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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO FACULDADE DE DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO BENÔNI ROSSI

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Academic year: 2019

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FACULDADE DE DIREITO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

BENÔNI ROSSI

EXECUÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PERANTE A JUSTIÇA DO TRABALHO

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EXECUÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PERANTE A JUSTIÇA DO TRABALHO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito das Relações Sociais, sub-área Direito do Trabalho, sob a orientação do Prof. Dr. Paulo Sérgio João.

(3)

EXECUÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PERANTE A JUSTIÇA DO TRABALHO

São Paulo, , de 2005.

BANCA EXAMINADORA

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RESUMO

O presente trabalho de dissertação traz em seu contexto uma análise crítica das disposições do inciso VIII do art. 114 da Constituição Federal, que atribui à Justiça do Trabalho a competência para executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a e II, da CF, decorrentes das sentenças que proferir.

São apontados no estudo conflitos existentes entre a sistemática de arrecadação de tributos pela Justiça do Trabalho e determinados princípios constitucionais, como da separação dos poderes, do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e da isonomia. Também está demonstrada a incompatibilidade do exercício dessa função atípica atribuída ao Juiz com o de sua principal e mais importante função - a prestação jurisdicional.

Para a demonstração dos limites da competência da Justiça do Trabalho na execução, de ofício, das contribuições sociais, há uma breve análise dos elementos da norma jurídica tributária. Somente as sentenças condenatórias e as decisões que homologam acordos judiciais podem gerar execução na Justiça do Trabalho, ou seja, aquelas que originam pagamentos no próprio processo do trabalho.

Também são traçados comentários à Lei 10.035, de 26.10.2000, que estabelece procedimentos para a liquidação e para a execução das contribuições previdenciárias de competência da Justiça do Trabalho. Em relação ao referido diploma legal, o presente estudo observa que normas de direito tributário foram inseridas na CLT sem a observância do que dispõe o inciso III do art. 146 da CF, no sentido de que cabe somente à lei complementar estabelecer normas sobre obrigação, lançamento e crédito tributários.

Ao final, há um breve estudo dos institutos da decadência e da prescrição incidentes sobre o direito da autarquia federal, o INSS.

A conclusão do estudo é no sentido de que a legislação que atribui à Justiça do Trabalho a obrigação de executar contribuições sociais deve ser alterada de imediato, sob pena de restar prejudicado o exercício da própria atividade jurisdicional e conseqüentemente da instituição, a Justiça do Trabalho.

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ABSTRACT

The present dissertation brings in its context a critical analysis of the provisions of the part VIII of the article 114 of the Federal Constitution, which attributes to the Labor Justice the competence to enforce, by himself, the social contributions which are foreseen in the article 195, I a e II, of Federal Constitution, resulting from the uttered sentences.

In the study there have been pointed conflicts which there are between the way of collecting tributes by the Labor Justice and certain constitutional principles, as the separation of the powers, as the due legal process, as ample defense, as contradictory and isonomy. It has also been demonstrated the incompability of the exercise of that atypical function attributed to the Judge with his main and most important function – the jurisdictional enforcement.

In order to demonstrate the limits of the competence of the Labor Justice in the enforcement by himself of the social contributions, there is a brief analysis of the elements of the juridical and tributary rule. Only the condemnatory sentences and the sentences which approve judicial accords can produce enforcement in the Labor Justice, that is, those which originate payment in the own process of work.

Comments are also made about the Law 10.035 ( 26.10.2000), which establishes procedures to the liquidation and to the enforcement of the social welfare contributions which are in the competence of the Labor Justice. Regarding to the aforesaid legal diploma, the present study remarks that rules from the tributary law have been inserted in the CLT, without observance of what it is decreed in part III of the article 146 of the Federal Constitution, that is, only a complementary law can establish rules about bond, entry and tributary credit.

At last, there is a brief study of the institutes of the decadence and of the prescription incident on the law of the federal autarchy, the INSS.

The conclusion of the study is that the legislation which attributes to the Labor Justice the obligation of enforcing social contributions should be altered immediately, under penalty of being affected the exercise of the own jurisdictional activity and consequently the institution, the Labor Justice.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...7

1 BREVE HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO ...11

2 INCONSTITUCIONALIDADE DO INCISO VIII DO ART. 114 DA CF...17

3 FUNÇÃO ARRECADATÓRIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO E OS ELEMENTOS DA ATIVIDADE JURISDICIONAL ...26

4 NORMA JURÍDICA TRIBUTÁRIA ...38

5 LIMITES NA COMPETÊNCIA ...48

6 COMENTÁRIOS À LEI 10.035/2000. PROCEDIMENTOS PARA A LIQUIDAÇÃO E A EXECUÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS...62

7 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA...83

8 ALÍQUOTAS...90

8.1 Dos Tomadores de Serviços...90

8.2 Dos Trabalhadores e Contribuintes Individuais ...94

9 BASE DE CÁLCULO ...95

CONCLUSÃO ... 103

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INTRODUÇÃO

A Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, que alterou o artigo 114 da Constituição Federal, acrescentando o parágrafo 3º, atribuiu à Justiça do Trabalho a competência para executar as Contribuições Sociais previstas no art. 195, I, a e II, da Constituição Federal, decorrentes das sentenças que proferir. A competência criada pela norma antes referida foi mantida com a publicação da nova Emenda Constitucional nº 45, de 31 de dezembro de 2004, passando a previsão para o atual inciso VIII do art. 114 da Constituição Federal. Tais contribuições sociais correspondem ao valor do tributo devido pelo empregador, ou pela empresa, incidente sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados à pessoa física em razão da prestação de serviços, com ou sem vínculo empregatício, bem como ao valor devido pelo trabalhador. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) também passou a ter novas disposições a partir da vigência da Lei 10.035, de 26.10.2000, relacionadas à apuração e à cobrança das contribuições previdenciárias decorrentes das sentenças trabalhistas.

(8)

Para isso, inicialmente se realizará uma rápida análise da evolução da legislação que gradativamente foi atribuindo responsabilidades ao Poder Judiciário até chegar ao ponto de

atribuir ao juiz a função de executar de ofício contribuições sociais.

Logo após, serão apontados os princípios e as disposições constitucionais que

conflitam com a sistemática imposta pelas Emendas Constitucionais já referidas e pela

legislação infraconstitucional que regulamenta a matéria. Os princípios do devido processo

legal, da ampla defesa, do contraditório e da isonomia não coadunam com a execução direta

de um tributo, sem que a parte tenha sequer participado de um processo na esfera

administrativa, perante o órgão competente. O princípio da separação dos poderes igualmente

terá grande relevância no presente estudo, pois a Justiça do Trabalho em realidade recebeu a

incumbência de arrecadar valores para uma autarquia do Poder Executivo, função que deve

desempenhar rotineiramente, no decorrer das execuções.

No quarto capítulo, abordar-se-á a função atribuída ao Juiz de executar de ofício as

contribuições sociais devidas pelas partes, bem como as possíveis incompatibilidades dessa

atividade atípica com a principal e mais importante função do Juiz - a prestação jurisdicional

– a qual possui elementos essenciais, como a independência e a imparcialidade. Todos que

atuam na área - ou de alguma forma possuem acesso aos dados da Previdência Social - sabem

que são significativos os valores cobrados pelo Judiciário Trabalhista a título de contribuições

sociais nas reclamações. Os Juízes do Trabalho passaram a ter mais uma função na fase de

execução dos processos: a de arrecadar mediante cobrança judicial o tributo devido pelas

partes, auxiliando diretamente o financiamento de nossa precária previdência social, que vem

cada vez mais sofrendo para manter o equilíbrio de suas contas. Será possível o Juiz se manter

(9)

tributo? Essa é uma questão importante que será amplamente abordada neste trabalho de

dissertação.

Também será analisada a norma jurídica tributária, que impõe a obrigação ao pagamento do tributo aos cofres do Estado e os elementos que integram essa norma, como a hipótese de incidência e a conseqüência da ocorrência do dito fato gerador, ou seja, aquele previsto na hipótese da norma. A análise feita neste tópico será essencial para a compreensão de determinadas incoerências do sistema, como a cobrança antecipada das contribuições sociais, se observadas as disposições da Lei 10.035, de 26.10.2000.

O presente estudo tem a finalidade de analisar questões relacionadas à nova competência da Justiça do Trabalho. Não se poderia deixar de fora, portanto, a discussão a respeito dos limites dessa competência, já que se tem observado posições divergentes na doutrina e também nas decisões proferidas pelo Poder Judiciário, ora no sentido de que somente as sentenças condenatórias e as decisões que homologam acordos judiciais podem gerar execução na Justiça do Trabalho, ora no sentido de que também cabe a esse órgão a execução de contribuições sociais devidas em razão do pagamento de valores efetuados em período objeto de decisão declaratória, como a que reconhece o vínculo de emprego.

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alterou a Consolidação das Leis do Trabalho possibilitando até mesmo que o INSS recorra das

decisões que homologam os acordos firmados entre as partes.

Em relação à Lei 10.035, ter-se-á a oportunidade de verificar que normas de direito tributário foram inseridas na CLT sem a observância do que dispõe o inciso III do art. 146 da CF, no sentido de que cabe somente à lei complementar estabelecer normas sobre obrigação, lançamento e crédito tributários.

Por fim, sempre buscando a lógica da aplicação das normas de direito tributário, por imposição da natureza das contribuições sociais, se fará um breve estudo dos institutos da decadência e da prescrição incidentes sobre o direito da autarquia federal, o INSS.

Também serão analisadas quais alíquotas se aplicam aos casos que geram a obrigação ao pagamento da contribuição social e a base de cálculo dessas contribuições, ou seja, quais parcelas integram o salário-de-contribuição.

(11)

1 BREVE HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO

O art. 12 da Lei nº 7.787, de 30/6/1989, estabelecia que “em caso de extinção de processos trabalhistas de qualquer natureza, inclusive a decorrente de acordo entre as partes, de que resultar pagamento de vencimentos, remuneração, salário e outros ganhos habituais do trabalhador, o recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social será efetuado incontinenti”. O parágrafo único desse mesmo artigo era no sentido de que “a autoridade judiciária velará pelo fiel cumprimento do disposto neste artigo”.

Evidentemente que a autoridade judiciária a que se referia a redação acima transcrita era o Juiz Trabalhista, que deveria “cuidar” para que as partes envolvidas no processo fizessem, o mais breve possível, os recolhimentos previdenciários sobre as parcelas pagas nas ações trabalhistas. A obrigação do Juiz, ou da autoridade judiciária, não estava bem definida, mas não vinculava o magistrado de forma direta à obrigatoriedade de exigir a comprovação do pagamento do valor da contribuição previdenciária.

O Tribunal Superior do Trabalho - TST - editou o Provimento nº 11, de 20/1/1990, determinando a observância do art. 12 da Lei nº 7.787/89. Segundo o provimento, de lavra do

1 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Provimento 1/90 da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho. DJ 06 mar. 1990, p. 1476.

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então Corregedor-Geral Ministro Marco Aurélio, os Tribunais Regionais do Trabalho

deveriam não só adotar medidas para que os devedores de parcelas trabalhistas decorrentes de decisão judicial demonstrassem o adimplemento do recolhimento das importâncias pertinentes devidas à Previdência Social, como também remeter cópia dos respectivos comprovantes e da sentença prolatada em cada processo à Procuradoria do órgão previdenciário.

O TST, na época, assumiu a posição constante do provimento para determinar que os Tribunais Regionais adotassem procedimentos que iam além daquilo que fora estabelecido em lei, no intuito de já colaborar com o órgão previdenciário. Não tinha, na lei, qualquer determinação de remessa de informações pela Justiça do Trabalho.

O art. 43 da Lei nº 8.212, de 24/7/1991, revogou o art. 12 da Lei 7.787/89, inserindo em nosso ordenamento jurídico a seguinte previsão: “em caso de extinção de processos trabalhistas de qualquer natureza, inclusive a decorrente de acordo entre as partes, de que resultar pagamento de remuneração ao segurado, o recolhimento das contribuições devidas à Seguridade Social será efetuado incontinenti”. A grande inovação veio com o teor do art. 44 da referida lei, no seguinte sentido: “a autoridade judiciária exigirá a comprovação do fiel cumprimento ao disposto no artigo anterior”. A revogação não foi expressa, mas tácita, pois tratou do mesmo tema.

Considerando a deliberação do Pleno do Tribunal, contida no Pedido de Providências nº 13/89 - Resolução 95/89, Resolve:

I Determinar aos Regionais a adoção de medidas objetivando alcançar a demonstração, pelos devedores de parcelas trabalhistas cuja satisfação tenha sido imposta por provimento judicial, do recolhimento das importâncias pertinentes devidas à Previdência Social, isto quando da satisfação dos débitos e visando à extinção do processo que os revelem;

II Anexados ao processo os respectivos comprovantes, serão extraídas cópias para remessa, juntamente com cópia da sentença prolatada, à Procuradoria do IAPAS.

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A lei nº 8.620, de 5/1/1993, alterou os artigos 43 e 44 acima citados, que passaram a ter a seguinte redação:

Art. 43 Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o juiz, sob pena de responsabilidade, determinará o imediato recolhimento das importâncias devidas à Seguridade Social.

Parágrafo único. Nas sentenças trabalhistas ou acordos homologados em que não figurarem, discriminadamente, as parcelas legais relativas à contribuição previdenciária, esta incidirá sobre o valor total apurado em liquidação de sentença ou sobre o valor do acordo homologado.

Art. 44.A autoridade judiciária velará pelo fiel cumprimento do disposto no artigo anterior, inclusive fazendo expedir notificação ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, dando-lhe ciência dos termos da sentença ou do acordo celebrado.

Veja-se que, até então, o Juiz Trabalhista tinha a função de exigir a comprovação do

pagamento do tributo e, caso a parte não fizesse a comprovação do recolhimento, expedia

ofício, não ocorrendo a execução da contribuição previdenciária nos autos do processo que

tramita na Justiça do Trabalho.

O Poder Judiciário Trabalhista sempre aceitou o papel de auxiliar o Instituto Nacional

de Seguridade Social - INSS, tendo inclusive o TST editado o Provimento nº 02/1993, em

15/9/1993, pelo então Corregedor-Geral Ministro Ermes Pedro Pedrassani, que estabelecia

procedimentos para que as empresas apresentassem cálculos relativos às contribuições

previdenciárias, assim como realizassem a juntada aos autos dos comprovantes de pagamento

do tributo. O teor do Provimento já antecipava procedimentos que posteriormente passaram a

ser previstos pela Lei 10.035/2000, como adiante se verá. Segundo o Provimento 02/1993:

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Art. 2º Os cálculos de liquidação de sentença exeqüenda consignarão os valores devidos a título de contribuição previdenciária, na forma da lei, para desconto nos pagamentos a serem efetivados.

Art. 3º Incumbe ao empregador, devedor das contribuições previdenciárias, efetivar o cálculo dos valores devidos e a serem deduzidos nos pagamentos correspondentes às condenações judiciais, quando não consignados em cálculos de liquidação, bem assim da cota patronal e das demais contribuições a seu cargo, para o correto cumprimento da sua obrigação legal.

Art. 7º Incumbe ao reclamado, devedor das contribuições previdenciárias, efetivar através de guia própria, por ele adquirida e preenchida, o recolhimento dos valores devidos, no estabelecimento arrecadador e comprovar nos autos do processo a que se refere, até o décimo quinto dia do mês subseqüente ao da competência, mediante uma via da guia com autenticação mecânica de recebimento ou cópia autenticada.

Pelos termos do provimento, a empresa devedora de contribuições previdenciárias

tinha a obrigação de calcular, recolher e comprovar, nos autos do processo trabalhista, o

tributo devido em razão da condenação sofrida na sentença.

Posteriormente, em 10/12/1996, o texto acima foi revogado pelo Provimento 01/1996,

que foi publicado com o seguinte conteúdo:

Art. 3º - Compete ao juiz da execução determinar as medidas necessárias ao cálculo, dedução e recolhimento das Contribuições devidas pelo empregado ao Instituto Nacional de Seguro Social, em razão de parcelas que lhe vierem a ser pagas por força de decisão proferida em reclamação trabalhista (art. 43 da Lei nº 8212/1991, com a redação dada pela Lei nº 8620/1993).

§ - 1º Homologado o acordo ou o cálculo de liquidação, o juiz determinará a intimação do executado para comprovar, nos autos, haver feito o recolhimento dos valores devidos pelo empregado à Previdência Social.

§ - 2º Havendo pagamento de parcelas de direitos trabalhistas, não comprovado o recolhimento previsto no § 1º , o juiz dará imediata ciência ao representante do Instituto Nacional de Seguridade Social, determinando a remessa mensal do rol dos inadimplementes, procedendo da mesma maneira em caso de alienação de bens em execução de sentença.

Até então, a Justiça do Trabalho estava servindo de fonte de informação ao INSS

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autarquia, mediante a constatação da existência do débito, efetuar o lançamento, a inscrição

do devedor em dívida ativa e a cobrança judicial de seu crédito.

A Emenda Constitucional nº 20/98 ampliou a competência da Justiça do Trabalho, inserindo o § 3º do art. 114 da Constituição Federal, nos seguintes termos: “Compete ainda à Justiça do trabalho executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir”.

A alteração constitucional promovida pela EC nº 20/98 pode ser considerada um verdadeiro marco na evolução da legislação relacionada ao tema objeto do presente estudo. A Justiça do Trabalho assumiu uma nova função - de arrecadar contribuições sociais -, sem que os sujeitos interessados tivessem a oportunidade de debater as conseqüências da delegação dessa função atípica a um dos órgãos do Poder Judiciário.

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CLT; recorrer da sentença de liquidação, como se parte fosse, conforme parágrafos 3º e 8º do

art. 897 da CLT.

A Emenda Constitucional nº 45, de 8/12/2004, alterou o art. 114 da CF, passando a antiga previsão do § 3º para o inciso VIII, que assim dispõe:

Art. 114. Compete à Justiça do trabalho processar e julgar: [...]

VIII a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir.

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2 INCONSTITUCIONALIDADE DO INCISO VIII DO ART. 114 DA CF

A Emenda Constitucional nº 20/1998, que posteriormente teve seu texto reproduzido na EC nº 45/2004, trouxe estranha inovação ao processo do trabalho e até mesmo ao

ordenamento jurídico brasileiro: a execução de ofício a ser provocada pelo Juiz do Trabalho. Há, na doutrina, teses de constitucionalidade e de inconstitucionalidade dos dispositivos do art. 114 da CF que atribuem à Justiça do Trabalho a competência para executar as

contribuições sociais decorrentes das sentenças que proferir.

Sérgio Pinto Martins2 analisa sob diversos aspectos a questão, defende que não pode existir inconstitucionalidade de uma norma da própria Constituição. Para o doutrinador, não

há violação aos princípios da igualdade, do contraditório ou do duplo grau de jurisdição,

sustentando que há momentos específicos para o exercício do contraditório quando da

impugnação aos cálculos de liquidação e da interposição de embargos à execução. Também

refere o autor que “não há violação ao princípio da separação dos poderes, pois a Justiça do

Trabalho continua sendo órgão do poder Judiciário e não do Executivo, mesmo tendo

competência para executar contribuições previdenciárias”.

Eduardo Fortunato Bim3 tem entendimento contrário. Segundo o autor:

A EC nº 20/98 afrontou a separação de poderes por dois motivos: i) equiparou o juiz a um membro do Poder Executivo, quer se considere que o lançamento é ato administrativo privativo da administração pública (Agente Fiscal), quer se considere que o start da cobrança de dívidas tributárias tenha que ser feita pelos servidores do executivo (Procuradores do INSS); ii) atenta contra a

2

MARTINS, Sérgio Pinto. Execução das contribuições previdenciárias. São Paulo: Editora Atlas, 2004, p. 32. 3

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própria natureza da Jurisdição ao obrigar o magistrado a agir de ofício, violando o princípio nemo judex sine actore ao fazê-lo atuar de ofício sobre pena de responsabilidade funcional. A principal distinção sobre o Poder Executivo e o Judiciário é que aquele aplica a lei de ofício, enquanto esse age por provocação. A EC nº 20/98 ignorou essa diferença, fazendo o juiz um mero vassalo do rei, obrigando-o a agir de ofício sem que houvesse respaldo no princípio da isonomia, agredindo de maneira frontal a separação de poderes.

Salvo melhor juízo, com todo respeito à primeira posição acima relatada, não há como

se afastarem as características de inconstitucionalidade das disposições do inciso VIII do art.

114 da Constituição Federal - CF.

Veja-se a regra contida no artigo 60, § 4º , incisos I a IV, da CF:

Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa do Estado;

II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos poderes;

IV – os direitos e garantias individuais.

Tais cláusulas são consideradas pétreas, de maior hierarquia em relação às demais

existentes na CF e não podem ser modificadas pelo Poder Legislativo. Em artigo publicado na

Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região, Carlos Augusto Escanfella e Renato

David Toloy4 ressaltaram que nem mesmo as disposições de Emendas Constitucionais que de forma velada ou enviesada tentem modificar os dispositivos acima podem ser aceitos em

nosso ordenamento.

A redação das Emendas Constitucionais, no que se refere ao tema em análise, tende a

abolir as garantias individuais previstas na CF, tais como o devido processo legal, o direito de

defesa e o contraditório, previstos nos incisos XXXV, LIV e LV do art. 5º da CF.

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As garantias individuais previstas no art. 5º da CF estão inseridas no Título II da Carta Maior, que trata dos direitos e garantias fundamentais. Conforme Plínio Saraiva Melgaré5:

A inserção dos direitos fundamentais na arquitetura constitucional proporciona, oferece, uma salvaguarda de natureza jurídica, resguardando-os de eventuais alterações nas diretrizes e opções político-ideológicas dos poderes constituídos, bem como de exigências impostas por fatores de natureza socioeconômica. Acentuamos aqui a noção segundo o qual um Estado de Direito é aquele subordinado ao Direito, ou seja, em que as estruturas do poder encontram-se vinculadas ao Direito. Releva observar, de modo expressivo, que a condição de ser vinculado ao Direito não significa a simples situação de cumprimento das normas positivadas ou ainda a mera sujeição ao texto legal, pois esses podem revelar-se contrários ao Direito. Pensar em um Estado apenas como uma organização adequada à lei não corresponde às hodiernas de um Estado de Direito materialmente constituído, mas sim um regresso ao Estado de legislação, forjado pelo típico legalismo moderno-iluminista, em que o Direito era sinônimo de lei - e esta a única fonte daquele. Na esteira do considerado, em Estado submetido ao Direito será aquele instruído e ajustado a princípios transcendentes à ordem jurídica positivada – portanto, indisponíveis às estruturas do poder-, determinantes e constituintes da intencionalidade axiológica do próprio Direito. De modo exemplificativo, arrolamos os princípios da legalidade, da igualdade perante o Direito e da imparcialidade do ofício jurisdicional. [...] a previsão constitucional expressa positivamente a vinculação do Poder Legislativo ao direitos fundamentais e sua axiologia, obrigando-o a orientar-se por eles. Do contrário, expõe-orientar-se o produto da atividade legislativa à nulidade. Oportuníssimo lembrarmos aqui o lapidar – e recorrente – pensamento: “Se antes os direitos fundamentais só existiam no quadro das leis, hoje as leis só valem no quadro dos direitos fundamentais.”6

[...] a constitucionalização dos direitos fundamentais não expressa apenas uma determinada unidade sistemática formal ou meros ditames da voluntas do poder, mas, sobretudo, constitui uma normatividade concreta, cimentada por uma base referencial axiológica fundamentante, refletindo a intencionalidade de valores e bens comunitariamente relevantes e desejáveis. Com efeito, a observação da História nos ensina que a tessitura da convivência social humana não pode ser urdida por simples atos impositivos do poder.

Os direitos fundamentais apontam linhas norteadoras aos três Podes (Executivo,

Legislativo e Judiciário). O legislador constitucional derivado, ao atribuir à Justiça do

Trabalho a obrigação de executar contribuições sociais, como se analisará a seguir, não

5 MALGARÉ, Plínio Saraiva. Um olhar sobre os direitos fundamentais e o Estado de Direito – breves reflexões ao abrigo de uma perspectiva material. In: ALMEIDA FILHO, Agassiz; ROCHA CRUZ, Danielle (Coord.). Estado de Direito e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 575-577.

6 KRÜGER apud VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos.

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garantiu aos contribuintes o exercício de determinados direitos individuais previstos na CF.

Para José Augusto Delgado7, “as garantias processuais do cidadão constituem realizações

jurídicas que devem guardar conformação com a Constituição. São limitações que não se

apresentam com a função total de restrição de direitos, por serem, apenas, formas de

regulamentar a atuação estatal, com a finalidade de concretizar esses direitos fundamentais”.

Como já se referiu acima, entre os direitos fundamentais estão o direito ao

contraditório e o direito de defesa. Na petição inicial da reclamação trabalhista, não há

qualquer pedido de condenação do réu ao pagamento de valores devidos ao INSS, o que

evidentemente acarreta a inexistência de defesa no processo em relação à matéria. Não há

como se fazer a execução direta, sem o contraditório, sem que a parte exerça seu direito de

defesa. Veja-se que sequer é instaurado o conflito de interesses entre o órgão gestor e o réu.

Para Carlos Augusto Escanfella e Renato David Toloy8, “a não existência de lide e do

devido processo legal faz com que não se estabeleça a relação processual triangular tão

7

DELGADO, José Augusto. A supremacia dos princípios nas garantias processuais do cidadão.. In: ALMEIDA FILHO, Agassiz; ROCHA CRUZ, Danielle (Coord.). Estado de Direito e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 326.

Segundo DELGADO, 2005, p. 325.

Para bem se compreender o valor dos princípios de um ordenamento jurídico, há de se partir da observação de que nos Estados contemporâneosà lei é um ato de vontade emanado pelos cidadãos através dos órgãos aos quais é confiada a tarefa legislativa. Essa volição não pode ser como sendo de sentido estrito, porque ela, além de ser mais ou menos abstrata, há de se integrar ao sistema jurídico instituído pela Nação e atuar como força viva dos sentimentos do povo a quem ela se destina.

Os princípios, no referente às garantias processuais do cidadão, atuam como forma de proteção das liberdades jurídicas, tendo “por objeto a proteção do status pessoal e de cada um dos direitos que implicam o exercício de funções públicas” que são “atividades que a própria ordenação considera para limitar em relação a elas os poderers do Estado ou de outros sujeitos que exercem funções públicas, de modo que, além deste limite jurídico, há uma esfera igualmente jurídica que se tem querido reservar à iniciativa e vontade de outrem, protegendo-a de váriuos modos” (Santi Romano, in Princípios de Direito Constitucional Geral, Ed. RT, trad. Maria Helena Diniz, p. 157).

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decantada pelos processualistas (autor, réu e estado-juiz) e impede que se efetue qualquer

execução de ofício, pelo órgão judicante”. Para os referidos autores, a anterior redação do § 3º do art. 114 da CF era inconstitucional, sob pena de que se aceite a condenação de alguém a

pagar contribuições ao estado sem o devido processo legal9.

Alexandre Macedo Tavares e Marcus Vinícius Mendes Mugnaini10 referem:

decorre a função excepcional dos princípios jurídico processuais para eficácia dos direitos, liberdades e garantias oferecidas aos jurisdicionados.

Ao se falar em princípios fundamentais comandando as garantias processuais do cidadão, impõe-se uma colocação preliminar a respeito da discussão existente , na doutrina, sobre a matéria. A investigação do pensamento positivo revela que os princípios são considerados como sedo normas obtidas por um processo de visão generalizada das leis. Por essa razão, entendeu-se que os princípios eram parte integrante do ordenamento jurídico positivo, pelo que a sua atuação ocorria com o mesmo grau hierárquico do possuído pela norma concreta. Para os jusnaturalistas, os princípios gerais de direito são normas de direito natural que, embora não se encontrem de modo positivo implantado no texto constitucional, possuem vigência e são obrigatórias , por integrarem a denominada ordem suprapositiva, com força de informar todo o sistema legal. Sobre tais aspectos, o melhor entendimento é o de José Joaquim Gomes Canotilho (CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito constitucional. Coimbra: Almedina, [s.d.], p. 237) por considerar que “[...]os princípios jurídicos fundamentais não se reduzem a simples princípios gerais de direito ou regras jurídicas gerais nem se inscrevem numa ordem jurídica suprapositiva”. Eles são “normas princípios e, portanto, fonte de direito, a partir do momento e na medida em que hajam sido encarados numa instituição e por um ato constitutivo de poder legislativo, da jurisprudência ou da vida jurídica” .

Perfilhando esse entendimento, concebe-se a força dos princípios processuais no garantir os direitos fundamentais do cidadão quando violados, por eles pertencerem à ordem jurídica positiva, haja vista terem sido introduzidos na consciência geral da Nação e encontrarem um recepção expressa ou implícita na Carta Magna.

8

ESCANFELLA; TOLOY, 1999, p. 97. 9

O princípio do devido processo legal, também denominado de due process of law, está inserido em nossa Constituição Federal de 1988, no seu art. 5º , inciso LVI, o qual preleciona que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”, observando -se que esse devido processo legal não deve apenas ser aplicado no processo judicial, assim como no processo administrativo, e, em nome dos direitos fundamentais do cidadão, deve ser interpretado de maneira flexível. (PASETTI, Babyton. A tempestividade da tutela jurisdicional e a função social do processo. Porto Alegre: Fabris, 2002, p 17.) 10

TAVARES, Alexandre Macedo; MUGNAINI, Marcus Vinícius Mendes. As impropriedades da execução ex officio de contribuições à seguridade social emergentes de decisões da justiça do trabalho. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 84, p. 33-46, 2002, p. 41.

Segundo Alexandre Macedo Tavares e Marcus Vinícius Mendes Mugnaini: O princípio do devido processo legal, erigido de nossa Lex Mater à categoria de um direito e garantia individual de qualquer cidadão-contribuinte, desdobra-se nos postulados do devido processo legal substancial (substantive due process) e do devido processo legal processual (procedural due process). Em sua concepção substantiva, essa garantia compreende os princípios de direito material que, no caso do Direito Tributário, são exteriorizados através das garantias da estrita legalidade tributária, da isonomia, do respeito à capacidade contributiva, à previsibilidade e à não-surpresa (anterioridade tributária), à impossibilidade da tributação com feição confiscatória, etc. Em sua vertente estritamente processual (procedural due process), o princípio do devido processo expressa garantias elementares das quais brotam relevantes princípios processuais...

(22)

Levando-se em consideração o alcance do princípio do devido processo legal e suas inapeláveis vertentes – de índole substancial e processual -, chegamos a uma triste constatação: a Emenda Constitucional nº 20/98 e sua lei regulamentadora (Lei 10.035/2000), no que se refere à ampliação da competência da Justiça do Trabalho, para fins de processamento e execução ex officio das contribuições à seguridade social (art. 195, I, a e inciso II) emergentes de decisões que proferir, não passam pelo teste de conformação à ordem jurídico-constitucional vigente.

Não se diga que a ação judicial trabalhista, por ter processo de conhecimento em relação ao seu objeto principal, garante o exercício do contraditório e da ampla defesa em relação à matéria previdenciária, pois, em nenhum momento da ação de conhecimento, há discussão sobre os referidos temas. Somente na execução é que a parte tem a oportunidade de apresentar cálculos e discutir valores. Em muitas oportunidades, somente após a penhora de bens isso ocorre, como é o procedimento adotado por muitas Varas do Trabalho da 9ª Região.

Verifica-se, portanto, que foram infringidos os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório.

Outro princípio constitucional que é manifestamente contrariado pelas disposições do inciso VIII do art. 114 da CF é o da isonomia, pois cria uma situação discriminatória entre pessoas em situações idênticas. O contribuinte regularmente notificado pelo INSS tem o direito de discutir o débito administrativamente, situação que não ocorre com o sujeito passivo da relação jurídica tributária gerada por pagamentos efetuados em razão de uma sentença trabalhista. O Código Tributário Nacional (CTN), em seu artigo 142, garante ao contribuinte fiscalizado e notificado pelo INSS o direito de discutir o débito através de um

(23)

regular processo administrativo, inclusive com o exercício do contraditório e do amplo direito de defesa, nos termos do inciso LV, do art. 5º , da Constituição Federal11.

Evidentemente que o contribuinte que figura em um dos pólos da ação trabalhista não recebe o mesmo tratamento. A execução é imediata, muitas vezes, ocorrendo concomitantemente com a execução do principal, na qual, em realidade, se encontram as parcelas cujo pagamento é o fato gerador do tributo.

O mais grave, no entanto, está na ofensa ao dispositivo constitucional que prevê a separação dos poderes, inciso III do § 4º do art. 60 da CF, acima transcrito, bem como ao art. 2ª da CF, que prevê a independência dos três poderes da União: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

Ora, a atribuição de competência para executar, de ofício, contribuições sociais decorrentes das sentenças que proferir transforma a Justiça do Trabalho em um órgão auxiliar do INSS - autarquia do Poder Executivo - no que se refere à arrecadação de tributos. A independência e a separação dos poderes da União também estão relacionadas às funções de cada um desses poderes. Não se podem atribuir funções típicas do Executivo ao Judiciário, o que inegavelmente acarreta a vinculação desses dois poderes e conseqüentemente das pessoas que os representam, como o Juiz do Trabalho.

Segundo o professor José Afonso da Silva12:

11 CASTILHO, Paulo César Bária de. Crédito tributário sem lançamento e execução de ofício da contribuição previdenciária pela Justiça do Trabalho. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 89, p. 58-70, 2003, p. 59.

(24)

A divisão de poderes fundamenta-se, pois, em dois elementos: a) especialização funcional, significando que cada órgão é especializado no exercício de uma função; assim às assembléias (Congresso, Câmaras, Parlamento) se atribui a função Legislativa; ao Executivo, a função executiva; ao Judiciário a função jurisdicional; b) independência orgânica, além da especialização funcional, é necessário que cada órgão seja efetivamente independente dos outros, o que postula ausência de subordinação.

A função de arrecadar contribuições sociais é própria do INSS, como se pode observar do art. 33 da Lei 8.212/91, intitulada de “plano de custeio da previdência social”. A atribuição de tal função à Justiça do Trabalho compromete a atividade jurisdicional, pois o Juiz, que tem a obrigação de executar de ofício contribuições sociais, participa diretamente do custeio da previdência social, o que inegavelmente terá reflexos nas decisões judiciais - em especial, as cognitivas -, que são a própria origem das contribuições sociais devidas pelas partes.

Manoel Carlos Toledo Filho13, apesar de entender que é possível a execução direta das contribuições sociais no processo trabalhista, refere que “o constituinte aparentemente enleou as figuras do procurador autárquico e do magistrado trabalhista, impondo a este que fizesse as vezes daquele”. E foi exatamente isso que ocorreu, pois o constituinte derivado atribuiu ao Juiz Trabalhista uma função atípica.

Para Alexandre Macedo Tavares e Marcus Vinícius Mendes Mugnaini14, o exercício de função atípica há de estar constitucionalmente consagrada (excepcionado), vez que a regra é que cada poder constituído naturalmente exerça função predominante – típica – que lhe foi atribuída. Segundo os referidos autores,

13

TOLEDO FILHO, Manuel Carlos de. Execução das contribuições previdenciárias no processo trabalhista. Síntese Trabalhista, São Paulo, n. 139, p. 16-21, jan. 2001, p. 17.

14

(25)

considerar legítima toda e qualquer delegação de atribuição funcional, independente de ressalva expressa na Lei Maior, seria o mesmo que convalidar um contínuo e potencial vilipêndio ao espírito do art. 2º , que minimizaria sobremaneira a máxima efetividade do princípio da tripartição da funções estatais.15

Não há outra conclusão senão a de que a Emenda Constitucional 45/2004 é inconstitucional, o que é absolutamente viável, conforme já se manifestou o Supremo Tribunal Federal16. O § 4º do art. 60, da CF, já transcrito, traz limitações materiais para a atuação do Poder Constituinte Derivado.

Há, portanto, na hipótese de cobrança direta de contribuições sociais pela Justiça do Trabalho, violação aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório, ampla defesa, da isonomia e da separação dos poderes.

15

TAVARES; MUGNAINE, 2002, p. 40. 16

(26)

3 FUNÇÃO ARRECADATÓRIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO E OS ELEMENTOS DA ATIVIDADE JURISDICIONAL

Desde a EC nº 20/98, que alterou o art. 114 da CF, uma indagação veio na mente de todos os que são da área do Direito: É função da Justiça do Trabalho, um órgão do Poder Judiciário, a arrecadação de contribuições sociais para o INSS?

A vontade estatal se manifesta através dos Poderes de Estado17 instituídos, como o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. A função administrativa encontra-se como atividade desempenhada pelos três poderes, mas o Poder Executivo exerce preponderantemente a função administrativa, a qual é objeto da Administração Pública.A atividade de cobrança de tributos é função típica do Poder Executivo.

Função Pública, segundo Marcus Cláudio Acquaviva18, provém do latim functionem, acusativo de functio (radical funtion), função, execução, cumprimento, atividade, de functus, particípio passado de fungi, executar, cumprir, desempenhar, e io, ação, processo.

17 Poderes de Estado – os Poderes de Estado, na clássica tripartição de Montesquieu, até hoje adorada nos Estados de Direito, são o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, independentes e harmônicos entre si e com suas funções reciprocamente indelegáveis (CF, art. 2º ). Esses Poderes são imanentes e estruturais do Estado (diversamente dos poderes administrativos, que são incidentais e instrumentais da administração), a cada um deles correspondendo uma função que lhe é atribuída com precipuidade. Assim, a função precípua do Poder Legislativo é a elaboração da lei (função normativa); a função precípua do Poder Executivo é a conversão da lei em ato individual e concreto (função administrativa); a função precípua do poder judiciário é a aplicação coativa da lei aos litigantes (função judicial). Referimo-nos à função precípua de cada Poder de Estado porque, embora o ideal fosse a privatividade de cada função em cada Poder, na realidade, isso não ocorre, uma vez que todos os Poderes têm necessidade de praticar atos administrativos, ainda que restritos à sua organização e ao seu funcionamento, e, em caráter excepcional admitido pela Constituição, desempenham funções e praticam atos que, a rigor, seriam de outro Poder. O que há, portanto, não é a separação de Poderes com divisão absoluta de funções, mas, sim, distribuição das três funções estatais precípuas entre órgãos independentes, mas harmônicos e coordenados no seu funcionamento, mesmo porque o poder estatal é uno e indivisível. (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 61)

18 FUNÇÃO pública. In: ACQUAVIVA, Marcus Cláudio.

(27)

O juiz trabalhista tem suas funções, suas atividades, previstas na própria Constituição

Federal. Segundo a atual redação do art. 114 da CF:

Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I - as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II - as ações que envolvam exercício do direito de greve;

III - as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV - os mandados de segurança, habeas corpuse habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V - os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

VI - as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

VII - as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII - a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir; IX - outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.

Veja-se que a função de executar de ofício contribuições previdenciárias é a única das

previstas nos incisos I a IX do art. 114 da CF que não se dá por provocação da parte

interessada, no caso o INSS, mas sim por ato do próprio do Juiz. Não há, portanto, nas

referidas execuções, o processamento de uma pretensão, mas sim o exercício de uma

atividade, uma ação a ser executada pelo Juiz do Trabalho. A cobrança e o julgamento são

realizados por um só órgão, o que acarreta a completa ausência de limitação ao referido

poder19. Todas as demais funções da Justiça do Trabalho, previstas no art. 114 da CF, visam

somente à prestação jurisdicional, típica do Poder Judiciário.

A função principal do Poder Judiciário é julgar. O Juiz existe para julgar e não para

arrecadar tributos. A função de cobrar contribuições previdenciárias é atípica, pois não tem

19

(28)

relação com a atividade jurisdicional, mas visa a angariar recursos para uma autarquia, o INSS.

Para Paulo César Bária de Castilho20,

admite-se que cada um dos poderes pode realizar (e realiza) funções típicas e atípicas, sem haver qualquer ingerência de um poder sobre o outro. Para o citado autor, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é prova viva dessa mudança de função entre os poderes que compõem a União e que, necessariamente, gera modificações radicais no plano jurídico.

Efetivamente a nossa CF de 1988 admite que o Poder Executivo faça lei, conforme o seu art. 62, que autoriza o Presidente da República adotar medidas provisórias, com força de lei, em caso de relevância ou urgência. Essa função é típica do Poder Legislativo. O Poder Judiciário também tem autorização da CF para elaborar seus regimentos internos, conforme

art. 96, I, estabelecendo normas de funcionamento dos tribunais. A própria Justiça do

Trabalho exerce função atípica, quando julga Dissídio Coletivo e profere decisão com poder de normatizar relações entre empregados e empregadores. Tais funções são típicas do Poder Legislativo. O § 3º do art. 58 da CF autoriza o Poder Legislativo a criar CPIs – Comissões

Parlamentares de Inquérito - com poderes de investigação próprios das autoridades judiciais.

Essa função é típica do poder Judiciário.

Em um primeiro plano, portanto, não se identifica qualquer óbice para que o Poder Judiciário exerça uma função atípica, hipótese do inciso VIII do art. 114 da CF.

(29)

No entanto, deve-se observar que, para o exercício da jurisdição, devem estar presentes no órgão jurisdicional certos elementos, sem os quais essa função típica não poderia

ser executada. Mário Pimentel Albuquerque21 aponta como principais elementos da atividade jurisdicional a independência e a imparcialidade.

A independência judicial exige que o julgador observe estritamente a lei, sem estar vinculado a qualquer outro elemento estranho que, sob qualquer pretexto, a ele ou à lei venha

interpor-se. O Juiz deve ficar dependente apenas do ordenamento jurídico, o que lhe dará

legitimidade no exercício de sua função.

O elemento da independência não necessita de previsão legal, mas sim decorre do

próprio ordenamento jurídico. Trata-se de uma imposição do sistema, o que legitima a

jurisdição.

A independência do juiz retira do sistema quaisquer vínculos de direito, delimitando o setor do ordenamento que contém os elementos necessários para a atividade jurisdicional.

O elemento imparcialidade objetiva prevenir o exercício da jurisdição de

subordinações de fato, o que, se existentes, pode comprometer a aplicação do Direito.

Segundo Mário Pimentel Albuquerque:

Em outros termos, assim como a independência, eliminando toda e qualquer vinculação jurídica do juiz a instâncias estranhas à legalidade vigente, torna efetiva sua sujeição ao ordenamento, a imparcialidade, por seu turno, reforça indiretamente essa sujeição, reprimindo as subordinações fáticas que, por

21

(30)

serem tais, não são menos perigosas para a realização da atividade jurisdicional.22

Há diversos mecanismos no próprio ordenamento jurídico brasileiro que buscam

assegurar a imparcialidade do Juiz, como a proibição do exercício de outro cargo ou função, salvo do magistério, e da atividade político-partidária, conforme incisos I e III do parágrafo

único do art. 95 da CF. Por essas mesmas razões, são reconhecidas aos juízes garantias que buscam evitar os surgimentos de subordinações de fato, nos termos dos incisos I, II e III do caput do art. 95 da CF, como a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de subsídio.

Emílio Bonaudi23, refere:

Não há dúvida que um ordenamento estatal deva ser constituído de modo que as várias funções, através das quais se manifesta a soberania, encontrem órgãos adequados; mas não se pode admitir que órgãos e funções possam, por si mesmos, necessariamente, achar-se em contraste. Assim, para continuar na comparação, se não é admissível que os vários órgãos do corpo humano cumpram, pela sua natureza, funções nocivas aos outros órgãos com reflexo no organismo inteiro, contudo, sob influência de várias causas (doenças ou atos violentos), um órgão pode degenerar e, ao invés de cumprir uma função útil, pode tornar-se nocivo ao organismo, caso em que cumpre proceder a cura, recorrendo ao extremo remédio da extirpação do órgão: mas esse é um fato patológico, não um fato normal. Igualmente na vida dos Estados e sob influência de fatores vários, os órgãos estatais por vezes podem degenerar em suas funções, caso em que será necessário recorrer-se àqueles remédios que a gravidade do mal reclama: remédios de vária natureza e que, da providência administrativa, podem chegar à reforma constitucional.

O Juiz do Trabalho, exercendo a função atípica de cobrar de ofício contribuições previdenciárias, acaba por se vincular ao INSS, uma autarquia do Poder Executivo, pois passa

a ser um dos principais meios de arrecadação de renda para o custeio da Previdência Social.

22

ALBUQUERQUE, 1997, p. 168. 23

(31)

Para que se tenha uma noção de valores, foram as seguintes as importâncias

arrecadadas pela Justiça do Trabalho para o INSS: no ano de 2001, R$ 640.069.296,33

(seiscentos e quarenta milhões, sessenta e nove mil, duzentos e noventa e seis reais e trinta e

três centavos); no ano de 2002, R$ 571.125.543,46 (quinhentos e setenta e um milhões, cento

e vinte e cinco mil, quinhentos e quarenta e três reais e quarenta e seis centavos); no ano de

2003, R$ 668.029.016,40 (seiscentos e sessenta e oito milhões, vinte e nove mil e dezesseis

reais e quarenta centavos)24.

A atividade atípica, por óbvio, compromete a função principal da Justiça do Trabalho,

a jurisdicional, já que a arrecadação de tributos somente ocorrerá se existir o fato gerador,

qual seja, a condenação do sujeito passivo da reclamação ao pagamento de verbas integrantes

do salário de contribuição.

A atividade jurisdicional exercida pelos juízes da Justiça do Trabalho deixa de ter as

características da independência e da imparcialidade, pois há uma vinculação de direito para com a autarquia do INSS. Passa a ser de interesse da Justiça do Trabalho a execução de

contribuições sociais, pois essa função atípica está equivocadamente inserida no rol de suas

competências. Necessária, portanto, a imediata modificação da Constituição Federal, para a

exclusão do inciso VII do art. 114. Como refere Mário Pimenta Albuquerque: “[...] a primeira

vítima de um juiz parcial é ele mesmo [...]” 25

Veja-se que a Administração Pública realiza sua função executiva por meio de atos

jurídicos que recebem a denominação especial de atos administrativos. Tais atos, por sua

natureza, conteúdo e forma, diferenciam-se dos que emanam do Poder Legislativo (leis) e do

24 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho.

Dados do relatório geral da Justiça do Trabalho: 2001, 2002 e 2003. Disponível em: <http:// www.tst.gov.br>

(32)

Poder Judiciário (decisões judiciais), quando desempenham suas atribuições específicas de

legislação e jurisdição26. Existem, portanto, três categorias de atos: atos legislativos, atos judiciais e atos administrativos. Atos administrativos é toda manifestação unilateral de

vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato

adquirir; resguardar; transferir; modificar; extinguir; e declarar direitos, ou impor obrigações

aos administrados ou a si própria.27

O que pratica o Juiz do Trabalho ao cobrar a contribuição previdenciária das partes?

Um ato com características de ato judicial ou com características de um ato administrativo,

próprio da Administração Pública?

A Administração Pública exerce suas funções observando determinados princípios28, entre eles o da Supremacia do Interesse Público, em que a função administrativa tem como objetivo a realização do bem comum e, para tanto, no desempenho de suas atividades, por

vezes, defronta-se com um conflito entre o interesse particular e o interesse público, devendo

esse último prevalecer justamente para que seja possível alcançar seus fins29.

26

[...] função legislativa é a função que o estado, e somente ele, exerce por via de normas gerais, normalmente abstratas, que inovam inicialmente na ordem jurídica, isto é, que se fundam direta e imediatamente na Constituição.

Função jurisdicional é a função que o estado, e somente ele, exerce por via de decisões que resolvem controvérsias com força de “coisa julgada”, atributo este que corres ponde à decisão proferida em última instância pelo Judiciário e que é predicado desfrutado por qualquer sentença ou acórdão contra os quais não tenha havido tempestivo recurso.

Função administrativa é a função que o estado, ou quem lhe faça as vezes, exerce na intimidade de uma estrutura e regime hierárquicos e que o sistema constitucional brasileiro se caracteriza pelo fato de ser desempenhada mediante comportamentos infralegais ou, excepcionalmente, infraconstitucionais, submissos todos a controle de legalidade pelo poder Judiciário. (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Malheiros 2005, p. 33-34).

27

MEIRELLES, 1998, p. 130. 28

Nós adotamos os seguintes princípios: da Supremacia do Interesse Público, da Indisponibilidade, da Finalidade, da Presunção de Legitimidade, da Razoabilidade, da Proporcionalidade, da Boa-fé Objetiva, da Economicidade, da Igualdade, da Motivação. (ANJOS, Luis Henrique Martins dos; ANJOS, Walter Jone dos. Manual de direito administrativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 54.)

29

(33)

Não parece lógica a sistemática adotada pelas Emendas Constitucionais 20/98 e 45/04.

O Juiz do Trabalho jamais conseguirá exercer de forma isolada suas funções. Ao prestar jurisdição, sempre estará inconscientemente vinculado à função atípica que lhe atribuiu o legislador constituinte derivado e conseqüentemente aos princípios da Administração Pública.

Paulo Emílio Ribeiro Vilhena, ao comentar a Lei 10.035/2000, refere:

Não bastasse a regra geral contida no art. 878 da CLT, segundo o qual o Juiz do trabalho poderá ex officio promover a execução da sentença, dá-lhe feição procedimental especial e agora agregado parágrafo único do art. 876, mais uma vez nomeando o INSS como privilegiado especial ao referir a execução ex officio de seus créditos, modulando o Juiz como um agente especial da autarquia, a serviço dela e praticando ato incompatível com sua a independência, com a natureza e a finalidade do órgão judicial.30

Sérgio Pinto Martins, em obra escrita antes da publicação da EC nº 45/04, refere expressamente que “o objetivo do § 3º do artigo do art. 114 da Constituição e da Lei nº 1035 é aumentar a arrecadação das contribuições previdenciárias na própria fonte de pagamento, que é o processo trabalhista [...]”31. Como seria possível imaginar que uma pessoa humana, o Juiz, com essa função, com esse objetivo, não se deixasse interferir no momento das decisões cognitivas?

Edilton Meireles chega a afirmar que a decisão do Juiz no processo, ao homologar

cálculos de liquidação que apuram contribuições previdenciárias, seria de natureza

administrativa. Veja-se o entendimento do referido autor:

Em princípio, poder-se-ia afirmar que o título é judicial, pois decorrente de uma decisão proferida por órgão judicante, pelo magistrado. Porém, é preciso lembrar que, para o título judicial ser formado, é indispensável a

30

VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro. A conciliação trabalhista, a transação e o INSS. In: ALVES, Emérson José; LOPES, Mônica Sette (Coord.). Execução previdenciária na Justiça do Trabalho: aspectos jurisprudenciais e doutrinários. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 19.

31

(34)

presença do credor e do devedor da obrigação na relação jurídico processual. [...] A decisão do magistrado que institui o título respaldador da execução previdenciária [...] se equipara à decisão do juiz que, numa ação trabalhista, condena o vencido a pagar custas processuais [...] o juiz não está sentenciando, isto é, exercendo sua função jurisdicional, mas, sim, apenas cumprindo uma de suas muitas funções anômalas, de cunho administrativo. Está, em outras palavras, cumprindo uma das etapas necessárias ao lançamento tributário, isto é, “o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível” (art. 142 do CTN). O juiz, em verdade, age como se fosse um agente fiscal que, diante do fato gerador, lança o tributo, para ser cobrado a quem de direito. O juiz trabalhista, verificado o fato gerador da obrigação tributária previdenciária, deverá proceder ao lançamento do crédito previdencial. Deverá expedir um título executivo administrativo equiparado à certidão de dívida ativa. 32

Importante se destacar que o texto acima foi publicado antes da Lei 10.035/2000, que

criou procedimentos padrões para as execuções das contribuições previdenciárias na Justiça

do Trabalho. Também não se consideram corretas suas conclusões, no que se refere ao

enquadramento do ato do juiz trabalhista como administrativo, pois não há lançamento do

tributo. No entanto, é importante que se observe a gravidade da hipótese aventada pelo

doutrinador, de que o juiz passe a fazer as vezes do agente fiscal, atividade que certamente

comprometeria sua função jurisdicional.

Interessante observar os termos do inciso II art. 54 da Instrução Normativa – IN

INSS/DC - nº 70, de 10 de maio de 2002, que foi alterada pela IN INSS/DC nº 80, de 27 de

agosto de 2002:

II – a partir de 16 de dezembro de 1998, é de competência exclusiva da Justiça do Trabalho promover a execução das contribuições previdenciárias destinadas à previdência social e às entidades e fundos, devendo a fiscalização abster-se de lançar qualquer débito que porventura verificar em ação fiscal.

32

(35)

Posteriormente, a IN INSS/DC nº 70 foi revogada pela IN INSS/DC nº 100, de 18 de dezembro de 2003, que por sua vez foi revogada pela IN MPS/RSP nº 3, de 14 de julho de 2005. A previsão dos artigos 128 e 129 da IN MPS/SRP nº 3, de 14 de julho de 2005, é a

seguinte:

Art. 128. Serão adotados os seguintes procedimentos de fiscalização quanto às contribuições sociais incidentes sobre os fatos geradores reconhecidos por sentença proferida em reclamatória trabalhista:

I - nas decisões cognitivas ou homologatórias cumpridas ou cuja execução se tenha iniciado até 15 de dezembro de 1998, data anterior ao início da vigência da Emenda Constitucional nº 20, o AFPS, durante a Auditoria-Fiscal, ao constatar o não recolhimento das contribuições sociais devidas ou o recolhimento inferior ao devido, deverá apurar e lançar os créditos correspondentes;

II - nas decisões cognitivas ou homologatórias cumpridas ou cuja execução se tenha iniciado a partir de 16 de dezembro de 1998, é de competência da Justiça do Trabalho promover de ofício a execução da cobrança das contribuições sociais, devendo a fiscalização apurar e lançar exclusivamente o débito que porventura verificar em ação fiscal, relativo às:

a) contribuições destinadas a outras entidades ou fundos, conforme disposto no art. 94 da Lei nº 8.212, de 1991, exceto aquelas executadas pelo Juiz do Trabalho;

b) contribuições incidentes sobre remunerações pagas durante o período trabalhado, com ou sem vínculo empregatício, quando, por qualquer motivo, não houver sido executada a cobrança pela Justiça do Trabalho.

Parágrafo único. O disposto no inciso II do caput não implica dispensa do cumprimento, pelo sujeito passivo, das obrigações acessórias previstas na legislação previdenciária.

Art. 129. Nos termos do § 3º do art. 114 da Constituição Federal e da Lei nº 10.035, de 2000, à Justiça do Trabalho ficaram atribuídas as seguintes competências:

I - apurar, com o auxílio de órgão auxiliar da Justiça ou perito, se necessário, o valor do crédito previdenciário decorrente de fatos ou direitos reconhecidos por suas decisões;

II - promover de ofício a execução do crédito previdenciário e determinar, quando for o caso, a retenção e o recolhimento de contribuições incidentes sobre valores depositados à sua ordem;

III - cientificar a SRP da homologação de acordo ou de sentença proferida líquida;

IV - intimar a SRP para manifestar-se sobre os cálculos de liquidação, quando neles estiver abrangido o cálculo do crédito previdenciário.

Parágrafo único. A Justiça do Trabalho, mediante convênio de cooperação técnica com o INSS, poderá servir-se de sistema informatizado de Execução Fiscal Trabalhista para a execução das operações a que se referem os incisos I e II do caput.

As Instruções Normativas acima referidas dispõem sobre os procedimentos fiscais e

(36)

termos das orientações aos agentes fiscais são claros, no sentido de não interferir naqueles casos em que o “parceiro Justiça do Trabalho” realiza a fiscalização. Tal disposição evidencia que a Justiça do Trabalho se tornou um agente arrecadador do INSS, tendo funções

equivalentes à fiscalização.

Não há compatibilidade no exercício da atividade jurisdicional com o exercício da atividade de cobrança de tributos. Tais funções não podem ser desempenhadas pelo mesmo órgão do Poder Público, em especial porque, no momento em que o Juiz exerce sua função

principal, a jurisdicional, está ao mesmo tempo decidindo a futura existência ou não de fatos

que ensejarão o recolhimento de contribuições previdenciárias.

Veja-se que os sistemas jurídicos de outros países não adotam essa sistemática. Na

Espanha, por exemplo, a competência dos “Tribunales de Trabajo” fica limitada aos conflitos coletivos e aos conflitos entre empregados e empregadores, como segue:

1.2.3. ¿Cuál és la competencia de los tribunales de trabajo?

Competencia Material

De acuerdo con los artículos 2, 2ª , 3 de la Ley sobre Tribunales de Trabajo, la competencia del tribunal de trabajo se extiende únicamente a las materias allí citadas;

[...]

Segun lo dispuesto en el artículo 2, párrafo 1, nº 1, de la Ley sobre tribunales de Trabajo, formulado de forma poco clara, los tribunales de trabajo tienen competencia en los litigios entablados entre las partes contratantes de um convenio colectivo (o bien entre éstas Y terceiros) sobre la existencia Y el contenido de los convenios colectivos.

[...]

Conforme o lo dispuesto en el nº 2, a eso es preciso añadir los litigios derivados del acto ilícito, siempre que se trate de medidas propias del conflicto colectivo.

(37)

De acuerdo con el artículo 2, párrafo 1, nº 3, los tribunales de trabajo tienen competencia en todos los derechos jurídico-privados entre trabajadores y empresarios. Tales derechos se pueden derivar del contrato de trabajo, si bien también del acto ilícito, siempre que este último tenga algún nexo con la relación laboral.33

O Direito Brasileiro, portanto, parece ser o precursor desse sistema distorcido e

inadequado de arrecadação de tributos.

Não há outra conclusão a se chegar senão a de que é necessária a imediata alteração do

art. 114 da CF, para a exclusão do seu inciso VII, com a exclusão dessa função atípica

atribuída ao juiz do rol de competências da Justiça do Trabalho.

33 DÄUBLER, Wolfgang. Derecho del trabajo. Madrid: Centro de Publicaciones Ministério del Trabajo y

(38)

4 NORMA JURÍDICA TRIBUTÁRIA

Desde a Constituição Federal de 1988, não há mais divergência sobre a natureza

tributária das contribuições previdenciárias, já que estão inseridas no art. 149 da CF, no capítulo que trata do Sistema Tributário Nacional. Também consta no referido dispositivo, de forma expressa e literal, que se aplicam às contribuições os princípios constitucionais tributários - da legalidade e da irretroatividade – além de todas as normas gerais de Direito Tributário, previstos no art. 150 da Constituição Federal.

Conforme Luiz Fernando de Souza Neves:

A Lei maior corrige o amesquinhamento do conceito de tributo, implícito da Constituição e expresso no CTN, segundo o qual tributo é toda prestação pecuniária e compulsória que não decorra de sanção de ato ilícito, que deve ser instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada, ou seja, os tributos nascem de pressupostos e descrevem sempre fatos lícitos e que não se confundem, que são independentes do consentimento do obrigado [...]. [...] Pelo aspecto topográfico, insere essas contribuições no art. 149, I, no capítulo que trata do Sistema Tributário Nacional, remetendo o intérprete ao art. 195, no título Ordem Social e de lá novamente ao capítulo do Sistema Tributário Nacional.34

Pelas razões acima é que os elementos que constituem as normas jurídicas tributárias serão abordados no presente estudo.

A norma jurídica tributária35 possibilita ao Estado exigir determinada conduta do sujeito, sob pena de coação, quando se concretiza, no plano material, a situação prevista na

34 NEVES, Luiz Fernando Souza.

COFINS: Contribuição Social sobre o Faturamento. São Paulo: Max Limonad, 1997, p. 68.

35 Toda norma jurídica é composta de um antecedente e um conseqüente. Aquele descreve um fato de possível ocorrência; este prescreve um conduta intersubjetiva deonticamente modalizada.

Referências

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