• Nenhum resultado encontrado

Translatio iudicii: análise sobre a conservação de decisão liminar proferida por tribunal absolutamente incompetente

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Translatio iudicii: análise sobre a conservação de decisão liminar proferida por tribunal absolutamente incompetente"

Copied!
89
0
0

Texto

(1)

LUIZA NEVES DEODATO

TRANSLATIO IUDICII:

ANÁLISE SOBRE A CONSERVAÇÃO DE DECISÃO LIMINAR PROFERIDA POR TRIBUNAL ABSOLUTAMENTE INCOMPETENTE

Tubarão 2019

(2)

LUIZA NEVES DEODATO

TRANSLATIO IUDICII:

ANÁLISE SOBRE A CONSERVAÇÃO DE DECISÃO LIMINAR PROFERIDA POR TRIBUNAL ABSOLUTAMENTE INCOMPETENTE

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Linha de pesquisa: justiça e sociedade.

Orientador: Prof. Zulmar Duarte de Oliveira Junior, Esp.

Tubarão 2019

(3)
(4)

ll

Dedico esta monografia aos meus pais, Adriana e Dirto, porque são a fonte de toda a minha força. E, em especial, dedico ao Tio Plínio (in memoriam) e à Tia Zine, que me encorajaram a cursar Direito. Sem dúvida, essa foi uma das melhores escolhas da minha vida. Toda minha gratidão a vocês.

(5)

AGRADECIMENTOS

cONC

Considero este trabalho acadêmico uma grande realização, em razão de ser uma das principais metas que me propus a cumprir ao longo de minha jornada de estudos. Assim, o fiz com muita dedicação, mas, sem dúvidas, não foi uma conquista que obtive sozinha. Por isso, mister algumas palavras para demonstrar minha gratidão às pessoas que estiveram comigo nessa fase tão importante.

Sempre, em primeiro lugar, agradeço a Deus por toda proteção e paz concedidas a mim, sendo meu amparo nos momentos de dúvidas e ansiedade.

Expresso toda a minha gratidão à minha mãe, Adriana, que, com toda a sua bondade genuína, me proporcionou conforto físico e mental para que eu pudesse me concentrar neste estudo. Do mesmo modo, agradeço imensamente ao meu pai, Dirto, porque sempre muito disposto a me apoiar, permitiu que esse caminho envolto por abdicações e preocupações se tornasse muito mais leve. Obrigada por tudo!

Tenho grande consideração e gratidão às minhas amigas de infância e às amigas que tive a graça de encontrar na universidade, porque foram elas que me afagaram quando eu estava cansada e preocupada. Aos meus amigos, agradeço pelos favores, pelas risadas, pelas conversas e compreensão. Vocês são demais!

Agradeço aos meus colegas da Procuradoria Jurídica de Tubarão, que foram essenciais à produção do projeto desta pesquisa. Em especial, guardo gratidão à Dra. Patrícia Uliano Effting, pois, além do suporte prestado como chefe e professora, foi quem me abriu os olhos ao relevante tema deste trabalho.

À equipe de trabalho que faço parte na Promotoria de Justiça de Armazém, obrigada por me ouvirem sempre, pelas sugestões e atenção dadas a mim com muito esmero. Essa contribuição foi ímpar para o trabalho.

Registro grande admiração ao meu orientador, Zulmar Duarte de Oliveira Junior, pelo profissional de sucesso que é, e manifesto a minha gratidão por tanto conhecimento transmitido a mim com muita paciência nesses meses de pesquisa. Redigir um trabalho acadêmico com a orientação de um profissional desta qualificação foi e é uma honra para mim. Enfim, oferto meus sinceros agradecimentos aos professores da Universidade por todos os ensinamentos repassados, porque foram fundamentais à redação desta monografia.

(6)
(7)

RESUMO

O principal objetivo deste trabalho monográfico é analisar a possibilidade de conservação dos efeitos da decisão liminar proferida por Tribunal absolutamente incompetente até o recebimento do recurso pelas Turmas Recusais dos Juizados Especiais Federais e dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, conforme a regra da translatio iudicii e diante da controvérsia sobre a admissibilidade do recurso contra decisão que indefere a tutela provisória no âmbito destes juízos. À vista disso, classificou-se a pesquisa em nível exploratório, tendo o método de abordagem natureza qualitativa, utilizando-se o procedimento bibliográfico e documental como fonte predominante da coleta de dados, entre doutrinas, trabalhos acadêmicos, legislação, regimentos e decisões dos órgãos colegiados. Por meio deste ensaio constatou-se que há interpretação extensiva pela doutrina e pelas Turmas Recursais quanto aos artigos 5º da Lei n. 10.259/2001 e 4º da Lei n. 12.153/2009, admitindo-se recurso da decisão que defere e indefere a tutela de urgência no âmbito dos Juizados Especiais Federais e dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, bem como interpretação literal, admitindo-se recurso somente da decisão que defere a tutela provisória. Ainda, a regra translatio iudicii foi encampada pelo Código de Processo Civil de 2015, no artigo 64, §4º, assentando que, salvo ordem contrária, as decisões proferidas por juízo incompetente continuarão surtindo efeitos até nova decisão do juízo competente. Concluiu-se que, não havendo revogação expressa, a translatio iudicii impõe a conservação da decisão liminar exarada por Tribunal absolutamente incompetente, que continuará surtindo efeitos substanciais e processuais após o declínio da competência e até o recebimento do recurso pela Turma Recursal correspondente, independentemente do entendimento acolhido quanto à admissibilidade ou à inadmissibilidade do recurso. De sorte, a obrigação de fornecer medicamentos por parte dos entes públicos ao demandante particular permanecerá enquanto não disposição contrária pelas Turmas de Recurso.

Palavras-chave: Juizado Especial. Tutela provisória. Translatio iudicii. Medicamentos. Recurso.

(8)

ABSTRACT

The main objective of this study is to analyze the possibility of preserving the effects of the injunction rendered by an absolutely incompetent court until the appeal is received by the Federal Special Courts and the Special Treasury Courts, according to the translatio iudicii rule and before the controversy regarding the admissibility of the appeal against a decision rejecting interim relief under those judgments. In view of this, the research was classified at the exploratory level, having the method of approach qualitative nature, using the bibliographic and documentary procedure as the predominant source of data collection, among doctrines, academic papers, legislation, regiments and decisions of the Colegiate Court. Through this essay it was found that there is extensive interpretation by the doctrine and the Appellant Courts regarding articles 5th of Law n. 10.259/2001 and 4th of Law n. 12.153/2009, admitting an appeal against the decision that defends and rejects the urgent tutelage under the Federal Special Courts and the Special Treasury Courts, as well as literal interpretation, admitting appeal only from the decision that provides for provisional protection. In addition, the translatio iudicii rule was overturned by the 2015 Code of Civil Procedure, article 64, §4th, stating that, unless otherwise ordered, decisions rendered by an incompetent court will continue to be effective until further decision by the competent court. It was concluded that, in the absence of express revocation, translatio iudicii imposes the retention of the preliminary ruling issued by the absolutely incompetent Court, which will continue to have substantial and procedural effects after the jurisdiction has declined and until the corresponding Appeal Chamber has received the appeal, regardless of upholding the admissibility or inadmissibility of the action. Accordingly, the obligation to provide public authorities with medicinal products to the private plaintiff will remain as long as the Appellant Courts do not provide otherwise.

(9)

LISTA DE SIGLAS

CF – Constituição Federal CPC – Código de Processo Civil

FONAJE – Fórum Nacional dos Juizados Especiais

FONEJEF – Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais FPPC – Fórum Permanente de Processualistas Civis

JEC – Juizado Especial Cível JEF – Juizado Especial Federal

JEFP – Juizado Especial da Fazenda Pública LJEF – Lei do Juizado Especial Federal LJEFP - Lei do Juizado da Fazenda Pública STJ – Superir Tribunal de Justiça

STF – Supremo Tribunal Federal

TJSC – Tribunal de Justiça de Santa Catarina

(10)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 11

1.1 DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMA ... 11

1.2 HIPÓTESES ... 14 1.2.1 Hipótese I.. ... 14 1.2.2 Hipótese II ...14 1.3 JUSTIFICATIVA ... 15 1.4 OBJETIVOS ... 16 1.4.1 Geral...16 1.4.2 Específicos ...16

1.5 DEFINIÇÃO DOS CONCEITOS OPERACIONAIS ... 17

1.6 DELINEAMENTO DA PESQUISA ... 18

1.6.1 Caracterização básica ... 18

1.7 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO E ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS ... 19

2 COMPETÊNCIA INTERNA DO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO ... 20

2.1 JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA ... 20

2.1.1 Distribuição e organização jurisdicional ... 21

2.1.1.1 Critérios de repartição e características da competência absoluta e relativa ... 23

2.2 SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS ... 25

2.2.1 Lei n. 9.099/1995 como base no Sistema dos Juizados Especiais ... 26

2.2.2 Princípios (critérios) gerais dos Juizados Especiais ... 29

2.2.2.1 Princípio do devido processo legal ... 30

2.2.2.2 Princípio da oralidade ... 31

2.2.2.3 Princípio da simplicidade e da informalidade ... 32

2.2.2.4 Princípio da economia processual ... 33

2.2.2.5 Princípio da celeridade ... 33

2.2.3 Conciliação e mediação ... 33

2.3 A FAZENDA PÚBLICA NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS ... 34

2.3.1 Conceito de Fazenda Pública ... 35

2.3.2 O Juizado Especial Federal Cível ... 35

2.3.2.1 A competência absoluta do Juizado Federal ... 36

2.3.3 O Juizado Especial Fazendário Estadual Cível ... 38

2.3.3.1 Competência absoluta do Juizado Fazendário ... 39

(11)

3.1 DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS ... 41

3.1.1 Conceito e características das decisões liminares inaudita altera parte ... 42

3.2 DECISÕES MONOCRÁTICAS DOS ÓRGÃOS COLEGIADOS ... 43

3.2.1 Decisões monocráticas de natureza interlocutória ... 44

3.3 ASPECTOS GERAIS SOBRE AS TUTELAS PROVISÓRIAS NO CPC ... 45

3.3.1 Considerações sobre a tutela de urgência ... 47

3.3.1.1 A tutela provisória de urgência acautelatória e satisfativa ... 48

3.3.2 Tutela de urgência contra a Fazenda Pública ... 50

3.3.3 Tutelas provisórias no Juizado Especial Federal ... 52

3.3.4 Tutelas provisórias no Juizado Especial da Fazenda Pública ... 53

3.3.5 Concessão de tutela provisória no agravo de instrumento ... 53

4 RECURSOS... 55

4.1 CARACTERÍSTICAS E REQUISITOS GERAIS DOS RECURSOS ... 56

4.1.1 Breves considerações sobre o recurso de agravo de instrumento ... 57

4.2 SISTEMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS ... 59

4.2.1 Competência das Turmas Recursais ... 60

4.3 RECURSO CONTRA DECISÃO QUE CONCEDE OU NEGA TUTELA PROVISÓRIA NOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS E FAZENDÁRIOS ... 62

4.3.1 Entendimento consolidado das Turmas Recursais do TRF-4 e do TJSC ... 66

5 TRANSLATIO IUDICII E A ANÁLISE SOBRE A CONSERVAÇÃO DE DECISÃO LIMINAR PROFERIDA POR TRIBUNAL INCOMPETENTE ... 68

5.1 CONSEQUÊNCIAS DA INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA NO CÓDIGO DE 1973 ... 68

5.2 A TRANSLATIO IUDICII NO CÓDIGO VIGENTE ... 69

5.2.1 Base principiológica ... 72

5.2.2 A origem da regra no direito italiano ... 72

5.3 POSSIBILIDADE DE CONSERVAÇÃO DA DECISÃO ANTE À ADMISSIBILIDADE OU INADMISSIBILIDADE DO AGRAVO DE INSTRUMENTO ... 73

6 CONCLUSÃO ... 78

(12)

1 INTRODUÇÃO

A presente monografia tem como escopo analisar a possibilidade de aplicação da regra translatio iudicii para conservar a decisão liminar proferida por Tribunal absolutamente incompetente até o recebimento do recurso pelas Turmas Recursais, diante da controvérsia sobre a admissibilidade do agravo de instrumento no âmbito dos Juizados Especiais Federais e dos Juizados Especiais Fazendários.

1.1 DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMA

O processo civil é o instrumento criado para que toda e qualquer pessoa possa obter tutela de seu direito material ao Estado (latu sensu) e, assim, resguardar suas garantias fundamentais e sociais previstas pela Constituição da República Federativa do Brasil.

Para a pesquisa em tela, merece relevo a garantia do direito à saúde (art 6º, CF) em ponderação às regras processuais civis da jurisdição brasileira. Explica-se: a União, seus Estados e os Municípios têm a responsabilidade solidária de prover tratamentos de saúde aos cidadãos. Quando não há o fornecimento de medicamentos, por exemplo, pela via administrativa, o indivíduo ingressa com ação judicial com a pretensão de ser reconhecida a referida obrigação dos entes públicos à concessão de tratamento medicamentoso.

Desta feita, o particular, representado por advogado, ajuíza a ação pleiteando o fornecimento de fármacos, requerendo, também, a antecipação da tutela, para que possa ter acesso ao tratamento durante a tramitação do processo, não correndo o risco de seu direito perecer ante à morosidade existente no Poder Judiciário.

Nestas ações, em que a Fazenda Pública figura como ré, se o valor total da causa não ultrapassar 60 (sessenta) salários mínimos, a competência absoluta para apreciação das demandas será dos Juizados Especiais Federais - quando a parte requerer a concessão de medicamentos à União - e dos Juizados Especiais da Fazenda Pública quando requerer aos Estados e/ou Municípios, a depender do ente que figurar da parte ré. 1

Na situação em análise, pelos requisitos expostos acima, a ação deveria tramitar no Juizado Especial Federal ou no Juizado Especial Fazendário, contudo, diante do erro de

1 A jurisdição no Brasil é exercida através da divisão de competências, organizadas conforme critérios materiais,

(13)

indicação do juízo pela parte demandante e do não reconhecimento da incompetência pelo magistrado, o processo prossegue no foro absolutamente incompetente.

Por conseguinte, o juiz aprecia o pedido de tutela de urgência antecipada e, entendendo que a parte não tem direito, a indefere. Talamini e Wambier (2016, p. 863 e 864) ilustram que a atividade jurisdicional que envolve a concessão de tutela de urgência possui cognição sumária, em que o juiz analisa a razoabilidade dos fundamentos de risco de lesão irreparável ou de reparação muito difícil do direito, desenvolvendo uma simples investigação superficial do processo.

Em razão disso, o demandante, com fulcro no artigo 1.015, I2, do Código de

Processo Civil, interpõe o recurso de agravo de instrumento, requerendo a reapreciação da decisão em segundo grau de jurisdição cominada com o pedido de antecipação de tutela ao Tribunal correspondente.

No Tribunal, o desembargador relator3 recebe o recurso, o conhece e julga

procedente o pedido de tutela fundado na urgência, determinando o fornecimento antecipado do tratamento de saúde, ficando o julgamento definitivo do agravo de instrumento para análise posterior do órgão colegiado.

Porém, antes mesmo de o recurso ter seu julgamento final, o relator reconhece a competência absoluta do Juizado Especial Federal (art. 3º, §3º, Lei n. 10.253/2001) ou do Juizado Especial da Fazenda Pública (art. 2º, §4º, Lei n. 12.153/2009), em razão da natureza e do valor da causa, e declina da competência, determinado que os autos sejam remetidos ao órgão de segundo grau competente, qual seja, a Turma Recursal correspondente.

Todavia, a decisão que reconhece a incompetência da Corte de Justiça, não raras vezes, é silenciosa quanto à validade da liminar anteriormente concedida. Nesse ponto, Bueno (2018, p. 152) e Dellore et al (2018a, p. 245) apontam a solução, discorrendo que a decisão judicial, ainda que determinada por juízo incompetente, conservará seus afeitos até nova ordem do juízo competente, sendo essa a regra denominada translatio iudicii (transferência de juízo), trazida pelo Código de Processo Civil, em seu artigo 64, §4º, in verbis:

Art. 64. A incompetência, absoluta ou relativa, será alegada como questão preliminar de contestação.

[...]

2 “Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

I - tutelas provisórias;” (BRASIL, 2015).

3 “Art. 932 do Código de Processo Civil: Incumbe ao relator:

II - apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal;” (BRASIL, 2015).

(14)

§ 4º Salvo decisão judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos de decisão proferida pelo juízo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente (BRASIL, 2015).

Entretanto, a problemática em questão se insurge da possibilidade ou não deste agravo de instrumento ser analisado pelas Turmas Recursais. Isso porque, em interpretação literal ao artigo 4º cominado com o artigo 5º da Lei do Juizado Especial Federal (n. 10.259/2001), somente seria permitido a interposição de recurso para impugnar decisão que defere a tutela provisória, conforme o termo expressamente utilizado, in verbis:

Art. 4º O Juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir medidas cautelares no curso do processo, para evitar dano de difícil reparação (BRASIL, 2001).

Art. 5º Exceto nos casos do art. 4º, somente será admitido recurso de sentença definitiva (BRASIL, 2001).

Com disposição análoga, editou-se o artigo 3º cominado com o artigo 4º da Lei do Juizado Especial da Fazenda Pública (n. 12.153/2009):

Art. 3º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir quaisquer providências cautelares e antecipatórias no curso do processo, para evitar dano de difícil ou de incerta reparação (BRASIL, 2009).

Art. 4º Exceto nos casos do art. 3º, somente será admitido recurso contra a sentença. (BRASIL, 2009).

Observa-se que houve abstenção de previsão de recurso para impugnar o indeferimento do pedido de medidas cautelares e antecipatórias, sendo justamente essa a razão da impugnação narrada no caso em análise.

Não obstante, a doutrina e os órgãos jurisdicionais demonstram que essa regra abriu espaço para interpretação ampliativa – admitindo o recurso da decisão que defere e indefere a tutela de urgência - e restritiva – admitindo o recurso somente da decisão de deferimento - o que torna o recurso e a decisão liminar prejudicados após o declínio da competência, não havendo entendimento consensual sobre as normas.

Visto isso, a regra translatio iudicii pode ser aplicada para manter válida a decisão liminar proferida por Tribunal Regional Federal ou por Tribunal de Justiça, absolutamente incompetentes, até o recebimento do agravo de instrumento pelas Turmas Recursais, diante da controvérsia sobre a admissibilidade de recurso interposto contra a decisão que indefere a tutela provisória no âmbito dos Juizados Especiais Federais e dos Juizados Especiais da Fazenda Pública?

(15)

1.2 HIPÓTESES

Por meio da pesquisa à legislação cível e aprofundamento bibliográfico, é possível obter-se duas hipóteses para resolução da problemática apresentada. Leonel e Marcomim (2015, p. 35) apontam que “as hipóteses não são respostas que se tenha que validar; ao contrário, elas indicam um caminho a seguir para chegar à verdade dos fatos e à compreensão dos fenômenos, podendo indicar algo absolutamente contrário ao que se supunha inicialmente.”

Após este estudo, uma destas hipóteses, apresentadas a seguir, será corroborada e a outra refutada, porquanto visa-se empregar a possibilidade mais adequada do ponto de vista jurídico.

1.2.1 Hipótese I

A decisão liminar proferida por Tribunal que se declara absolutamente incompetente para julgamento do recurso e, por conseguinte, declina da competência às Turmas Recursais deve manter seus efeitos, em consonância com a translatio iudicii, regra prevista no Código de Processo Civil vigente, em seu artigo 64, §4º, independente da interpretação do órgãos colegiados dos Juizados sobre a admissibilidade do recurso de agravo de instrumento da decisão que indefere a antecipação de tutela.

1.2.2 Hipótese II

A decisão liminar proferida por Tribunal que se declara absolutamente incompetente para julgamento do recurso e, por conseguinte, declina da competência deve ter os efeitos cessados na hipótese de haver interpretação da Turma Recursal no sentido de inadmitir o recurso de agravo de instrumento da decisão que indefere a tutela de urgência.

Isso porque, mesmo com a vigência do princípio da translatio iudicii, instituído pelo novo Código de Processo Civil, em seu artigo 64, §4º, o agravo de instrumento perde por completo a sua função de provocar o reexame da decisão intermediária de piso, tornando-se um recurso prejudicado.

Diante disso, é irrazoável a conservação dos efeitos da decisão liminar neste período entre os atos decisórios dos órgãos colegiados, pois é certa a inadmissibilidade do agravo de instrumento quando do seu recebimento pela Turma Recursal e, consequentemente, a revogação automática da tutela de urgência anteriormente concedida.

(16)

1.3 JUSTIFICATIVA

Obter conhecimento sobre a as regras que envolvem a conservação de uma decisão de segunda instância que dispõe, mesmo que em caráter provisório, sobre um direito expressivamente significativo, como é o direito à saúde e à vida, é de suma importância, principalmente, aos aplicadores do direito, os quais têm a incumbência de representar em juízo os interesses dos particulares e da Fazenda Pública de modo sublime, mas também aos acadêmicos do curso de Direito, como fonte de visualização prática do conteúdo teórico.

Com este estudo, os aplicadores do direito - aqui refere-se aos magistrados, advogados particulares, procuradores das entidades federativas, promotores de justiça e defensores públicos, que exercem seu labor em prol dos indivíduos – têm a resposta imediata e completa acerca da validade da ordem judicial exarada pelo TRF-4 ou pelo TJSC, permitindo-os obter de pronto o prognóstico do processo, mesmo com a modificação drástica de juízo e de rito processual.

Sob outro olhar, a prática forense tem demonstrado que o erro de competência versado neste ensaio, muitas vezes, não tem sua origem na indicação equivocada do juízo pela parte demandante ao peticionar a ação, mas sim por descuido da jurisdição, quando tem a incumbência de submeter o processo ao rito especial dos Juizados. À vista disso, um impasse de cunho puramente processual, que o próprio Judiciário deu causa, não pode causar tamanha insegurança jurídica ao ponto de causar prejuízos ao particular detentor do direito à saúde nem onerar o erário, que possui a obrigação de prezar pelo melhor aproveitamento do dinheiro público.

Nesse ponto, os doutrinadores Medina e Wambier (2008, p. 101 apud SATO, 2010, p. 58) elencam as controvérsias que envolvem o caso em estudo quanto à incompetência do juízo, provocados pelas próprias partes e pelo magistrado:

As regras relativas à definição do juízo competente nem sempre são de fácil interpretação e, não raro, há, mesmo na jurisprudência dos tribunais superiores, controvérsia a respeito. Se é certo, de um lado, que as partes podem ter errado ao ajuizar a ação perante órgão incompetente, não menos certo é dizer que, tendo em vista que as hipóteses de incompetência absoluta devem ser conhecidas ex officio pelo juiz, não podem as partes ser punidas nos casos em que o vício não é corrigido antes de proferida a decisão.

Ademais, este ensaio pode proporcionar aos estudantes uma nova percepção do conteúdo teórico repassado na universidade, facilitando a compreensão sobre leis gerais e leis especiais, noções de competência jurisdicional e de meios de impugnação de decisões judiciais

(17)

e, precipuamente, apresentando-lhes o instituto processual da translatio iudicii, inovação trazida pelo CPC, que merece ser melhor explorado sob a ótica científica nas academias.

Noutro vértice, efetuou-se pesquisa em artigos, teses e doutrinas não verificando-se a existência de estudos tratando do tema especificamente, ou verificando-seja, da aplicação da translatio iudicii no reconhecimento da competência absoluta dos Juizados Especiais referenciados neste trabalho.

Com efeito, diante da ocorrência frequente destas situações na prática forense, viu-se a necessidade de promover um estudo conjugado das normas de competência elencadas pelo CPC com as regras das Leis especiais do JEF e do JEFP, associadas ao regimento das Turmas de Recurso sobre a interpretação uniformizada, oferecendo a conclusão da pesquisa como suporte aos profissionais que atuam no Estado de Santa Catarina, para que possam se posicionar de imediato no processo, acautelando o direito de seus representados, por exemplo.

1.4 OBJETIVOS

1.4.1 Geral

Analisar a aplicação da regra translatio iudicii para conservar a decisão liminar proferida por Tribunal Regional Federal e por Tribunal de Justiça, absolutamente incompetentes, até o recebimento do recurso pelas Turmas Recursais do Juizado Especial Federal e pelas Turmas Recursais do Juizado Especial da Fazenda Pública.

1.4.2 Específicos

Apontar as regras comuns de competência jurisdicional, previstas no CPC; Descrever as características do sistema dos Juizados Especiais;

Detalhar a competência e o sistema recursal dos Juizados Especiais Federais e dos Juizados Especiais Fazendários;

Elencar as peculiaridades da Fazenda Pública em juízo;

Conceituar os atos decisórios, em especial as decisões de natureza interlocutória; Descrever os requisitos para concessão de decisão liminar provisória pelos Tribunais de Justiça;

(18)

Identificar a função e requisitos dos recursos cíveis, destacando-se o agravo de instrumento;

Desenvolver a possibilidade de interpor recurso da decisão que indefere a tutela provisórias nos Juizados Especiais Federais/Fazendários;

Demonstrar a interpretação das Turmas Recursais do TRF-4 e das Turmas Recursais do TJSC sobre a possibilidade de interpor recurso da decisão que indefere a tutela provisórias nos Juizados Especiais Federais/Fazendários;

Descrever as particularidades da regra da translatio iudicii;

Verificar a possibilidade de as decisões dos Tribunais incompetentes serem conservadas de acordo com regra da translatio iudicii cominada com a interpretação sobre o (não) cabimento de impugnação das decisões que indeferem a tutela provisória no âmbito dos Juizados;

Discorrer as consequências processuais após o recebimento do recurso pelas Turmas Recursais.

1.5 DEFINIÇÃO DOS CONCEITOS OPERACIONAIS

Considera-se extremamente importante, para uma melhor compreensão do tema deste trabalho acadêmico, traçar a definição dos conceitos inseridos no contexto em estudo.

A decisão liminar “qualifica qualquer medida judicial tomada antes do debate em contraditório do tema que constitui o objeto do processo [...]” (THEODORO JUNIOR, 2015, p. 816). Neste ensaio, trata-se do ato decisório que defere a tutela de urgência antecipada requerida no agravo de instrumento. Assim, na concepção de Didier Junior e Cunha (2016, p. 307) essa decisão é um pronunciamento judicial com conteúdo provisório que não possui aptidão para encerrar o procedimento no tribunal.

Já o recurso “é o meio ou instrumento destinado a provocar o reexame da decisão judicial, no mesmo processo em que proferida, com a finalidade de obter-lhe a invalidação, a reforma, o esclarecimento ou a integração” (DIDIER JUNIOR; CUNHA, 2016, p. 87).

A partir desta compreensão, o agravo de instrumento pode ser descrito como “[...] o recurso cabível, em primeiro grau de jurisdição, contra específicas decisões interlocutórias previstas em lei.” (TALAMINI; WAMBIER, 2016, p. 537). As hipóteses estão previstas no rol taxativo do artigo 1.015 do Código de Processo Civil e em outras leis, como na Lei n. 10.259/2001 e na Lei n. 12.153/2009, objetos desta pesquisa. É através deste meio de impugnação que o particular busca a revisão da decisão interlocutória de primeiro grau.

(19)

O Tribunal é um órgão colegiado do segundo grau de jurisdição que exerce sua função em grau de recurso; em reexame no duplo grau de jurisdição; e em processos de competência originária (THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 949). No tema em tela, o Tribunal Regional Federal e o Tribunal de Justiça reapreciam a decisão de piso que negou o pedido de tutela provisória. É absolutamente incompetente em razão de a ação preencher os requisitos para tramitação sob o rito dos Juizados Especiais Federais e dos Juizados Especiais Fazendários, que, nos termos da legislação, possuem competência absoluta.

Os Juizados Especiais Federais e os Juizados Especiais Fazendários são órgãos da justiça comum e integrantes do Sistema dos Juizados Especiais que visam a conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas até o valor de 60 (sessenta) salários mínimos em que a Fazenda Pública for parte (Leis n. 10.259/2001 e n. 12.153/2001).

As Turmas Recursais são conceituadas como órgão colegiado responsável pela apreciação de recursos interpostos nos processos que tramitam nos Juizados Especiais.

Por fim, o instituto de grande importância neste estudo, a translatio iudicii, é definida por Lourenço (2019, p. 125) como a transferência de juízo de um processo travado em outro foro, conservando-se todos os efeitos da relação jurídica processual anterior.

1.6 DELINEAMENTO DA PESQUISA

O delineamento da pesquisa é o momento em que se estabelece os meios técnicos da investigação, prevendo-se os instrumentos e os procedimentos necessários utilizados para a coleta de dados.

1.6.1 Caracterização básica

A natureza da presente pesquisa tem classificação de nível exploratório, porquanto busca-se ter conhecimento sobre uma situação jurídica específica a partir do levantamento de regras processuais gerais, aplicadas em conjunto com a legislação especial e suas respectivas interpretações consolidadas pelos órgãos jurisdicionais e pela doutrina.

A abordagem é de natureza qualitativa, pois a pesquisa analisa a possibilidade de manutenção de um ato decisório a partir da problemática envolvendo modificações no mesmo processo.

Para desenvolvimento da monografia utilizou-se o procedimento bibliográfico como fonte predominante coleta de dados, encontrando-os em doutrinas, artigos científicos e

(20)

teses, estabelecendo-se a técnica de leitura exploratória, seletiva e analítica das obras encontradas a partir da definição dos conceitos operacionais elencados acima.

Ainda, houve a pesquisa documental, tendo como fonte o Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), a Lei dos Juizados Especiais (n. 9.099/1995), a Lei dos Juizados Especiais Federais (n. 10.259/2001) e a Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (n. 12.153/2009), bem como a Resolução n. 33/2018 das Turmas Recursais e da Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais da 4ª Região, e o Manual dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, de 2015.

Como demonstrativo do entendimento adotado pelos órgãos jurisdicionais, selecionou-se súmulas, enunciados e decisões da 3ª Turma de Recursos do Juizados Especial Federal da 4ª Região e da 4ª Turma de Recursos do Juizado Especial da Fazenda Pública de Santa Catarina.

1.7 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO E ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS

A presente monografia se dividiu em quatro capítulos de desenvolvimento e seus desdobramentos sobre a temática.

Assim, o segundo capítulo dispôs sobre a distribuição da competência interna e o exercício da jurisdição no Poder Judiciário; sobre o sistema dos Juizados Especiais; e sobre a competência dos Juizados em que a Fazenda Pública é atuante;

O terceiro capítulo conceituou os atos decisórios de natureza interlocutória no processo civil, em primeiro e segundo grau de jurisdição, bem como aborda o instituto das tutelas provisórias e suas peculiaridades quanto à Fazenda Pública nos Juizados Especiais;

O quarto capítulo qualificou os aspectos comuns dos recursos cíveis, englobando o sistema recursal dos Juizados Especiais e o cabimento do agravo de instrumento no âmbito dos Juizados Especiais Federais/Fazendários;

O quinto capítulo versou exclusivamente sobre a regra translatio iudicii, sua previsão legal, histórico, natureza jurídica, demonstrando-se se há ou não a conservação da decisão liminar objeto do problema de pesquisa.

(21)

2 COMPETÊNCIA INTERNA DO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO

Para melhor compreensão das competências no exercício da função jurisdicional civil brasileira - conteúdo de grande relevância ao objeto do presente trabalho acadêmico - as quais serão abordadas neste capítulo, previamente se faz necessário definir a jurisdição enquanto função precípua do Poder Judiciário, porque possui vinculação imediata à competência dos órgãos para processamento e julgamento de litígios.

2.1 JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA

A jurisdição dentro do território nacional, materializada através de uma das três divisões políticas estruturais e organizacionais do Estado, o Poder Judiciário, é, na lição de Neves (2010, p. 19), a atuação estatal que propende a executar objetivamente o direito quando a prática assim demanda, resolvendo, em caráter definitivo, uma situação de conflito jurídico, tendo como finalidade a harmonia de uma sociedade.

O Código de Processo Civil vigente também dispôs acerca do funcionamento da jurisdição: “art. 16. A jurisdição civil é exercida pelos juízes e pelos tribunais em todo o território nacional, conforme as disposições deste Código.” (BRASIL, 2015). Neste ponto, Oliveira Junior et al (2018a, p. 115) enfatizam que “A jurisdição é una e indivisível. O poder jurisdicional não se fraciona, pelo que todos os órgãos do Poder Judiciário estão investidos dele em potência.” Ainda, salienta que o exercício da jurisdição se dá em observância às regras de competência interna previstas no Caderno Processual Cível.

Assim, tem-se que a jurisdição é diretamente ligada aos órgãos do Poder Judiciário, e seu exercício legítimo é limitado por meio da distribuição de competências (NEVES, 2010, p. 21).

De maneira clara e objetiva, Alvim et al (2017, p. 98) expõem a função da competência interna na qualidade de composição institucional do Judiciário: “é justamente para regular o exercício da jurisdição, no plano interno, que surgem as regras de competência, não propriamente como um agente limitador da jurisdição, mas, antes de tudo, como regras de eficácia atributiva do poder de resolver conflitos, decidindo pretensões e impondo decisões.”

(22)

As regras de competência não estão previstas somente na Legislação Processual Cível4, mas também na Constituição Federal, estabelecidas como direitos e garantias

fundamentais a todos os indivíduos. Isto porque entende-se que a função jurisdicional deve ser exercida pelos agentes com poderes para tanto (juiz competente) e observando as regras processuais pré-estabelecidas (devido processo legal) (ALVIM et al., 2017, p. 98).

Ainda, existem leis esparsas que dispõem sobre competência, como no caso das normas trabalhadas neste estudo, incluindo-se a lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais (n. 9.099/1995), a lei dos Juizados Especiais Federais (n. 12.153/09) e a lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (n. 10.253/01), em que o valor da causa da ação a ser ajuizada, bem como, a complexidade da demanda são critérios para definição da competência, conforme entendimento doutrinário majoritário, tratado nos tópicos 2.3.2.1 e 2.3.3.1 infra.

2.1.1 Distribuição e organização jurisdicional

O Poder Judiciário, em abordagem rasa, é incumbido da função propriamente dita de julgar, em observação e interpretação das normas, os conflitos de interesse decorrentes das relações de uma sociedade e, assim, materializa de modo imperativo os direitos daqueles que optam pela solução via judicial. A organização estrutural e funcional de seus órgãos está disciplinada em seções, no Capítulo III, da Constituição Federal de 1988.

Pois, diante de tamanho encargo e visando uma melhor efetividade da atividade jurisdicional, o judiciário é estruturado em órgãos (“Justiças”) especializados e em residuais, com a competência designada a depender da natureza da demanda.

As justiças especializadas são determinadas com base em ramos do direito material, sendo as Justiças do trabalho, eleitoral e militar. Desta forma, havendo litígios que versem sobre outras matérias, a competência será residual, portanto, da Justiça (comum) federal e da Justiça (comum) estadual, porquanto ambas exercem a jurisdição civil e a jurisdição penal (MONNERAT, 2018, p. 124 e 125).

Monnerat (2018, p. 123) ainda esclarece que há “a repartição de competências internas entre os órgãos da Justiça Ordinária, sendo possível, entretanto, sobretudo em

4 O uso da expressão legislação processual justifica-se na existência de outras leis, federais e estaduais que

disciplinam e identificam mais especificamente o órgão jurisdicional atuante, devendo o CPC ser interpretado e aplicado em associação com estas (BUENO, 2018, p. 130): Art. 44 “Obedecidos os limites estabelecidos pela Constituição Federal, a competência é determinada pelas normas previstas neste Código ou em legislação especial, pelas normas de organização judiciária e, ainda, no que couber, pelas constituições dos Estados.” (BRASIL, 2015).

(23)

localidades de pequeno porte, que um mesmo juiz acumule a competência e o exercício jurisdicional civil e penal.” Esta competência dentro das comarcas ou seções judiciárias é subdividida nas denominadas varas judiciárias, resultando numa melhor divisão das demandas judiciais. É comum haver a simultaneidade entre a Vara da Fazenda Pública e o Juizado Especial da Fazenda Pública, o que, não raras as vezes, implica na aplicação do rito comum quando a ação deveria tramitar sob o rito especial, gerando o conflito de competência.

Como exemplo relativo ao tema de pesquisa temos a Vara da Fazenda Pública em âmbito estadual que, quando instituída, o juiz titular será responsável pelo julgamento de todas as ações em que o Poder Executivo - dos estados ou dos municípios - figurar no polo passivo, exceto quando a causa demandar direito indisponível e havendo vara especializada na matéria.

Ainda, a Justiça comum pode ser fragmentada na Justiça Federal e na Justiça Estadual. A Justiça Federal é mantida pela União e é responsável pelo julgamento de litígios que envolvam a União, suas autarquias, agências reguladoras e empresas públicas (BUENO, 2018, p. 63), com amparo nos artigos 106 a 110, da CF. Assim, quando não incida na lide as hipóteses de competência da Justiça Federal ou das Justiças Especializadas, cabe, residualmente, à Justiça Estadual, a qual é mantida pelos estados-membros e pelo Distrito Federal, a apreciação dos demais pleitos (MONNERAT, p. 2018, p. 124).

Além disso, a Constituição Federal, em seu artigo 98, I, ordenou a criação dos Juizados Especiais, a compor a Justiça Ordinária, sendo caracterizados pela doutrina majoritária como um microssistema de direito com o objetivo de facilitar o acesso à justiça, bem como prestar um serviço jurisdicional mais célere em causas que demandem menos complexibilidade diante do rito processual especial que estão vinculados. São órgãos providos por juízes togados, ou togados e leigos, e subdividem-se nos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, regidos pela Lei n. 9.099/1995; nos Juizados Especiais Federais (Lei n. 10.259/2001); e nos Juizados Especiais da Fazenda Pública (Lei n. 12.153/2009).

O Poder Judiciário, à luz do princípio do duplo grau de jurisdição, ainda é dividido em instâncias, compostas por órgãos colegiados (turma, câmara etc.), os quais apreciam feitos em caráter originário ou exercendo o reexame e novo julgamento de decisões dos juízes de primeiro grau (THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 948). Em complemento, Monnerat (2018, p. 127) sustenta que a competência dos órgãos colegiados para revisar e modificar a decisão de piso por meio apreciação de recurso,

se dá por critérios territoriais e em razão da matéria, havendo, portanto, em cada uma das “Justiças”, uma série de tribunais (regionais federais, regionais do trabalho, regionais eleitorais e tribunais de justiça estaduais) divididos por regiões ou por unidades da federação, com competência e hierarquia sobre os juízes de primeiro grau pertencentes àquele território.

(24)

Na seara dos Juizados Especiais, a dualidade da jurisdição é exercida através das Turmas Recursais (órgãos de segundo grau), “órgão com atribuição para realizar o segundo grau dentro do sistema da Lei 9.099/1995” (ROCHA, 2017, p. 350).

Não obstante, no âmbito forense ainda existem os tribunais superiores, que, na doutrina de Monnerat (2018, p. 129), exercem “jurisdição de sobreposição”, pois uniformizam a interpretação e aplicação do direito do território nacional, além da função recursal de última instância – motivo pelo qual entende-se que há, em determinadas hipóteses expressamente citadas na Constituição Federal, um terceiro grau de jurisdição. São estes: o Tribunal Superior do Trabalho – TST; na Justiça Eleitoral, pelo Tribunal Superior Eleitoral – TSE; e na Justiça Ordinária, pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ.

Por fim, como o órgão de cúpula do Judiciário brasileiro, com atribuição recursal também de última instância, tem-se o Supremo Tribunal Federal, com função preponderante de guardião da Constituição Federal, exercendo a nominada “jurisdição constitucional” (MONNERAT, 2018, p. 129).

Vê-se que o Poder Judiciário é composto por uma estrutura complexa de órgãos com fragmentação selecionada em critérios materiais, funcionais, territoriais, hierárquicos e de valor, com atribuições específicas, a fim de efetivar o objeto maior do Estado Democrático de Direito, a se dizer, o reconhecimento pleno dos direitos e garantias individuais e coletivas amparadas pela legislação de forma ampla.

2.1.1.1 Critérios de repartição e características da competência absoluta e relativa

O Codex vigente, em seus artigos 62 e 63, classifica a competência em absoluta, distinta pela matéria, pessoa e função; e em relativa, distinta pelo valor e território. 5

A competência absoluta é gênero que possui como espécies: (a) competência em razão da matéria (Justiça Comum ou Justiça Especializada), (b) competência em razão da pessoa (União, autarquias e empresas públicas federais devem ser julgadas pela Justiça Federal) e (c) competência funcional (competência originária em primeiro grau ou tribunal; competência

5 Art. 43, do Código de Processo Civil: “Determina-se a competência no momento do registro ou da distribuição

da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta.” (BRASIL, 2015).

(25)

atribuída a um juiz especificamente para uma situação). Vale ressaltar que é o interesse público que fixa a competência absoluta, não o interesse das partes (DELLORE et al., 2018a, p. 212).

A competência absoluta, mencionada no artigo 64, §1º, da Norma Processual Cível, não pode ser deliberada pelas partes nem se prorroga, podendo ser alegada de ofício em qualquer tempo e grau de jurisdição6, pois não está submetida à preclusão, podendo ser

levantada inclusive após o trânsito em julgado, por meio de ação rescisória (art. 966, II, do CPC7), (BUENO, 2018, p. 144). A Norma Processual Cível prevê expressamente esta

impossibilidade de modificação de juízo: “art. 62. A competência determinada em razão da matéria, da pessoa ou da função é inderrogável por convenção das partes” (BRASIL, 2015).

De forma sucinta, o critério de repartição material da competência absoluta é baseado na natureza da relação litigiosa, ou seja, na matéria discutida em juízo, sendo imprescindível para a identificação do juízo competente; o critério em razão da pessoa leva em consideração a qualidade das partes do litígio, se são pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou de direito privado ou se maiores e capazes ou incapazes; o critério funcional diz respeito à função que determinado órgão jurisdicional vai exercer, como o grau de jurisdição e procedimentos específicos (MONNERAT, 2018, p. 500 e 501).

A competência relativa também é gênero, subdivida em duas espécies: (a) competência em razão do território e (b) competência em razão do valor (por exemplo: Juizado Especial Cível ou Vara tradicional da Justiça Estadual). Contrastando com a competência absoluta, a competência relativa se dá com base no interesse das partes, não no interesse público (DELLORE et al., 2018a, p. 242).

Esse gênero de competência, por conter critérios estabelecidos em consideração ao interesse privado, pode ser objeto de acordo inter partes8 ou pode sofrer derrogação em razão

da inércia do réu ao deixar de arguir o vício em preliminar de contestação (art. 64, caput) (BUENO, 2018, p. 144), razão pela qual inexiste a possibilidade de ação rescisória no caso de

6 “Art. 64. A incompetência, absoluta ou relativa, será alegada como questão preliminar de contestação.

§1º A incompetência absoluta pode ser alegada em qualquer tempo e grau de jurisdição e deve ser declarada de ofício.

§3º Caso a alegação de incompetência seja acolhida, os autos serão remetidos ao juízo competente.” (BRASIL, 2015).” (BRASIL, 2015).

7 “Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:

II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;” (BRASIL, 2015).

8 “Art. 63. As partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será

(26)

incompetência relativa. Ademais, também pode haver a modificação da competência por força da conexão ou continência (art. 54) (DELLORE et al., 2018a, p. 242).

O critério territorial de determinação da competência, na lição de Theodoro Júnior (2019, p. 219) “decorre da necessidade de definição, entre os vários juízes do país, de igual competência em razão da matéria e do valor, qual poderá conhecer de determinada causa”. A partir do critério em razão do valor dado na ação é que se define “se a causa pode ser processada e julgada pelos juizados especiais, caso existam estes órgãos no foro competente, ou se a competência deste está, de plano, excluído, mesmo que a localidade possua juizados instalados” (MONNERAT, 2018, p. 502).

Contudo, apesar de a regra geral posicionar o critério do valor da causa no âmbito da competência relativa, como seria o caso dos Juizados Especiais Cíveis (lei n. 9.099/1995), existem exceções que devem ser salientadas em razão da pertinência ao objeto do presente estudo. São as hipóteses em que a valoração da causa determinará a competência absoluta do Juizado Especial Fazendário ou no Juizado Especial Federal (art. 2º, §4º Lei n. 12.153/2009 e art. 3º §3º, Lei n. 10.259/2001, nesta ordem). Essa peculiaridade dos Juizados é discutida ou com mais afinco nos tópicos 2.3.2.1 e 2.3.3.1 infra.

Em síntese, os critérios elencados para dividir a competência são utilizados para: a) identificar o juízo competente; b) identificar o “foro competente”; c) identificar a competência dos juizados especiais; e d) identificar a competência das varas especializadas. Cumpre ressaltar que identificação da jurisdição brasileira e da competência originária dos tribunais superiores e de segundo grau não são disciplinados pelos critérios genéricos mencionados, mas sim de normas excepcionais e específicas (MONNERAT, 2018, p. 499).

2.2 SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

Os Juizados Especiais possuem amparo constitucional e integram o Poder Judiciário como órgãos diferenciados dos demais, justamente por possuírem características próprias e procedimento especial, prestigiando princípios que também são únicos deste juízo. “O procedimento e o juízo são especificadamente criados um para o outro, com vistas a um determinado objetivo e no pressuposto de que a operação de um supõe a presença do seu correspectivo, sempre visando à facilitação do aceso à Justiça.” (BOCHENEK, NASCIMENTO, 2011, p. 13).

Ainda, na concepção de Cunha (2018, p. 736), “inspirada no princípio da efetividade e da facilitação do acesso à justiça, a criação dos Juizados Especiais Cíveis vem

(27)

causando uma gradativa eliminação da chamada litigiosidade contida: quem não se socorria da atividade jurisdicional passou a fazê-lo, o que acarretou uma maior conscientização de muitos pela busca do reconhecimento judicial de direitos.”

Logo, é substancial que se apresente um maior aprofundamento das peculiaridades processuais e materiais previstas pelas leis dos Juizados Especiais, em especial, a Lei do Juizado Especial Cível, a Lei do Juizado Especial Federal e a Lei do Juizado Especial da Fazenda Pública. Isto porque os Juizados possuem procedimento especial, os quais, em observação atenta da prática jurídica, notam-se equívocos na aplicação de tais regramentos, como é o caso das normas quanto à competências e os meios de impugnação das duas últimas leis supracitadas, as quais suscitaram a problemática em apreço (vide tópico 2.3 infra).

De se registrar, por oportuno, a previsão, pela Carta Maior (art. 24, X), dos Juizados de Pequenas Causas e distingui-los dos Juizados Especiais, também previstos constitucionalmente, no artigo 98, I. Isso porque os Juizados de Pequenas Causas já tinham previsão normativa desde a Constituição Federal de 1934, contudo, foram implantados apenas no ano de 1984, através da Lei n. 7.244/84, levando-se em conta as causas somente pelo seu baixo valor econômico e objetivando a conciliação dos litigantes (ROCHA, 2017, p. 3):

A Constituição Federal, em seu art. 98, I, impôs a criação de Juizados Especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade, mediante procedimento oral e sumariíssimo, permitidos a transação e o julgamento de recursos por Turmas de juízes de primeira instância (CUNHA, 2018, p. 735).

Rocha (2017, p. 3), relata que, mais tarde, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, ficaram estabelecidos os dois modelos de juizados, contudo, a lei que dispôs sobre os Juizados de Pequenas Causas restou revogada expressamente pela vigência da Lei n. 9.099/95, pois esta abrangeu as causas de menos complexibilidade, bem como as de menor valor econômico, objetivando a conciliação, julgamento e execução das ações. Para este doutrinador, “trata-se, pois, de um único modelo de Juizado, abrangendo simultaneamente as competências previstas nos artigos 24, X, e 98, I, da Constituição Federal.”

2.2.1 Lei n. 9.099/1995 como base no Sistema dos Juizados Especiais

Cabe adentrar à Lei n. 9.099/1995, a qual introduziu pioneiramente os Juizados Especiais na jurisdição brasileira, porquanto é o suporte do Sistema dos Juizados Especiais e

(28)

que foi utilizada como base para a projeção das leis que integram este mesmo sistema no âmbito Federal e da Fazenda Pública.9

Além disso, as normas gerais dos Juizados Especiais Cíveis/Criminais servem de interpretação e como fonte subsidiária e suplementar às leis supramencionadas, isto porque, Rocha (2017, p. 23) afirma que “os Juizados Federais e os Juizados Fazendários são incapazes de, isoladamente, regular os seus modelos. [...] Precisam visceralmente da estrutura criada pelos Juizados Especiais Cíveis para poderem funcionar”, fazendo com que as três normativas contenham estruturas e regras comuns, justamente pela natureza jurídica processual.

Quanto à vinculação do Código Processual Cível no Sistema dos Juizados, Gajardoni (2010, p. 207 apud CHIMENTI; SANTOS, 2018, p. 51) leciona que “Trata-se de um sistema jurídico aberto ou integrativo (não subsidiário!), em que as várias normas regentes do tema se comunicam entre si, complementando-se e evitando-se, com isso, a ocorrência de omissões prejudiciais à tutela dos direitos.”

Assim, a Lei 9.099/1995 é a base deste Sistema especial e, portanto, fonte de direito para o Juizado Especial da Fazenda Pública e o Juizado Especial Federal, servindo não só como orientação, mas também aplicando-se por extensão quando haver lacuna normativa ou diante das remissões expressas na lei (ROCHA, 2017, p. 16).

Contudo, urge ressaltar que ambas as leis possuem regramentos dessemelhantes. A título de exemplo, a competência dos Juizados Federais e Fazendários é absoluta, enquanto a competência dos Juizados Especiais Cíveis é relativa, de acordo com a jurisprudência que se assentou10 e o entendimento dos magistrados que atuam nos Juizados Especiais11. Noutro giro,

a interposição de recurso das decisões que dispõem sobre a tutela de decisões cautelares ou antecipatórias foi permitida somente no rito especial do Juizado Federal e da Fazenda Pública, sendo inadmitido o recurso de agravo de instrumento nos JECs.

Quanto à instituição dos Juizados Especiais por todos os entes federados, houve a previsão na Constituição Federal de forma a efetivar a celeridade jurisdicional, uma vez que

9 Assim, expressamente consta no artigo 1º, da Lei n. 10.259/2001: “São instituídos os Juizados Especiais Cíveis

e Criminais da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta Lei, o disposto na Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995 e no artigo 27, da Lei n. 12.153/2009: “Aplica-se subsidiariamente o disposto nas Leis nos 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, 9.099, de 26 de setembro de 1995, e 10.259, de 12 de julho de 2001.”

10 “O processamento da ação perante o Juizado Especial Estadual é opção do autor, que pode, se preferir, ajuizar

sua demanda perante a Justiça Comum.” (STJ, Jurisprudências em Teses, edição n. 89, 2017).

11 “Enunciado 1: O exercício do direito de ação no Juizado Especial Cível é facultativo para o autor.” (FONAJE,

(29)

nem sempre é garantida aos processos que tramitam no rito comum, muitas vezes pelo procedimento mais formal e complexo.12

A redação do artigo constitucional informa sucintamente a competência e as possibilidades processuais deste juízo, in verbis:

Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:

I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau; (BRASIL, 1988).

Destarte, a Lei Ordinária Federal n. 9.099, sancionada em 1995, a qual dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, implementou o “microssistema de direito”, assim denominado por grande parte dos doutrinadores, como Rocha (2017, p. 21) e Rossato (2012, p. 13), para definir a autonomia desse sistema. Trata-se de um sistema que estabelece procedimento especial, usualmente designado como rito sumariíssimo13, em que se preza por

princípios tais quais o princípio da oralidade, informalidade, celeridade, economia etc.

Outra característica a se destacar é o sistema recursal próprio deste juízo, que será melhor aprofundando no tópico 4.2 infra. As Turmas Recursais exercem a função de órgão revisor, no entanto, ainda são órgãos judiciais de primeira instância por serem compostos por juízes de direito, não integrando os órgãos dos tribunais (ROCHA, 2017, p. 25).

Por fim, cabe a interação de que ordenamento jurídico que rege o microssistema dos Juizados Especiais ainda conta com a uniformização de entendimentos do Fórum Nacional Juizados Especiais – FONAJE, formado pela reunião periódica de magistrados que atuam nos

12 Ainda, possui princípios únicos, introduzidos para facilitar o acesso à Justiça aos cidadãos que não tiverem

condições de arcar com as custas iniciais de um processo no rito comum (art. 54, Lei n. 9.099/95) e, para que, litigando de boa-fé, não deixem de ser assistidos por advogado (art. 9º, da Lei n. 9.099/9) ou de acionar seus direitos por receio das despesas advindas dos honorários advocatícios (art. 55, Lei n. 9.099/95). Ou, pela simplicidade da causa, que possam obter uma tutela satisfatória mais rapidamente.

13 Sobre os procedimentos, cabe o adendo do doutrinador Rubin (2018): “O rito comum sumário (arts. 275/281)

foi, de fato, suprimido do novo CPC, restando, pois, tão somente o procedimento comum.” Contudo, observa-se que prevalece o entendimento doutrinário quanto à subsistência do rito sumariíssimo: “[...] da mesma forma, seguem tratamento à parte as demandas que correm no rito sumaríssimo dos Juizados Especiais. Isto não quer dizer, por outro lado, que não seja possível a aplicação subsidiária do Novo CPC a esses modelos, em casos de compatibilidades.” (RUBIN, 2018).

O Código de Processo Civil expressamente declara a revogação do procedimento sumário: “Art. 318. Aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo disposição em contrário deste Código ou de lei. Parágrafo único. O procedimento comum aplica-se subsidiariamente aos demais procedimentos especiais e ao processo de execução.” (BRASIL, 2015) e “art. 1.046. Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. §1º As disposições da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, relativas ao procedimento sumário e aos procedimentos especiais que forem revogadas aplicar-se-ão às ações propostas e não sentenciadas até o início da vigência deste Código.” (BRASIL, 2015).

(30)

Juizados Especiais, os quais editam enunciados de orientação material e processual deste sistema, e também “indicam interpretações flexibilizadoras do procedimento sumaríssimo, algumas complementares ao regime legal, outras fazendo prevalecer, ainda que em contraste manifesto com a Lei n. 9.099/95, razões de cunho pragmático de casos concretos sobre disposições normativas genéricas” (GAJARDONI, 2008, p. 151 apud ROSSATO, 2012, p. 16).

Ressalta-se que os enunciados não possuem poder vinculativo, apenas de mera orientação ao aplicador do Direito, como o Enunciado n. 01 do FONAJE da Fazenda Pública, que dispõe sobre a aplicabilidade subsidiária da Lei n. 9.099/95 aos JEFPs.

2.2.2 Princípios (critérios) gerais dos Juizados Especiais

Os princípios introduzidos no ordenamento jurídico, sejam eles de ordem material ou processual, possuem função fundamental de orientar e sustentar todo o regramento de direito e, do mesmo modo, ou até de maneira mais acentuada, ocorre nos Juizados Especiais. Isto porque a Lei n. 9.099/95, a qual é aplicada subsidiária e supletivamente a todo o Sistema, estabelece critérios - os quais entende-se também como princípios próprios - de aplicação no procedimento sumariíssimo que, quando interligados, manifestam o ideal deste microssistema e são utilizados, antes de qualquer outra norma, como fonte própria de interpretação, diferenciando-se do processo tradicional.

Veja-se a disposição desta Lei: “Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.” (BRASIL, 1995) (grifou-se).

Contudo, é de extrema importância relembrar que existem princípios que são inerentes ao Direito Processual e aplicáveis a todo e qualquer processo judicial para que se garanta o objetivo maior da função jurídica do Estado-Juiz. Cita-se como exemplo, dentre outros, o devido processo legal, a isonomia, o contraditório e ampla defesa, a imparcialidade do juiz, o duplo grau de jurisdição, os quais

têm aplicação cogente aos Juizados Especiais, não apenas pela determinação constitucional, mas também pela imposição lógica do ordenamento jurídico. O que ocorre é que os princípios arrolados no art. 2º formam um filtro que, envolvendo o sistema, permitem a passagem do que é compatível com seus institutos, dentro de uma lógica de ponderação de valores. A estrutura dos Juizados, portanto, não é simplesmente preenchida pelas demais normas processuais, mas por elas integrada. A regra hermenêutica aplicável, nesse caso, não é apenas a especialidade, mas também a compatibilidade teleológica (NEGRÃO, 1997, p. 989; CÂMARA, p. 11 apud ROCHA, 2017, p. 28).

(31)

Deste modo, o conjunto de garantias do devido processo legal deve estar em concordância com princípios do microssistema, por melhores que sejam seus propósitos. Rossato (2012, p. 18) comenta que, “mesmo na ânsia de celeridade e simplicidade procedimental, deve-se respeitar o núcleo duro do due process of law, sem o que não se garante a Justiça.” O que se visa é sempre efetivar a tutela de direitos da melhor forma, independente do procedimento em prática.

2.2.2.1 Princípio do devido processo legal

Partindo-se do pressuposto que o direito à jurisdição e o direito ao processo são meios indispensáveis à realização da Justiça e, portanto, garantias individuais constitucionalmente reconhecidas, tem-se que o julgamento de conflitos só será alcançada de forma justa quando prestada a tutela jurisdicional dentro das normas processuais traçadas pelo Direito Processual Civil (THEODORO JÚNIOR, 2015, p. 98).

Assim, é através do princípio do devido processo legal que se permite a discussão sobre a afetação de bens (materiais e não materiais) de um indivíduo, servindo de garantia contra a face arbitrária do Estado (DUARTE; OLIVEIRA JUNIOR, 2012, p. 35).

Vale anotar que essa a garantia do devido processo legal, não exige somente a observância das da legislação para a tramitação das causas em juízo, devendo haver a observância da garantia do juiz natural (CF, art. 5º, XXXVII) e do juiz competente (CF, art. 5º, LIII), bem como da garantia de acesso à Justiça (CF, art. 5º, XXXV), da ampla defesa e contraditório (CF, art. 5º, LV) e, ainda, a de fundamentação de todas as decisões judiciais (art. 93, IX) (THEODORO JUNIOR, 2015, p. 98).

Ademais, Theodoro Júnior (2015, p. 98) menciona que “a Carta brasileira foi emendada para explicitar que a garantia do devido processo legal (processo justo) deve assegurar “a razoável duração do processo” e os meios que proporcionem “a celeridade de sua tramitação” (CF, art. 5º, inc. LXXVIII, acrescentado pela Emenda Constitucional nº 45, de 30.12.2004).”

Nesse ponto, tem-se que o devido processo legal exige que os processos tramitem dentro do regramento que lhe é aplicável, uma vez que “é na legislação infraconstitucional que se estabelece a sucessão dos atos procedimentais, os ônus, os direitos, as garantias, os deveres etc., que deverão ser observados pelos litigantes e pelo órgão público, a fim de que o efetivo devido processo não seja maculado.” (DUARTE; OLIVEIRA JUNIOR, 2012, p. 36).

Por fim, sem rodeios, Duarte e Oliveira Júnior (2012, p. 36) concluem que o princípio do devido processo legal impõe a aplicação de regramentos legais aos diversos

(32)

procedimentos, “[...] adequando-se aos apanágios do devido processo legal em sentido instrumental (contraditório, ampla defesa, juiz natural, motivação, publicidade etc.), bem como ao aspecto substancial do último (proporcionalidade/razoabilidade).”

2.2.2.2 Princípio da oralidade

No procedimento dos Juizados, díspar do sistema cível tradicional, os atos processuais serão, sempre que possível, praticados à luz do princípio da oralidade, prezando-se pelo uso da palavra não escrita, “faculdade essa que, ainda assim, pode ser dispensada pelas partes, quando lhes for conveniente, ou pelo juiz, quando julgar necessário e seguro. Em algumas situações pontuais, entretanto, a oralidade é imperativa, para permitir o funcionamento do procedimento especial.” (ROCHA, 2017, p. 29).

O objetivo deste princípio é facilitar a comunicação, inclusive sendo possibilitado às partes oferecerem a petição inicial oral na Secretaria dos Juizados Especiais, reduzindo-se a escrito (art. 14, §3º, Lei n. 9.099/95), bem como oferecer defesa ou embargos declaratórios oralmente em audiência, etc. (ROSSATO, 2012, p. 18).

Oliveira Junior (2011 apud DUARTE; OLIVEIRA JUNIOR, 2012, p. 90), em estudo aprofundando ao princípio da oralidade, chamou atenção as cinco características desse regramento, definidas como o “quinteto da oralidade”, que, pela lógica, também impõem observância no âmbito dos Juizados Especiais, quais sejam:

i) prevalência da palavra como forma de expressão combinada com o uso de meios escritos para preparação e de documentação; ii) imediação na relação entre o juiz e os sujeitos processuais; iii) permanência subjetiva do juiz na condução do processo; iv) concentração do procedimento; v) irrecorribilidade das decisões interlocutórias em separado da decisão principal.

Então, o “[...] processo verdadeiramente oral deve dar preferência à comunicação oral entre os sujeitos do processo, exercendo a escrita o papel de preparação dos debates e como documentação.” (DUARTE; OLIVEIRA JUNIOR, 2012, p. 90).

Pode-se constar que o princípio da oralidade é oriundo da Carta Maior de direitos, quando disciplina os direitos fundamentais, em seu artigo 5º: “LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.” Essa é uma previsão constitucional sobre o processo judicial que se materializou de forma exitosa nos Juizados Especiais.

À vista disso, depreende-se que a Lei n. 9.099/95, que inaugurou o Sistema, se consagra pioneira em encampar o diálogo entre os litigantes e ao meio probatório, efetivando o

(33)

objetivo de economia processual ao predominar-se a verbalização em face dos atos escritos em todo o procedimento cognitivo (ROCHA, 2017, p. 29; ROSSATO, 2012, p. 18).

2.2.2.3 Princípio da simplicidade e da informalidade

Pode-se afirmar que esses princípios estão interligados entre si, visto que possuem regramentos em comum nas leis, assim, se fazendo presentes nos mesmos atos processuais.

Em síntese, o princípio da simplicidade “significa a dispensa de formas rígidas dos atos processuais, não devendo o processo dar ensejo a incidentes processuais.” (SOUZA, 2010). Ainda, para Chimenti e Santos (2018, p. 53), “o processo tem de apresentar resultados, como de resto toda prestação de serviços públicos”. Esta afirmação destaca a importância dos Juizados Especiais Federais e da Fazenda Pública, pois, sendo órgãos competentes para conciliar e julgar determinadas causas cíveis de interesse dos entes públicos federados - os quais têm como finalidade maior efetivar os direitos sociais fundamentais à toda população, através da prestação de serviços de ordem pública -, se os litígios judicializados tramitarem de forma célere nestes juízos, eventuais obrigações de direitos, reconhecidos em desfavor da Fazenda Pública em face de outrem, também serão efetivados de forma célere.

Em complemento, Rocha (2017, p. 32) sustenta que o princípio da simplicidade seria “um corolário do princípio democrático, buscando aproximar a população e os jurisdicionados da atividade judicial”, facilitando, por exemplo, às pessoas que necessitam de tratamento medicamentoso/cirúrgico quando não obtém o fornecimento pela via administrativa - através do requerimento aos entes públicos - pois podem efetuar o requerimento judicialmente nos JEFs e JEFPs, evitando o perecimento do direito constitucional à saúde.

O critério da informalidade requer a realização dos atos processuais de forma mais ágil, de forma que o ato seja o instrumento para concretização do direito e não uma finalidade do processo (CHIMENTI; SANTOS, 2018, p. 55). 14

No entanto, cabe ressaltar que a informalidade preconiza a eliminação somente das formas não essenciais dos atos, que seriam as circunstâncias destes e não o conteúdo em si, sob pena de comprometer a validade do ato (ROCHA, 2017, p.33). O doutrinador ainda conclui

14 Tem-se como exemplo a intimação de testemunhas por telefone, constando nos autos a certificação: Enunciado n. 73: “A intimação telefônica, desde que realizada diretamente com a parte e devidamente certificada pelo servidor responsável, atende plenamente aos princípios constitucionais aplicáveis à comunicação dos atos processuais.” (FONAJEF, 2018).

Referências

Documentos relacionados

Após a colheita, normalmente é necessário aguar- dar alguns dias, cerca de 10 a 15 dias dependendo da cultivar e das condições meteorológicas, para que a pele dos tubérculos continue

5 “A Teoria Pura do Direito é uma teoria do Direito positivo – do Direito positivo em geral, não de uma ordem jurídica especial” (KELSEN, Teoria pura do direito, p..

As questões acima foram a motivação para o desenvolvimento deste artigo, orientar o desenvol- vedor sobre o impacto que as cores podem causar no layout do aplicativo,

Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo realizar testes de tração mecânica e de trilhamento elétrico nos dois polímeros mais utilizados na impressão

Neste estudo foram estipulados os seguintes objec- tivos: (a) identifi car as dimensões do desenvolvimento vocacional (convicção vocacional, cooperação vocacio- nal,

O relatório encontra-se dividido em 4 secções: a introdução, onde são explicitados os objetivos gerais; o corpo de trabalho, que consiste numa descrição sumária das

Foi membro da Comissão Instaladora do Instituto Universitário de Évora e viria a exercer muitos outros cargos de relevo na Universidade de Évora, nomeadamente, o de Pró-reitor (1976-

Os principais resultados obtidos pelo modelo numérico foram que a implementação da metodologia baseada no risco (Cenário C) resultou numa descida média por disjuntor, de 38% no