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Com a palavra, o autor

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do Programa Nacional do Livro Didático Copyright © 2010

FRANCISCO AZEVEDO DE ARRUDA SAMPAIO ALOMA FERNANDES DE CARVALHO

1ª edição – 2010 Editores

Aloma Fernandes de Carvalho Francisco Azevedo de Arruda Sampaio

Rita Marte Arruda Sampaio Preparação e revisão do texto

Maria Rita Camarini Izabel Bueno Produção e edição de imagem

Eduardo Justiniano Rafael Sato Administração e apoio

Ana Maria P. C. Mello Ana Paula de Menezes Carolina Oliveira Silva José Henrique Mello Eldo Francisco da Silva (Pixinguinha)

Projeto gráfico e diagramação Figurativa Editorial

Capa FAAS/BrasilFoto

Todos os direitos reservados. Editora Sarandi

Av. Brigadeiro Faria Lima, 1912 – Conjunto 208 B Pinheiros – São Paulo – SP

Tel. (11) 3097 -9040 http://www.editorasarandi.com.br e -mail: editora@editorasarandi.com.br

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Sampaio, Francisco Azevedo de Arruda

Com a palavra, o autor : em nossa defesa : um elogio à importância e uma crítica às limitações do Programa Nacional do Livro Didático / Francisco Azevedo de Arruda Sampaio, Aloma Fernandes de Carvalho. -- São Paulo : Editora Sarandi, 2010.

ISBN 978-85-99018-68-2

1. Autores brasileiros 2. Educação - Brasil 3. Livros didáticos - Avaliação 4. Livros didáticos Brasil 5. Livros didáticos - Critérios de escolha 6. Política e educação 7. Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) I. Carvalho, Aloma Fernandes de. II. Título.

10-07931 CDD-371.320981

Índices para catálogo sistemático:

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Sumário

Prefácio

Com licença, a palavra é nossa! ...5

Introdução

Quem somos nós que aqui falamos tanto ...7 Siglas ...20

Capítulo 1

O PNLD e os melhores livros para a escola pública ... 21

Capítulo 2

A avaliação do livro didático: importância e problemas ... 43

Capítulo 3

O caso da Coleção Caminhos da Ciência ... 69

Capítulo 4

O caso da Coleção Ponto de Partida Ciências ... 139

Capítulo 5

O caso da Coleção Projeto ALLE ... 205

Capítulo 6

O caso da Coleção Ponto de Partida Letramento e Alfabetização ... 299

Capítulo 7

Sugestões para o aprimoramento do atual modelo do PNLD ... 359

Epílogo ...386

Anexos ...389 Anexo 1 – Relatório de Reprovação Coleção Caminhos da Ciência

Anexo 2 – Relatório de Reprovação Coleção Ponto de Partida Ciências

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Prefácio

Com licença, a palavra é nossa!

Em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo em 30/01/2010 a advogada Maria Inês Dolci, que atua na área de defesa do consumidor, pede explicação sobre os preços abusivos do livro didático. Reclama que todo ano é a mesma coisa: as escolas soltam a lista do material escolar e os pais desesperam -se com o valor dos livros. Sentem -se lesados: o livro não só é caro, como é preciso comprar cinco, seis ou até mais. Surge a balbúrdia, todo mundo sai gritando: é o imposto dos livros que faz o preço subir, são as editoras que ganham muito, são as livrarias que faturam alto, é o livro que é desatualizado e sempre precisa ser trocado… Maria Inês protesta. Afinal, os principais atores não se posicionam: autores e editoras permanecem em silêncio face à algazarra de queixas e protestos. E Maria Inês provoca: encerra o artigo cedendo a palavra. Convoca esses atores a se manifestarem.

Então, com licença, assumimos a palavra. Nós, autores de livros didáticos. Nós que temos fama de escrever livros ruins, de ser mercenários por faturar com a educação dos outros e de desenvolver um trabalho intelectual menor, sem importância… Mas não é sobre isso que queremos falar. Não é sobre o valor social do livro e o papel dos autores e editores na educação… Pedimos a palavra para contar uma outra história: a história das avaliações dos livros didáticos. Sim, é verdade, os livros didáticos brasileiros são avaliados de forma frequente por especialistas de renome de todo o país. Nem os alimentos que integram a merenda escolar são tão analisados e fiscalizados pelo governo. Mas apostamos que pouca gente sabe disso. Também não deve ser de amplo conhecimento que a avaliação é séria e se fosse mais divulgada ajudaria a resolver, inclusive, o problema do preço do livro didático. É essa a história que nós vamos contar neste livro. Nos seus detalhes. Parágrafo por parágrafo. E como livro didático é um livro que todo mundo usa – ou já teve que usar um dia – acreditamos que essa história interesse a muita gente. Não apenas educadores, especialistas da universidade ou técnicos do MEC. Na verdade, essa história interessa a todo mundo, pois até de imposto o livro didático é isento. Logo, faz parte da conta que todos nós pagamos ano a ano.

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Introdução

Quem somos nós que aqui falamos tanto

“A última coisa a decidir ao se escrever um livro é o que se deve pôr em primeiro”, ponderou Blaise Pascal em uma das suas reflexões. Assim, após termos escrito e reescrito os textos que compõem os capítulos deste livro, selecionado os títulos e subtítulos, prepa-rado os anexos de modo a incentivar o leitor a se aprofundar em nossa reflexão, é preciso examinar o que fizemos e, principalmente, porque o fizemos.

Afinal, passamos mais de um ano analisando profundamente os relatórios de reprova-ção de nossas obras no PNLD 2010; investigando de forma exaustiva sobre os especialistas que participaram da avaliação de 2010 (sua formação, rede de relações, linha de pesquisa e publicações); pesquisando a evolução da participação dos grandes grupos editoriais nos programas de aquisição de livros do governo (percentual de obras inscritas e aprovadas no PNLD, aumento do valor gasto pelo FNDE na avaliação dessas obras, publicações e assessorias envolvendo integrantes das equipes de avaliação); consultando advogados, jornalistas e especialistas em livros didáticos para verificar se nossas reflexões estavam no caminho certo… Para que tudo isso? Revanchismo, alguns dirão. Hipocrisia, outros acu-sarão. Ingenuidade, muitos afirmarão. Mas não é nada disso.

Nosso trabalho, nossas vidas estão voltados para o ofício da escrita. Não uma escri-ta qualquer, literária, científica ou jornalística – fácil de ser apreciada, boniescri-ta, eterna. Mas uma escrita ingrata: interessa a poucos, não é bem -vinda, ninguém gosta de ler. E é rapidamente descartada. Nossa produção autoral resulta em livros didáticos. A universi-dade e também muitos dos nossos colegas pesquisadores e educadores não nos conside-ram escritores, mas apenas “autores”. Segundo eles, nossos livros não têm leitores, apenas “usuários”1. Nossos livros são considerados “menores”: não servem para presentear e sequer

são expostos nas prateleiras das livrarias (só sob encomenda!). Essa, porém, não é a visão que temos do nosso ofício. Escrever livros didáticos foi, desde o início, um grande desafio intelectual. Como todo desafio dessa natureza, envolve angústia, mas também prazer. En-volve ainda a certeza de estar proporcionando prazer aos outros, sejam eles grandes leitores ou apenas simples “usuários”: prazer em aprender, prazer em ensinar. Sempre imaginamos nossos livros, de alguma forma, lembrados como uma boa recordação: por suas lindas fotografias (quanto trabalho para selecioná -las!), por suas informações generosas (como é difícil falar fácil sobre assuntos tão complexos!), por sua diagramação bem cuidada, quase artesanal (é tão difícil convencer os editores a investirem mais e a inovarem o projeto grá-fico dos livros didáticos!).

Toda essa paixão pelo livro didático começou com a fotografia de uma criança mara-vilhada diante de um livro cujas páginas emanavam magia e encantamento. A fotografia abria o primeiro volume de uma coleção elaborada com o objetivo de ensinar Ciências

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Naturais aos jovens estudantes das séries iniciais do ensino fundamental. Mas não dá para ensinar Ciências com magia, não é mesmo? A partir dessa crítica, iniciou -se a parceria en-tre uma pedagoga e um biólogo na escrita de livros didáticos e surgiu a Coleção Caminhos da Ciência. O ano era 1998, já faz mais de dez anos.

A Coleção Caminhos da Ciência talvez tenha sido uma das primeiras obras didáticas publicadas no Brasil fruto do trabalho integrado entre educador e especialista. Ou me-lhor, entre um especialista na área de Educação e outro na área de Ciências. Até então, tradicionalmente, os livros didáticos eram decorrentes da experiência da sala de aula de professores, independentemente da sua formação. A professora da antiga 1ª série era uma boa alfabetizadora, sua proposta virava livro. Inclusive de Matemática ou de Ciências. O professor de Física fazia sucesso entre os alunos, suas aulas se materializavam em textos impressos. Para as empresas do setor editorial, funcionava muito bem: os editores sabiam que o seu grande sucesso editorial estava ali, na sala de aula.

São muitos os exemplos de professores que “viraram livros”. Talvez o mais célebre deles seja o Professor Scipione di Pierro Netto (1926 -2005). Quem frequentou a escola básica nos anos 1970/1980 deve se lembrar dos seus livros de Matemática, publicados a partir do final dos anos 1960. Sua proposta pedagógica nasceu da intensa experiência que teve como professor de ginásio em escolas públicas e no Colégio de Aplicação da USP – na época, reconhecido por suas inovações2. O sucesso de suas obras destrinchou um caminho que,

posteriormente, foi seguido por outros autores (inclusive por nós, autores da Coleção Ca-minhos da Ciência). Scipione, de autor, passou a editor, dando origem a um dos principais grupos editoriais do país, a Editora Scipione.

A Professora Déborah Pádua Mello Neves é outro exemplo de sucesso. Professora pri-mária do interior de São Paulo, Déborah vivenciou quase um século de transformações na educação brasileira. Como normalista, começou a lecionar numa época em que as jovens professoras ainda precisavam da autorização dos pais para trabalhar; presenciou a expansão do ensino primário para quatro anos, com a inauguração dos grupos escolares; preparou dezenas de alunos para os rigorosos exames de admissão no antigo ginásio3. Sobretudo:

enfrentou, na prática, um dos desafios de sala de aula mais frequentes até os dias de hoje: a cópia.

Déborah (como atualmente prosseguem fazendo os professores) colocava na lousa a matéria das aulas e seus alunos (como os alunos de hoje) demoravam muito tempo para copiar. Tanto tempo e esforço nem sempre tinha bons resultados: os alunos copiavam in-formações erradas, a letra não era legível. Logo, não dava para usar o caderno para estudar. Foi uma necessidade didática que fez com que Déborah produzisse o seu primeiro material impresso. Eis uma autora que já nasceu editora, inclusive com departamento comercial. As primeiras edições de seus impressos foram concebidas, escritas, diagramadas, ilustradas,

2   ABRALE. Memória: Professor Scipione Di Pierro Netto (1926-2005). Disponível em: <http://www.abrale.com.br/ scipione.htm> (acesso: abr/2010).

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impressas e vendidas pela própria autora, livro a livro. Com mais de cem títulos publica-dos, Déborah é uma das professoras -autora -editora com mais livros vendidos na história da educação brasileira. Foram cerca de 250 milhões de exemplares ao longo de 30 anos de produção autoral!

Seguindo os passos da Professora Déborah, no início dos anos 1990, surgiram as pro-fessoras Célia Passos e Zeneide Silva, com a Coleção Eu Gosto. A fórmula era a mesma: transformar em material impresso as atividades que eram passadas na lousa ou reprodu-zidas, na escola, por meio de mimeógrafo. Resultado: enorme sucesso de vendas. Em seis anos, foram mais de 20 milhões de livros! Segundo um importante empresário editorial daquela época, esse era o segredo do estrondoso sucesso das vendas dessas coleções que saíam da sala de aula para as prateleiras das livrarias: era muito fácil para os professores reconhecer o seu trabalho de sala de aula nas propostas de ensino desses autores. A empatia entre o livro didático e o leitor -professor, consequentemente, era imediata. Logo, a adesão aos livros também.

Mas falar sobre o livro didático no Brasil é, em sua essência, falar também das políticas públicas engendradas há quase um século para os materiais escolares, em particular, e para a educação brasileira, de forma geral. Desde o início da década de 1930, o governo federal implementa regularmente mecanismos de controle sobre a produção e sobre o uso dos textos impressos, conferindo maior ou menor liberdade à definição de seus conteúdos e propostas de ensino4. Tais políticas orientam também as escolhas dos livros por professores

e diretores das escolas públicas, com pouco ou nenhum impacto nos livros escolhidos pelas escolas particulares.

Não há como separar, portanto, a história da educação brasileira e a história do merca-do editorial brasileiro. Também não é possível desvincular o ofício merca-do autor/editor de livro didático das orientações oriundas sobretudo do governo federal. É quase uma dezena de decretos -lei e diversas comissões, acordos e institutos: INL – Instituto Nacional do Livro Didático (1937), CNLD – Comissão Nacional do Livro Didático (1938), COLTED – Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático (1967), FENAME – Fundação Nacional do Material Escolar (1968), PLIDEF – Programa do Livro Didático do Ensino Funda-mental (1984), FAE – Fundação de Amparo ao Estudante (1983) e PNLD – Programa Nacional do Livro Didático (1985).

Nessa longa história de livros e decretos, temos especial interesse nas políticas públicas propostas a partir da década de 1980, quando livro didático na escola pública passou a ter status similar ao da merenda escolar: impossível melhorar a educação do Brasil sem eles. Aluno carente e livro didático tornaram -se um binômio inseparável no discurso político (FREITAG, 1989) e, ousamos afirmar, no discurso pedagógico também5. A aquisição e

4   FREITAG, B. O livro didático em questão. São Paulo: Cortez, 1989, p. 15.

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a distribuição gratuita de livros didáticos foi, gradativamente, ampliada6 e cada vez mais

regulamentada.

O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD)7 surge nesse contexto. Sob a

res-ponsabilidade do Ministério da Educação (MEC) e gerenciado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), esse programa de livros está baseado, desde sua origem, nos princípios da livre participação das editoras privadas e da livre escolha por parte dos professores.

Embora inicialmente o PNLD tenha concentrado seus esforços em regulamentar e padronizar aspectos administrativos e logísticos relacionados à compra e à distribuição dos livros, logo passou também a gerir sobre a sua forma e o seu conteúdo. Afinal, ao longo da década de 1990, o Estado oficializou o livro didático enquanto instrumento de trans-formação social.

Dois grandes eventos balizaram os fundamentos da avaliação didático -pedagógica e conceitual do livro didático. Um deles foi a implantação do Plano Decenal de Educação para Todos (1993), documento elaborado pelo MEC no qual foram estabelecidas diretrizes políticas voltadas para recuperação da escola fundamental. Era um esforço do governo federal para cumprir as resoluções da Conferência Mundial de Educação para Todos, reali-zada em Jomtien (Tailândia), em 1990. O Brasil é signatário da Conferência de Jomtien e assumiu importantes compromissos para melhorar a educação do país junto a organiza-ções internacionais como a UNESCO, a UNICEF, o PNUD e o Banco Mundial8. Para

essas organizações, o livro didático sempre foi um recurso fácil de manejar e de baixo valor econômico, verdadeiro “insumo” da instituição escolar.

Por outro lado, o Plano Decenal também foi elaborado para atender a Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96). Sancionada em 1996, foi preciso quase uma década para que nossos congressistas chegassem a um acordo sobre o conteúdo da lei geral, que redefiniria e regulamentaria o sistema de ensino brasileiro de acordo com a Constituição de 1988. Dentre outras obrigações, a LDB/96 reiterou o dever do Estado em atender o educando da escola pública por meio de programas de distribuição gratuita de materiais escolares.

Assim, a partir de 1995, o PNLD passa a avaliar o conteúdo e a proposta de ensino das coleções didáticas antes de adquirir os livros. Pesquisadores são convocados para dar a sua opinião, universidades contratadas para julgar. Surge um novo personagem no mercado editorial: o “especialista”. Em educação, em didática, em história do livro didático, em entender o que o governo quer… Afinal, o PNLD, desde o início, dedicou -se à definição daquilo que o livro didático não pode ter: não pode ter informação errada, não pode estar desatualizado, não pode ser racista (nem preconceituoso), não pode ter apenas exercício

6   Sobre os números do mercado editorial e das vendas de livros didáticos para os programas de governo, ver Capí-tulo 1.

7   O PNLD é tratado em seus detalhes no Capítulo 1 e também no Capítulo 7.

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do tipo pergunta/resposta… Mas, até hoje, pouco disse sobre o que o livro didático deve ter e como deve fazer para ensinar. Nós vimos, nós estávamos lá: o que o livro didático não podia mais realmente era refletir aquela sala de aula que o governo precisava, de acordo com a Conferência de Jomtien, “recuperar”, transformar.

O final da década de 1990 representou, portanto, o declínio9 daqueles “antigos”

professores -autores. A Professora Déborah? Seus livros não podiam mais ser inscritos no PNLD10… A Coleção Eu Gosto? As autoridades do MEC cancelaram o PNLD 1996

quando verificaram que, naquele ano, 55% do total de livros escolhidos pelos professores para as áreas de Língua Portuguesa e de Matemática eram da Coleção Eu Gosto. Depois disso, a obra passou a ser sistematicamente reprovada no PNLD e motivo de chacota nos jornais… O Professor Scipione? Muitos dizem que nunca perdoou aqueles seus alunos e colegas que, agora “especialistas”, reprovaram as suas obras, que passaram a ser excluídas sistematicamente do Guia de Livros Didáticos11 do PNLD.

O estabelecimento de critérios de natureza didática abriu o mercado editorial para novos autores. Quando as editoras viram seus autores campeões de venda barrados no PNLD, não tiveram dúvida, procuraram por outros. De preferência, autores que com-preen dessem as diretrizes estabelecidas no Plano Decenal – tarefa nem sempre fácil até para os “especialistas” – e conseguissem escrever livros didáticos de acordo com as diretrizes estabelecidas nos documentos publicados pelo governo federal naquela ocasião, como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)12.

A Coleção Caminhos da Ciência (1998) foi resultado de um intenso esforço nosso – como “especialistas”, ou melhor, agora “especialistas -autores” – para transformar em pro-posta prática de ensino as proposições teóricas do MEC estabelecidas principalmente no documento de Ciências Naturais dos PCN. Sem falsa modéstia, tivemos muito sucesso nessa empreitada: grande sucesso intelectual e razoável sucesso financeiro. A Coleção Ca-minhos da Ciência foi inscrita e aprovada nos PNLD 2001, 2004 e 2007. Em todas essas ocasiões, foi muito bem avaliada. A bem da verdade, é a única coleção de Ciências reco-mendada com distinção em toda a história do PNLD. Podemos afirmar que conseguimos

9   Muitas das coleções de sucesso reprovadas no PNLD nos anos 1990 continuam até hoje com bons índices de ven-da. Estrategicamente, as grandes editoras mantêm, com anuência do próprio MEC, o mercado das escolas particulares  alienado das avaliações do PNLD, preservando as vendas dessas coleções ao alunado das particulares. Do ponto de  vista editorial, essas coleções passam para o “time da reserva” e seus autores perdem status em suas próprias casas  publicadoras. Seus novos projetos são “congelados”; o esforço na propaganda de suas obras também.

10   Na mesma época em que viu seus livros reprovados pela avaliação da SEB e eliminados do PNLD, a Professora  Déborah testemunhou o próprio MEC adquirindo mais de 100 milhões de exemplares de suas coleções de Língua Por-tuguesa e de Matemática para distribuir nos municípios participantes do Projeto Nordeste (1994 -1999). Nesse caso, o  processo de escolha não foi dos professores, mas da própria SEF, com anuência do Banco Mundial.

11   Sobre o que é e como funciona o Guia de Livros Didáticos, ver Capítulo 1.

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atender às expectativas dos PCN, do PNLD, do MEC, da SEB, do Plano Decenal, da LDB, da UNESCO, da UNICEF, do PNUD, do Banco Mundial, da USP e da UFPE (responsáveis pelas avaliações), não é mesmo? Impossível sucesso maior. Só para avisar os desconfiados: a avaliação positiva dos livros da Coleção Caminhos não é fruto de decisões internacionais. Pelo contrário. Ela foi feita por especialistas brasileiros atuantes em uni-versidades nacionais sob a coordenação de eminentes autoridades no ensino de Ciências, como o Professor Doutor Nélio Marco Vicenzo Bizzo, da Universidade de São Paulo e o Professor Doutor Antonio Carlos Pavão, da Universidade Federal de Pernambuco.

Além do sucesso intelectual expresso pelos resultados na avaliação do MEC, a Coleção Caminhos da Ciência também foi muito bem acolhida pelos professores das escolas públi-cas brasileiras, apesar de sua inovadora abordagem construtivista. Ao longo de 10 anos, a Caminhos vendeu mais de 7 milhões de exemplares e foi utilizada por mais de 12 milhões de alunos. São números para lá de significativos, embora sequer cheguem perto dos núme-ros da Profressora Déborah…

Nós tomamos gosto pelo ofício de escrever livros didáticos. Tornou -se, com o passar dos anos, nossa principal atividade profissional. O trabalho com formação de professores foi deixado de lado, assim como a sala de aula. As assessorias internacionais na área am-biental também foram descartadas. Nosso foco passou a ser o livro didático, com muito prazer. Afinal, é realmente um trabalho instigante do ponto de vista intelectual, mais de-safiador do que a elaboração de um mestrado ou de um doutorado, por exemplo, embora não seja tarefa para qualquer um. Basta verificar a enorme quantidade de teses que criticam o livro didático e constatar o número ínfimo de professores e especialistas que realmente se dispõem a escrever uma obra dessa natureza. O desafio de planejar e desenvolver por escri-to sequências de aprendizagem que trazem informações e atividades não é uma tarefa sim-ples. Quando se soma a isso a necessidade de se apresentar fatos, conceitos e explicações complexas dos vários campos científicos para crianças e jovens que começam a dominar a leitura e a escrita, a coisa fica ainda mais complicada. Se acrescentarmos a exigência de atender às novas diretrizes traçadas para a educação brasileira, que não são poucas, e tam-bém as prerrogativas teóricas e didáticas das correntes de ensino mais atuais, nem se fala… Mas, mesmo assim, é um excelente desafio e um imenso prazer enfrentar esses problemas e encontrar soluções que resultem em um livro voltado para a aprendizagem.

Em 2003, nosso entusiasmo como autores encorajou -nos a dar um passo adiante: mon-tar uma editora formada exclusivamente para publicar livros de qualidade que realmente refletissem as opções teóricas e didáticas de seus autores. Nossa intenção era a de atender exclusivamente aos programas de livros do governo. Queríamos produzir livros para o aluno das escolas públicas, considerando o conhecimento atual acerca das suas condições de aprendizagem. Queríamos livros para o professor da rede pública, apresentando -lhe um grande leque de opções para poder planejar mais livremente as suas aulas. Queríamos utili-zar todo o nosso potencial enquanto educadores e editores para contribuir com a melhoria do ensino no país. Nós também acreditávamos no papel transformador do livro didático.

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edi-toriais faziam o inverso: publicavam livros sem autores, fruto do trabalho de editores – que passavam a ser os grandes “especialistas em livros didáticos”. Mas estávamos confiantes no papel do autor no processo editorial, não apenas como fornecedor de conteúdo. E a ideia básica de nossa editora logo se revelou certa. No primeiro ano de existência da Sarandi fo-mos capazes de produzir cinco livros, formando duas coleções: uma de Ciências Naturais e outra de Alfabetização. Isso com uma equipe de apenas seis pessoas! Além de nós, autores, dois funcionários cuidavam da preparação dos textos, outros dois nos ajudavam com as imagens e havia mais duas pessoas que cuidavam do gerenciamento da empresa. Depar-tamento de propaganda? Não. DeparDepar-tamento comercial? Não. Divulgadores: nenhum. A Editora Sarandi não tinha e nunca teve equipe de divulgadores ou de distribuidores.

Nosso entusiasmo cresceu quando o MEC publicou a determinação de disciplinar a divulgação dos livros didáticos no âmbito do PNLD13. O edital do PNLD 2007

introdu-ziu essa inovação por meio da Portaria nº 2.963/2005 estabelecendo regras para evitar as interferências indevidas das editoras na escolha dos livros a serem adquiridos pelo FNDE. Era a resposta do Poder Público aos excessos das grandes editoras no processo de divulga-ção. Tais excessos incluíam desde a distribuição de brindes (uma autora amiga nossa nos contou que viu de perto um divulgador sortear máquina de fazer pão entre os professores e diretores das escolas que escolhessem o livro da sua editora), até a interferência direta na rotina das escolas, tais como a presença indiscriminada de divulgadores no espaço escolar (há quem diga que alguns deles ajudam os diretores e coordenadores a preencherem os pedidos para o FNDE!) e até mesmo a suspensão das aulas para a realização de verdadeiros “malhos de venda” sob o disfarce de palestras de capacitação de professores (essa nós vimos e estávamos lá: reuniram mais de 700 professores e suspenderam a aula de mais de 20 mil crianças!). A Portaria nº 2.963/2005 foi, portanto, da maior relevância e pertinência. Os divulgadores foram impedidos de entrar nas escolas durante o período de escolha dos livros pelos professores. Também foram suspensas as palestras nas escolas, que não pude-ram mais acontecer durante o período da escolha dos livros. A pressão dos grandes grupos editoriais sobre os professores, os diretores e as secretarias de educação ficou, assim, sob certo controle. Alguma regulamentação é sempre melhor do que nenhuma e o aprimora-mento do PNLD, nesse sentido, foi muito positivo para todos os atores envolvidos, apesar das inúmeras pressões que os grandes grupos editorias fizeram no FNDE para reverter as determinações da Portaria nº 2.963/2005.

Com a divulgação regulamentada, a ação das editoras para promover suas obras se res-tringiria basicamente à distribuição de amostras de livros. Sem os divulgadores, a disputa ficaria nos materiais impressos. Os livros falariam por si. Afinal, nem sempre os professores conseguem compreender as informações das resenhas do Guia de Livros Didáticos14.

Quan-do conseguem, fica sempre a dúvida sobre como os livros presentes no Guia realmente são, pois não os têm em mãos. Para a Editora Sarandi e outras pequenas editoras, essa inovação do PNLD representou uma oportunidade ímpar de concorrer de forma mais justa com os

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grandes grupos editoriais, apesar das enormes diferenças. Bastava mandar os nossos livros para os professores analisarem em conjunto com as resenhas do Guia.

Mas o nosso entusiasmo cresceu muito mais quando soubemos que as duas primeiras coleções da Sarandi foram aprovadas no PNLD 2007. No Guia de Livros Didáticos as resenhas da avaliação foram favoráveis, com destaque para a obra de Ciências. Naquele ano, nós fomos os autores com maior número de obras desse componente curricular par-ticipando de um PNLD. A Coleção Caminhos da Ciência, embora ainda sob contrato de outra editora, também havia sido aprovada com elogios.

Eficiência na produção, contexto favorável para a divulgação, concorrência regulamen-tada e aprovação dos livros… Não deu outra. A Editora Sarandi realizou com sucesso a primeira venda de seus livros. Com apenas cinco livros e duas coleções, abarcarmos cerca de 4% do total de livros de Alfabetização adquiridos pelo FNDE naquele programa e aproximadamente 6% dos livros de Ciências. Na prática, foram quase 900 mil exemplares. Para uma grande editora, esses números podem ser irrisórios. Mas para nós, com apenas oito funcionários15, foram números para lá de significativos. Vale lembrar que a Sarandi

não comercializa seus livros junto às escolas particulares. Logo, a venda feita em 2006 para o FNDE, após três longos anos de trabalho sem faturamento, foi realmente a primeira venda. Primeira e única. Única?! Sim, única. Depois do PNLD 2007, os livros da Sarandi passaram a ser sistematicamente reprovados nos programas seguintes: 2010 e 2011. Até mesmo a tão elogiada Coleção Caminhos da Ciência foi, em 2010, rejeitada pelos avalia-dores da equipe de Ciências e excluída do programa.

Nossa primeira venda ocorreu com sucesso justamente porque o FNDE aprimorou o PNLD e garantiu condições mais equânimes para que todas as editoras inscritas partici-passem livremente dos programas de livro (um dos seus pressupostos básicos). A regula-mentação disciplinatória foi eficaz para controlar os ferozes mecanismos da concorrência desleal. Isso nos animou. Para o programa seguinte, o PNLD 2010, nós ampliamos nosso catálogo e desenvolvemos três novas coleções relacionadas aos componentes curricula-res de Letramento e Alfabetização Linguística, Alfabetização Matemática e Matemática. Além disso, nosso contrato com a editora que até então publicava Caminhos expirou e pudemos trazer esse nosso primeiro trabalho para a Sarandi. No PNLD 2010, portanto, inscrevemos 17 livros que compunham, na ocasião, seis coleções distintas. Se com apenas cinco livros já estávamos satisfeitos, imaginávamos que uma quantidade três vezes maior poderia alavancar de vez a Sarandi e firmá -la no mercado editorial. Estávamos certos sobre a aprovação das obras. Afinal, as duas coleções de Ciências (Caminhos e Ponto de Partida) já haviam sido aprovadas com elogios nos programas anteriores; uma de nossas coleções de Letramento e Alfabetização Linguística, agora intitulada Projeto ALLE, também já tinha sido aprovada com algumas sugestões para sua melhoria. De qualquer forma, no PNLD anterior, a Coleção Projeto ALLE ficou em sexto lugar no ranking das obras adquiridas pelo FNDE (dentre as 47 obras ofertadas ao professorado no Guia do Livro Didático

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PNLD 2007 – Alfabetização), sendo a primeira dentre as coleções com propostas inova-doras (as cinco primeiras coleções mais vendidas baseavam -se em métodos tradicionais de ensino, dentre eles, o método da silabação que o MEC combatia há tanto tempo). As coleções de Alfabetização Matemática e Matemática também já haviam participado de programas anteriores e sido aprovadas. Suas autoras, insatisfeitas com o plano de divulga-ção dado às suas obras pela editora anterior, recém -ingressavam na Sarandi. Apenas nossa segunda coleção de Letramento e Alfabetização Linguística, também sob o selo Ponto de Partida, era inédita.

Foi, portanto, com imensa surpresa que recebemos a informação de que as nossas obras tinham sido reprovadas16. Não que alguém do MEC ou do FNDE tenha entrado em contato

para dar a notícia ou pelo menos publicado em algum veículo oficial… Não. A notícia da re-provação chegou pela mera constatação de que nossos livros não constavam do Guia de Livros Didáticos PNLD 2010. Não constam? Como assim?! Olha direito!! Foi aí que descobrimos que, se a reprovação em si já é um fato de grande constrangimento, a sucessão de eventos em torno da reprovação e da obtenção e análise do relatório de reprovação é pior ainda.

Assim que tomamos conhecimento da reprovação, solicitamos junto à SEB os rela-tórios de reprovação elaborados pela coordenação da avaliação. Embora o Guia de Livros Didáticos do PNLD 2010 tenha sido publicado no site do FNDE em 16 abril de 2009, tivemos de esperar por três longas semanas com muita angústia para que esses relatórios chegassem até nós17. Nossa intenção era a de identificar o quanto antes os graves

proble-mas de nossas obras que culminaram em sua exclusão do programa. Esse é o movimento natural de quem não tem nada a temer e acredita no processo. Como autores e editores, especulávamos se havíamos cometido algum erro na inscrição, omitido algum documen-to, entregado livros com defeidocumen-to, cometido algum erro grave de conteúdo. Em momentos como esse, a imaginação é fértil. Todavia, o que verificamos ao ler os relatórios de reprova-ção foi uma miríade de erros, alguns deles tão primários que se comparam àquelas famosas compilações de erros e frases esdrúxulas das provas de redação dos exames finais do Ensino Médio, conhecidas como “pérolas do ENEM”. Além de inúmeras “pérolas”, também iden-tificamos uma quantidade inexplicável de ilegalidades, erros factuais e exorbitâncias dos avaliadores. Ficamos estarrecidos. O que fazer? Com quem falar? Não era possível aceitar tantos erros18

Ainda incrédulos e com boa dose de ingenuidade, tentamos recorrer à SEB por meio de um relatório elaborado em apenas cinco dias (!) no qual refutamos todos os argumentos presentes nos relatórios de reprovação. Como fomos ingênuos… Quem analisou a perti-nência de nossa refutação foi a própria equipe da avaliação. É claro que os avaliadores do

16   As coleções dos componentes curriculares Alfabetização Matemática e Matemática, das autoras Regina Maria  Chacur, Maria Inez Cerullo e Maria Tomie Shirahige foram aprovadas. Nós atuamos como autores em parceria com  outros professores nas demais coleções inscritas pela Sarandi no PNLD 2010, todas elas reprovadas.

17   Os prazos entre a publicação do Guia de Livros Didáticos  e a entrega do relatório de exclusão foram regulamenta- dos no Decreto nº 7.084/2010, que institucionaliza o PNLD como lei e apresenta uma série de aprimoramentos impor-tantes no programa. Mais informações sobre o assunto nos Capítulos 1 e 7.

(16)

PNLD 2010 não reconheceriam os seus próprios erros. Seria o mesmo que assinar uma confissão!

O resultado é que nossas obras de Ciências e de Letramento e Alfabetização Linguística ficaram de fora não apenas do PNLD 2010, mas também de suas edições de 2011 e 2012. Sim, são três anos sem venda, nada de faturamento. Fora o comprometimento moral e intelectual. Ainda por cima temos de lidar com o status de “autor reprovado”. Pior ainda: para inscrevermos novamente nossa obra, o que só poderá ocorrer no PNLD 2013, tere-mos de incorporar os erros dos avaliadores em nossos livros! Isso, na prática, inviabiliza a correção e, portanto, a reinscrição. Afinal, como autores, discordamos em acrescentar uma informação errada em nossos livros. Mesmo que a pedido dos avaliadores do PNLD 2010. Se o leitor for benevolente conosco e curioso o suficiente para percorrer as páginas deste livro, atestará que os erros que os avaliadores cometeram na avaliação das nossas obras são mesmo escandalosos19.

De certa forma, o trabalho dos avaliadores do PNLD é muito fácil e, na maioria das vezes, tem decorrências muito positivas. Alguns ganham fama com suas críticas, princi-palmente no meio acadêmico. Muitos aproveitam essa experiência para impulsionar suas carreiras. Avançam em seus estudos, defendendo teses de mestrado ou doutorado que têm como objeto de análise os livros didáticos por eles próprios avaliados no PNLD. Prestam concurso, ingressam na universidade como professores. Surge também a oportunidade de ingressar no mercado privado. Muitos passam a fazer assessoria às editoras, conferindo a qualidade dos livros antes da inscrição em um programa. Alguns avaliadores tornam -se autores. Tudo isso é legítimo. Mas o fato é que os avaliadores do PNLD pouco ou quase nada arriscam. Quem fica sabendo do acerto ou do erro dos argumentos da sua crítica? Ninguém! Quem pode discordar das referências didático -pedagógicas de seus argumentos? Ninguém! E se as suas referências conceituais estiverem erradas? Ninguém nunca saberá de nada porque o próprio PNLD apresenta brechas que permitem ao avaliador exceder em seu poder discricionário. Como os relatórios da avaliação (tanto dos livros aprovados como dos livros excluídos) não são divulgados pela SEB, pelas editoras ou pelos autores, verifica--se atualmente um ciclo sem fim no qual obras (não apenas as nossas) são reprovadas com base em justificativas incorretas e/ou infundadas.

A bem da verdade é que nossa experiência no PNLD 2010 nos fez perceber que alguns avaliadores analisam com superioridade aqueles (autores e editores) que lhes submetem seu trabalho e sua reputação. Ganham fama com as críticas negativas que até podem ser diver-tidas de escrever e logo se tornam best -sellers no meio acadêmico. Mas a pura realidade que os avaliadores (pelo menos alguns deles) devem encarar é que o mais simples livro didático traz em si desafios intelectuais e profissionais que a academia jamais poderá proporcionar ao pesquisador.

(17)

Nós autores, por outro lado, arriscamos tudo: trabalho e reputação.

Acreditamos na atuação das equipes de avaliação do PNLD e no importante papel que as universidades têm na constituição de políticas públicas mais democráticas e menos centrali-zadoras. Esse é um dos méritos dos gestores do MEC e do FNDE em sua incansável defesa do PNLD e no imenso esforço que fizeram nos últimos anos para aprimorar um programa que, em sua essência, é um programa público que envolve cerca de 1 bilhão de reais por ano. Acreditamos profundamente que o Decreto nº 7.084/2010 resolverá uma parte im-portante dos problemas por nós vivenciados no PNLD 2010. Mas ainda há muito para avançar. Os editais dos próximos PNLD representam o instrumento fundamental para esse aprimoramento. Aprimoramento que interessa a autores e editoras e também a todas as pessoas interessadas na construção de uma sociedade mais transparente e justa.

Os acontecimentos ocorridos no PNLD 2010 que resultaram na reprovação de 12 livros nossos, porém, desafiam a nossa percepção dos fatos e, temos certeza, também desafiará a per-cepção do nosso leitor. Embora sejamos árduos defensores do PNLD e da avaliação dos livros, somos obrigados a assumir a palavra e denunciar esses fatos. Como ficará evidente ao longo dos próximos capítulos, trata -se de uma imposição que nos foi feita pelos próprios avaliadores do PNLD 2010. É como se esta nossa publicação tivesse que falar por nós, uma vez que as conversas com os nossos interlocutores reais nada ou pouco nos ajudaram.

Trata -se então de narrar os acontecimentos do PNLD 2010. Esse é o objetivo deste livro. De certo modo, o que se pretende aqui é tão somente fornecer elementos concretos para que os gestores do PNLD possam aprimorar os mecanismos da avaliação dos livros didáticos. Fragmentos de provas, depoimentos esparsos, pistas tênues, indícios, sinais que apontam falhas, distorções e irregularidades na avaliação dos livros didáticos já existem aos montes20. Para que realmente se possa chegar a um veredicto, faltava alguém falar a

verdade, de verdade.

Falar, por exemplo, que a avaliação do PNLD 2010 apresenta imperícia e negligência ao apontar erros inexistentes; imperícia ao exigir que se adote conceitos errados; ilegali-dades ao avaliar com base em critérios que não constam ou que contradizem o Edital do PNLD 2010; contradição com relação a avaliações anteriores, afrontando a opinião de outras equipes de avaliação.

Falar também sobre o fato da maioria dos supostos erros apontados pelos avaliadores do PNLD 2010 para reprovar nossas obras estarem também presentes em todas ou em grande parte das obras aprovadas nesse mesmo programa, o que constitui prova de violação ao princípio da isonomia21.

20   MUNAKATA, K. Produzindo livros didáticos e paradidáticos. Dissertação (Doutorado em História e Filosofia da  Educação): Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1997, p. 14. 

(18)

As consequências dos erros da avaliação que levaram à exclusão das coleções Caminhos da Ciência, Ponto de Partida Ciências, Projeto ALLE e Ponto de Partida Letramento e Alfabetização Linguística do PNLD 2010 não se limitam ao programa de 2010 e suas re-posições, visto que o Edital do PNLD 2010 e o Decreto nº 7.084/2010 determinam que os livros didáticos reprovados só poderão ser reapresentados nos programas posteriores, desde que tenham sido reformulados com base nos pareceres emitidos. Também queremos falar sobre isso.

Notas de esclarecimento

1. Como está organizado este livro

A estrutura e o funcionamento do PNLD são apresentados no Capítulo  1, quando a etapa da avaliação pedagógica é descrita em seus aspectos formais, de acordo com os últimos editais. Destaca -se neste capítulo a importância do Decreto nº 7.084/2010 e são antecipadas algumas críticas à atual regulamentação – críticas que serão aprofundadas no Capítulo 2 e mais pormenorizadas no Capítulo 7. No Capítulo 2, o foco é a avaliação pedagógica e as consequências práticas que suas limitações impõem aos autores e editores. Já neste capítulo, faz -se um recenseamento inicial acerca dos erros cometidos pelos ava-liadores do PNLD 2010 nos relatórios de reprovação das nossas obras. Os erros, os falsos argumentos, os exemplos fraudados, as aleivosias e as ilegalidades presentes no Relatório de Reprovação da Coleção Caminhos da Ciência são apresentados no Capí tulo  3. Em seguida, no Capítulo 4, discorremos sobre a Coleção Ponto de Partida Ciências e identifi-camos e comprovamos as falhas e as irregularidades cometidas na avaliação desta Coleção. Os Capítulos 5 e 6 denunciam os erros, os falsos argumentos, os exemplos fraudados, as aleivosias e as ilegalidades cometidas pelos avaliadores do PNLD 2010 na avaliação das coleções Projeto ALLE e Ponto de Partida Letramento e Alfabetização Linguística. Então, finalmente, no Capítulo 7, apresentam -se algumas soluções simples. Afinal, a nossa inten-ção é a de preservar o PNLD e ajudar seus gestores a aprimorá -lo.

2. Quem são os “avaliadores do PNLD 2010”?

Ao longo de todo o livro nós nos referimos aos “avaliadores do PNLD 2010”. Quem são eles? Não sabemos. Assim como os delatores da Santa Inquisição eram mantidos em segredo, o mesmo acontece com os avaliadores do PNLD. Os avaliadores não assinam o relatório de reprovação. Quem faz isso são o Coordenador de Área e o representante da Comissão Técnica do PNLD de cada área do conhecimento.

(19)

nossas denúncias para toda a equipe de avaliadores do PNLD 2010. Muito pelo contrário. No PNLD 2010, os livros de Ciências e de Letramento e Alfabetização Linguística foram avaliados por mais de 80 especialistas e temos certeza de que boa parte destes avaliadores se dedicaram ao trabalho avaliatório com afinco, competência e sincera isenção. Logo, insistimos que as críticas feitas neste livro se restringem aos “avaliadores do PNLD 2010” responsáveis pela avaliação dos nossos livros. As nossas críticas também são dirigidas aos Coordenadores de Área e aos representantes da Comissão Técnica do PNLD que assina-ram os relatórios de reprovação. O motivo é óbvio, ao firmarem os documentos com os erros que relatamos neste livro, eles afiançaram as afirmações dos avaliadores das nossas obras e apropriaram -se dos erros que aqueles cometeram.

Bibliografia

ABRALE. Memória: Professor Scipione Di Pierro Netto (1926 – 2005).

BATISTA, A. A. G. Livros Escolares de Leitura no Brasil – elementos para uma história. Campinas: Mercado das Letras, 2009. BATISTA, A. A. G. Um objeto variável e instável: textos impressos e livros didáticos. In: ABREU, M. (Org.). Leitura, história e história da leitura. Campinas: Mercado das Letras, 1999.

BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Guia de Livros Didáticos PNLD 2010: ciências. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria da Educação Básica, 2009.

BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Guia de Livros Didáticos PNLD 2010: letramento e alfabetização/ língua portuguesa. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria da Educação Básica, 2009.

BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Guia do Livro Didático 2007: ciências. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria da Educação Básica, 2006.

BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Guia do Livro Didático 2007: alfabetização. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria da Educação Básica, 2006.

DOLCI, Maria Inês. O Cartel dos Livros Didáticos. In: Caderno Vitrine. Folha de S.Paulo, 30/jan/2010. FREITAG B. et al. O livro didático em questão. São Paulo: Cortez, 1989.

IVO, Consuelo. Caderninhos da Déborah: a história do livro didático passa por aqui. In: Revista Comunicação & Educação. São Paulo: CGA/ECA/USP: Paulinas, 1994.

MENEZES, E. T.; SANTOS, T. H. Livro didático (verbete). Dicionário Interativo da Educação Brasileira – EducaBrasil. São Paulo: Midiamix Editora, 2002.

MUNAKATA, K. Capítulo 15 – Devem os livros didáticos de história ser condenados?. In: ROCHA, H., MAGALHÃES, M., GONTIJO, R. (Org.). A história da escrita escolar – memória e historiografia. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2009.

MUNAKATA, K. Livro didático: produção e leituras. In: ROCHA, H., MAGALHÃES, M., GONTIJO, R. (Org.). A história da escrita escolar – memória e historiografia. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2009.

MUNAKATA, K. Produzindo livros didáticos e paradidáticos. Dissertação (Doutorado em História e Filosofia da Educação): Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1997.

(20)

Siglas

ABRALE – Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos ABRELIVROS – Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento

CEALE – Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita CNLD – Comissão Nacional do Livro Didático

COLTED – Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático ENEM –Exame Nacional do Ensino Médio

FAE – Fundação de Apoio ao Estudante

FENAME – Fundação Nacional do Material Escolar

FNDE – Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais INL – Instituto Nacional do Livro Didático

IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo LDB – Lei de Diretrizes e Base

MEC – Ministério da Educação PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais

PISA – Programa Internacional de Avaliação de Estudantes PLIDEF – Programa do Livro Didático do Ensino Fundamental PNBE – Programa Nacional Biblioteca da Escola

PNLD – Programa Nacional do Livro Didático

PNLEM – Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PUC – Pontifícia Universidade Católica

SEB – Secretaria de Educação Básica SEF – Secretaria de Ensino Fundamental UFF – Universidade Federal Fluminense UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais UFPE – Universidade Federal de Pernambuco UFSCar – Universidade Federal de São Carlos

UNESCO – The United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization UNICAMP – Universidade de Campinas

(21)

CA

PÍTULO

1

O PNLD e os

melhores livros para

a escola pública

O

Programa Nacional do Livro Didático1 é,

atualmen-te, o segundo maior programa de distribuição de li-vros didáticos do mundo, ficando atrás apenas para o programa chinês2. Trata -se de um enorme esforço do Estado

brasileiro para suprir os alunos das escolas públicas com livros didáticos, paradidáticos, dicionários e periódicos de forma gra-tuita e regular. Para se ter noção do tamanho do PNLD, basta consultar a Tabela 1.1 e conferir alguns números do PNLD rela-tivos ao ano letivo de 2010.

Os custos do programa são igualmente enormes. Segundo o Relatório de Gestão do FNDE relativo ao exercício de 2008, os gastos do Governo Federal com os programas de materiais didáticos (PNLD e PNLEM) totalizaram, naquele ano, quase um bilhão de reais. Foram gastos mais de R$ 900 milhões com a aquisição, a armazenagem e distribuição de livros e periódicos,

1   O Decreto nº 7.084/2010 reuniu em um só programa, sob a designação “PNLD”,  os dois programas de livros e materiais didáticos do Governo Federal que existiam  até aquela data: o PNLD (que atendia os alunos do Ensino Fundamental) e o PNLEM  (que atendia os alunos do Ensino Médio). Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/ index.php/pnld -legislacao> (acesso: maio/2010).

(22)

a avaliação e a publicação do Guia de Livros Didáticos, dentre outras ações. A Tabela 1.2 sintetiza o destino dado aos recursos daquele programa.

T A B E L A 1 . 1 Programas de livros didáticos para o ano letivo de 2010

Ano de

aquisição Programa

Alunos beneficiados

Escolas beneficiadas

Livros adquiridos

2009 PNLD 2010 28.986.104 136.781 103.581.176

2009 PNLEM 2010 7.630.803 17.576 11.189.592

Total 36.616.907 154.357 114.770.768

Fonte: FNDE. Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/index.php/pnld ‑dados ‑estatisticos> (acesso: abril/2010).

T A B E L A 1 . 2 Custos dos programas de livros didáticos no exercício de 20083

Componente do custo PNLD 2009 PNLEM 2009 Total

Livros didáticos R$ 307.352.497,26 R$ 417.999.711,04 R$ 725.352.208,30 Livros p/ alunos c/ surdez R$ 3.735.776,00 – R$ 3.735.776,00 Periódicos R$ 15.101.882,50 R$ 184.451,73 R$ 15.286.334,23

Avaliação R$ 11.355.523,60 – R$ 11.355.523,60

Guia do Livro Didático – R$ 192.467,46 R$ 192.467,46 Distribuição R$ 62.914.374,82 R$ 86.163.271,74 R$ 149.077.646,56

Armazenagem R$ 468.622,82 – R$ 468.622,82

Controle de qualidade R$ 1.895.950,00 R$ 135.199,30 R$ 2.031.149,30

Total R$ 402.824.627,00 R$ 504.675.101,27 R$ 907.499.728,27

Fonte: BRASIL. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Relatório de gestão do FNDE: exercício de 2008. Brasília: FNDE, 2009.

Considerando os números do PNLD, é importante que o leitor atente para a impor-tância não apenas social, cidadã, desse programa cujo funcionamento é complexo, mas bastante eficaz. Para que seja possível compreender a estrutura e o funcionamento do PNLD e as críticas que fazemos aos mecanismos de avaliação e aos acontecimentos que sucederam na avaliação de nossas obras no PNLD 2010, faremos neste capítulo uma bre-ve (nem tanto assim) descrição do programa com base nos moldes do PNLD definidos no Decreto nº  7.084/20104. Todavia, em diversos momentos, será necessário também

descrever as normas que regeram os PNLD anteriores, em particular o PNLD 2010. Essa

3   No exercício de 2008, as aquisições de livros referem -se ao PNLD 2009 (reposição de livros do Ensino Fundamen-tal) e ao PNLEM 2009 (compra integral do Ensino Médio).

(23)

descrição será importante para esclarecer os pontos falhos do programa e a importância das sugestões que faremos ao final do livro, no Capítulo 7.

O modelo atual do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), consolidado pelo Decreto nº 7.084/2010, começou a ser implementado em 1996, no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, com a publicação do Edital do PNLD 1997 (ver Introdução para mais informações). Este edital:

‹

‹ institucionalizou a universalização do acesso ao livro didático no Brasil, com a dis-tribuição para todos os alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental (denominadas então 1ª a 4ª séries)5;

‹

‹ implantou a avaliação pedagógica que passou a excluir do Guia de Livros Didáticos aque-les livros que, na opinião dos “especialistas” das universidades sob a coordenação da Secreta-ria de Ensino Fundamental (SEF) – atual SecretaSecreta-ria de Educação Básica (SEB) –, apresen-tavam erros conceituais, informações desatualizadas, abordagens pedagógicas ultrapassadas, preconceito ou discriminação de qualquer tipo, falhas no projeto gráfico ou na impressão;

‹

‹ classificava as obras aprovadas em Recomendadas com Distinção (RD), Recomendadas (R); Recomendadas com Ressalvas (RR) e Não Recomendadas (NR);

‹

‹ abrangia os principais componentes curriculares (Alfabetização, Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia e Ciências); e

‹

‹ estabelecia a distribuição continuada de obras em ciclos de três anos, sendo os livros destinados à 1ª série consumíveis6, com reposição integral todos os anos; e os demais livros

não consumíveis, com reposição apenas parcial a cada ano (geralmente em torno de 13% da compra inicial).

Em 1997, a Fundação de Assistência ao Estudante (FAE), até então responsável pelos programas de material didático, foi extinta e a execução do PNLD passou a ser de respon-sabilidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Entretanto, a responsabilidade pela elaboração dos critérios de avaliação e a realização da avaliação pedagógica permaneceu com a Secretaria de Ensino Fundamental (SEF) do Ministério da Educação. Nesse mesmo ano, foi publicado o Edital do PNLD 1998, que ampliou o atendimento do PNLD para as séries finais do Ensino Fundamental (5ª a 8ª séries).

No PNLD 2001, além dos livros didáticos, também foram distribuídos dicionários de Língua Portuguesa para os alunos de 1ª a 4ª séries. Nas edições seguintes do programa, a

distribuição de dicionários foi ampliada para os alunos de 5ª e 8ª séries7. Ainda em 2001,

tem início o fornecimento de livros didáticos em Braille para os alunos portadores de defi-ciência visual. Em 2003, o PNLD distribui atlas geográficos para as escolas que atendiam alunos de 5ª a 8ª séries e ofereciam Educação para Jovens e Adultos (EJA). Desde 2007,

5   Naquela ocasião, as escolas do estado de São Paulo escolheram seus livros de forma separada das demais escolas  do Brasil, mas foram atendidas com recursos do PNLD.

6   Livros consumíveis são aqueles que apresentam em seu projeto gráfico espaços para os alunos escreverem e, con-sequentemente, não podem ser reutilizados. Os livros não consumíveis não possuem espaço para escrita dos alunos e  são utilizados, por diferentes turmas de alunos, ao longo de três anos.

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os alunos com surdez, de 1ª a 4ª séries, recebem livro de Alfabetização e livro de Língua Portuguesa em Língua Brasileira de Sinais (Libras) e em CD -ROM.

Em 2004 foi implementado o Programa Nacional do Livro Didático do Ensino Mé-dio (PNLEM)8 visando estender a universalização do acesso ao livro didático para os

alunos do Ensino Médio. A primeira edição do programa (PNLEM 2005) atendeu ape-nas aos alunos do 1º ano do Ensino Médio de escolas do Nordeste nos componentes de Língua Portuguesa e de Matemática. Nas edições seguintes do PNLEM, o atendimento foi gradualmente ampliado para todos os alunos do território nacional e para outros componentes curriculares (Biologia, Física, Química, Geografia, História, Filosofia e Sociologia).

O Edital do PNLD 2010 apresentou modificações significativas, reflexo da implemen-tação do Ensino Fundamental de nove anos9. Também marcou o início do fornecimento

de livros de Língua Estrangeira Moderna (Inglês e Espanhol) para os alunos das escolas públicas brasileiras.

Em janeiro de 2010, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o Decreto nº 7.084/2010 que dispõe sobre os programas de material didático do Governo Federal. São eles: o PNLD (que passa a englobar os antigos PNLD e PNLEM) e o Programa Na-cional Biblioteca na Escola (PNBE). O novo instrumento legal consolidou muitas práticas bem -sucedidas dos programas do livro e apresentou novidades, em particular nas etapas da triagem e da avaliação. Todavia, como os editais dos PNLD 2011 e 2012 foram publicados antes do Decreto nº 7.084/2010, as novidades só terão efeitos práticos a partir do PNLD 2013 (cujo edital deverá ser publicado no segundo semestre de 2010).

Abrangência e periodicidade

O PNLD fornece gratuita e regularmente livros didáticos, dicionários e outros ma-teriais didáticos para as escolas de Educação Básica públicas das redes federal, estadual, municipal e do Distrito Federal. As edições do programa seguem ciclos trienais alternados, intercalando os três níveis de ensino da Educação Básica:

‹

‹ Nível I – 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental ‹

‹ Nível II – 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental ‹

‹ Nível III – Ensino Médio

Como os livros adquiridos são, na sua maior parte, livros não consumíveis, a cada ano faz-se a aquisição principal de um dos níveis de ensino e apenas a reposição (geralmente em torno de 13% da compra principal) dos livros dos outros dois níveis. A exceção é para os

8   FNDE – Resolução nº 38/2003.

(25)

livros consumíveis de Letramento e Alfabetização Linguística e Alfabetização Matemática destinados aos dois primeiros anos do Ensino Fundamental e também para os livros de Lín-gua Estrangeira. A Tabela 1.3 mostra o cronograma de atendimento relativo ao período de 2010 a 2015.

T A B E L A 1 . 3 Cronograma de atendimento do PNLD – 2010 a 2015

Programa

Nível I EF – 1° ao 5° ano

Nível II EF – 6° ao 9° ano

Nível III Ensino Médio

PNLD 2010 INTEGRAL reposição reposição

PNLD 2011 reposição INTEGRAL reposição

PNLD 2012 reposição reposição INTEGRAL

PNLD 2013 INTEGRAL reposição reposição

PNLD 2014 reposição INTEGRAL reposição

PNLD 2015 reposição reposição INTEGRAL

Fonte: FNDE e Resolução MEC ‑FNDE no 60/2009.

Os editais

As características de cada edição do PNLD são definidas por edital específico publicado no Diário Oficial da União, que pode ser obtido em versão digital no site do FNDE na In-ternet. O edital é o documento que estabelece as regras para inscrição, os prazos de entrega, os parâmetros da triagem. É nesse documento também que são definidos os critérios da avaliação.

Embora obedeçam às linhas gerais definidas pelos instrumentos legais que regem os programas do livro, os editais do PNLD não guardam relação entre si e podem incluir exi-gências novas entre um edital e outro. Algumas exiexi-gências podem até ser imprevisíveis para autores e editores. No caso do PNLD 2010, por exemplo, a exigência da nova ortografia da Língua Portuguesa e as mudanças decorrentes da implantação do Ensino Fundamental de nove anos só foram definidas pouco antes da publicação do edital e os detalhes especí-ficos apenas após a sua publicação10.

Os editais geralmente são publicados com mais de dois anos de antecedência do ano letivo ao qual se destinam as obras da compra integral. O Edital do PNLD 2010 foi uma exceção. Em vista das inúmeras inovações que trazia, sua publicação aconteceu somente em 16 de janeiro de 2008. Caso seguisse a prática normal, ele seria publicado no segundo semestre de 2007.

(26)

A inscrição

A inscrição corresponde à primeira etapa de uma edição do PNLD. Ela tem início com a pré ‑inscrição das editoras, das coleções didáticas e dos autores via Internet. A inscrição propriamente dita consiste na entrega da documentação e dos exemplares dos livros em duas versões: a) exemplares caracterizados, idênticos aos que serão enviados às escolas; b) exemplares descaracterizados, isto é, sem a capa, a página de rosto, o verso da página de rosto e qualquer elemento que possa identificar a obra, a editora ou os autores11. Os exem‑

plares descaracterizados são destinados aos avaliadores pareceristas que, em tese, farão a avaliação das obras “às cegas” (isto é, sem identificar obra, autor ou editora), para evitar qualquer tipo de preconcepção ou influência externa.

O prazo para inscrição no PNLD geralmente é de 90 dias a partir da data de publica‑ ção do edital, mas esse prazo pode ser ampliado ou reduzido em função da conveniência do FNDE e da SEB, os executores do programa. Novamente, dada a excepcionalidade das suas exigências, o PNLD 2010 estabeleceu um prazo para a inscrição das obras de pouco mais de 120 dias.

A triagem

As obras inscritas são enviadas para a triagem. Esta fase consiste na análise técnica das características físicas12 das obras e ocorre sob a responsabilidade direta do FNDE. Tradi‑

cionalmente, o FNDE estabelece parceria com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT).

As obras cujas características físicas não estão de acordo com os dados informados na pré ‑inscrição ou não atendam às exigências técnicas do edital são sumariamente excluídas do PNLD. Na triagem, assim como na avaliação, a exclusão de um volume de uma coleção resulta na exclusão de toda a coleção. O Decreto nº 7.084/2010 permite que as editoras corrijam, no prazo máximo de cinco dias, falhas editoriais e/ou gráficas pontuais detecta‑ das na triagem13. Esta importante inovação terá efeito a partir do Edital do PNLD 2013.

A triagem também inclui uma etapa de pré ‑análise, realizada pela SEB, na qual é exami‑ nada a documentação e verificado se as obras reprovadas em edições anteriores do PNLD passaram por reformulação de acordo com o relatório de reprovação do PNLD anterior.

11   A página de rosto corresponde à primeira página (página 1) do livro. Seu conteúdo é definido pelos editais do 

PNLD que especificam que essa página deve conter informações sobre o nome da coleção, o ano a que se destina, o  componente curricular, o nome dos autores, a edição e a editora. O verso da página de rosto (página 2) também tem  seu conteúdo definido pelos editais e inclui o expediente do livro (onde se dá crédito às pessoas que participaram do  processo editorial), a ficha catalográfica etc. As figuras 5.19 e 5.20 (Capítulo 5) reproduzem a página de rosto e o verso  da página de rosto do livro do 1º ano da Coleção Projeto ALLE – Letramento e Alfabetização Linguística, reprovadas por  supostamente conter atividades de leitura que comprometem a formação leitora dos alunos.

12   A análise técnica verifica aspectos gráficos, como o formato do livro, a gramatura do papel e da capa, as falhas de  impressão, o número de páginas, a presença de elementos que identificam a obra nos exemplares descaracterizados etc.

13   BRASIL. Decreto nº 7.084, de 27/jan/2010. Diário Oficial da União, 27/jan/2010. Seção 1 – Edição Extra, artigo 18, 

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A exclusão da obra na fase de triagem não admite recurso. Este procedimento, consolida-do no parágrafo 1º do artigo 18 do Decreto nº 7.084/2010, é necessário, pois não tem

sen-tido gastar os recursos do PNLD na avaliação de obras que não apresentem a documentação adequada ou não conformam com as exigências técnicas do edital. Também é justificável excluir obras reprovadas que não corrigiram os erros graves apontados em avaliação anterior. Todavia, é indispensável destacar que este último aspecto da regra pressupõe uma avaliação pedagógica de qualidade, livre de erros grosseiros. Como será demonstrado nos próximos capítulos, esta regra cria problemas insolúveis para os autores quando o relatório de repro-vação justifica a exclusão de uma obra com base em erros que podem ser de interpretação, conceituais ou até mesmo decorrentes do excesso de rigor dos avaliadores (ver Capítulo 2).

A avaliação pedagógica

As coleções didáticas que passam pela fase de triagem são enviadas pelo IPT à Se-cretaria de Educação Básica (SEB) para se submeterem à avaliação pedagógica. A SEB estabelece convênios com universidades públicas que se responsabilizam pela organização e treinamento das equipes de avaliadores pareceristas. Cada componente curricular fica sob responsabilidade de uma universidade, que nomeia um coordenador responsável. A equipe coordenadora da avaliação de cada componente curricular conta ainda com a ajuda da equipe técnico -pedagógica da SEB, de coordenadores adjuntos, assessores, revisores, redatores e até mesmo leitores críticos. Embora o número de integrantes das equipes de avaliação varie conforme o componente curricular, podemos afirmar que essas equipes reúnem cerca de 50 pessoas por área. No caso do PNLD 2010, mais de 350 especialistas das universidades foram contratados pela SEB para fazer a avaliação dos livros inscritos naquele programa. A Tabela 1.4 apresenta dados sobre as equipes de avaliação referentes aos componentes de Ciências e de Letramento e Alfabetização Linguística.

Na avaliação do PNLD 2010, o componente Ciências ficou a cargo da Universidade Federal de São Carlos, que indicou o Professor Doutor Nelson Studart (UFSCar) como coordenador responsável da área e o Professor Doutor Antônio Carlos Pavão (UFPE) como responsável técnico do PNLD. O componente Letramento e Alfabetização Lin-guística, assim como o de Língua Portuguesa, ficou sob os cuidados da Universidade Federal de Minas Gerais, cuja coordenação de área foi encarregada à Professora Doutora Ceris Salete Ribas da Silva (UFMG – CEALE), sendo o Professor Egon de Oliveira Rangel designado como o responsável técnico do PNLD desse componente curricular.

Embora o Decreto nº 7.084/2010 não estabeleça qualquer exigência curricular para os avaliadores, o FNDE e a SEB declaram, em seus sites, que os mesmos devem ser “especia-listas”. A equipe coordenadora também convida pessoas de notório saber que colaboram no treinamento e nas orientações dadas aos avaliadores. Finalmente, vale destacar que o artigo 14 do Decreto nº 7.084/2010 consolida que as universidades contratadas para a

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se as instituições a quais estão vinculados devem ser ou não públicas) e/ou professores da rede pública de ensino. O decreto reafirma a necessidade essencial de que os especialistas contratados para a avaliação não sejam prestadores de serviço ou de consultoria em edi-toras participantes do programa e, ainda, que não devem possuir cônjuge ou parente até o terceiro grau entre os titulares de direito autoral ou de edição inscritos no PNLD, ou qualquer outra situação que configure impedimento ou conflito de interesse14. O objetivo

é garantir o princípio da isonomia e da livre participação que rege os programas do livro.

T A B E L A 1 . 4 Número de integrantes das equipes de avaliação

Letramento e

Alfabetização* Ciências**

Equipe técnica SEB 8 8

Comissão técnica PNLD 1 1

Coordenação 5 4

Assessoria (apoio técnico) 12 1

Leitor crítico das resenhas 7 1

Redator 5 0

Revisor 11 0

Avaliadores 31 44

Total 69 59

Fonte:

* BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Guia de Livros Didáticos PNLD 2010: letramento e alfabetização/língua portuguesa. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria da Educação Básica, 2009, pp. 2 ‑8.

** BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Guia de Livros Didáticos PNLD 2010: ciências. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria da Educação Básica, 2009, pp. 2, 3, 4.

Os critérios da avaliação

Os critérios utilizados na avaliação pedagógica das obras inscritas no PNLD são classi-ficados em dois grandes grupos: os critérios comuns que definem os parâmetros gerais que os livros didáticos devem atender, destacando aspectos relacionados à formação cidadã dos alunos e à sua relevância enquanto instrumento transformador das práticas da sala de aula (sobretudo no que se refere às contribuições que o livro didático deve fazer à atualização dos professores); e os critérios específicos, que definem os parâmetros conceituais e didá-ticos dos livros conforme as especificidades de cada componente curricular. Em ambos os grupos, alguns critérios são considerados fundamentais e o não atendimento aos mesmos implica, necessariamente, a exclusão da obra. São os chamados “critérios fundamentais e

Referências

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