupos étnicos no território brasileiro, bem como o acesso à terra por esses grupos.

Em um quarto momento, o presente trabalho faz uma breve análise sobre a possibilidade de controle da política agrícola, seja de forma interna pela Administração Pública como dever de avaliar seus próprios atos, seja no âmbito externo com a participação social dos agricultores no planejamento, na execução e no controle da política agrícola, ou, ainda, com o controle judicial por meio da judicialização das políticas agrícolas.

Sabe-se, porém, que ao escolher o tema política agrícola a presente pesquisadora tomou para si uma discussão que deverá acompanhá-la por toda sua vida acadêmica, diante da importância do tema e da necessidade de seu amadurecimento, tarefa que só vem com o estudo e com a reflexão no tempo, o que indica que este trabalho não foi apenas a descoberta de um tema de interesse pessoal, mais do que isso, foi para a pesquisadora a descoberta de si mesmo.

(14)

1 DIREITO E POLÍTICA PÚBLICA

De acordo com os ensinamentos de Antonino Carlos Vivanco, o Direito é o meio ou a via que torna possível a concretização de toda política, isto é, a aplicação de uma política ocorre por meio do Direito2.

Tal interdependência entre a política pública e o Direito também pode ser extraído dos ensinamentos de Maria Paula Dallari Bucci:

O direito tem um papel na conformação das instituições que impulsionam, desenham e realizam as políticas públicas. As expressões da atuação governamental correspondem, em regra, a formas definidas e disciplinadas pelo direito.3

Apesar dessa influência que exerce o Direito na conformação da atuação estatal por meio de política pública, a princípio, esta ficou circunscrita ao âmbito das discussões e estudos da ciência política, entretanto, é temática que vem ganhando espaço na literatura jurídica e na jurisprudência brasileiras4.

Ensina Maria Paula Dallari Bucci que a necessidade de compreensão das políticas públicas como categoria jurídica se apresenta à medida que se buscam formas de concretização dos direitos humanos, em particular os direitos sociais5.

De forma pioneira no Direito pátrio, Fábio Konder Comparato, em seu Ensaio Sobre o Juízo de Constitucionalidade de Políticas Públicas, ao tratar da discussão jurídica que vem se formando em torno das políticas públicas assim dispôs:

O conceito de política, no sentido de programa de ação, só recentemente passou a fazer parte das cogitações da teoria jurídica. E a razão é simples: ele corresponde a uma realidade inexistente ou desimportante antes da Revolução Industrial, durante todo o longo período histórico em que se forjou o conjunto dos conceitos jurídicos dos quais nos servimos

2

VIVANCO, Antonino Carlos. Teoria de Derecho agrario. La Plata: Ediciones Libreria Juridica, 1967. V. 1. p. 76.  Assim entende o autor ao explicar que a política agrária só pode ser aplicada a partir do ordenamento jurídico, ou seja, das normas de Direito agrário.

3

BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em Direito. In: BUCCI, Maria Paula Dallari. (org.). Políticas públicas: reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 37. No mesmo sentido MASSA-ARZABE, Patrícia Helena. Dimensão jurídica das políticas públicas. In: BUCCI, Maria Paula Dallari. (org.). Políticas públicas: reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 51-52.

4

BREUS, Thiago Lima. Políticas públicas no Estado constitucional: problemática da concretização dos direitos fundamentais pela administração pública brasileira contemporânea. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 1.

(15)

habitualmente.6

Tais ensinamentos corroboram com a assertiva de que é preciso, mesmo que em breves palavras, analisar o contexto jurídico e histórico no qual a política pública passou a integrar as discussões de um Direito posto pelo Estado, e, consequentemente, analisar o modelo de Estado no qual a política pública ganhou relevância, bem como se esta sobrevive mesmo que o modelo de Estado se altere.

Nesse sentido, Maria Paula Dallari Bucci destaca que uma das primeiras observações a ser feita ao se trabalhar com a política pública no Direito é sobre a relação entre o Direito e o modelo de Estado7.

Conforme aponta Jacques Chevallier, vale lembrar que esse modelo de Estado que é estudado é uma forma de organização política construída na Europa, que se expandiu para os demais países diante da dominação da vida internacional pelas potências políticas, mas que apesar disso também assumiu feições particulares dos sistemas de valores e das tradições próprias de cada país8.

Montesquieu já ressaltava que cada Estado assumia particularidade própria ao ensinar que ainda que todos os Estados possuam em geral o mesmo objeto, que é conservar-se, cada Estado, no entanto, possui um que lhe é particular9.

Isto é, o Estado pode assumir modelos diferentes de acordo com as particularidades de cada povo, ser exercido sob a égide de diferentes formas de mercado ou ideologias. Não será idêntico ao mesmo tempo em todo lugar do mundo, mas marcará mesmo que mínima presença nos países que historicamente foram influenciados pelo modelo de Estado europeu.

Nesse sentido, explica Jorge Reis Novais, ao elaborar um conceito base como ponto de partida para o estudo do Estado de Direito:

Podem variar as técnicas formais de vinculação e limitação do Estado; pode haver muito ou pouco Estado; as formas de organização do poder político e os sistemas de governo não serão necessariamente idênticos, mas só haverá Estado de Direito quando no cerne das preocupações do Estado e dos seus fins figurar a proteção e garantia dos direitos fundamentais, verdadeiro

6 COMPARATO, Fábio Konder. Ensaio sobre o juízo de constitucionalidade de políticas públicas. Revista dos

Tribunais, São Paulo, ano 86, n. 737, p. 11-22, mar. 1997. p. 44.

7

BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito Administrativo e políticas públicas. 2 tiragem. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 244-245.

8 CHEVALLIER, Jacques. O Estado pós-moderno. Traduzido por Marçal Justen Filho. Belo Horizonte: Fórum,

2009. p. 11-12.

9 MONTESQUIEU, Charles de Secondat. O espírito das leis. Traduzido por Cristina Murachco. São Paulo:

(16)

ponto de partida e chegada do conceito.10

Esse Estado, conceituado por Dalmo de Abreu Dallari como a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território11, assume seu adjetivo de Direito quando protege e garante os direitos fundamentais em seu ordenamento jurídico.

O Estado de Direito adquiriu dois adjetivos distintos durante sua trajetória histórica. Em um primeiro momento, assumiu o Estado o adjetivo liberal ao desenvolver um papel menos participativo na sociedade, havia nítida separação entre Estado e sociedade 12. Já em um segundo momento, ora mais interventivo e dirigente, adotou o adjetivo social. Vale ressaltar que ambos foram criados sob a égide do Estado de Direito – Estado Liberal de Direito e Estado Social de Direito.

Ainda de acordo com os ensinamentos de Jorge Reis Novais, a adjetivação social se agrega ao Estado de Direito diante das novas exigências de socialidade e democracia no século XX, momento em que ocorre a estadualização da sociedade e a socialização do Estado13.

A passagem do Estado Liberal para o Estado Social não ocorreu de uma só vez, ou por meio de uma só transformação14. Após a primeira Guerra Mundial, surge a necessidade de reavaliação da relação entre Estado e sociedade, momento também marcado pela gênese das Constituições que incorporaram em seus textos os direitos fundamentais e sociais15.

Dessa forma, é no bojo do Estado social que direitos econômicos, sociais e culturais são constitucionalizados, a começar pela Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição de Weimar de 1919, que influenciaram as Constituições brasileiras a partir do século XX em um movimento que Paulo Bonavides explica como constitucionalismo do Estado social16.

O intervencionismo estatal no desenvolvimento econômico e social é característica marcante do Estado social pós-guerra, conforme ressalta Eros Roberto Grau, a liberdade econômica que constrói, que viceja no Estado Social, compatível com os ideais de bem-estar

10 NOVAIS, Jorge Reis. Contributo para uma teoria do Estado de direito: do Estado de direito liberal ao Estado

de direito social e democrático de direito. Coimbra: Coimbra, 1987. p. 16.

11

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 118.

12 LOC. Cit. p. 51 e ss.

A compatibilidade entre Estado de Direito e Estado social não é assunto pacífico na doutrina. Ver estudo realizado por NOVAIS, Jorge Reis. Contributo para uma teoria do Estado de direito: do Estado de direito liberal ao Estado de direito social e democrático de direito. Coimbra: Coimbra, 1987. p. 203 e ss.

13 IBIDEM, p. 188 e ss. 14

GRAU, Eros Roberto. Planejamento econômico e regra jurídica. São Paulo: RT, 1978. p. 20.

15 LOC. CIT. p. 188-189.

(17)

e desenvolvimento, é então moldada pela política de intervencionismo econômico e social17. É dentro desse cenário consolidado após as duas grandes Guerras Mundiais que o Estado atinge seu ápice na direção e na intervenção na sociedade, momento em que floresce o Estado de bem-estar social como um Estado intervencionista e de bem-estar, representado, mais especificamente, pelo Estado de bem-estar europeu e pelo New Deal norte-americano, com base no capitalismo como forma de mercado, o qual atingiria sua idade de ouro durante as décadas de cinquenta e sessenta ao representar o crescimento mais rápido da história18.

Entretanto, o Estado de bem-estar social, com forte regulação social e econômica pelo Estado, apesar dos anos de glória que atingiu no pós-guerra, experimentou sua decadência no início da década de setenta, como salienta Perry Anderson:

A chegada da grande crise do modelo econômico do pós-guerra, em 1973, quando todo o mundo capitalista avançado caiu numa longa e profunda recessão, combinando, pela primeira vez, baixas taxas de crescimento com altas taxas de inflação, mudou tudo. A partir daí as ideias neoliberais passaram a ganhar terreno.19

Assim, com a perda de força do Estado de bem-estar e com a máquina estatal que se tornara pesada diante das prestações sociais assumidas, ganham força, principalmente na Inglaterra, as ideias neoliberais, exigindo do Estado uma contenção dos gastos com o bem-estar20.

Entretanto, Maria Paula Dallari Bucci ensina que não se deve confundir Estado de bem-estar social com o Estado Social de Direito. Expressa a autora que o Estado social de direito, que se consagrou nas Constituições do século XX, não é sinônimo de Estado de bem-estar, produto de trinta anos de excedentes capitalistas no pós-guerra21.

Continua Maria Paula Dallari Bucci:

A inscrição de direitos sociais nas cartas políticas nacionais não é um decalque de uma situação econômica que muda com as circunstâncias. Os direitos constitucionais permanecem, sendo este um dos dilemas do modelo constitucional dirigente: como garantir a efetividade do programa constitucional cujos pressupostos, especialmente econômicos, escapam ao poder de determinação normativa? Ainda mais num período de globalização, em que os rumos das economias nacionais são diretamente

17

GRAU, Eros Roberto, op. cit., p. 20-21.

18 ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In: SADER, Emir; GENTILI, Pablo. Pós-neoliberalismo: as

políticas sociais e o Estado democrático. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. p. 9-10.

19

IBIDEM, p. 10.

20 IBIDEM, p. 10-11.

(18)

influenciados pelos grandes movimentos financeiros internacionais e a ação cogente do Estado nacional dentro de suas fronteiras perde força.

Mesmo assim, a noção de política pública é válida no esquema conceitual do Estado social de direito, que absorve algumas das figuras criadas com o Estado de bem-estar, dando a elas um novo sentido, agora não mais de intervenção sobre a atividade privada, mas de diretriz geral, tanto para a ação de indivíduos e organizações, como do próprio Estado.22

Desta forma, o movimento de constitucionalização de direitos sociais pelo velho mundo também influenciou as Constituições brasileiras, a começar pela Constituição de 1934. Tais influências ocorreram uma vez que o Brasil, ao experimentar a colonização europeia, adotou a formação de Estado conforme o modelo europeu. No entanto, imprimiu suas particularidades e identidade ao Estado, construindo seus próprios processos de luta e constitucionalização dos direitos sociais.

Paulo Bonavides e Paes de Andrade, em estudo sobre a história constitucional do Brasil, afirmam que, com o advento da Constituição de 1934, sob influência das tendências europeias do Welfare State, pós-guerra, ou Estado de bem estar europeu, pela primeira vez na história constitucional brasileira, considerações sobre a ordem econômica e social estiveram presentes no texto constitucional.23

Sobre a história de constitucionalização dos direitos sociais e o advento do Estado social brasileiro, continuam Paulo Bonavides e Paes de Andrade:

Em 1934 demos o grande salto constitucional que nos conduziria ao Estado social, já efetivado em parte depois da Revolução de 30 por obra de algumas medidas tomadas pela ditadura do Governo Provisório. Os novos governantes fizeram dos princípios políticos e formais de liberalismo uma bandeira de combate, mas em verdade estavam mais empenhados em legitimar seu movimento com a concretização de medidas sociais, atendendo assim a um anseio reformista patenteado de modo inconsciente desde a década de 20, por influxo talvez das pressões ideológicas sopradas do velho mundo que traziam para o País o rumor inquietante da questão social.24

Os direitos sociais, uma vez constitucionalizados em 1934, permaneceram prestigiados pelos textos constitucionais seguintes, mantendo sucessivamente os direitos anteriormente garantidos, isto é, não houve supressão destes direitos com a substituição dos textos constitucionais.25

22 BUCCI, Maria Paula Dallari, Direito administrativo... p. 247.

23 BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História constitucional do Brasil. Porto: Universidade

Portucalense, 2003. p. 325.

24 IBIDEM, p. 331. 25 IBIDEM, p. 327.

(19)

Como instrumentos de realização de direitos sociais, econômicos e culturais as políticas públicas ganham relevância. A partir desse momento, segundo Rogério Gesta Leal:

Passam então os Poderes Públicos instituídos a avocar para si a responsabilidade de uma tutela política mais eficaz, de natureza coletiva e indeterminada no âmbito das satisfações econômicas básicas de sua população, e uma gradativa intervenção ou direção na vida econômica dos setores produtivos, com o objetivo explícito de reajustar e mitigar os conflitos nas estruturas sociais respectivas.26

Eros Roberto Grau defende que ainda deve-se insistir na afirmação de que o Estado do nosso tempo – o Estado contemporâneo - é, fundamentalmente, Estado implementador de políticas públicas27. Continua o autor:

Essas políticas, contudo, não se reduzem à categoria das políticas econômicas; antes, de modo mais amplo, englobam todo o conjunto de atuações estatais no campo social (políticas sociais). A expressão políticas públicas, assim, designa todas as atuações do Estado, cobrindo todas as formas de intervenção do poder público na vida social. E de tal forma isso se institucionaliza que o próprio direito, neste quadro, passa a manifestar-se como uma política pública – o direito é também, ele próprio, uma política pública.28

Como reflexo da constitucionalização dos direitos sociais, econômico e culturais o Estado viu-se vinculado a seguir as diretrizes estabelecidas pela Constituição para planejar e elaborar suas políticas públicas. Mesmo que ainda haja margem de discricionariedade nas escolhas públicas, existem diretrizes mínimas impostas pela Constituição que devem nortear o Administrador Público na elaboração de políticas públicas.

Assim, ressalta Vanice Regina do Valle que ao serem transpostos valores e projetos para o corpo da constituição, juridicizam-se áreas do viver social até então excluídas da órbita de incidência desse texto.29

Expressa Maria Paula Dallari Bucci:

À medida que se amplia o alcance da Constituição, também se juridificam,

26 LEAL, Rogério Gesta. Condições e possibilidades eficaciais dos direitos fundamentais sociais: os desafios do

Poder Judiciário no Brasil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 72.

27

GRAU, Eros Roberto. O discurso neoliberal e a teoria da regulação. In: CAMARGO, Ricardo Antônio Lucas (org.). Desenvolvimento econômico e intervenção do Estado na ordem econômica constitucional: estudos jurídicos em homenagem ao Professor Washington Peluso Albino de Souza. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1995. p. 59.

28 IBIDEM., p. 61.

(20)

crescentemente, as esferas de atuação política não disciplinada direta ou exclusivamente por ela. O paradigma jurídico do pós-guerra, centrado nas Constituições garantistas, com sua “força normativa” assegurada pela multiplicação dos instrumentos de controle judicial, modifica o papel jurídico específico dos governos. Consagraram-se os direitos e também as garantias, o que faz deles bens exigíveis. Isso tudo constitui limitação da política. E impõe custo político aos governos que cogitem diminuir a fruição de qualquer desses direitos.30

É a partir da constitucionalização das políticas públicas como instrumentos concretizadores de direitos fundamentais, sociais, econômicos e culturais, que a política pública passa a integrar o dia a dia do aplicador do Direito e a figurar como instituto jurídico, o que ressalta a necessidade de discussão sobre sua natureza jurídica, conforme será estudado a seguir.

4.1 A POLÍTICA PÚBLICA COMO INSTITUTO JURÍDICO

Ao tentar compreender o que é a política pública sob a ótica jurídica a primeira questão que surge é quanto sua natureza jurídica e para responder tal indagação é preciso analisar a literatura jurídica que se debruça sobre o tema.

Como já mencionado no presente trabalho, de forma pioneira no Direito pátrio, Fábio Konder Comparato se dedicou ao estudo da política pública sob a ótica jurídica, discursando sobre sua natureza:

A primeira distinção a ser feita no que diz respeito à política como programa de ação, é de ordem negativa. Ela não é uma norma nem um ato, ou seja, ela se distingue nitidamente dos elementos da realidade jurídica, sobre os quais os juristas desenvolveram a maior parte de suas reflexões, desde os primórdios da iurisprudentia romana.31

Para Fábio Konder Comparato com a adoção das políticas públicas houve uma mudança significativa na estrutura jurídica do Estado, que ocorre a partir da passagem progressiva do Estado regido pela lei, para o Estado regido por princípios e, finalmente, para

30

BUCCI, Maria Paula Dallari. Fundamentos para uma teoria jurídica das políticas públicas. 2 tiragem. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 97.

O que ocorre, por exemplo, com os magistrados que vêm se deparando diariamente com a questão do controle judicial da atuação estatal por meio de política pública como mecanismo para a efetivação de direitos fundamentais, sociais, econômicos e culturais.

(21)

o Estado que se funda na realização de finalidades coletivas, isto é, de metas coletivas, formando um Estado fundado em políticas públicas ou programas de ação governamental32.

Desta forma, para Comparato a política pública não é norma e nem ato, apesar de englobá-los como seus componentes. Para o autor, a política pública teria natureza de atividade, conforme exposição a seguir:

Mas, se a política deve ser claramente distinguida das normas e dos atos, é preciso reconhecer que ela acaba por englobá-los como seus componentes. É que a política aparece, antes de tudo, como uma atividade, isto é, um conjunto organizado de normas e atos tendentes à realização de um objetivo determinado.33

De forma bastante clara, Comparato se manifesta sobre a natureza da política pública, que para o autor é de atividade, esta, por sua vez, é definida por ele como um conjunto organizado de normas e atos com finalidade de alcançar determinado objetivo.

Assim, diante do exposto, para Comparato a política pública é um programa de ação estatal, cuja natureza jurídica é de atividade administrativa.

Ao identificar a abrangência da atividade na ciência do Direito, Comparato aponta que a atividade ora é debatida no Direito Empresarial como substituta dos antigos atos de comércio, outrora emprega novos contornos ao Direito Administrativo ao delinear a noção de serviço público, dos procedimentos administrativos, bem como da noção de direção estatal na economia34.

Essa atividade administrativa aparece até mesmo nas discussões que elegem os critérios para a definição de Administração Pública e do próprio Direito Administrativo35.

Sobre a atividade, Rui Cirne Lima ensina que:

Traço característico da atividade assim designada é estar vinculada, - não a uma vontade livremente determinada, - porém, a um fim alheio à pessoa e aos interêsses (sic) particulares do agente ou órgão que a exercita.

Uma atividade e um fim supõem uma norma que lhes estabeleça, entre ambos, o nexo necessário. Entre uma causa e o fenômeno que lhe é efeito, a lei natural estabelece êsse (sic) nexo. Entre uma atividade e um fim, sòmente

32 COMPARATO, Fábio Konder, Ensaio sobre... p. 43-44. 33 IBIDEM, p. 44-45.

Como visto no item anterior, p.12, do presente trabalho acadêmico.

34 IBIDEM, p. 45.

35 Neste sentido: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p.

46-47; LIMA, Rui Cirne. Princípios de direito administrativo. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987. p. 19-26; MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 15. ed. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. p. 74-75.

(22)

(sic) uma lei prática, no caso, jurídica, o poderá estabelecer36.

Portanto, a atividade vincula-se aos fins estabelecidos pela lei. Como atividade, a política pública estaria submetida à aplicação dos princípios de Direito Administrativo, ou seja, legalidade, moralidade, impessoalidade, eficiência e publicidade, uma vez que tais princípios se aplicam a todas as atividades da Administração Pública, eles necessariamente funcionam como vetores axiológicos das políticas públicas 37.

José Cretella Júnior divide a atividade em jurídica e social. A atividade jurídica é aquela desenvolvida pelo Estado para a tutela do Direito, enquanto à atividade social é toda ação desenvolvida pelo Estado para assegurar aos cidadãos bem-estar, cultura e progresso.38 Entende o autor que esta atividade social se desdobra em quatro campos seguintes: demográfico, saúde pública, educacional e econômico, exercendo o Estado sua ação social na ordem econômica, interferindo na produção, circulação e distribuição da riqueza.39

Ao analisar a natureza de atividade da política pública, levantada no ensaio de Fábio Konder Comparato, Nagibe de Melo Jorge Neto entende que a política pública pode ser dividida em dois campos de interesses distintos:

Mirando-se exclusivamente na esfera da atividade, as políticas públicas podem ser definidas, de modo bastante amplo, como qualquer fazer, qualquer atuação ou atividade estatal que tenham por escopo implementar os fins do Estado, oferecer aos cidadãos os bens da vida e os serviços que cumpre ao Estado fornecer.

[...] poderíamos dizer que o conceito de política pública está relacionado a um fazer estatal, a uma noção ou atuação pública, com vistas a concretizar, mediata ou imediatamente, os direitos fundamentais.

Poderíamos ainda falar em políticas públicas querendo significar os programas de governo ou planejamento de ação dos órgãos públicos nas mais diversas áreas. Essa segunda acepção difere da primeira. Uma coisa é a própria ação, o próprio fazer, o próprio atuar; outra, que lhe antecede, é o programa formal da ação ou o planejamento da atuação estatal.40

Jorge Neto faz a separação entre os processos que compõem a política pública, tais como o planejamento e a elaboração da política pública, da própria política pública como ato estatal final.

36

LIMA, Rui Cirne. Princípios de direito administrativo. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987. p. 21.

37

BREUS, Thiago Lima, op. cit. p. 228-229.

38 CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de Direito Administrativo: teoria do direito administrativo. Rio de

Janeiro/São Paulo: Forense, 1966. p. 140.

39

IDEM.

40 JORGE NETO, Nagibe de Melo. O controle jurisdicional das políticas públicas: concretizando a democracia

(23)

No entanto, os ensinamentos de Fábio Konder Comparato são claros no sentido de que a política pública como atividade é um todo unificado pela sua finalidade, isto é, engloba todos os atos, normas e processos que a formam. Nas palavras do autor a política, como conjunto de normas e atos, é unificada pela sua finalidade. Os atos, decisões ou normas que a compõem, tomados isoladamente, são de natureza heterogênea e submetem-se a um regime jurídico que lhes é próprio41.

No mesmo sentido, segue explicando Patrícia Massa-Arzabe:

O que dá unidade à política é, portanto, a sua finalidade. Podemos estabelecer, então, que uma só ação governamental não constitui política pública. Do mesmo modo, um único programa não chega a caracterizar uma política pública, sendo preciso o conjunto articulado de programas operando para a realização de um objetivo, como partes de um todo42.

Quando se transcende a política pública da ciência política para a ciência do Direito, com ela vem a sua elaboração em ciclos ou processos43, ou seja, a política pública não se forma por um único ato ou ação estatal, mas engloba o conjunto de procedimentos necessários à sua elaboração.

Também compartilhando a ideia da unidade dos atos que compõem a política pública, Celso Antônio Bandeira de Mello entende que Política pública é um conjunto de atos unificados por um fio condutor que os une ao objetivo comum de empreender ou prosseguir um dado projeto governamental para o País44. Continua o autor ao defini-la como conjunto de atos unificados ou como um plexo de atos45. Portanto, a política pública depende de um conjunto de atos para ser formulada, não se trata de único ato.

Já analisar a possibilidade de natureza de norma jurídica da política pública envolve reflexões sobre o positivismo jurídico e o sistema normativo até então adotado.

Um dos autores a enfrentar a questão foi Ronald Dworkin, pois ao contextualizar a vinculação do positivismo às regras jurídicas, aponta que tal sistema não está aberto a resolução de conflitos a partir de outros padrões que não sejam regras. Esses outros padrões são representados por princípios e políticas, como fórmulas para a resolução de casos difíceis,

41

COMPARATO, Fábio Konder, Ensaio sobre... p. 44-45.

42

MASSA-ARZABE, Patrícia Helena, op. cit., p. 62.

43 HOWLETT, Michael; RAMESH, M.; PERL, Anthony. Política pública: seus ciclos e subsistemas: uma

abordagem integral. Traduzido por Francisco G. Heidemann. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. p. 12-17.

44

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 27. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 814.

(24)

que não são solucionados apenas com a aplicação das regras46. Portanto, para o autor, política e princípios não são regras, mas devem compor o sistema normativo para auxiliar na resolução de conflitos 47.

Sobre a política, Dworkin defende que esta não tem natureza de regra e nem de princípio, apesar de com este se confundir às vezes. Para o autor a política seria um padrão com metas a serem atingidas em prol da coletividade. Tais metas seriam baseadas em fundamentos econômicos, políticos ou sociais e beneficiariam toda a comunidade.48

Eros Grau também aponta insuficiências ao que chamou de pensamento jurídico moderno, que tem como marca a adoção do formalismo ou do positivismo49, os quais, em regra, não conhecem valor normativo aos princípios50. O autor entende que as normas compreendem um gênero do qual são espécies, as regras e os princípios51, ou seja, para o autor os princípios possuem conteúdo normativo.

Patrícia Massa-Arzabe afirma que este tema é de grande complexidade jurídica e que a pirâmide Kelsiana não é adequada a explicar a normatividade da política pública em seu conjunto52. Afirma ainda que ao se incluírem novas categorias normativas no sistema jurídico, este acaba por precisar de uma reestruturação, segue a autora:

Note-se que a política pública funciona numa dimensão diferente da norma tradicional estruturada sobre a coerção. É importante ressaltar que a ação estatal meramente repressiva é insuficiente e não raro inócua para dar cabo de situações disseminadas e culturalmente toleradas na sociedade. A estrutura da política pública, ao contrário, permite o encaminhamento e tratamento do problema de forma mais razoável e possibilitando aos agentes causadores do problema em questão uma reconceitualização de si, de suas próprias ações frente ao mundo e da realidade de seu entorno. Seja isto com questão ambiental, quanto ao poluidor, seja na questão social, com a prostituição infantil ou o trabalho infantil, como modo de obtenção de renda para mitigar a pobreza familiar. Sob este prisma, pela via da participação na implantação da política pública, as crianças, os pais e a comunidade dialogam com o Estado, passam a respeitar a si próprias e tornam-se respeitados como pessoas dignas de serem ouvidas e como cidadãos. Assim, em lugar tão somente da via repressiva, pela vedação de determinada atividade ou conduta, que consistiria no caminho mais simples, mas de duvidosa efetividade, como mostra a experiência, busca-se interferir

46

DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Traduzido por Nelson Boeira. 3. ed. 2 tiragem. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011. p. 35 e ss.

47 IDEM. 48 IDEM. 49

GRAU, Eros Roberto. O Direito posto e o direito pressuposto. 6. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 30-31.

50 IBIDEM, p. 31.

51 GRAU, Eros Roberto, O Direito posto... p. 22. 52

MASSA-ARZABE, Patrícia Helena, op. cit., p. 67-68.

(25)

nas causas do problema, no caso, na necessidade de complementação da renda familiar. E a intervenção do Estado em estreita participação da sociedade dá-se, positivamente, por essa porta.53.

Eros Grau avalia o impacto no sistema jurídico da atuação do Estado por meio de políticas públicas ao explicar a atuação estatal na economia e sobre a economia:

O impacto dessas técnicas de atuação estatal reflete efeitos sobre a teoria geral do direito, o fenômeno das sanções premiais e da prospectividade do direito reclamando a reanálise da norma jurídica. A utilização do direito como instrumento de implementação de políticas públicas coloca em pauta outro fenômeno, o da profusa produção de normas pela Administração, que Carnelutti referiu como “inflação normativa”.54

Maria Paula Dallari Bucci aponta algumas diferenças entre a política e outras categorias normativas, uma vez que a lei, como categoria jurídica, caracteriza-se pela generalidade e abstração. Embora tenha uma dimensão teleológica, isto é, vise atingir um fim, isso não lhe confere, necessariamente, “endereço certo”.55

Continua a autora, as políticas, diferentemente das leis, não são gerais e abstratas, mas, ao contrário, são forjadas para a realização de objetivos determinados.56

Maria Paula Dallari Bucci também diferencia a política pública dos princípios, citando a distinção feita por Dworkin, a autora aponta que “Princípios são proposições que descrevem direitos; políticas (policies) são proposições que descrevem objetivos”.57

Desta forma, a política pública não seria nem regra e nem princípio, mas seria possível sustentar que a política pública é categoria especial de norma, ou seja, outra categoria de norma que não seja nem regra e nem princípio, isto a partir dos ensinamentos de Maria Paula Dallari Bucci:

Poder-se-ia dizer que as políticas públicas atuam de forma complementar, preenchendo os espaços normativos e concretizando os princípios e regras, com vista a objetivos determinados.

Caberia, então, encontrar lugar (ou melhorar os seus contornos) para uma categoria jurídico-formal, situada provavelmente abaixo das normas constitucionais e acima ou ao lado das infraconstitucionais. Por esse raciocínio, as políticas públicas corresponderiam, no plano jurídico, a diretrizes, normas de um tipo especial, na medida em que romperiam as amarras dos atributos de generalidade e abstração – que extremam as

53 MASSA-ARZABE, Patrícia Helena, op. cit., p. 57. 54 GRAU, Eros Roberto, O Direito posto... p. 27. 55

BUCCI, Maria Paula Dallari, O conceito de política... p. 25.

56 IDEM. 57 IDEM.

(26)

normas dos atos jurídicos, esses sempre concretos -, para dispor sobre matérias contingentes.58

Dos ensinamentos de Maria Paula Dallari Bucci destaca-se que as políticas públicas seriam instrumentos concretizadores de princípios e regras com fins determinados. E quanto à sua organização no ordenamento jurídico, a autora supõe duas possíveis situações distintas, a primeira seria a política pública sob a superioridade da Constituição e ao lado das normas infraconstitucionais, na segunda a política pública continuaria sob a Constituição, mas acima das normas infraconstitucionais. Nesta última hipótese, as políticas públicas teriam natureza supra legal, assim como os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que não foram aprovados pelo quorum de Emenda Constitucional, isto é, nos termos do artigo 5º, § 3º, da Constituição Federal de 1988.

Ainda ao tentar compreender uma possível natureza de norma jurídica da política pública, Maria Paula Dallari Bucci retoma uma discussão sobre a natureza jurídica do plano, materialização do planejamento, que ocorreu na literatura jurídica brasileira na década de 1970, fazendo um paralelo entre a discussão que tratou o plano como uma espécie normativa especial com a política pública também como espécie normativa especial. A autora traz a tona os estudos de Eros Grau para o qual o plano apresenta natureza de norma-objetivo.59

Normas-objetivos, segundo os ensinamentos de Eros Grau, não se confundiriam com as normas de conduta ou de organização, uma vez que por meio das normas-objetivo o legislador não enuncia regras de conduta, mas sim resultados concretos que devem ser alcançados pelos seus destinatários60. Expressa o autor que:

No caso da norma-objetivo não há nem comportamento, nem estrutura e funcionamento de órgão ou disciplina de processo técnico de identificação e aplicação de outras normas sendo regulados; pelo contrário, nelas se estabelece uma obrigação de resultado, deixando-se porém aos seus destinatários a opção pelos meios e formas de comportamento a dinamizar, na busca de sua realização. É o seu conceito, sem dúvida, que mais se amolda às situações de normação prospectiva, visto como nelas se definem obrigações de resultado e não de meios.61

58 BUCCI, Maria Paula Dallari, O conceito de política... p. 26-27.

O Supremo Tribunal Federal vem adotando o status de norma supra legal para os tratados internacionais sobre direitos humanos desde 2008, a partir do julgamento do RE 349703, Relator: Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 03/12/2008, DJe-104 DIVULG 04-06-2009 PUBLIC 05-06-2009 EMENT VOL-02363-04 PP-00675.

59

IBIDEM, p. 27.

60 GRAU, Eros Roberto, Planejamento econômico... p. 243. 61 IDEM.

(27)

Ao apresentar natureza de norma especial, norma objetivo, por si só a política pública entraria no sistema jurídico. Entretanto, diante da controvérsia sobre a natureza de norma da política pública, surge a questão de que a política pública se vale da norma para adentrar no sistema jurídico, para efetivar as metas por ela prescritas, isto é:

[...] as políticas públicas são conjuntos de ações e programas de ação governamental que se valem precipuamente de normas jurídicas para moldar e impulsionar a consecução dos objetivos estabelecidos. A norma jurídica desempenha a função de plasmar os objetivos, as diretrizes e os meios da atividade estatal dirigida. Por isso, a norma é fundamental no contexto presente tanto para viabilização da política como para a realização dos direitos que se visa proteger.62

Ao se valerem das normas jurídicas as políticas públicas podem entrar no ordenamento jurídico por meio de diferentes suportes legais, como enfatiza Maria Paula Dallari Bucci:

As políticas públicas têm distintos suportes legais. Podem ser expressas em disposições constitucionais, ou em leis, ou ainda em normas infralegais, como decretos e portarias e até mesmo em instrumentos jurídicos de outra natureza, como contratos de serviço público, por exemplo.63

Desta forma, as políticas públicas podem ser inseridas no ordenamento jurídico pelo texto constitucional, por leis ou por outras espécies normativas, tais como os decretos e as portarias, ou até mesmo por meio de outros instrumentos jurídicos, como, por exemplo, os Planos Diretores e os contratos de concessão de serviço público.64

Alguns autores se preocuparam em constituir um conceito jurídico para a política pública. Comparato aponta Ronald Dworkin como um dos raros autores contemporâneos que enfrentaram o conceito de política65.

Dworkin conceitua política como:

[...] aquele tipo de padrão que estabelece um objetivo a ser alcançado, em geral uma melhoria em algum aspecto econômico, político ou social da comunidade (ainda que certos objetivos sejam negativos pelo fato de estipularem que algum estado atual deve ser protegido contra mudanças

62

MASSA-ARZABE, Patrícia Helena, op. cit., p. 67.

63 BUCCI, Maria Paula Dallari, O conceito de política... p. 11. No mesmo sentido ver JORGE NETO, Nagibe de

Melo. O controle jurisdicional das políticas públicas: concretizando a democracia e os direitos sociais fundamentais. Salvador: JusPodivm, 2009. p. 54.

64 IBIDEM, p. 11-22.

(28)

adversas).66

Em seu conceito, Dworkin deixa claro que a política pública é instituída para um fim determinado, ou seja, para que certo objetivo seja alcançado em prol da coletividade.

Em sua tese intitulada Direito Administrativo e Política Pública, Maria Paula Dallari Bucci preocupou-se em construir um conceito jurídico para política pública:

Políticas públicas são programas de ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados.67

Assim, a política pública seria um programa de ação estatal composta de metas e objetivos predeterminados a serem alcançados.

Em um segundo momento, Maria Paula Dallari Bucci reformula o conceito de política pública que construiu em sua tese, com o objetivo de incluir os processos juridicamente regulados como componentes da política pública. Nas palavras da autora:

Política pública é o programa de ação governamental que resulta de um processo ou conjunto de processos juridicamente regulados – processo eleitoral, processo de planejamento, processo de governo, processo orçamentário, processo legislativo, processo administrativo, processo judicial – visando coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados.

Como tipo ideal, a política pública deve visar a realização de objetivos definidos, expressando a seleção de prioridades, a reserva de meios necessários à sua consecução e o intervalo de tempo em que se espera o atingimento dos resultados.68

Maria Paula Dallari Bucci nesse segundo conceito preocupa-se em incluir todo o conjunto de processos pelo qual passa a política pública, desde seu planejamento até a sua execução e possibilidade de controle. Observando tal conjunto de processos é possível perceber que as políticas públicas são compostas por várias etapas, vários processos, passando por distintos órgãos competentes para que possam ser planejadas, executadas e, finalmente, controladas.

Maria Paula Dallari Bucci justifica que a política pública figura como programa ou quadro de ação governamental [...] porque consiste num conjunto de medidas articuladas

66

DWORKIN, Ronald, op. cit., p. 36.

67 BUCCI, Maria Paula Dallari, Direito administrativo... p. 241. 68 BUCCI, Maria Paula Dallari, O conceito de política... p. 39.

(29)

(coordenadas), cujo escopo é dar impulso, isto é, movimentar a máquina do governo, no sentido de realizar algum objetivo de ordem pública ou, na ótica dos juristas, concretizar um direito.69

Eros Grau vai adiante ao designar o próprio Direito como uma expressão da política pública:

A expressão políticas públicas designa todas as atuações do Estado, cobrindo todas as formas de intervenção do poder público na vida social. E de tal forma isso se institucionaliza que o próprio direito, neste quadro, passa a manifestar-se como uma política pública – o direito é também, ele próprio, uma política pública.70

Sobre a busca por um conceito jurídico para a política pública, Maria Paula Dallari Bucci encerra sua pesquisa com a seguinte conclusão:

Embora estejamos raciocinando há algum tempo sobre a hipótese de um conceito de políticas públicas em direito, é plausível considerar que não haja um conceito jurídico de políticas públicas. Há apenas um conceito de que se servem os juristas (e os não juristas) como guia para o entendimento das políticas públicas e o trabalho nesse campo. Não há propriamente um conceito jurídico, uma vez que as categorias que estruturam o conceito são próprias ou da política ou da administração pública.

Entretanto, se não há um conceito jurídico, deve haver, com certeza, uma metodologia jurídica. As tarefas dessa são descrever, compreender e analisar as políticas públicas, de modo a conceber as formas e processos jurídicos correspondentes.71

Desta forma, parafraseando José Afonso da Silva ao se referir ao planejamento como instituição jurídica72, pode-se dizer que a institucionalização da política pública implicou em sua inserção como um tema de Direito, e de um elemento basicamente técnico da ciência política passou a ser um instituto jurídico, mas sem perder suas características técnicas. Entretanto, suas características técnicas acabaram se juridicizando, deixando de ser regras puramente técnicas para se tornarem regras técnico-jurídicas.

Assim, a política pública assume sua forma jurídica, passa a ter seu desdobramento em processos regulados pelo sistema jurídico. É composta por um conjunto de atos e processos que se unem com o fim de alcançar as metas estabelecidas pela própria política pública, seja essa meta a realização de um direito fundamental, social, cultural ou econômico.

69 BUCCI, Maria Paula Dallari, O conceito de política..., p. 14. 70

GRAU, Eros Roberto, O Direito posto... p. 26.

71 LOC. CIT. p. 47.

(30)

A política pública como atuação do Estado no domínio econômico e social acaba por ser um instrumento de efetivação de direitos.

4.2 A POLÍTICA PÚBLICA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Entre os diferentes suportes pelos quais a política pública integra o sistema jurídico está o suporte da norma constitucional. Desde a constitucionalização dos direitos sociais, culturais e econômicos, o que no Brasil se deu a partir da Constituição de 1934, as políticas públicas podem ser compreendidas como instrumento de concretização destes direitos, o que permanece na atual Constituição Federal de 1988.

São várias as políticas públicas que integram o texto constitucional de 1988, dentre elas, a título de exemplos, estão as políticas orçamentárias – artigo 165 e ss., as de saúde – artigo 196 e ss., as de educação e cultura – artigo 205 e ss., as políticas urbana – artigos 182 e 183 -, fundiária e agrícola – artigo 184 e ss.

Ao trazer em seu texto a atuação estatal por meio de políticas públicas a Constituição Federal de 1988 traça as diretrizes gerais que devem ser observadas pelo legislador e pelo Administrador Público ao editarem normas e atos com o fim de especificar o planejamento e a execução das políticas.

Ou seja, o constituinte traça as diretrizes gerais da política pública, delegando ao legislador ordinário e ao Administrador Público a tarefa de especificar os objetivos e metas da política e como estes deverão ser alcançados.

Quanto à função da Constituição de estabelecer diretrizes mínimas à atuação do Administrador Público por meio de políticas públicas, expressa Ana Paula Barcellos:

Os poderes públicos estão submetidos à Constituição, como uma decorrência direta da noção de Estado de Direito, por força da qual o exercício do poder político encontra limites em normas jurídicas. À Constituição, é certo, não cabe invadir os espaços próprios da deliberação majoritária, a ser levada a cabo pelas maiorias democraticamente eleitas em cada momento histórico. Uma das funções de um texto constitucional, porém, é justamente estabelecer vinculações mínimas aos agentes políticos, sobretudo no que diz respeito à promoção dos direitos fundamentais.73

73 BARCELLOS, Ana Paula. Constitucionalização das políticas públicas em matéria de direitos fundamentais: o

controle político-social e o controle jurídico no espaço democrático. Disponível em: https://www.academia.edu /7784818/ Constitucionalização_das_políticas_públicas_em_matéria_de_direitos_fundamentais.

(31)

A Constituição Federal de 1988, além de prever políticas públicas específicas, como nos exemplos citados acima, também traz dispositivos sobre a atuação do Estado no domínio econômico e social que são aplicáveis a todas as políticas públicas, isto é, até àquelas que não tiveram suporte constitucional para compor o sistema jurídico.

Constata-se que nem toda política pública tem suporte constitucional, mas toda política pública deverá observar as diretrizes mínimas estabelecidas pela Constituição Federal de 1988 para nortear a atuação do Estado no domínio econômico e social.

Dentre as diretrizes gerais traçadas pelo constituinte para a implementação de políticas públicas estão àquelas destinadas à atuação estatal no domínio econômico e social, bem como às destinadas ao planejamento.

4.2.1 A atuação do Estado no domínio econômico e social por meio de políticas públicas

Explica Eros Grau que o Estado social se difere do Estado liberal ao deixa de ser apenas produtor do direito e provedor da segurança para também intervir na ordem econômica e social como implementador de políticas públicas. O Estado passa a atuar não apenas como terceiro-árbitro, mas também como terceiro-ordenador74.

Entretanto, parece haver na doutrina certa distinção entre o ato de intervenção e o de atuação do Estado no domínio econômico e social. Para esclarecer esta questão terminológica, desenvolve-se o estudo sobre o que diz a literatura jurídica para que se possa identificar se na ordem constitucional de 1988 o Estado atua ou intervém na ordem econômica e social por meio de políticas públicas.

Para Hely Lopes Meirelles, a Constituição Federal de 1988 trata da atuação do Estado na atividade econômica, rompendo com o modelo de intervenção do Estado no domínio econômico discutido nos textos constitucionais anteriores. O Estado atua a partir da fiscalização, do incentivo e do planejamento, mas de forma indicativa para a iniciativa privada e determinante para o setor público, nos termos do artigo 174, da Constituição Federal de 1988. Portanto, o entendimento deste autor é no sentido de atuação supletiva do Estado na

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