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Revista RecreArte 12 + 1

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Revista RecreArte 12 + 1 > I - Creatividad Básica: Investigación y Fundamentación

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Serendipidade: Para além da Intuição!

RESUMO

Ao longo deste espaço de reflexão será importante promover a sensibilização e tomada de consciência dos agentes educativos, bem como da população em geral, do papel que pode desempenhar o pensamento criativo na sua formação pessoal, escolar e profissional, apesar dos mais diversos discursos políticos, pessoais e decretos-lei fazerem passar a ideia de que a questão do estudo e da promoção do pensamento criativo estão por demais acautelados, em particular no contexto escolar. Nesse sentido, torna-se incontornável o reconhecimento da heterogeneidade de modelos, privilegiando os mais molares, ou os da confluência e, por isso mesmo, considerados menos redutores e parcelares na análise que fazem da criatividade. No âmbito dos modelos mais compreensivos de criatividade, o modelo componencial da criatividade de Urban e Jellen (1986) faz emergir o TCT-DP (Test for Creative Thinking-Drawing Production, 1996, na sua versão mais actual), que pretende de forma mais holística fazer uma avaliação da criatividade. Apesar de algumas das suas inevitáveis limitações, este instrumento tem-se revelado de particular importância pelos estudos psicométricos que tem gerado, não apenas no seu país de origem, a Alemanha, como em outros contextos culturais, nomeadamente o português, salientando-se a caracterização dos níveis de criatividade de diversas amostras populacionais. A importância de variáveis sócio-demográficas, cognitivas, emocionais e personalísticas no desempenho criativo, também tem sido evidenciada por outros vastos estudos, tanto de natureza correlacional como experimental, alguns dos quais ainda em curso em Portugal. O desejo de envolver mais gentes na promoção do pensamento criativo obriga inevitavelmente a uma reflexão sobre a sua avaliação, assumindo o TCT-DP uma excelente oportunidade para partilhar esperanças, mas também dúvidas e questionamentos, na busca de uma resposta a este desafio que é a avaliação da criatividade.

Palavras-Chave: Test for Creative Thinking-Drawing Production (TCT-DP), Criatividade, Serendipidade, Pensamento divergente.

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Serendipity: Beyond the Intuition!

ABSTRACT

Along this opportunity for reflexion it will be important to promote the awareness to the educational agents, as well as the general population, for the role of the creative way of thinking in their personal, academic and professional development, despite several ordinances and political or personal speeches’ attempts to spread the idea that the studies and the promotion of creative thinking, particularly in the scholar context, are already well cautioned. In this sense, it becomes unavoidable the recognition of the heterogeneity of the models , focusing on the molars, the confluence ones, therefore, considered less partial in their analysis of creativity. In the context of the more comprehensive models of creativity, the componential model of creativity of Urban and Jellen (1986) brings out the TCT-DP (Test for Creative Thinking-Drawing Production, 1996, the most recent version), able to make a more holistic assessment of creativity. Although some of its inevitable limitations, this instrument has proved to be of particular importance for psychometric studies that have generated, not only in their home country, Germany, as in other cultural contexts, including Portuguese, emphasizing the characterization levels of creativity in various population samples. The importance of socio-demographic, cognitive, emotional and personalistic variables in the creative performance, it has also been shown by other large studies, either correlational or experimental, some of which are still ongoing in Portugal. The desire to involve more people in the promotion of the creative thinking, unevitably requires a reflection on its evaluation, assuming the TCT-DP an excellent opportunity to share some hopes, and also some doubts and questions, searching for an answer to the creativity evaluation challenge.

Key-words: Test for Creative Thinking-Drawing Production (TCT-DP), Creativity; Serendipity, Divergent Thinking.

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“It seems impossible to find a definition that can be operacionalized ... The line between creative processes and other complex problem-solving, like imagination, intuition, and artistic productivity, stays blurry” (Preiser, 2006, 174).

INTRODUÇÃO

Tantos anos após os trabalhos de E. P. Torrance (1988), o paradoxo subsiste: como estudar cientificamente algo que parece escapar aos critérios da frequência e da previsibilidade tão caros à ciência?

A intuição parece-nos, numa primeira abordagem, um dos termos mais adequados para podermos definir o acto ou o instante da criação, tão bem retratado pelas ideias de Mozart: “Composições musicais? Como surgem? Não sei e não tenho nada a ver com isso”.

É, sem dúvida, tentador aceitar a criatividade como o resultado da sorte, do acaso, ou da intuição súbita e repentina!

Eureka pode representar um dos insights mais marcantes da história da

ciência, no momento em que Arquimedes, imerso na banheira, terá descoberto a solução para um dos problemas que o atormentava, de avaliar a composição da coroa do rei de Siracusa, abrindo caminho a um dos princípios fundamentais da hidrostática. A penicilina, primeiro antibiótico capaz de curar diversas infecções bacterianas, terá sido descoberta, por acaso, por Fleming que ao chegar de férias, verificou que um dos tabuleiros em que havia inoculado estafilococos, estava limpo. Nesse mesmo tabuleiro, as bactérias não se teriam desenvolvido pelo facto de ele ter sido contaminado por esporos do fungo Penicillium Notatum que teriam voado de um local próximo, onde um perito em fungos se dedicava ao seu cultivo. A forma da molécula de benzeno, não se enquadrando nas formas já conhecidas, terá sido descoberta a partir do sonho de August Kekulé sobre uma cobra que mordia a sua própria cauda, assemelhando-se a uma espiral.

O termo serendipidade refere-se muitas vezes a este tipo de descobertas felizes, feitas por acaso, devidas à sorte ou a alguma intuição inesperada.

Mas, em rigor, devemos acreditar no mero acaso, sorte, na simples intuição ingénua?

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O termo serendipidade foi criado em 1754 por Horace Walpole, escritor e político inglês, a partir de um facto impressionante e marcante na sua vida: a tomada de conhecimento de um conto persa “Os três príncipes de Serendip” (Boyle, 2000). Serendip era o nome que se dava ao Ceilão, actual Sri Lanka, e reza a lenda que um rei destas terras tinha três filhos, cuja educação constituía para si uma grande preocupação, pois, apesar de lhes reconhecer uma grande inteligência, gostaria também que se evidenciassem como altamente instruídos nas artes e nas ciências. Para além disso, e como forma de lhes dar alguma experiência de vida, mandou o rei que os filhos saíssem de Serendip e iniciassem a sua peregrinação. Quando os príncipes começaram a aprofundar (dip) as suas experiências de vida com serenidade (seren-dip-ity), vários episódios em que por acaso se iam envolvendo, tornavam extremamente excitante a sua caminhada. Entre eles, consta que um condutor de camelos lhes perguntou se não tinham visto passar um camelo. Embora, de facto, não o tivessem visto, os três irmãos perguntaram se esse camelo era cego de um olho, se lhe faltava um dente e se era coxo. Perante esta descrição, o condutor apressou-se a ir no encalço do camelo, mas como não o encontrou, decidiu interrogar novamente os príncipes. Estes acrescentaram que o camelo deveria carregar um pote de mel e outro de manteiga e que uma mulher grávida o conduzia. Tal era a precisão das descrições, que o condutor se convenceu que os príncipes não só tinham visto o camelo como tinham ficado com ele, tendo-os denunciado e tendo estes acabado por ser presos. Só quando mais tarde o camelo foi encontrado, os príncipes foram libertados! Chamados à presença do imperador daquela região e indagados sobre tamanha eficácia na descrição de algo que nunca tinham visto, os príncipes responderam que apenas tinham estado extremamente atentos aos diversos indícios ao longo do percurso. Por exemplo, deduziram que o camelo era cego de um olho por terem reparado que a erva apenas estava comida de um dos lados do caminho; que lhe faltava um dente por haver um tufo de erva entre aquela que tinha sido comida e que era coxo por haver apenas três pegadas mais nítidas no chão.

Assim, serendipidade parece indicar a sorte, a forma inesperada e casual de alguém detectar um qualquer facto ou acontecimento relevante, até aí desconhecido ou mesclado por um conjunto de variáveis confundentes.

Contudo, as posições menos românticas de Poincaré, “Uma ideia após longas horas de esforço” e de Edison “1% de inspiração e 99% de transpiração”,

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levam-nos a compreender que a criatividade nunca pode surgir senão após um longo período de investimento. Já em 1926, Wallas (cit. por Torre, 1993) referia-se às fases do processo criativo de que o insight era apenas uma parte. Previamente ao

insight, as fases de preparação acurada e de incubação, não poderiam ser

descuradas e tornavam-se mesmo imprescindíveis à fase de insight, por norma, a mais referenciada.

De facto, a sorte apenas parece favorecer as mentes mais preparadas, tal como afirmava Pasteur!

E é esta a essência daquilo que devemos entender por serendipidade.

Serendipidade, não no sentido das descobertas serem fruto estrito da sorte ou do acaso, mas sim de uma coincidência entre diversas variáveis. Assim, a serendipidade deverá ser considerada como o resultado de um olhar, mas de um olhar sagaz, a partir de um caldo concentrado e efervescente de ingredientes que levam ao acto criativo e para o qual se exige, pelo menos a inteligência, a emoção e a perseverança. Em termos mais precisos, como entender a criatividade senão como o resultado de uma coincidência feliz, já de si uma sorte ou acaso, entre tantos factores que se prendem quer com as características individuais (capacidades, conhecimentos, estilos cognitivos, interesses, motivações, traços de personalidade), quer com os aspectos contextuais que promovem e reconhecem como novos, adequados e úteis, determinados produtos científicos ou artísticos?

Parece imprescindível apostar na criatividade, pois sabemos quão arreigados estão os obstáculos ao investimento na criatividade, quer pela ideologia dominante, pelos objectivos traçados, como pelas práticas e atitudes escolares e parentais (Alencar & Fleith, 2008).

Partindo do pressuposto de que a denominada pequena criatividade abre caminho à grande criatividade (Torrance, 1988; Barron & Harrington, 1981), somos obrigados a considerar as múltiplas oportunidades que estão ao nosso alcance, para estimular, desenvolver e promover todas as formas criativas de pensamento.

Contudo, fazer um juízo de valor sobre a eficácia de um qualquer plano de intervenção, sem antes conseguirmos claramente caracterizar o estado da criatividade dos indivíduos considerados, seria insensato. Nesse sentido, impõe-se

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a reflexão sobre a pertinência e tentativas de adequação de um instrumento de avaliação de diversas facetas do pensamento criativo, à população portuguesa.

O TCT-DP (Test for Creative Thinking- Drawing Production ), de Urban e Jellen (1996), que pretende de forma mais holística fazer uma avaliação da criatividade, surge-nos como uma alternativa a ser seriamente ponderada.

O repto está lançado e se conseguirmos que algumas pessoas se mobilizem no sentido de estudar, questionar e reflectir sobre o conceito e as formas de avaliação da criatividade, ou mesmo de lutar pela implementação de estratégias mais criativas de pensamento em contexto familiar, escolar ou profissional, então já terá valido e pena.

CRIATIVIDADE: É URGENTE INVESTIR

“Students who fail to acquire a flexible and creative attitude toward life are at risk for absolescence, not only in their knowledge, but also in their skills for coping with life” (Sternberg, 2000a).

Apesar de moroso, difícil, paradoxal, complexo ou quase impossível, estudar e investir na criatividade é uma prioridade (Sternberg & Lubart, 1996). A promoção da mera capacidade de aprendizagem e de memória humanas, mostrou-se relativamente impotente face às mais modernas tecnologias, com as quais nos sentimos incapazes de competir. Para além disso, os avanços civilizacionais não se fizeram a partir de um amontoado de saberes ou dos vários saber - fazer e, nesse caso, não podemos descurar a importância da capacidade inventiva, eminentemente humana. A Filosofia sempre lhe conferiu destaque e, em particular, as teorias filosóficas mais modernas encaram a criatividade como uma força vital, de inspiração Darwiniana, ou como uma força cósmica, em que os ciclos de mudança se sucedem, em que se geram inevitavelmente novas formas, seja em termos evolutivos, filogenéticos, seja em termos científicos, artísticos ou tecnológicos (Stoltz, 1999).

A promoção da criatividade tem sido sentida como um dos melhores investimentos por parte de uma sociedade que almeje a sua própria sobrevivência. Luxuosa ou supérfula, foram os adjectivos que Einstein não conseguiu atribuir à criatividade, sob pena das soluções inovadoras para os mais graves problemas mundiais, como a pobreza ou o aumento demográfico, ficarem indefinidamente adiadas (Isaacson, 2008).

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Para essas soluções, seria necessário trabalhar afincadamente, com uma motivação inabalável, provavelmente intrínseca à própria forma de pensar, permitindo lançar novos e arrojados olhares sobre o status quo (Amabile, 1985).

Se pensarmos que a adopção de uma forma criativa de estar ainda pode trazer benefícios na forma como se encara o envelhecimento ou as doenças terminais, tal como alguns estudos referenciados por Smith e Carlsson (2006) nos apontam...

Se pensarmos que, em termos organizacionais, as recorrentes mudanças, desafios e maiores exigências exigem a implementação de uma política de sobrevivência, da qual faz parte a proliferação de cursos de formação do tipo, “Criatividade e Inovação”, “Competir na economia criativa”, “Criatividade nas cidades”, em que as capacidades de liderança e de inovação são cada vez mais enaltecidas...

Se os países e sucessivos governos, dizem querer investir na criatividade, e se, infelizmente, as suas condutas não são consonantes com esses ideais...

Sabemos que a ciência não é ideologicamente ingénua e que o domínio e o

campo, na acepção de Csikszentmihalyi (1988), exercem a sua influência no

sentido de determinar o que deve ou não ser considerado válido, inovador e digno de se perpetuar. O indivíduo e as suas produções vão deparar-se com o domínio de especialistas que obriga a uma distinção entre aquilo que é inovação e aquilo que é apenas bizarro ou pouco profícuo. Não menos importante é o campo de professores, historiadores, galeristas e críticos que, em última instância, redefinem o domínio considerado, ao ditar que tipo de informação simbólica é ou não digna de ser preservada e transmitida às gerações vindouras. Existe, assim, todo um contexto histórico-cultural que baliza a emergência dos produtos criativos e que referencia a sua importância.

Entenda-se o zeitgeist como o espírito do tempo ou espírito da época que impulsiona ou, pelo contrário, pode impedir a produção criativa. Se Rembrant constitui um excelente exemplo de como o reconhecimento não foi simultâneo ao trabalho efectuado, ou se o protótipo da máquina a vapor na Alexandria, caiu no esquecimento até à revolução industrial, por outro lado, as denominadas “épocas de ouro” como, por exemplo, o desenvolvimento da pintura e da escultura na Grécia Clássica e no Renascimento, da literatura em Paris no séc. XIX, ou da matemática no séc. XVII, elucidam-nos sobre a forma como muito provavelmente,

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os jovens mais dotados terão estado expostos a uma série de modelos e a uma grande diversidade cultural (Simonton, 1983).

De forma mais radical, Csikszentmihalyi (1988) levanta a grande questão “Onde está a criatividade?” que deveria substituir a já obsoleta questão “O que é a criatividade”. Obsoleta, pois segundo o mesmo autor, a criatividade não mais poderá ser vista como uma característica inerente a um sujeito, sem atendermos à valorização que o contexto mais vasto possa fazer dos produtos criativos.

Compreendemos, desta forma, a insistência e a referência, por parte de diversos autores, aos múltiplos e complexos obstáculos ao desenvolvimento da criatividade (Alencar & Fleith, 2008). O zeitgeist, na sua faceta de guerra e instabilidade política, pode não encarar positivamente a inovação, como na sua faceta de anarquia política, pode inibir o desenvolvimento da ciência e da filosofia, mas, pelo contrário, promover as actividades artísticas (Simonton, 1983, 1988)1.

Se se pode e deve investir na criatividade, todos teremos responsabilidades em defender a promoção de algumas atitudes que visem o desenvolvimento de maiores níveis de criatividade nos sujeitos (Sternberg, 2000b). Assim, entre essas atitudes, teríamos de ser capazes de redefinir os problemas, encorajar a geração de ideias, analisar as próprias ideias, vender as próprias ideias, reconhecer que o conhecimento pode ser simultaneamente essencial e contraproducente, saber identificar e ultrapassar obstáculos, encorajar a assunção de riscos, encorajar a tolerância à ambiguidade, sentir desejo de crescer, permitir a crença em si próprio, procurar fazer aquilo que mais se gosta, ensinar a importância de saber esperar pela gratificação e propiciar um ambiente que estimule a criatividade.

Não podemos continuar de costas voltadas para a necessidade de consciencialização por parte de todos os agentes educativos e organizacionais, bem como da população de uma maneira geral, da imprescindibilidade de desenvolver a criatividade aquando da formação pessoal, escolar e profissional dos sujeitos. Só assim se poderão atingir níveis mínimos de literacia científica e de capacidade de resolução de problemas, combatendo a acusação que tem

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A pressão familiar para que certas tarefas sejam cumpridas num específico espaço de tempo, para que se limite a liberdade de escolha da carreira; a pressão social e a sua inerente falta de tolerância à inovação; as condições económicas que obrigam a que muitos famílias estejam essencialmente preocupadas com a satisfação das necessidades básicas, bem como muitas das crenças religiosas, constituem-se como alguns dos obstáculos percebidos como mais determinantes da falta de investimento na criatividade (Oral, 2006).

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recaído sobre Portugal, como um dos países com menores índices de criatividade entre os países da OCDE, de acordo com os estudos Pisa de 2000 e 2003.

No sentido de podermos e devermos implementar medidas de promoção do pensamento criativo e ajuizarmos sobre a sua eficácia, torna-se vital, em primeiro lugar, possuirmos um instrumento que possa não apenas fazer um diagnóstico sobre os níveis de criatividade da nossa população, como também uma avaliação sobre os resultados de uma eventual intervenção escolar ou organizacional.

Mas, o que se entende, afinal, por criatividade?

CRIATIVIDADE: TENTATIVAS DE DEFINIÇÃO

Ibda significa criatividade na língua árabe, não havendo em nenhum país

africano, um termo que se possa traduzir por criatividade. Em cerca de vinte sete dialectos africanos aquilo que mais se aproxima de criatividade é, por exemplo, kunjingirisa, imo, atinuda, akankanyu, dimpa ou kusting, referindo-se a imaginativo, inteligente, ajuizado, talentoso ou artista (Mpofu et al., 2006).

No nosso continente europeu, o termo criatividade surge em França apenas após a segunda Grande Guerra, embora o termo criativo remonte a 1877, no suplemento do Dicionário de Língua Francesa, referindo-se a todo aquele que teria a virtude de criar. Contudo, os termos originalidade e imaginação continuariam a ser os mais frequentemente empregues, evidenciando a capacidade de um sujeito poder fazer emergir algo de novo ou original, já que, pelas raízes da teologia tradicional ainda tão presentes, criar, seria apanágio exclusivo de Deus (Torre, 1993).

Teríamos, a esse propósito, a referência à imaginação da Enciclopédia de Diderot e d’Alembert, alertando para a criatividade artística, ou a perspectiva de Gall, nos primórdios dos séc. XIX, sobre a detecção, através das saliências cerebrais, dos talentos para a música ou matemática, ou ainda a capacidade inventiva de todo o ser humano, mesmo que acto repetido e inovador meramente para o próprio, na acepção de Ribot (Mouchirou & Lubart, 2006).

No início do século XX, as abordagens dinâmicas, de inspiração freudiana, conferiram algum cariz científico ao estudo da criatividade. As criações literárias e artísticas seriam a expressão culturalmente aceitável de desejos inconscientes como, por exemplo, o poder, a riqueza, a fama, a honra e o amor. O conflito entre a

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realidade consciente e as pulsões inconscientes tanto se poderia evidenciar sob a forma de neurose, como sublimar-se sob a forma de produtos criativos. Claramente, nem todos poderiam ter ao seu alcance essa arma poderosíssima: o poder de criar (Lubart, 2007).

As teorias humanistas de Maslow e Rogers encararam a criatividade como uma tendência válida de auto-realização, apenas passível de ser alcançada depois dos sujeitos terem concretizado todas as suas outras necessidades e, por consequência, terem atingido um nível de maturidade psicológica, condição sine qua non, ao investimento no processo criativo. Para Maslow (1954), nesse percurso de auto-realização, bastaria que o sujeito se envolvesse no processo criativo, embora para Rogers (1985) fosse importante que a criatividade se traduzisse num produto criativo.

As teorias psicanalíticas e humanistas, tão diferentes nas suas origens e princípios, assemelharam-se num aspecto particular: privilegiaram os aspectos não especificamente cognitivos da personalidade.

Em simultâneo, Max Wertheimer, em 1912 (cit. por Wertheimer, 1961), alerta para os princípios da organização perceptiva (proximidade, semelhança, orientação, fechamento e continuidade), donde se conclui que o todo é muito mais do que o somatório das partes. A teoria da Gestalt lança assim os seus alicerces e, mais tarde, Kohler (1947) retrata o insight como um processo de organização súbita e inovadora de elementos, levado a cabo por um sujeito activo e capaz de atribuir significados, longe do mecanismo meramente associacionista. Nesse sentido, a criatividade constitui-se como uma reestruturação ou uma nova combinação de ideias.

Ainda, em 1950, a imaginação, função natural e universal da mente, era o termo mais referenciado (Barron, 1988).

A distinção entre a criatividade comum e a criatividade produtiva nos diferentes domínios do conhecimento, efectuada por Stein (1987) e Treffinger (1987), traduziu-se, respectivamente, nos conceitos de criatividade quotidiana, ou

pequena criatividade (little c) e de alta criatividade, ou grande criatividade (Big C), patente nos grandes criadores do mundo das ciências e das artes.

Contudo, a distinção entre pequena e grande criatividade já estava subjacente ao discurso de Guilford, em 1950. Na sua comunicação à APA (American Psychiatric Association), começa por criticar a hegemonia que o

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estudo da inteligência tinha assumido na Psicologia e na Educação, relegando para último plano os estudos sobre a criatividade, donde se viria a tornar particularmente evidente e compreensível, embora doloroso, que o lançamento do Sputnik em 1957 não tivesse sido efectuado pelos americanos. Guilford obrigou a que se lançasse um novo olhar sobre o conceito de criatividade demasiado apegado ao fenómeno de insight que parecia privilegiar apenas alguns eleitos, tais como um Mozart, Da Vinci ou Einstein. De facto, é feito um alerta para a importância de várias operações cognitivas, tais como a produção convergente, a cognição, a memória, a avaliação e, não menos importante, a produção divergente, passível de ser encontrada no comum dos mortais e de ser avaliada por uma série de questões cujas respostas não teriam uma única resposta correcta. Portanto, considerar que a criatividade quotidiana, ou as formas de pensamento divergente, poderiam seguir a curva normal de distribuição e que seria possível avaliá-las de forma mais fácil e frequente, constituía um avanço ímpar, pois a distribuição altamente assimétrica, a curva em forma de J invertido, das grandes revoluções artísticas e científicas, produzidas apenas por alguns sujeitos, tinha travado o estudo de outras facetas da criatividade (Simonton, 1988; Walberg, 1988).

E foi, sem dúvida, este legado de Guilford que inspirou a maior parte das conceptualizações no campo da criatividade.

Não terá sido por acaso que, apenas na segunda metade do séc. XX, o termo criatividade, enquanto substantivo abstracto, se tenha imposto no seio do vocabulário das diversas línguas (Torre, 1993). Em 1990, a edição do Concise Oxford Dictionary refere a criatividade como o substantivo referente ao adjectivo “criativo”, embora não apresente nenhuma definição (Kohot & Colman, 1997).

Os modelos da confluência, mais actuais, apostam na multiplicidade de componentes interactuantes: cognitivos (conhecimentos e capacidades relevantes, estilos cognitivos), conativos (características motivacionais e de personalidade), emocionais e contextuais (ambiente adverso ou, pelo contrário, recompensador), imprescindíveis à compreensão da emergência de um produto criativo.

Amabile (1983), no seu Modelo Componencial da criatividade, aponta três componentes como decisivos do processo criativo: a motivação, as aptidões relevantes para um determinado domínio (conhecimentos e aptidões que contribuem para um desempenho criativo num determinado domínio) e as aptidões criativas relevantes (aptidões transversais a vários domínios e que podem

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contribuir para o desempenho criativo em qualquer um deles). Esta autora é, sem dúvida, por demais reconhecida pela importância ímpar que atribuiu à motivação intrínseca, no desenvolvimento da criatividade.

Na mesma linha de ideias, Csikszentmihalyi (1997, 1998) desenvolve a Teoria do Fluxo da criatividade, acentuando o sentimento de prazer que as pessoas parecem retirar das actividades em que por vontade própria estão envolvidas, sejam elas de natureza física ou intelectual. Esse prazer é o que parece estar na origem do investimento mais acentuado, permitindo lidar com as dificuldades e engendrar novas respostas e soluções para os problemas que vão surgindo, não tendo em vista, a obtenção de recompensas extrínsecas, dinheiro ou fama, por exemplo. Esse estado de prazer, em que a concentração é absoluta, o medo de fracasso não existe, e se perde a noção do tempo e a noção de si próprio, é denominado de fluir.

Sternberg e Lubart (1991) também referem a confluência de diferentes factores na criatividade. Os cognitivos estão essencialmente centrados nas capacidades intelectuais (sintética, analítica, prático-contextual), nos conhecimentos e nos estilos de pensamento (legislativo, executivo e judicial). Os afectivos estão ligados à personalidade, mais concretamente ao não conformismo, à capacidade de assunção de riscos calculados, ao sentido de auto-eficácia, à concentração e à motivação intrínseca. Os contextuais referem-se ao ambiente que se revela apoiante ou, pelo contrário, pouco reforçador. Assim, de acordo com a Teoria do Investimento na criatividade, ser criativo significa que um sujeito, com certos traços cognitivos, persiga ideias desconhecidas, impopulares, ou seja, “compre em baixa” certas ideias, mas que, em termos afectivos, se sinta capaz de persistir até ao ponto em que será capaz de “vender em alta”, no momento em que o contexto sócio-cultural lhe tiver ficado rendido.

Este apelo à identificação, promoção e estimulação das formas criativas de pensamento em nada é paradoxal com o facto de devermos atender às variações desenvolvimentistas. Estas variações, flutuações, entre o pensamento mais conformista ou mais criativo, são inevitáveis e mesmo indispensáveis para que se atinjam os níveis mais elevados de pensamento criativo.

Numa perspectiva desenvolvimentista, Yurkevich (1996, cit. por Stepanossova & Grigorenko, 2006) propõe uma distinção entre criatividade ingénua ou natural e criatividade cultural típicas, respectivamente, das crianças

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mais jovens e dos adultos. As crianças mais novas, que ainda não adquiriram uma série de estereótipos sociais e culturais, evidenciam uma criatividade natural como forma de se expressarem no mundo em que vivem e não como forma de ultrapassar os conhecimentos tácitos. Ao longo do processo de desenvolvimento, as crianças desenvolvem-se em termos cognitivos e personalísticos, devendo passar a evidenciar um esforço para ultrapassar os estereótipos culturais. Assim se compreende que no início do período das operações concretas e com a aquisição simultânea dos estereótipos culturais, haja um decréscimo dos níveis de criatividade, pois a criança tem de passar pela fase de transição da criatividade natural para a criatividade cultural. Segundo a mesma autora, as crianças com características de sobredotação, com cerca de 7-8 anos, evidenciam menores índices de criatividade, comparativamente às crianças não sobredotadas, ao passo que por volta dos 8-9 anos, as crianças sobredotadas se distinguem de todas as outras pelos seus níveis mais elevados de pensamento criativo. Tal poderia ser explicado pelo facto das crianças sobredotadas adquirirem as normas sociais e os estereótipos mais cedo e mais rapidamente do que as outras, iniciando mais cedo, e por esse motivo, o processo de transição da criatividade natural para a criatividade cultural.

Sem pretendermos ter sido exaustivos na explanação das definições mais restritas ou dos modelos mais integradores da criatividade, ficamos certamente com a convicção de que a tarefa de avaliar a criatividade se vai tornando cada vez mais complexa, pelos modelos mais integradores a que a sua leitura tem obrigado. Nesse sentido, uma medida de avaliação da criatividade será, consciente e inevitavelmente, parcelar, não podendo contudo, descartar-nos dessa aventura de avaliar o possível, o melhor possível.

AVALIAÇÃO DA CRIATIVIDADE: POSSIBILIDADE(S)

Para além das abordagens mais ou menos filosóficas na avaliação dos processos ou dos produtos criativos, as primeiras metodologias empíricas assentavam nas medidas de aptidões relacionadas com a imaginação. Binet, em colaboração com Henri (1905, cit. por Gardner, 1998), preferiu apostar na avaliação dos processos intelectuais mais complexos, contrariando a prática de Galton, ou seja, deixando de lado as meras medidas psicofísicas tão em voga, tais como as de discriminação sensorial. Esses processos intelectuais mais complexos,

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entre outros, centravam-se na imaginação passível de ser avaliada, por exemplo, através de uma tarefa em que se pedia a cada sujeito para dizer o maior número de palavras em alguns minutos.

Também no início do séc. XX, mais precisamente em 1916, Laura Chassell (cit. por Torrance, 1976) propõe uma bateria de 12 testes de originalidade.

Portanto, cedo no percurso da Psicologia, diversos autores foram optando, em função do ângulo que mais valorizavam, por algumas metodologias de avaliação da imaginação que pudessem evidenciar a sua natureza polifacetada.

Assumindo a distinção defendida por Simonton (1988) entre os quatro P’s da criatividade (pessoa, processo, produto e persuasão), não menosprezamos a importância das formas de avaliação da criatividade centradas nas características de personalidade, nos produtos criativos ou na força da persuasão, enquanto condicionante sócio-cultural na promoção e aceitação dos produtos criativos. Sabemos que os modernos modelos da confluência nos acautelaram contra o perigo de avaliarmos de forma unidimensional aquilo que é, afinal, multifacetado. Assim, é compreensível que os instrumentos de avaliação da criatividade possam assumir as mais diversas formas, desde os inventários biográficos, as escalas de avaliação da personalidade, os inventários de atitudes e interesses, as avaliações de terceiros, a análise de sujeitos que se destacaram nas diversas áreas do saber, até aos tão divulgados testes de pensamento divergente, onde se inclui, por exemplo, o TTCT (Torrance’s Tests of Creative Thinking, 1974) de E. P. Torrance, e os de pensamento criativo, em que se enquadra o TCT-DP (Test for Creative Thinking-Drawing Production), elaborado em 1986 por Hans Jellen e Klaus Urban.

Estamos, contudo, cientes de que um dos maiores inspiradores, quer do TTCT, como do TCT-DP, foi, inegavelmente, Guilford. Em 1950, Guilford apostou na avaliação das formas de pensamento divergente, em pessoas comuns, utilizando testes de papel e lápis. Um dos mais difundidos, o Teste dos Usos Invulgares, pressupunha que os sujeitos escrevessem o maior número possível de usos para um objecto vulgar, como por exemplo, para um tijolo.

Estava, sem dúvida, ateado o rastilho para Torrance, enquanto representante de uma das mais influentes teorias do pensamento divergente, fazer emergir, em 1966, a sua Bateria de Testes de Pensamento Criativo (TTCT) amplamente divulgada em todo o mundo, a que não serão alheias as suas características de sistematicidade na cotação, fiablidade teste-reteste e fiabilidade

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inter-cotadores. Esta bateria é constituída por três subtestes figurativos (por exemplo, formar desenhos a partir de um conjunto de linhas paralelas) e sete subtestes verbais (por exemplo, pensar nos usos interessantes e invulgares que se poderão dar a caixas de cartão) que exigem competências de pensamento divergente e outras de resolução de problemas. Os critérios de cotação considerados são a fluência (número total de respostas relevantes), a flexibilidade (número de diferentes categorias de resposta), a originalidade (atendendo ao critério de raridade estatística) e, ainda, a elaboração (o número de pormenores adicionais à resposta base). Contudo, as versões mais recentes do TTCT, atentas a algumas dimensões personalísticas, não têm sido igualmente difundidas e percebemos que em Portugal ou na nossa vizinha Espanha, os critérios da fluência,

flexibilidade, originalidade e elaboração continuam os mais determinantes na

avaliação da criatividade. Já anteriormente, Bahia e Ibérico Nogueira (2006) haviam alertado para a importância da utilização de dimensões complementares tais como a expressividade do título, a emotividade do desenho, a abstracção, a fantasia e humor e ainda, o movimento, a inversão, a perspectivação invulgar e o rompimento de fronteiras.

Uma das mais sérias críticas dirigidas à generalidade dos testes de pensamento divergente, centra-se na questão da sua validade preditiva. Torrance (1988), baseado em dois estudos longitudinais (um com estudantes universitários e outro com sujeitos do 1º e 2º ano de escolaridade), conclui que os resultados obtidos nos testes de pensamento divergente prevêem com alguma segurança o desempenho criativo na vida adulta, através, por exemplo, de invenções, prémios e composições musicais. Da revisão de estudos efectuada por Barron e Harrington (1981), nem sempre se pôde concluir por uma inegável correlação entre os resultados dos testes de pensamento divergente e o comportamento criativo nas diversas áreas consideradas. Faria muito mais sentido, segundo esses autores, que os testes de pensamento divergente também se baseassem em estímulos específicos e relativos a cada uma das áreas ou domínios considerados. Talvez os testes de pensamento divergente não consigam prever com toda a certeza quais os sujeitos que se evidenciarão na vida adulta, mas reconhece-se que existe um grau, nada irrelevante, de probabilidade na previsão do comportamento criativo futuro (Torrance & Torrance, 1974).

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Em 1986, Hans Jellen e Klaus Urban criam um instrumento, o TCT-DP (Test for Creative Thinking - Drawing Production), cuja versão de 1996 se evidencia pela sua simplicidade e economia na aplicação, correcção e interpretação, permitindo identificar os sujeitos com o mais elevado potencial criativo, bem como os sujeitos com graves limitações nas aptidões criativas e que necessitem de programas de incentivo e apoio. Existem, portanto, vários campos de aplicação para esta forma de avaliação da criatividade: caracterização dos níveis e dimensões da criatividade numa vasta amplitude etária (sujeitos entre os 5 e 95 anos de idade), maior precisão por parte dos professores na análise dos potenciais criativos dos seus alunos; comparação entre turmas em termos dos seus níveis médios de criatividade com todas as implicações possíveis em termos de estilo de ensino a adoptar, modelo pedagógico a assumir e programas específicos de intervenção; detecção, nos níveis etários mais precoces, de maiores índices de criatividade; possibilidade de avaliar os efeitos pré/pós-teste de programas de intervenção; necessidade de ter em conta os índices criativos nos processos de orientação escolar e profissional; identificação de sujeitos sobredotados com um elevado potencial criativo; exploração de certas particularidades nos mais diversos casos clínicos e ainda pertinência do teste no domínio da investigação.

O TCT-DP, utilizado predominantemente na Europa, procura avaliar de forma holística e gestáltica a criatividade, a partir de seis fragmentos inacabados (semi-círculo, ponto, ângulo recto, linha curva, linha quebrada e pequeno quadrado aberto exterior à moldura) desenhados numa folha A4 e que os sujeitos devem completar de forma livre e aberta. O TCT–DP é composto por duas formas (A e B), a aplicar de seguida, representando cada uma delas uma rotação da folha de 180º em relação à outra.

As instruções consistem no seguinte: “Têm à vossa frente um desenho incompleto. O artista que o começou foi interrompido antes de saber exactamente o que iria desenhar. Vocês terão agora que completar este desenho. Podem desenhar tudo o que quiserem. Nada do que desenharem poderá ser considerado errado. Tudo o que desenharem será considerado correcto. Quando acabarem o vosso desenho façam-me um sinal para que eu o possa recolher.”.

Esses fragmentos incompletos, irregulares e de significado vago, permitem que o sujeito possa ser o mais flexível possível, condição indispensável à criatividade. Contudo, esses mesmos estímulos, pela sua própria configuração,

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impelem os sujeitos com menores níveis de criatividade, a apresentar respostas mais estereotipadas. Trata-se, portanto, de um teste figurativo, e que pretende avaliar algumas dimensões cognitivas e de personalidade, tais como a predisposição para assumir riscos, a afectividade, o humor, a quebra de fronteiras ou limites, ultrapassando em muito a essência de alguns testes de pensamento divergente, claramente mais redutores.

A forma de cotação contempla um total de 14 dimensões que enunciaremos de forma breve: Continuações; Completações; Novos elementos; Ligações feitas com linhas; Ligações que contribuem para um tema; Quebra do limite dependente do fragmento; Quebra do limite independente do fragmento; Perspectiva; Humor, emocionalidade e poder expressivo do desenho; Não Convencional A - manipulação não convencional do material; Não Convencional B - simbólico, abstracto, fictício; Não Convencional C - símbolo, figura; Não Convencional D - não estereotipado; e, ainda, a Rapidez.

O TCT–DP tem por base o Modelo Componencial, entretanto reapresentado por Urban, em 1991, que assenta em seis componentes que funcionalmente interactuam e se influenciam mutuamente, intervindo na globalidade do processo criativo, não podendo qualquer deles, tomado isoladamente, ser responsável pelo processo criativo como um todo. Esses componentes dizem respeito ao “Pensamento Divergente e Acção”, “ Conhecimento Geral e Pensamento de Base”, “Conhecimento de Base Específico e Aptidões em Áreas Específicas”, “Concentração e Empenho na Tarefa”, “ Motivação e Motivos” e “ Abertura e Tolerância à Ambiguidade.” Para além disso, esses componentes apenas podem ser entendidos à luz de três vectores ecológicos: de um ponto de vista desenvolvimentista, aquele que estimula ou inibe o desenvolvimento da criatividade; aquele que aponta para procedimentos específicos e aquele que alude a variáveis individuais, grupais e históricas.

De acordo com este modelo componencial e com os 14 critérios de cotação, a visão sobre o processo de avaliação da criatividade parece-nos amplo, ultrapassando em muito a análise das características de pensamento divergente mais difundidas. Contudo, e considerando igualmente a nossa prática com este instrumento, facilmente reconhecemos a dificuldade dos 14 critérios de cotação corresponderem directamente e de forma abrangente às diversas dimensões inerentes ao modelo componencial de base. Sabemos que um instrumento de

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avaliação e diagnóstico da criatividade dificilmente pode espelhar de forma directa e compreensiva todas as dimensões de um modelo teórico, mas reconhecemos que, apesar dessa mesma lacuna, o TCT-DP nos pode fornecer indicadores valiosos. No entanto, a questão da validade de conteúdo é uma questão incontornável, exigindo uma atenção mais apurada e que será objecto de estudos futuros.

Como vemos, nenhum dos testes considerados, TTCT e TCT-DP, está isento de críticas. Em um trabalho anterior, Bahia e Ibérico Nogueira (2006) tentam contrapor os aspectos que se afiguram mais e menos positivos de ambos, por forma a poder vir a fazer uma opção mais consciente, tendo em vista uma metodologia de investigação e/ou uma prática interventiva. Assim, o TTCT impõe- se pela sua ampla divulgação e aferição para um grande número de países e, por outro lado, o facto de englobar subtestes de tipo verbal e figurativo, permite obviar algumas das limitações inerentes à natureza quer dos estímulos verbais, quer dos estímulos figurativos, tomados isoladamente. É reconhecido que os estímulos figurativos permitem que sujeitos com poucas competências escolares ou culturais possam, ainda assim, evidenciar características de pensamento divergente e, por outro lado, compreende-se que os estímulos verbais possam obviar algumas dificuldades frequentemente apontadas pelos sujeitos, relativas à falta de interesse ou de aptidão para as actividades pictóricas. Contudo, na nossa prática de avaliação dos sujeitos, sentimos que o TTCT é moroso na aplicação e na cotação das respostas, o que torna difícil a sua exequibilidade, optando os investigadores, na maior parte das vezes, pelo recurso a um ou dois dos subtestes, normalmente figurativos, mais apelativos e fáceis de cotar. Assim, parece perder-se uma das vantagens que à partida o TTCT apresenta relativamente a outros testes, a de avaliar a criatividade com base em estímulos tanto figurativos como verbais.

O TCT – DP apresenta-se como mais económico, pois apenas se cinge a dois subtestes (formas A e B), ao invés dos 10 integrantes do TTCT e, apesar do seu carácter eminentemente figurativo, tem em consideração 14 critérios de cotação, abrangendo factores de personalidade, motivacionais e emocionais, partindo de uma visão mais holística e gestáltica da criatividade, o que por si só nos parece aliciante para apostarmos na promoção de estudos sobre as suas qualidades psicométricas, bem como na caracterização do nossa população, nas suas diversas facetas e dimensões.

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O TCT-DP tem originado um grande número de investigações, algumas das quais centradas na elaboração de normas para diversos países, bem como nas suas qualidades psicométricas.

De referir que os estudos que decorreram entre 1988 e 1993 com 2519 sujeitos da população alemã, a quem se aplicou a forma A, permitiram elaborar normas para as mais diversas faixas etárias, para ambos os sexos e diferentes níveis de escolaridade (Urban & Jellen, 1996). Igualmente, vários países (Filipinas, Inglaterra, Alemanha, USA, Nigéria, China, Zimbabwe, índia, África do Sul, Indonésia e Camarões) realizaram os seus estudos com o TCT-DP, com sujeitos de idades compreendidas entre os 11 e os 16 anos, donde resultaram valores médios de criatividade que passaram a servir de padrão de referência. O valor médio da amostra alemã, relativa a essa ampla faixa etária, é de 24 pontos, evidenciando os Camarões e a Indonésia, os valores mais baixos (14.9) e as Filipinas o valor médio mais elevado (28.2). Contudo, a reduzida dimensão das amostras consideradas (entre 40 e 70 participantes) exige algumas cautelas na utilização e interpretação destes resultados. Um estudo efectuado por Crammond e Urban (1995, cit. por Urban & Jellen, 1996) com amostras alemãs e americanas de estudantes universitários, que enferma exactamente da mesma limitação quanto ao número de participantes, evidenciou para o TCT-DP, valores médios, respectivamente, de 30.2 e 28.8.

Urban e Jellen (1996) referem alguns estudos por si desenvolvidos, ou em parceria, que apontam para bons índices de consistência interna (com valores de Alpha de Cronbach superiores a .87), níveis elevados de fiabilidade intercotadores (valor médio de .95 para cotadores treinados) e de fiabilidade entre as formas paralelas A e B (cujos índices variam entre .64 e .77, numa amostra de 161 sujeitos húngaros do 4º ano de escolaridade). Outros autores realizaram diversos estudos, encontrando igualmente boas qualidades psicométricas para o TCT-DP. Por exemplo, Brocher (1989, cit. por Urban & Jellen, 1996), com uma amostra de sujeitos com características de sobredotação (entre os 14 e 18 anos), encontrou bons índices de fiabilidade teste-reteste (que variam entre .71 e .81, consoante se considere os grupos submetidos a um programa de treino da criatividade, ou pelo contrário, de controlo). Em termos de validade, mais especificamente de validade discriminante, os primeiros estudos efectuados e referidos Urban e Jellen (1996) não encontraram correlações significativas entre os resultados do TCT-DP e do

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IST 70 (Inteligence Structural Test), aplicados a sujeitos sobredotados na matemática a frequentar o 7º ano de escolaridade. Os igualmente citados Wolanska e Neçka (1990) não encontraram correlações significativas entre os resultados do TCT-DP e das Matrizes Progressivas de Raven, em sujeitos sobredotados intelectualmente, na amostra polaca. Contudo, em sujeitos sem características de sobredotação, com idades compreendidas entre os 7 e os 18 anos, foram encontradas correlações positivas entre os resultados de ambos os instrumentos. Estes resultados parecem reforçar a ideia central subjacente à Teoria do Limiar de Torrance (1962, cit. por Lubart, 2007), segundo a qual se pressupõe que a criatividade está condicionada por um limiar mínimo de inteligência, limiar esse, acima do qual criatividade e inteligência parecem operar de forma relativamente independente. Nesse sentido, a inteligência seria uma condição necessária mas não suficiente à emergência da criatividade. Em termos de validade convergente, um estudo de Kirsch (1988, cit. por Urban & Jellen, 1996) terá evidenciado algumas correlações positivas entre as pontuações obtidas no TCT-DP e as obtidas numa bateria de testes de pensamento divergente (TDK), apenas num grupo escolar considerado (5º ano de escolaridade). A correlação mais forte existe entre o critério Novos elementos do TCT-DP e o subteste 3 do TDK, um subteste figurativo, considerado mais próximo do TCT-DP. Outras correlações menos fortes foram encontradas entre algumas dimensões do TCT-DP (Novos elementos e Ligações que contribuem para um tema) e alguns subtestes do TDK (Desenhos, Comparações Engraçadas e Adivinhar Desenhos). Com os subtestes Jogar com Cubos e Histórias Malucas, não foram encontradas correlações estatisticamente significativas, provavelmente devido à diferente natureza dos critérios de cotação. Parece-nos relevante, a este propósito, alertarmos para uma questão central na área da criatividade: saber se se deve falar de criatividade ou de criatividades, de uma criatividade geral ou de várias criatividades mais específicas. Na acepção de Gardner (1998), no seu modelo das inteligências múltiplas e autónomas, é compreensível que se refiram as várias formas de criatividade, mas, segundo outros autores (e.g., Martindale, 1989), deveríamos antes considerar a criatividade como uma aptidão geral e transversal aos vários domínios e áreas do saber. Urban e Jellen (1996) ainda referem um estudo para avaliar possíveis correlações entre os resultados do TCT-DP e os juízos que os professores faziam sobre os índices de criatividade dos seus alunos (3º-6º e 8º-9º anos de escolaridade). As avaliações

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efectuadas por oito dos 14 professores correlacionaram-se positivamente com os resultados do TCT-DP e, de forma mais acentuada, no caso de se tratarem de professores de artes. Diversas investigações, referidas por Urban e Jellen, encontraram outros resultados interessantes em termos de validade prática. Assim, puderam encontrar-se: níveis mais elevados de criatividade (em particular nos critérios Novos elementos, Humor, Ligações que contribuem para um tema) em sujeitos submetidos a um estilo de ensino democrático (por oposição ao autocrático) por parte dos seus professores de futebol (Herrman, 1987); níveis mais elevados de criatividade em compositores musicais (de jazz e rock, entre os 18 e 35 anos) comparativamente a sujeitos que trabalhavam no Instituto Científico e Técnico (entre 20 e 40 anos) (Scheliga, 1988); níveis mais elevados de criatividade nos 10 estudantes que tinham ganho prémios de engenharia numa competição nos EUA (Jellen & Bugingo, 1989); um leque mais alargado de hobbies e de interesses, maior atenção às artes e música e manifestação de objectivos profissionais mais ambiciosos, por parte dos sujeitos considerados mais criativos, numa amostra húngara de 1100 sujeitos do 4º ano de escolaridade (Gefferth, s. d.).

Em Portugal, desde 2006 que temos vindo a desenvolver alguns estudos preliminares e exploratórios com base no TCT-DP, tendo em vista a análise das suas qualidades psicométricas em amostras de jovens e adultos portugueses, bem como a caracterização dos níveis de criatividade dos diversos sujeitos, atendendo às diferenças em função do sexo, idade e habilitações literárias, entre outras variáveis.

Em termos de fiabilidade, temos encontrado bons níveis de consistência interna (através do índice de Alpha de Cronbach), quer para amostras de trabalhadores portugueses (Almeida & Ibérico Nogueira, 2006, 2008b; Almeida, Ibérico Nogueira, & Urban, 2008), como para uma amostra de jovens pertencentes aos 6º e 9º anos de escolaridade (Ibérico Nogueira & Almeida, 2008a). Refira-se, em particular, o estudo de Almeida, Ibérico Nogueira e Urban (2008), efectuado com uma amostra de 646 adultos, com uma média de idades de 32 anos, tendo sido obtidos bons índices de consistência interna (.80 para a forma A e .78 para a forma B).

No que diz respeito à validade factorial, as análises factoriais para as diversas amostras têm revelado cinco e quatro factores, respectivamente para as formas A e B, e seis factores para as duas formas tomadas em conjunto, numa

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amostra de 169 adultos trabalhadores (Almeida & Ibérico Nogueira, 2006), quatro factores para a forma A, numa amostra de 210 trabalhadores (Almeida & Ibérico Nogueira, 2008b), seis factores para a forma A, com estudantes universitários (Ibérico Nogueira & Almeida, 2008a) e quatro factores, respectivamente para as formas A e B, numa amostra de 646 adultos portugueses (Almeida, Ibérico Nogueira, & Urban, 2008). A diversidade das estruturas factoriais encontrada leva-nos a considerar a sensibilidade deste instrumento em termos desenvolvimentistas e culturais, obrigando-nos, contudo, a projectar estudos com amostras mais alargadas e diversificadas da população portuguesa.

Também encontrámos uma elevada correlação entre os índices de criatividade obtidos a partir das formas A e B, não havendo diferenças estatisticamente significativas entre eles (Almeida & Ibérico Nogueira, 2006), o que nos levou, em estudos posteriores, a optar pela aplicação exclusiva da forma A. Contudo, esta questão da pertinência de se aplicarem ambas as formas no contexto português, ainda está em aberto. É relevante salientar o facto da aplicação de ambas as formas na amostra alemã gerar alguma melhoria nos índices de criatividade aquando da aplicação da forma B, embora, em rigor, essas diferenças não sejam estatisticamente significativas, e de, pelo contrário, na amostra portuguesa, haver um decréscimo, apesar de também não estatisticamente significativo. Os autores do TCT-DP alegam que a forma A tem a função de quebrar a primeira resistência por parte dos sujeitos, sentindo estes que as suas respostas mais inovadoras ou arriscadas são definitivamente aceites aquando do desempenho com a forma B. Do contexto real de aplicação do TCT-DP a amostras portuguesas, retivemos vários comentários que os sujeitos não se inibiam de fazer ao darem-se conta de que havia uma forma B ainda por realizar. Esses comentários reflectiam a ideia de que se estava a perder tempo com uma tarefa tão semelhante à anterior, ou, por outras palavras, que o grau de motivação inevitavelmente decrescia face a uma tarefa cujo grau de desafio e novidade teria diminuído. Certamente que alguns aspectos culturais poderão diferenciar as realidades alemã e portuguesa e explicar, pelo menos em parte, a divergência de resultados senão mesmo de atitudes, obtida. De facto, um estudo de Crammond e Urban (1995, cit. por Urban & jellen, 1996), sobre os desempenhos criativos de estudantes americanos e alemães, não encontra diferenças estatisticamente significativas entre eles, quer no TCT-DP, quer no TTCT, revelando, contudo, que os alemães eram os

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mais insatisfeitos com a primeira boa solução encontrada, o que, de alguma forma, segundo o nosso ponto de vista, poderá explicar o seu maior investimento na forma B do TCT-DP, referida anteriormente. Assim, consideramos a possibilidade de efectuar novos estudos por forma a tomar uma decisão mais empiricamente fundamentada.

De uma forma geral, encontrámos diferenças estatisticamente significativas a favor dos jovens alemães, por comparação com os jovens portugueses (Ibérico Nogueira & Almeida, 2008a), bem como a favor da população adulta alemã, em detrimento da população adulta portuguesa (Almeida & Ibérico Nogueira, 2008c). Claramente que esta discrepância sistemática entre os níveis de criatividade das amostras portuguesas e alemãs nos leva a questionar seriamente a forma como muito em particular as nossas escolas têm investido no desenvolvimento do potencial criativo dos estudantes, apesar das directrizes formais em termos curriculares. Para além disso, é reconhecido por vários autores (Runco, 2007; Simonton, 1983) que as diversas dimensões culturais relativas a cada cultura considerada, poderão promover ou, pelo contrário inibir o desempenho criativo, de que o maior investimento por parte dos alemães na forma B do TCT-DP, pode ser um bom exemplo, como tivemos oportunidade de referir.

Atendendo à variável sexo, os nossos resultados são consonantes com os referidos por Urban e Jellen (1996), pois não detectaram diferenças estatisticamente significativas entre homens e mulheres, no que diz respeito aos índices de criatividade (cf. amostra de professores, Almeida, Correia, & Ibérico Nogueira, 2007; amostra de sujeitos trabalhadores, Almeida, Ibérico Nogueira, & Bahia, 2007; amostra de adultos trabalhadores, Almeida, Ibérico Nogueira, & Farinha, 2008; amostra de jovens estudantes, Ibérico Nogueira & Almeida, 2008b), à excepção de um estudo efectuado com adultos trabalhadores que apontou os homens como mais criativos (Almeida & Ibérico Nogueira, 2006). Atenda-se ao facto das tarefas em causa avaliarem a denominada pequena criatividade, e neste caso, os estudos, efectuados a partir de vários testes de pensamento divergente, são contraditórios, enquanto que ao nível da grande criatividade, os estudos são mais unânimes na afirmação da superioridade evidenciada pelo sexo masculino, estando a importância relativa das influências biológicas e sociais envolta numa grande polémica teórica (Simonton, 1984).

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Considerando a variável idade, originalmente, Jellen e Urban (1986) não encontraram diferenças nos níveis de criatividade entre os sujeitos com mais de 11 anos de idade. Contudo, no que diz respeito aos estudos portugueses, os resultados são aparentemente contraditórios, pois encontrámos diferenças estatisticamente significativas que favorecem tanto os sujeitos mais velhos (Almeida, Ibérico Nogueira, & Bahia, 2007; Ibérico Nogueira & Almeida, 2008b), como os mais novos (Almeida & Ibérico Nogueira, 2006, 2008a), no que à criatividade diz respeito. No entanto, uma análise mais fina revela que os grupos que mais se destacam pelos seus níveis de criatividade são precisamente aqueles que possuem maiores níveis de habilitações literárias, independentemente de serem ou não mais velhos. De facto, os sujeitos cujas habilitações literárias se situam num mesmo nível superior não se diferenciam pelos seus níveis de criatividade, apesar de poderem diferenciar-se em termos etários. É o que parece acontecer com uma amostra de professores (Almeida, Correia, & Ibérico Nogueira, 2007), ou de delegados de propaganda médica, bastante homogéneos em termos de habilitações literárias, apesar das suas diferenças de idade (Almeida, Farinha, & Ibérico Nogueira, 2008). Nesse sentido, também se compreende que os jovens que frequentam o 6º e 9º anos de escolaridade, para além das diferenças etárias, revelem diferentes níveis de criatividade (Ibérico Nogueira & Almeida, 2008b). De facto, algumas análises de regressão têm mostrado que uma das variáveis preditoras dos níveis de criatividade são as habilitações literárias (Ibérico Nogueira & Almeida, 2008b; Almeida & Ibérico Nogueira, 2008b). Mais uma vez se levanta a questão de saber se o pensamento criativo opera independentemente de um certo nível de instrução e de conhecimentos quando, segundo os modelos da confluência já descritos, o conhecimento de base parece constituir uma condição necessária, embora não suficiente à emergência da criatividade. Se a escola é apontada como tão deficitária em tantos aspectos, nomeadamente no que ao incentivo à criatividade diz respeito, parece-nos que a ausência de escolarização teria efeitos muito mais nefastos para os indivíduos.

Outros estudos, por nós efectuados, têm revelado resultados adicionais. Por exemplo, encontrámos diferenças estatisticamente significativas que apontam os filhos únicos ou primogénitos como mais criativos (Ibérico Nogueira & Almeida, 2008). Contudo, a questão da posição na fratria e sua relação com a inteligência e criatividade, não tem sido pacífica. Alguns defendem que os primogénitos são

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menos criativos, pois que o seu papel na família obriga-os, muitas das vezes, a assumir comportamentos mais conservadores e conformistas, nomeadamente perante os irmãos mais novos, dificultando, assim, a assunção da fantasia necessária à criatividade (Sulloway, 1996, cit. por Lubart, 2007). Outros, pelo contrário, defendem que a maior percentagem de primogénitos entre os que mais se destacam na sua vida adulta, indicia um elevado nível de criatividade (Altus, 1966, cit. por Baer et al., 2005). Outros, ainda, defendem que os filhos do meio estariam na posição privilegiada para assumir a sua não submissão, principalmente se fossem os segundos filhos (Sulloway, 1996, cit. por Runco, 2007). Sugerem-se mais estudos no âmbito português para esclarecer esta questão, considerando que as variáveis relativas ao domínio de excelência considerado, bem como o tipo de criatividade avaliada (pequena ou grande criatividade), poderão conter, em parte, a resposta para algumas destas divergências.

Outros resultados apontam os estudantes de Arquitectura como mais criativos comparativamente aos Psicologia e Engenharia Civil (Ibérico Nogueira, Almeida, & Bragança, 2010). Se os estudantes de Arquitectura se evidenciam como mais criativos, podemos considerá-los efectivamente como mais criativos, por exigência do curso que frequentam ou pelas suas características próprias que os levam a optar pela Arquitectura. Contudo, e para além destas hipóteses, devemos colocar uma outra, a de estes sujeitos poderem, de alguma forma, ter sido beneficiados pelo carácter figurativo do TCT-DP. Estudos posteriores com outras tarefas criativas, nomeadamente de natureza verbal, poderão elucidar-nos relativamente a esta questão.

Outros estudos estão em curso, centrados quer nas qualidades psicométricas do TCT-DP, quer na caracterização dos níveis de criatividade dos alunos de diversos anos de escolaridade, como ainda na detecção de eventuais correlações entre os níveis de criatividade e outros índices de criatividade, em que se incluem os avaliados pelos professores através da EACCAS (Escala de Avaliação de Características Comportamentais dos Alunos Sobredotados, Renzulli & Hartman, 1974, Adaptação portuguesa de Pereira, 1994), os sinalizados por escalas de valores, nomeadamente o LVI-R (Life Values Inventory, Crace & Brown, 1996, Adaptação portuguesa de Almeida & Pinto, 2004), que identifica, por exemplo o valor Criatividade),ou os avaliados por escalas de estilos de pensar e criar, nomeadamente a EPC (Estilos de Pensar e Criar, Wechsler, 2006). Outros

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estudos estão a decorrer com o recurso a certas formas de avaliação de algumas variáveis possivelmente associadas à criatividade, tais como: inteligência, personalidade, práticas parentais e vinculação, entre outras. Designs experimentais para averiguar a importância das emoções positivas e negativas no desempenho criativo começaram igualmente a ser implementados com amostras de estudantes universitários.

Parafraseando Sternberg (2000b), se a criatividade é uma decisão, então considerar e reflectir sobre as vantagens e desvantagens de um instrumento de avaliação, o TCT-DP, foi o primeiro passo. A formulação de toda uma cadeia de investigações de natureza correlacional e experimental, baseada num instrumento cujas qualidades psicométricas nos pareceram promissoras, continuará o seu decurso, aliada a um instrumento devidamente validado para a população portuguesa. Provavelmente, ainda lacunar e insuficiente, o TCT-DP, parece merecer tornar-se o despoletador de novos e enriquecedores olhares e contributos sobre a criatividade.

O acaso de conhecermos alguém que nos levou pelo caminho da criatividade, a sorte de outro alguém reforçar a nossa opção e podermos decidir investir na área da criatividade, em termos pessoais e institucionais, o desejo partilhado por tantos, para que a criatividade não mais se mantenha nas margens da Psicologia e da Educação, a motivação para persistir numa área de investigação ainda pouco reconhecida, a intuição de que investir numa “ideia que ainda está em baixa”, a aferição de um instrumento de avaliação da criatividade, que se reverterá, mais tarde ou mais cedo, num produto de “venda em alta”... isso é Serendipidade!

Nota final: Se alguém ainda se questiona sobre as deduções a propósito dos potes de manteiga e de mel e da mulher grávida que conduzia o camelo, sugerimos que continue a sua viagem, aprofundando o conceito de serendipidade. Encontrará, não duas, mas mais respostas e certamente mais inquietações que o levarão pelo caminho da criatividade, tornando-se um desafio cada vez mais intrigante e fascinante.

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Referências

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