• Nenhum resultado encontrado

RESPONSABILIDADE CIVIL NA UNIÃO ESTÁVEL

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "RESPONSABILIDADE CIVIL NA UNIÃO ESTÁVEL"

Copied!
142
0
0

Texto

(1)

Cristiane Okanobo

RESPONSABILIDADE CIVIL NA UNIÃO ESTÁVEL

(2)

Cristiane Okanobo

RESPONSABILIDADE CIVIL NA UNIÃO ESTÁVEL

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Direito Civil, sob a orientação do Professor Doutor José Manoel de Arruda Alvim Netto.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP São Paulo

(3)

Banca Examinadora

_____________________________________

_____________________________________

(4)

AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador, por toda a atenção dedicada, sempre.

(5)

RESUMO

Este trabalho procura demonstrar o alcance das regras da responsabilidade civil na ruptura da união estável. Para tanto, demonstram-se outras situações no âmbito do direito de família, que também viabilizam a aplicação das regras de responsabilidade civil, trata-se da ruptura do noivado e da separação litigiosa com grave violação dos deveres matrimoniais.

O estudo da responsabilidade civil abrange seu conceito, pressupostos e as espécies contratual e extracontratual, pois se quer demonstrar que se trata de um instituto dinâmico e visa, através da reparação de danos, recompor o equilíbrio abalado pelo ato ilícito.

Demonstra-se a mudança na estrutura familiar, constatando que o casamento, hodiernamente, não é mais o único meio de se constituir família. Nota-se também, que o alicerce da família é o afeto. Desta forma, o objetivo deste trabalho possibilita que a família cumpra seu papel constitucional de base da sociedade, à medida que fortalece suas raízes.

A análise histórica da união estável facilita a compreensão de suas características, efeitos e a razão da terminologia adotada, companheiros ou conviventes. Destaca-se o estudo dos direitos e deveres atribuídos a esta forma de entidade familiar, a fim de demonstrar que o direito de família não estabelece regras para a reparação de danos oriundos do descumprimento grave e culposo destes deveres, por parte de um dos companheiros.

Privilegiando estudos teóricos, buscam-se subsídios na doutrina e na jurisprudência para fundamentar a reparação de danos, materiais ou morais, ocasionados através do rompimento culposo da união estável.

Constata-se, por fim, a possibilidade de extensão das regras de responsabilidade civil no direito de família, especialmente na união estável. Desde que presentes os pressupostos caracterizadores da responsabilidade civil, funda-se a reparação dos danos no artigo 186 do Código Civil. Objetiva-se com a reparação das ofensas, fortalecer a família valorizando os laços de afeto e o respeito entre seus membros.

(6)

ABSTRACT

This essay tries to convey the reach for the rules of the civil responsibility in the rupture of the stable union. For that, other situations in the ambit of the family right are shown, and these also make the application of the civil responsibility rules viable – they are the rupture of engagement and the litigious separation with severe violation of the marital obligations.

The study of the civil responsibility comprehends its concept, presuppositions and the contractual and extra-contractual types, once it refers to a dynamic institution and aims at restating the balance threatened by the illicit act, through damage repairing.

The change in the family structure is conveyed, affirming that the marriage, these days, is not the only way to build a family anymore. It can also be observed that the basis of the family is affection. Thus, the purpose of this essay makes it possible for the family to play its constitutional role as the society foundation, as it strengthens its roots.

The historical analysis of the stable union makes it easier to understand its characteristics, effects and the reason for the adopted terminology, partners or people living together. The study of the rights and duties addressed to this kind of family entity is pointed out, in order to show that the family right does not state rules for repairing damage caused by the severe and guilty act of not accomplishing these duties by one of the partners.

Enhancing the theoretical studies, we search for subsidies in the doctrine and in the jurisprudence to found the repairing of damage, either material or moral, which occurred through the guilty rupture of the stable union.

Finally, we can confirm the possibility to extend the civil responsibility rules in the family right, especially in the stable union. Since the presupposed characters of the civil responsibility are present, the repairing of damage is based on the article no.186 of the Civil Code. The repairing of the offenses aims at strengthening the family, valuing the affection bonds and the respect among its members.

(7)

SUMÁRIO

RESUMO...V

ABSTRACT...VI

INTRODUÇÃO...09

CAPÍTULO I – Responsabilidade civil...11

1. Noções gerais...11

2. Conceito...18

3. Pressupostos da responsabilidade civil...23

3.1.Ação ou omissão...23

3.2.Dolo ou culpa do agente...25

3.3.Relação de causalidade...28

3.4.Dano...29

3.4.1.Dano moral...32

4. Responsabilidade civil contratual e extracontratual...37

CAPÍTULO II – Responsabilidade civil no direito de família...41

CAPÍTULO III – União estável...60

1. Breve histórico...60

2. Terminologia adotada...67

3. Conceito...71

4. Natureza jurídica...76

5. Requisitos necessários para a configuração da união estável...79

6. Deveres de ambos os companheiros...91

(8)

CAPÍTULO IV – Reparação de danos na união estável...109

1. Principais causas que reclamam reparação...116

2. Possibilidade de reparação de danos entre conviventes...121

CONCLUSÃO...124

(9)

INTRODUÇÃO

No presente trabalho, dentro da temática da responsabilidade civil, procura-se vincular as relações familiares, especificamente, no que se refere à aplicação das regras de responsabilidade civil na união estável.

A figura da união estável, que por muito tempo ficou às margens da lei, ganhou reconhecimento jurídico com a Constituição Federal de 1988, no artigo 226, parágrafo terceiro. Posteriormente, este artigo foi regulamentado pelas Leis nº 8.971 de 1994 e Lei nº 9.278 de 1996 e, hoje, está disciplinada no Código Civil, do artigo 1.723 ao 1.729.

Diante da possibilidade de conviventes praticarem atos que possam resultar em lesões suscetíveis de reparação, este trabalho pretende demonstrar a possibilidade de reparação de danos patrimoniais e morais no âmbito da união estável.

A fim de atingir o tema proposto, é necessário traçar os aspectos gerais sobre a responsabilidade civil, desta forma, o primeiro capítulo, será dedicado ao conceito, aos pressupostos e às espécies de responsabilidade civil, contratual e extracontratual. No primeiro capítulo, também, destaca-se o Projeto 6960 que pretende incluir parágrafo ao artigo 927, propondo especificamente a aplicação dos princípios da responsabilidade civil no direito de família.

Dentro dos pressupostos imprescindíveis para a caracterização da responsabilidade civil, será enfatizado o dano moral, por ser de grande repercussão no âmbito das relações familiares.

O capítulo segundo, mesmo que em linhas gerais, cuida da responsabilidade civil no direito de família. A fim de explicitar as regras de responsabilidade civil no âmbito familiar, foram elencadas as situações mais comuns, pois não seria viável discorrer sobre todas as hipóteses possíveis. Assim, será analisado o rompimento imotivado da promessa de casamento ou a quebra dos esponsais, a reparação de danos na separação judicial culposa, em virtude de ato ilícito, a transmissão de aids entre cônjuges e companheiros e o abandono moral dos pais em relação aos filhos.

(10)

No quarto capítulo procura-se estabelecer a reparação de danos na união estável, analisando a possibilidade de responsabilidade civil com base no artigo 186 do Código Civil. Para tanto, são analisadas algumas situações, como a transmissão culposa da aids de um convivente ao outro, o abandono injusto e imotivado e o adultério. Colacionando decisões de Tribunais, nota-se que estes não são totalmente insensíveis à matéria.

Verifica-se a importância do instituto da responsabilidade civil no campo das relações familiares, pois, o que se busca, é valorar os laços de afeto e solidariedade que unem os membros de uma família, mantendo o respeito e a dignidade, indispensáveis para a estrutura familiar. De fato, o mal causado entre familiares causa sofrimento maior do que o causado por terceiro estranho ao ambiente familiar.

(11)

CAPÍTULO I – RESPONSABILIDADE CIVIL

1. NOÇÕES GERAIS

Topograficamente, verifica-se que a responsabilidade civil está em artigos espalhados pelo Código Civil. O atual Código trata da responsabilidade civil do artigo 927 ao 954. Situada na parte especial, livro das obrigações, sob título IX, a responsabilidade civil vem disciplinada com a mesma estrutura do diploma anterior1. Mas nem todos os artigos que dizem respeito à matéria estão neste título IX.

Na parte geral, livro III, títulos II e III, encontram-se respectivamente disciplinados os atos lícitos e os atos ilícitos. Aqui se nota que o novel Código cuida com maior profundidade da responsabilidade civil, pois foi acrescentada a possibilidade de indenização por dano exclusivamente moral, no artigo 1862. Possibilidade esta que já era prevista pela Constituição Federal, artigo 5º, V e X. 3

No artigo 186 do Código Civil, estabeleceu o legislador a responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana, ou seja, neste artigo encontra-se a base da responsabilidade civil subjetiva ou clássica, baseada na culpa. Esta forma de responsabilidade civil será estudada adiante. Observa-se que o Código Civil manteve a culpa como fundamento da responsabilidade subjetiva.

Dispõe o artigo 186: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano4 a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

1 De acordo com Regis Fichtner Pereira,

A responsabilidade civil pré-contratual, Rio de Janeiro:

Renovar, 2001, p. 14: “o legislador brasileiro optou pelo modelo francês de responsabilidade civil. O Código Civil brasileiro, conquanto sistematizado segundo o modelo do BGB – o modelo alemão consiste em dividir as disposições do Código em uma parte geral e uma parte especial - , contém uma regra geral de responsabilidade civil, expressa no seu art. 159 (atual 186), claramente inspirada no art. 1.382 do Código civil francês.”

2 Corresponde ao artigo 159 do Código Civil 1916.

3 Dispõe o artigo 5º, V: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização

por dano material, moral ou à imagem.” e no inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”

4 O novo Código trouxe uma modificação na redação do artigo 186, comparando-o ao artigo 156 do

Código Civil de 1916, este dispositivo usava a alternativa “ou” (“...violar direito ou causar prejuízo a

outrem”) e o atual artigo 186 usa a aditiva “e”, (“...violar direito e causar dano a outrem”). Explica Rui Stoco, Tratado de responsabilidade civil, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 6.ed., p. 124 que “a

(12)

A noção de ato ilícito está diretamente ligada ao tema, pois é uma das fontes da obrigação de reparar o dano, como veremos, a idéia de responsabilidade civil que interessa a este trabalho, é a reparação do prejuízo sofrido pela vítima. Desta forma, ainda que de maneira sucinta, importante situar o ato ilícito no ordenamento jurídico.

Encontram-se na doutrina várias classificações. A maioria parte do gênero fato jurídico que é a adequação de um fato à lei, produzindo conseqüências jurídicas, tem-se: fatos jurídicos naturais e voluntários. Os primeiros decorrem de acontecimentos da natureza, como por exemplo, raios e tempestades e, os segundos, originam-se de condutas humanas e, dividem-se em lícitos e ilícitos. Os atos lícitos, por sua vez, subdividem-se em ato jurídico e negócio jurídico. O ato jurídico depende da vontade humana para que ocorra e seus efeitos já estão previamente definidos em lei, por exemplo, a adoção. O negócio jurídico também depende da vontade humana, mas seus efeitos serão definidos por quem pratica o negócio, por exemplo, o testamento.5

Por fim, o ato ilícito que é aquele praticado contra a lei. Dentre as definições encontradas, há discussão em saber se a culpa integra o conceito de ato ilícito. Sérgio Cavalieri Filho levanta a questão: “com efeito, se a culpa é elemento integrante do ato ilícito, então, onde não houver culpa também não haverá ilícito. Nesse caso, qual seria o fato gerador da responsabilidade objetiva?”6 Adiante, o autor apresenta a solução baseado-se no duplo aspecto da ilicitude, ou seja, o ato ilícito deve ser analisado em sentido estrito e amplo. Em sentido estrito, ato ilícito é o conjunto de pressupostos da responsabilidade civil e, em sentido amplo, indica apenas a ilicitude do ato, o comportamento humano contrário à lei. Os pressupostos da responsabilidade civil serão analisados em item próprio, mas adianta-se que a culpa é um dos elementos caracterizadores da responsabilidade subjetiva, porém, não o é da responsabilidade objetiva que é fundada no risco e prescinde da culpa.

Conclui Sérgio Cavalieri Filho: “o conceito estrito de ato ilícito, tendo a culpa como um dos seus elementos, tornou-se insatisfatório até mesmo na responsabilidade subjetiva. Em sede de responsabilidade civil objetiva, cujo campo de incidência é hoje vastíssimo, só tem guarida o ato ilícito latu sensu, assim entendido

5 Consultar Sílvio de Salvo Venosa,

Direito Civil – Parte geral, São Paulo: Atlas, v. 1, 4.ed., 2004, págs.

377/378; Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro – Teoria geral do Direito Civil, São

Paulo: Saraiva, v. 1, 22.ed., 2005, págs. 360/361; Zeno Veloso, Invalidade do negócio jurídico – nulidade e anulabilidade, Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p.20; Silvio Rodrigues, Direito Civil – Parte geral, São

Paulo: Saraiva, v.2, 25.ed., 1995, págs. 159/162.

6 Sérgio Cavalieri Filho,

Programa de responsabilidade civil, São Paulo: Malheiros Editores, 4.ed., 2003,

(13)

como a mera contrariedade entre a conduta e a ordem jurídica, decorrente de violação de dever jurídico preexistente. Temos como certo que o novo Código Civil assumiu em relação ao ato ilícito esta postura dicotômica.”7

Rui Stoco entende que “os atos ilícitos, ou seja, praticados com desvio de conduta – em que o agente se afasta do comportamento médio do bonus pater familiae – devem submeter o lesante à satisfação do dano causado a outrem (...) assim sendo, para que haja ato ilícito, necessária se faz a conjugação dos seguintes fatores: a existência de uma ação; a violação da ordem jurídica; a imputabilidade; a penetração na esfera de outrem.”8

Para Orlando Gomes “ato ilícito é lesão de um direito absoluto, vale dizer, de um direito que todos devem respeitar. Trata-se de invasão da esfera jurídica alheia que atenta contra interesses e valores fundamentais da personalidade humana, como, dentre outros, a vida, a liberdade, a saúde, a honra. Toda lesão culposa de um desses direitos subjetivos obriga aquele que a praticou a indenizar suas conseqüências patrimoniais, configurando ato ilícito stricto sensu.”9

Desta forma, a prática do ato ilícito deve gerar dano e, segundo Clayton Reis, “o sentido de eqüidade da justiça conduz-nos à premissa de que todo ato ilícito que resultar em dano deve ser suscetível de reparação.”10

Como novidade, o Código Civil traz o artigo 186 seguido pelo artigo 187, que trata do abuso de direito, definindo-o como sendo aquele que excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, norma esta, que não era prevista no Código de 1916. Rogério Marrone de Castro Sampaio considera abuso de direito “conduta ilícita, não só aquele comportamento que objetivamente extrapola os limites do direito individual reconhecido, como também aquele que, embora se mantenha dentro desses limites objetivos, é praticado de maneira desvirtuada de sua função social ou econômica, vindo a prejudicar terceiros.”11

7 Sérgio Cavalieri Filho,

Programa, cit., p. 33. 8 Rui Stoco,

Tratado, cit., p. 129. Consultar também, Humberto Theodoro Júnior, Comentários ao novo Código Civil – Dos defeitos do negócio jurídico ao final do livro III, coord. Sálvio de Figueiredo

Teixeira. Rio de Janeiro: Forense, v.III (arts. 185 a 232), 2003, p. 18.

9 Orlando Gomes,

Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, 15.ed., 2000, p. 256. 10 Clayton Reis,

Dano moral, Rio de Janeiro: Forense, 4.ed., 1997, p. 44. 11 Rogério Marrone de Castro Sampaio,

Responsabilidade civil, São Paulo: Atlas, 3.ed., 2003 (Série

(14)

Ainda na parte geral, sobre o tema, encontra-se o artigo 188 que considera como atos lícitos os praticados em legítima defesa, estado de necessidade e exercício regular de um direito reconhecido. A ocorrência destas situações exclui a responsabilidade, observados os limites indispensáveis para a remoção do perigo.

Na parte especial do Código Civil, sob o título IV, do inadimplemento das obrigações, o artigo 389 traz a regra da responsabilidade civil contratual. Esta modalidade de responsabilidade civil também será objeto de estudo oportunamente.

Justifica-se a não concentração do tema em um único título, em virtude do vasto campo da responsabilidade civil, ou seja, a responsabilidade civil está presente em várias áreas do direito, público ou privado e, por isso, normas sobre responsabilidade civil encontram-se espalhadas por todo o Código.

José de Aguiar Dias ensina que antes da responsabilidade civil estar presente na vida jurídica, ela se faz presente na vida social12 e, conseqüentemente, é um instituto dinâmico, ensina que “o instituto é essencialmente dinâmico, tem de adaptar-se, transformar-se na mesma proporção em que envolve a civilização, há de ser dotado de flexibilidade suficiente para oferecer, em qualquer época, o meio ou processo pelo qual, em face de nova técnica, de novas conquistas, de novos gêneros de atividade, assegure a finalidade de restabelecer o equilíbrio desfeito por ocasião do dano, considerado, em cada tempo, em função das condições sociais então vigentes.”13

De fato, justifica-se o dinamismo na responsabilidade civil, pois é um instituto que precisa adequar-se à realidade que se apresenta, já que o ser humano está em constante evolução, novas fases e situações surgem em decorrência dessa evolução e, o direito, acima de tudo, deve acompanhar as modificações da vida social. Afinal, tudo o que procede do homem está sujeito a mudanças.

Nesse sentido, explica Washington de Barros Monteiro: “já que não existe e não pode existir teoria permanente sobre a responsabilidade civil, por ser um instituto dinâmico, que se adapta e se transforma conforme evolui a civilização, é preciso conferir-lhe flexibilidade suficiente para, que em qualquer época, independentemente de novas técnicas, de novas atividades, ser assegurada a sua finalidade de restabelecer o equilíbrio afetado pelo dano.”14

12 José de Aguiar Dias,

Da responsabilidade civil, Rio de Janeiro: Forense, 8.ed., v. I, 1987, p. 02. 13 José de Aguiar Dias,

Da responsabilidade civil, cit., p.19. 14 Washington de Barros Monteiro,

Curso de Direito Civil: direito das obrigações, São Paulo: Saraiva, v.

(15)

Assim sendo, a responsabilidade civil, evolui para tentar acompanhar o progresso humano, os avanços tecnológicos e científicos. Nesse sentido, Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho anotam que: “pode dizer-se, sem medo de errar, que os domínios da responsabilidade civil foram ampliados na mesma proporção em que se multiplicaram os inventos e outras conquistas da atividade humana, com o enorme manancial das descobertas científicas e tecnológicas, a começar pelo código genético.”15

Constatado que a responsabilidade civil não ocorre exclusivamente na vida jurídica, pois também se relaciona com a psicologia e a sociologia e, é nesta última noção que a responsabilidade é vista como aspecto da realidade social. O objetivo deste estudo cuidará apenas da responsabilidade jurídica.

Especificamente, normas sobre responsabilidade civil no direito de família, não foram disciplinadas pelo legislador no atual Código Civil, em razão dessa omissão, o Projeto 6960/2002, de autoria do deputado Ricardo Fiúza, prevê inclusão de parágrafo no artigo 927, dispondo que: “§ 2º - Os princípios da responsabilidade civil aplicam-se também às relações de família.”

O artigo 927, caput, do Código Civil refere-se à responsabilidade civil subjetiva com culpa,16 o futuro parágrafo segundo co-existiria com o atual parágrafo único que estabelece regra para responsabilidade civil objetiva em duas hipóteses: nos casos especificados em lei e, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

O futuro parágrafo segundo que se pretende acrescentar ao artigo 927 do Código Civil é sugestão da professora Regina Beatriz Tavares da Silva que, para tanto, apresenta os seguintes argumentos:

“Já que a responsabilidade civil avança conforme progride a civilização, há necessidade de constante adaptação desse instituto às novas necessidades sociais. Bem por isso, as leis sobre essa matéria devem ter caráter genérico, como a regra a seguir sugerida, e aos tribunais cabe delas extrair os preceitos para aplicá-los ao caso concreto. Em suma, não se pode negar a importância da responsabilidade civil, que invade todos os domínios da ciência jurídica, sendo o

15 Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho,

Comentários ao novo Código Civil. Da responsabilidade civil. Das preferências e privilégios creditórios, Rio de Janeiro: Forense, v. XIII, 2004,

p. 01.

16 Dispõe o artigo 927: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado

(16)

centro do direito civil e de todos os demais ramos do direito, tanto de natureza pública quanto privada, por constituir-se em proteção à pessoa em suas mais variadas relações. Dentre as relações de caráter privado destacam-se as familiares, em que também devem ser aplicados os princípios da responsabilidade civil, como já reconhecem a doutrina brasileira (...) Embora as relações familiares sejam repletas de

aspectos, especialmente pessoais, afetivos, sentimentais e religiosos, envolvendo as pessoas num projeto grandioso, preordenado a durar para sempre, por vezes o sonho acaba, o amor termina, o rompimento é inevitável. Nestas rupturas, são inúmeras as situações em que os deveres de família são violados, com desrespeito especialmente aos direitos da personalidade dos envolvidos nessas relações, a acarretar graves danos aos membros de uma família. As sevícias, ofensivas à integridade física, e injúrias graves, violadoras da honra, praticadas por um dos cônjuges contra o outro (v. Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Reparação Civil na Separação e no Divórcio, São Paulo, Saraiva, 1999, p. 76- 79, 153 e 163-165); o atentado à vida do convivente, configurado em contaminação de doença grave e letal ou em abandono moral e material da companheira (v. Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade Civil dos Conviventes, Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre, Síntese e IBDFAM, v. 1, nº 3, outubro/dezembro de 1999, p. 36-39); o

(17)

relações.’Remissão deve ser feita ao artigo 186 do novo Código Civil, que estabelece: ‘Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito’, sendo, evidentemente, ato ilícito aquele praticado em violação a um dever de família. (...) Em suma a responsabilidade civil é verdadeira tutela privada à dignidade da

pessoa humana e a seus direitos da personalidade, inclusive na família, que é centro de preservação do ser humano, antes mesmo de ser havida como núcleo essencial da nação. Conclui-se que a teoria da responsabilidade civil visa ao restabelecimento da ordem ou equilíbrio pessoal e social, inclusive em relações familiares, por meio da reparação dos danos morais e materiais oriundos da ação lesiva a interesse alheio, único meio de cumprir-se a própria finalidade do Direito, que é viabilizar a vida em sociedade, dentro do conhecido ditame de neminem laedere.”17

Assim sendo, caberá ao Projeto 6960, se aprovado, explicitar a aplicação dos princípios da responsabilidade civil no âmbito das relações familiares, pois “o Direito de Família, que regula as relações dos cônjuges, não está num pedestal inalcançável pelos princípios da responsabilidade civil.”18

A respeito da responsabilidade civil nas relações familiares, Rolf Madaleno anota que “a responsabilidade civil expande-se por todos os ramos do Direito Civil, e também transita pelo Direito de Família, tanto em seus aspectos pessoais de vínculo familiar, como na esfera patrimonial das relações oriundas do estado familiar.”19

17 Projeto de lei nº 6960, de 2002, de autoria do deputado Ricardo Fiúza, disponível em

www.camara.gov.br. Segundo Carlos Alberto Bittar, Responsabilidade civil – teoria e prática. Rio de

Janeiro: Forense Universitária, 5.ed., 2005, p.03, o princípio neminem laedere significa “um dos

princípios gerais de direito – consoante o qual a ninguém se deve lesar.”

18 Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos,

Responsabilidade civil dos conviventes. A família na

travessia do milênio – anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família, coord. Rodrigo da Cunha Pereira, Belo Horizonte: IBDFAM, 2000, p. 123.

19 Rolf Madaleno,

Direito de família – Aspectos polêmicos, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p.

(18)

2. CONCEITO

O termo responsabilidade vem do latim respondere, que significa responsabilizar-se, “revelando o dever jurídico, em que se coloca a pessoa, seja em virtude de contrato, seja em face de fato ou omissão, que lhe seja imputado, para satisfazer a prestação convencionada ou para suportar as sanções legais, que lhe serão impostas.”20

De acordo com Álvaro Villaça Azevedo, “a palavra responsabilidade descende do verbo latino respondere, de spondeo, primitiva obrigação de natureza contratual do direito quiritário, romano, pela qual o devedor se vinculava ao credor nos contratos verbais, por intermédio de pergunta e resposta (spondesne mihi dare Centum? Spondeo, ou seja, prometes-me dar um cento? Prometo).”21

A expressão responsabilidade civil pode ser definida como aquela que “designa a obrigação de reparar o dano ou de ressarcir o dano, quando injustamente causado a outrem.”22 Trata-se de conceito amplo, identificando a responsabilidade civil com a obrigação de indenizar.

Conceituar responsabilidade civil não é tarefa fácil.

A propósito, José de Aguiar Dias inicia sua obra alertando que “toda manifestação da atividade humana traz em si o problema da responsabilidade. Isso talvez dificulte o problema de fixar o seu conceito, que varia tanto como os aspectos que pode abranger, conforme as teorias filosófico-jurídicas.”23 Prossegue o autor dizendo que “mais aproximada de uma definição de responsabilidade é a idéia de obrigação. (...) A responsabilidade é, portanto, resultado da ação pela qual o homem expressa o seu comportamento, em face desse dever ou obrigação.”24

Ressalta-se que responsabilidade e obrigação não se confundem. Aponta José de Aguiar Dias que “a obrigação preexistente é a verdadeira fonte da

20 De Plácido e Silva,

Vocabulário jurídico, Rio de Janeiro: Forense, 12.ed.,v. IV, 1996, págs. 124/125.

Segundo Miguel Maria de Serpa Lopes, Curso de Direito Civil, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, v. 5, 4.ed.,

1995, p. 159, o termo responsabilidade “é de origem latina, do verbo – respondere, querendo dizer

aproximadamente o ter alguém se constituído garantidor de algo. Acrescente-se a isto o fato do Direito Romano, ao compor a fórmula sacramental da stipulatio, ter prescrito o pronunciamento das seguintes

palavras: dare mihi spondes? Spondeo, o que bastava para criar uma obrigação a cargo do que assim

respondia, obrigação de caráter abstrato, afastado qualquer liame com a causa debendi.” 21 Álvaro Villaça Azevedo,

Curso de Direito Civil. Teoria geral das obrigações, São Paulo: Revista dos

Tribunais, 5.ed., 1994, p.253. Ver também Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro, São

Paulo: Saraiva, v. 7, 18.ed., 2004, p.39.

22 De Plácido e Silva,

Vocabulário cit., v. IV, p. 125. 23 José de Aguiar Dias,

Da responsabilidade civil, cit., p.01. 24José de Aguiar Dias,

(19)

responsabilidade, e deriva, por sua vez, de qualquer fator social capaz de criar normas de conduta.”25

No mesmo sentido é a lição de Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho ao esclarecerem que “responsabilidade civil pode ser definida como a obrigação sucessiva que surge para recompor o dano decorrente do descumprimento de uma obrigação originária. Designa o dever que alguém tem de reparar o prejuízo causado pela violação de um anterior dever jurídico. Em síntese, só se cogita de responsabilidade civil onde há violação de um dever jurídico preexistente e dano.”26

No mesmo sentido é a lição de Carlos Roberto Gonçalves: “a responsabilidade civil tem, pois, como um de seus pressupostos, a violação do dever jurídico e o dano. Há um dever jurídico originário, cuja violação gera um dever jurídico sucessivo ou secundário, que é o de indenizar o prejuízo.”27

Entretanto, há autores que sustentam a possibilidade de existir obrigação sem responsabilidade e responsabilidade sem obrigação. Na primeira situação, Álvaro Villaça Azevedo cita como exemplo o caso de dívidas de jogo e dos débitos prescritos e, na segunda hipótese, o caso do fiador.28

A doutrina apresenta vários conceitos de responsabilidade civil, sendo que alguns autores, informa Caio Mário da Silva Pereira29, preferem até mesmo não definir o instituto, como Pontes de Miranda, que ao conceituar responsabilidade diz que “o conceito de responsabilidade é aspecto da realidade social” deixando sem resposta a pergunta que ele mesmo formula: “Como, então, caracteriza-se a responsabilidade?” 30

Dentre as definições encontradas na doutrina, cita-se.

Miguel Maria de Serpa Lopes leciona que “responsabilidade significa a obrigação de reparar um prejuízo, seja por decorrer de uma culpa ou de uma outra

25José de Aguiar Dias

Da responsabilidade civil, cit., p.112. 26Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho,

Comentários, cit., p. 50. Acrescentam os

autores que mesmo a responsabilidade pelo fato de outrem, não contradiz com esse entendimento, pois o responsável responderá pelo descumprimento da obrigação de outrem, ou seja, corresponde ao descumprimento de uma obrigação anterior.

27 Carlos Roberto Gonçalves,

Comentários ao Código Civil, coord. Antônio Junqueira de Azevedo, São

Paulo: Saraiva, v. 11 (arts. 927 a 965), 2003, p. 06.

28 Álvaro Villaça Azevedo,

Curso, cit., p.38. Explica o autor que “os direitos prescrevem após o decurso

de um determinado prazo fixado por lei. Depois de escoado esse prazo, perdura a obrigação, sem, contudo, perdurar a responsabilidade.” E no caso do fiador, diz que o fiador “é responsável, mas não é obrigado.”

29 Caio Mário da Silva Pereira,

Responsabilidade civil, Rio de Janeiro: Forense, 8.ed., 1998, p.08. 30 Pontes de Miranda,

(20)

circunstância legal que a justifique, como a culpa presumida, ou por uma circunstância meramente objetiva.”31

Maria Helena Diniz defini responsabilidade civil “como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva).”32

Caio Mário da Silva Pereira conceitua responsabilidade independente desta fundar-se ou não na culpa, pois para este autor, “a responsabilidade civil consiste na efetivação da reparabilidade abstrata do dano em relação a um sujeito passivo da relação jurídica que se forma. Reparação e sujeito passivo compõem o binômio da responsabilidade civil, que então se enuncia como o princípio que subordina a reparação à sua incidência na pessoa do causador do dano.”33

Silvio Rodrigues citando Savatier defini responsabilidade civil como “a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam.”34

Sílvio de Salvo Venosa enfatiza que “o que interessa saber é identificar aquela conduta que reflete na obrigação de indenizar. Nesse âmbito, uma pessoa é responsável quando suscetível de ser sancionada, independentemente de ter cometido pessoalmente um ato antijurídico.”35

Washington de Barros Monteiro conclui que a teoria da responsabilidade civil visa “ao restabelecimento da ordem ou equilíbrio pessoal e social, por meio da reparação dos danos morais e materiais oriundos da ação lesiva a interesse alheio, único meio de cumprir-se a própria finalidade do direito, que é viabilizar a vida em sociedade, dentro do conhecimento ditame de neminem laedere.”36

Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge defini responsabilidade civil “como a situação em que se encontra alguém que, tendo praticado um ato ilícito, é obrigado a indenizar o lesado dos prejuízos que lhe causou.”37

31 Miguel Maria de Serpa Lopes,

Curso, cit., p. 160. 32 Maria Helena Diniz,

Curso, cit.,v. 7, p.40. 33 Caio Mário da Silva Pereira,

Responsabilidade, cit., p.11. 34 Silvio Rodrigues,

Direito Civil, São Paulo: Saraiva, v.4, 20.ed., 2003, p. 06. 35 Sílvio de Salvo Venosa,

Direito, cit., v. 4, p.13. 36 Washington de Barros Monteiro,

Curso, cit., v. 5, 2. parte, p. 448. 37 Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge,

Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil,

(21)

Entende Álvaro Villaça Azevedo que responsabilidade civil “é a situação de indenizar o dano moral ou patrimonial, decorrente de inadimplemento culposo, de obrigação legal ou contratual, ou imposta por lei.”38

Nicolau Eládio Bassalo Crispino afirma que “a responsabilidade civil corresponde ao dever de determinado sujeito de reparar o prejuízo sofrido por outrem, em razão de um acordo anteriormente firmado, ou por imposição de lei.”39

Verifica-se que os autores procuram relacionar a definição de responsabilidade com o dever de reparação pelo prejuízo causado, ou seja, com a obrigação que resulta do dano suportado por outrem, seja de ordem moral ou patrimonial. Portanto, interessa a este trabalho o termo responsabilidade com o significado de reparar o dano.

Neste contexto, Atilio Aníbal Alterini menciona os sentidos amplo e restrito da responsabilidade civil. O sentido amplo seria a adequação da conduta humana de modo a não causar dano injustamente a outrem, bem como, a sanção caso haja transgressão a esse dever de conduta. Já no sentido restrito, a responsabilidade consistiria na reparação como sanção, pelo descumprimento do dever de não causar danos ao direito alheio.40

Nesse sentido, José de Aguiar Dias anota que é inútil “dissimular esse desencontro entre a denominação e o conteúdo da responsabilidade civil” reconhecendo que “a idéia do ressarcimento prima sobre a da responsabilidade.”41 Explica o autor que esse desencontro entre denominação e conteúdo da responsabilidade civil é devido às mudanças da vida social, e assim, “a idéia da responsabilidade não podia fugir a essa contigência. Sua transformação é resultado das mudanças sociais, notadamente do grande desenvolvimento da indústria. Da responsabilidade assente na culpa se passa rapidamente às presunções júris tantum, e daí à responsabilidade legal.”42

A transformação da responsabilidade civil, então, funda-se nas mudanças sociais e na evolução do fundamento da culpa, que deixa de ser individualista e passa para o sistema solidarista da reparação do dano. Quando o antigo sistema da culpa deixa

38 Álvaro Villaça Azevedo,

Curso, cit., p. 254. 39 Nicolau Eládio Bassalo Crispino,

Responsabilidade civil dos conviventes, A família na travessia do

milênio – Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família, coord. Rodrigo da Cunha Pereira, Belo Horizonte: IBDFAM, 2000, p. 107.

40 Atilio Aníbal Alterini,

Responsabilidad civil – limites de la reparacion civil, Buenos Aires: Abeledo –

Perrot, 2. ed., 2. reimpr., s.d., págs. 26/27.

41 José de Aguiar Dias

Da responsabilidade civil, cit., p.17. 42 José de Aguiar Dias

(22)

de ser satisfatório, é que surgem as noções de assistência, previdência e de garantia para supri-lo.43

Miguel Maria de Serpa Lopes aduz que “as definições dadas à responsabilidade civil têm partido sobretudo entre os clássicos, de um critério restrito, ou seja, uma ligação íntima entre o seu conceito e o de culpa. Atualmente, porém, certos juristas, tendo JOSSERAND como um dos iniciadores da idéia, dão à responsabilidade civil um caráter amplo, isto é, concebem-na desligada da noção de culpa.”44

Pode-se, então, conceituar responsabilidade civil como sendo a situação de quem, ao infringir norma jurídica preexistente, legal ou contratual, gerando dano, material ou moral, fica responsável pela reparação deste, levando ao stato quo ante.

43 Ver José de Aguiar Dias

Da responsabilidade civil, cit., p.19. 44 Miguel Maria de Serpa Lopes,

(23)

3. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Visto que o artigo 186 é a base da responsabilidade civil subjetiva, é de sua redação que se pode retirar os quatro requisitos necessários para que se configure a responsabilidade civil: a ação ou omissão, a culpa ou dolo do agente, o dano sofrido pela vítima e a relação de causalidade entre o dano e a conduta do agente.

3.1 Ação ou omissão

O comportamento humano relevante pode ser tanto positivo (fazer) quanto negativo (não fazer). Desta forma, tem-se um comportamento comissivo quando o sujeito age, pratica uma ação e, um comportamento omissivo, quando houver o dever de agir que pode surgir da lei, do contrato ou de fato social.

Silvio Rodrigues ensina que “o ato do agente causador do dano impõe-lhe o dever de reparar não só quando há, de sua parte, infringência a um dever legal, portanto ato praticado contra direito, como também quando seu ato, embora sem infringir a lei, foge da finalidade social a que ela se destina.”45

De acordo com o Código Civil e, considerando o comportamento do agente, podem ocorrer três situações: a responsabilidade civil por ato próprio do agente, por ato de terceiro que esteja sob sua responsabilidade e, por fato da coisa ou do animal que estejam sob sua guarda.

A responsabilidade civil ato próprio está regulada nos artigos 942 e 186 do Código Civil, nesta forma de responsabilidade a obrigação de indenizar é imposta ao agente que praticou a conduta e causou o resultado danoso e, se a conduta for praticada por mais de um agente, todos responderão solidariamente pela reparação.46

45 Silvio Rodrigues,

Direito, cit., v. 4, p. 15. O autor refere-se à teoria do abuso de direito ao mencionar o

desatendimento da finalidade social, pois prossegue o autor: “se o comportamento abusivo do agente causa dano a outrem, a obrigação de reparar, imposta àquele, apresenta-se inescondível.”

46 Artigo 942 do Código Civil,

caput, – “Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de

(24)

A imputabilidade para que o agente responda por ato próprio é analisada de acordo com a capacidade civil de fato ou de gozo47.

Responde por ato próprio o agente que se omite diante de um dever de agir, situação comumente encontrada na responsabilidade contratual ou quando o agente pratica ação infringindo um dever jurídico. Este dever jurídico consiste em cumprir o que foi contratado em caso de responsabilidade contratual ou, em se tratando de responsabilidade extracontratual, em cumprir norma legal e, caso não haja previsão contratual ou legal, deve-se observar o dever geral de não causar dano a ninguém.

Silvio Rodrigues ensina que “a indenização pode derivar de uma ação ou omissão individual do agente, sempre que, agindo ou se omitindo, infringe um dever contratual, legal ou social. A responsabilidade resulta de fato próprio, comissivo, ou uma abstenção do agente, que deixa de tomar um atitude que devia tomar.”48

A responsabilidade por ato próprio também pode ser chamada direta. É esta modalidade de responsabilidade que se verifica na ruptura da união estável, afinal, decorre de atos praticados pelos próprios conviventes. Mas, como veremos oportunamente, não se trata de qualquer ruptura, esta deve se dar em razão de ato ilícito, ou seja, não é o fato de pura e simplesmente romper a união estável, que gera a obrigação de indenizar. Deve-se observar a circunstância em que se deu o rompimento para que se possa amoldá-lo nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil.

O legislador destacou algumas situações que ensejam a responsabilidade civil por ato próprio49, como, por exemplo, a do artigo 953 do Código Civil em que “a indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido.”50 Trata-se de situação especial porque dificilmente se provaria o dano material, este seria presumido e, a vítima não precisaria prová-lo, dispõe o parágrafo único do artigo 953: “se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, eqüitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstâncias do caso.”

47 A respeito da capacidade de fato ou de exercício e da capacidade de gozo ou de direito, consultar:

Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 1, p.147: “Capacidade de fato ou de exercício é a aptidão de exercer

por si os atos da vida civil dependendo, portanto, do discernimento que é critério, prudência, juízo, tino, inteligência, e, sob o prisma jurídico, a aptidão que tem a pessoa de distinguir o lícito do ilícito, o conveniente do prejudicial.”Consultar também: Sílvio de Salvo Venosa, Direito civil, cit., v. 1, 5.ed. p.

150.

48 Silvio Rodrigues,

Direito, cit., v. 4, p. 19.

49 O Código Civil de 1916 referia-se também ao artigo 1.548 que tratava da ofensa da mulher, artigo sem

correspondência no Código Civil de 2002. Ver também artigo 954 do Código Civil de 2002.

50 Verifica-se a calúnia quando o agente imputa fato criminoso a outrem, a difamação ocorre quando se

(25)

Atualmente, embora não provado o dano material, mas analisadas as circunstâncias do caso concreto, o dano moral poderia ser fixado.

A responsabilidade por fato de terceiro está disciplinada nos artigos 932, 933 e 942 do Código Civil. O artigo 932 traz as hipóteses legais em que se verifica o fato de terceiro, o artigo 933 diz que as pessoas elencadas no artigo 932, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos e, o artigo 942 diz a que título estas pessoas respondem. Responderão solidariamente pela reparação, de modo que a responsabilidade civil por ato de terceiro, não exclui a por ato próprio.

As duas hipóteses que revelam maior interesse a este trabalho, estão presentes nos incisos I e II do artigo 932 e serão citadas oportunamente.

Por fim, a responsabilidade por fato da coisa ou do animal, nesta modalidade de responsabilidade interessa a relação de poder entre a coisa e o agente. Em razão do poder é que nasce o dever de guardar, de custodiar, trata-se da culpa in custodiano, que é a falta de cautela, de cuidado em relação a um animal ou objeto. Tem-se as Tem-seguintes situações: artigo 936, “o dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.” Artigo 937, “o dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.” E a do artigo 938, “ aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.”

Pode-se chamar responsabilidade indireta a que resulta de fato de terceiro bem como a proveniente de fato da coisa ou do animal.

3.2. Culpa ou dolo do agente

Sendo subjetiva a responsabilidade civil, é preciso provar que o indivíduo agiu mal, analisando dolo ou culpa. Caio Mário da Silva Pereira ensina que “a teoria da responsabilidade subjetiva erige em pressuposto da obrigação de indenizar, ou de reparar o dano, o comportamento culposo do agente, ou simplesmente a sua culpa, abrangendo no seu contexto a culpa propriamente dita e o dolo do agente.”51

51 Caio Mário da Silva Pereira,

(26)

O dolo verifica-se no comportamento, na ação ou omissão voluntária (art. 186), isto é, o agente intencionalmente pretendeu o prejuízo, segundo Silvio Rodrigues, “o dolo ou resultado danoso, afinal alcançado, foi deliberadamente procurado pelo agente. Ele desejava causar dano e seu comportamento realmente o causou.”52

A culpa, por sua vez, é a violação de um dever de cautela, a doutrina distingue a imprudência, a negligência e a imperícia. Observa Carlos Roberto Gonçalves que “em qualquer de suas modalidades, entretanto, a culpa implica a violação de um dever de diligência, ou, em outras palavras, a violação do dever de previsão de certos fatos ilícitos e de adoção das medidas capazes de evitá-los.”53

O artigo 186 traz a culpa em sentido estrito e a culpa em sentido amplo. Em sentido estrito, a culpa é caracterizada pela imprudência que se dá por uma ação, um ato comissivo; pela negligência, verificada por um ato omissivo e a imperícia que é a falta de capacitação técnica. Em sentido amplo, verifica-se o dolo que é a culpa grave, com intenção de causar prejuízo.54

Culpa é definida por Alvino Lima como “um erro de conduta, moralmente imputável ao agente e que não seria cometido por uma pessoa avisada, em iguais circunstâncias de fato.”55

É utilizado o critério do homem médio56 para verificar se no comportamento daquele que causou o dano houve culpa, ou seja, o homem médio seria capaz de prever o resultado danoso e, se o agente não o previu, foi porque agiu com imprudência, negligência ou imperícia.

A culpa pode ser classificada em três graus: grave, leve e levíssima. É grave a culpa quando se verifica que, baseado no critério do homem médio, este teria evitado o dano, isto é, é aquela que se configura de extrema e grosseira negligência e imprudência. A culpa grave pode ser equiparada ao dolo. A culpa leve é a tradicional, na qual o homem médio incorreria e, a culpa levíssima, é aquela que não pode ser prevista pelo mais prudente e cauteloso dos homens.57

52 Silvio Rodrigues,

Direito, cit., v. 4, págs. 16 e 147. 53 Carlos Roberto Gonçalves,

Responsabilidade civil, São Paulo: Saraiva, 6.ed., 1995, págs. 344/345. 54 Ver Álvaro Villaça Azevedo,

Curso, cit., p. 258, Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., p. 449 e

Maria Helena Diniz, Curso, cit., p. 46. 55 Alvino Lima,

Culpa e risco, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1960, p. 76. 56 Informa Carlos Roberto Gonçalves,

Responsabilidade, cit., p. 345 que “o critério para aferição da

diligência exigível do agente, e, portanto, para caracterização da culpa, é o da comparação de seu comportamento com o do homo medius, do homem ideal., que diligentemente prevê o mal e

precavidamente evita o perigo.” Consultar também Rui Stoco, Tratado, cit., p. 132. 57 Consultar Silvio Rodrigues,

(27)

Ocorre que independente do grau de culpa ou de ter o agente agido com dolo, se a vítima sofreu algum prejuízo, deverá ser indenizada, mas conforme dispõe o caput do artigo 944 do Código Civil, “indenização se mede pela extensão do dano” e seu parágrafo único que, “se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir eqüitativamente a indenização.”58

A culpa também pode ser classificada quanto ao seu conteúdo, como já visto, tem-se: culpa in custodiendo que é a falta de cautela e cuidado em relação a animal ou objeto, há também a culpa in committendo ou in faciendo que é a prática de um ato positivo, caracterizado pela imprudência, a culpa in omittendo que é a omissão (negligência), a culpa in eligendo é a que resulta da má escolha pelo agente e a culpa in vigilando é a que decorre da falta de atenção e fiscalização com relação a outrem.59

Diante do fato de que nem sempre é possível se verificar culpa, temos no parágrafo único do artigo 927 a responsabilidade civil baseada no risco, trata-se da responsabilidade civil objetiva, onde não se discute culpa. Referido parágrafo único, como já mencionado, estabelece regra para responsabilidade civil objetiva em duas hipóteses: nos casos especificados em lei60 e quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Aponta Rui Stoco que o Código Civil de 2002 “embora tenha adotado e mantido a culpa como pressuposto da responsabilidade civil, ou seja, exigindo que a conduta tenha um qualificativo ligado ao elemento subjetivo ou interno da pessoa, de modo que há de projetar-se em direção a um resultado querido ou assumido, excepcionou esse princípio para, como exceção, admitir a responsabilidade independentemente de culpa (objetiva) quando a atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar risco para os direitos de outrem (art. 927, parágrafo único).”61

No âmbito deste trabalho, importa a verificação da culpa para a configuração do dano moral, pois, verificar-se-á, que o simples rompimento da união

58 Silvio Rodrigues,

Direito, cit., v. 4, p. 150, aplaude a inovação do Código Civil de 2002, pois reputava

injusta a solução tradicional de impor ao causador do dano a total indenização pelo prejuízo causado, não levando em consideração de o agente agiu com dolo ou culpa levíssima.

59 Consular Maria Helena Diniz,

Curso, cit., v. 7, p. 49/50.

60 Verifica-se a responsabilidade civil objetiva nos artigos 37, §6º, da Constituição Federal de 1988; 43 do

Código Civil; 13, 14 e 18 do Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990 e Lei nº 6.543/1977 sobre a responsabilidade civil e criminal por danos nucleares.

61 Rui Stoco,

(28)

estável, como conseqüência do fim do amor, da afinidade, não é capaz de gerar dano indenizável.

Cabem aqui as palavras de Vitor Ugo Oltramari: “...na própria ruptura da união estável pelo fim do afeto, existem sofrimentos, mágoas e dissabores que não têm como serem compensados por fazerem parte do próprio contexto da quebra da relação. Fundamental é a ocorrência de conduta culposa e a verificação da sua intensidade para configuração do dano moral.”62

3.4. Relação de causalidade

Deve haver um nexo de causalidade entre a causa, isto é, a ação ou omissão praticada pelo agente e a conseqüência, ou seja, o dano causado à vítima.

Sérgio Cavalieri Filho lembra que o “conceito de nexo causal não é jurídico; decorre das leis naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado.”63

A doutrina aponta duas teorias: a da equivalência dos antecedentes e a da causalidade específica. Brevemente, a primeira teoria consiste em eliminar um comportamento, desaparecendo o dano, significa que aquele comportamento foi a causa do dano, gera, portanto, responsabilidade ilimitada. A segunda teoria considera como causa do prejuízo apenas o comportamento que por si só causou o dano, diferentemente da teoria da equivalência, a teoria da causalidade específica, gera responsabilidade limitada.64

Neste item cabe a análise das excludentes de responsabilidade civil. Trata-se de toda circunstância, comportamento que de alguma forma venha atingir o nexo de causalidade, quebrando-o.

São excludentes de responsabilidade civil: a culpa exclusiva da vítima, deve ser verificado se esta agiu com falta de cuidado; o fato de terceiro e, o caso fortuito e de força maior.

Se o dano decorre de comportamento exclusivo da vítima, a relação de causalidade é quebrada, não sendo possível propositura de ação. Segundo Maria Helena Diniz, “a vítima deverá arcar com todos os prejuízos, pois o agente que causou o dano é

62 Vitor Ugo Oltramari,

O dano moral na ruptura da sociedade conjugal, Rio de Janeiro: Forense, 2005,

p. 119.

63 Sérgio Cavalieri Filho,

Programa, cit., p. 67. 64 Consultar Rui Stoco,

(29)

apenas um instrumento do acidente, não se podendo falar em nexo de causalidade entre a sua ação e a lesão.”65Ao lado da culpa exclusiva da vítima também pode haver a culpa concorrente, esta forma de culpa não quebra a relação de causalidade, mas atenua a responsabilidade.

O fato de terceiro também é excludente de responsabilidade. O fato deve ser exclusivo, caso contrário, será concorrente e, neste caso, haverá responsabilidade. É o que se verifica no artigo 942 do Código Civil: “...se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.”

Outra excludente de responsabilidade são as hipóteses de caso fortuito e força maior. Nesta verificam-se os casos da natureza, imprevisíveis, inevitáveis e estranhos a vontade das partes. No caso fortuito, ocorrem acontecimentos imprevisíveis e inevitáveis que guardam relação com o agente ou com a atividade desenvolvida por ele.

Todas essas excludentes interferem na responsabilidade civil pois atacam a relação de causalidade. Deixará de existir a responsabilidade se a conduta do agente não for a causa do dano e, incidirá de forma atenuada a responsabilidade civil, se a conduta do agente não foi causa única.

Atenta Maria Helena Diniz que todas essas causas excludentes “deverão ser devidamente comprovadas e examinadas com cuidado pelo órgão judicante por importarem em exoneração do ofensor, deixando o lesado sem a composição do dano sofrido.”66

Além das excludentes examinadas acima, há as previstas no já referido artigo 188 do Código Civil: atos praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido e a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.

Ademais, além dessas excludentes de responsabilidade, encontra-se na esfera da responsabilidade contratual, a cláusula de não indenizar que é um pacto estabelecido, em contrato, que isenta de responsabilidade uma das partes contraentes. Está cláusula de não indenizar aplicá-se somente nos contatos.67

3.4. Dano

65 Maria Helena Diniz,

Curso, cit., v. 7, p. 110. 66 Maria Helena Diniz,

Curso, cit., v. 7, p. 114. 67 Consultar Silvio Rodrigues,

Direito, cit., v. 4, p. 179 e Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7, págs.

(30)

O dano68 é um dos pressupostos caracterizadores da responsabilidade civil tanto a contratual quanto a extracontratual69. Visto que o sentido de responsabilidade civil que interessa a este trabalho é o de reparar o dano causado, caberá neste item a análise do dano e, em particular, do dano moral. Entretanto, esta análise restringir-se-á aos limites do presente trabalho.

Alcino de Paula Salazar conceitua dano, em sentido amplo, como “toda e qualquer subtração ou diminuição imposta ao complexo de nossos bens, das utilidades que formam ou propiciam o nosso bem estar; tudo o que, em suma, nos suprime uma utilidade, um motivo de prazer ou nos impõe um sofrimento é dano, tomada a palavra na sua significação genérica.”70

Como um dos requisitos necessários para que se configure a responsabilidade civil, não havendo dano não há o que se indenizar. Cabe aqui a doutrina de José de Aguiar Dias: “com efeito, a unanimidade dos autores convém em que não pode haver responsabilidade sem a existência de um dano, e é verdadeiro truísmo sustentar esse princípio, porque resultando a responsabilidade civil em obrigação de ressarcir, logicamente não pode concretizar-se onde nada há que reparar.”71

Maria Helena Diniz defini dano “como a lesão (diminuição ou destruição) que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral.”72

Caio Mário da Silva Pereira opta pela definição de dano como “toda ofensa a um bem jurídico (grifo do autor)”73

Para Clayton Reis, “o dano deve ser considerado como uma lesão a um direito, que produza imediato reflexo no patrimônio material ou imaterial do ofendido, de forma a acarretar-lhe a sensação de perda.”74

Dano é lesão a um bem jurídico, que pode ser de ordem patrimonial ou de natureza não patrimonial, ou seja, dano moral. O dano material abrange tudo aquilo que o sujeito perdeu ou que efetivamente deixou de ganhar, abrangendo o dano

68 Em sentido comum, dano significa “todo

mal ou ofensa que tenha uma pessoa causado a outrem, da

qual possa resultar uma deterioração ou destruição à coisa dele ou um prejuízo a seu patrimônio.” De Plácido e Silva, Vocabulário, cit., p. 02.

69 Esta distinção, responsabilidade contratual e extracontratual, será vista em item seguinte. 70 Alcino de Paula Salazar,

Reparação do dano moral, Rio de Janeiro: s.n., 1943, p. 125. 71 José de Aguiar Dias,

Da responsabilidade, cit., p. 832. 72 Maria Helena Diniz,

Curso, cit., v. 7, p. 66. 73 Caio Mário da Silva Pereira,

Responsabilidade, cit., p.53. 74 Clayton Reis,

(31)

emergente (aquilo que efetivamente se perdeu, a diminuição do patrimônio), os lucros cessantes (aquilo que razoavelmente se deixou de ganhar, a privação do patrimônio) e as perdas e danos, que, em se tratando de responsabilidade contratual, podem ser estipuladas previamente.75

Devem ser observados os seguintes requisitos para que o dano seja indenizável: a diminuição de um bem jurídico, seja patrimonial ou moral; a certeza do dano, não se indeniza o dano hipotético ou a perda uma chance; a causalidade entre a conduta do agente e o dano experimentado pela vítima; a subsistência do dano, deve haver prejuízo a ser reparado, de modo que se o agente causador do dano, já o reparou, não há mais prejuízo a ser cobrado; legitimidade, só pode reclamar indenização o verdadeiro titular do direito atingido ou seus beneficiários e, finalmente, deve haver ausência de causas excludentes de responsabilidade.76

A respeito do requisito certeza, esclarece Antonio Jeová Santos que: “a simples possibilidade de dano, a situação meramente hipotética, não chegará a ser dano moral. A certeza do dano está vinculada à conseqüência que esse dano originou no espírito da vítima. Se causou angústia, vergonha, humilhação etc., o dano é atual e certo na sua existência. O reverso do dano certo e atual é o futuro, considerado como perda de chance. Para certos doutrinadores, o dano moral é sempre atual e transitório. Ele não permanece na pessoa de forma duradoura, nem se perpetua.” 77

Para que se configure a responsabilidade civil é imprescindível a existência de um dano, seja em virtude de ação ou omissão do agente causador, de modo que não havendo o dano, não se fala em responsabilidade, nem em obrigação de indenizar. Havendo dano, sempre que possível, deverá o agente causador restabelecer a situação anterior ao evento danoso.78

Ensina Silvio Rodrigues que “princípio geral de direito, informador de toda a teoria da responsabilidade, encontradiço no ordenamento jurídico de todos os

75 Consultar artigos 402 e 403 do Código Civil e, também, Maria Helena Diniz,

Curso, cit., págs. 71/72;

João Casillo, Dano à pessoa e sua indenização, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1987, p. 28 :

“...o conceito de dano deve vir acoplado ao de diminuição, empobrecimento, perda mensurável.”

76 De acordo com Maria Helena Diniz,

Curso, cit., v.7, págs. 67/69. 77 Antonio Jeová Santos,

Dano moral indenizável, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 4.ed., 2003,

p. 105.

78 Consultar Maria Helena Diniz,

Curso, cit., v. 7, p. 17: “procurar-se-á sempre que possível conduzir a

(32)

povos civilizados e sem o qual a vida social é quase inconcebível, é aquele que impõe a quem causa dano a outrem o dever de o reparar.”79

3.4.1. Dano moral

Por muitos anos, doutrina e jurisprudência não reconheciam os danos morais. A uma, porque não havia legislação específica e a duas, em vista da dificuldade em se quantificar a dor, a tristeza, o sofrimento, sentimentos que não se vêem, apenas se sentem. Assim, questiona Georges Ripert: “se é certo que a lei civil sanciona o dever moral de não prejudicar outrem, como poderia ela, que defende o corpo e os bens, ficar indiferente em presença do ato prejudicial que atinge a alma?”80

Com o passar dos anos, a maioria da doutrina manifestou-se favoravelmente à possibilidade de indenização por danos morais. Lentamente, a jurisprudência também demonstrou aceitação pela indenização por danos morais. Silvio Rodrigues anota que: “no que concerne à posição de jurisprudência brasileira em relação à ressarcibilidade do dano moral, poder-se-ia afirmar que até há uns 25 anos atrás, eram escassíssimas, se é que existentes, as decisões de tribunais superiores admitindo a indenização do dano moral.”81

O dano moral é a lesão a um direito personalíssimo, esclarece Carlos Alberto Bittar que os direitos personalíssimos são aqueles que “voltam-se, pois, para aspectos íntimos da pessoa, ou seja, tomada esta em si, como ente individualizado na sociedade. A pessoa é protegida em seus mais íntimos valores e em suas projeções na sociedade. Abrangem, portanto, o complexo valorativo intrínseco (intelectual e moral) e extrínseco (físico) do ente, alcançando a pessoa em si, ou integrada à sociedade (...)”82.

Atingindo bens personalíssimos, o dano moral revela-se na dor, aborrecimento, sofrimento, tristeza. Sentimentos anormalmente vividos pela pessoa em razão da prática de ato ilícito, incomuns do dia-a-dia. Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho, anotam que “mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de

79 Silvio Rodrigues,

Direito, cit., v. 4, p.13.

80 Georges Ripert citado por Artur Oscar de Oliveira Deda,

A proteção dos direitos da personalidade,

Grandes temas da atualidade – dano moral – aspectos constitucionais, civis, penais e trabalhistas, coord. Eduardo de Oliveira Leite, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 43.

81 Silvio Rodrigues,

Direito, cit., v. 4, p. 192. 82 Carlos Alberto Bittar,

Os direitos da personalidade, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 6.ed., 2003,

(33)

fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos.”83

Observa Sílvio de Salvo Venosa que “é importante o critério objetivo do homem médio, o bonus pater famílias: não se levará em conta o psiquismo do homem excessivamente sensível, que se aborrece com fatos diuturnos da vida, nem o homem de pouca ou nenhuma sensibilidade, capaz de resistir sempre às rudezas do destino.”84

O dano moral foi reconhecido expressamente pela Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, incisos V e X, pois, antes do Código Civil de 1916, em princípio, não se cogitava o dano moral, tanto que o antigo Código não trazia disposição expressa85 como a Carta Magna.

O atual Código Civil, por sua vez, faz referência ao dano moral no artigo 186, e, novamente, se faz referência ao Projeto 6960, que propõe o acréscimo do parágrafo segundo ao artigo 944, referindo-se também ao dano moral. Este artigo determina no caput que a indenização se mede pela extensão do dano, todavia, se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir eqüitativamente a indenização (parágrafo único). A proposta do referido Projeto traz a seguinte redação: “§2º. A reparação do dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e adequado desestímulo ao lesante.”

A fim de conceituar dano moral, destacam-se duas correntes doutrinárias: a que se baseia na natureza do direito subjetivo violado e a que se fundamenta nos efeitos da ofensa.86

Roberto Brebbia é adepto da primeira corrente, afirma que “de todas las clasificaciones que se formulan de los daños reconocidos por el Derecho, es, sin dejar lugar a la menor duda, la más importante, la distinción que se efectúa teniendo en

83 Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho,

Comentários, cit., p 103. 84 Sílvio de Salvo Venosa,

Direito, cit., v. 4, p. 39.

85 Isso não significa que o dano moral não era indenizado, era intuído, por exemplo, nos antigos artigos

76 (artigo sem correspondência), 159 (atual 186), 1.537 (atual 948) e 1.538, §2º (atual 949), 1.543 (atual 952, parágrafo único), 1.547 (atual 953), 1.550 (atual 954), 1.548, 1.553 (atual 946), também se cogitava o dano moral nas leis nº 4.417/62, art. 84 e na lei de imprensa, lei nº 5.250/67, artigo 53. Consultar Paulo Esteves et al, Dano moral, São Paulo: Editora Fisco e Contribuinte Ltda, 1.ed., 1999, págs. 37/42.

86 Consultar: Artur Oscar de Oliveira Deda,

A proteção, cit., págs. 43/44; Antonio Jeová Santos, Dano,

cit., págs. 92/94 e José Antonio Remédio et al, Dano moral – doutrina, jurisprudência e legislação, São

Referências

Documentos relacionados

No presente trabalho foram avaliadas as propriedades físicas-mecânicas de painéis aglomerados produzidos a partir de resíduos gerados de poda de Acacia mangium.. Para

Eu, (especificar nome completo) portador (a) do RG nº (especificar o número) e CPF nº (especificar o número), candidato (a) pré-selecionado (a) para o Programa Universidade

Processo Nº 76.798// ARTUR CHAVES FERREIRA, brasileiro, solteiro, profissão Engenheiro Civil, natural de Uberlândia - MG, residente e domiciliado na Rua An- darai, 99,

Conforme o que se é sabido, não é impedido pelo ordenamento jurídico que sejam realizados pelos casais, antes do casamento civil, os chamados contratos pré- nupciais.

APÓS A CONFIRMAÇÃO DE TODOS OS DOCUMENTOS VOCÊ PODERÁ FAZER O SEU DEPÓSITO EM REAIS PARA COMPRAR O BITCOIN.... COMO FAZER UM

Assim, mesmo havendo a necessidade de comprovação de união estável e através do uso de analogias, com referência na família tradicional, os direitos que são conquistados

Assim como não há formalidades para que se estabeleça uma união estável, da mesma forma não há qualquer requisito para a sua dissolução, desde que os

O CC 1790 caput, sob cujos limites os incisos que se lhe seguem devem ser interpretados, somente confere direito de sucessão ao companheiro com relação aos