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Caleidoscópio: percurso intelectual e a estréia de Heron de Alencar como crítico literário no jornal A Tarde (1947-1952)

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Academic year: 2021

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(1)Universidade Federal da Bahia Instituto de Letras Programa de Pós-Graduação em Letras e Lingüística Rua Barão de Geremoabo, nº147 - CEP: 40170-290 - Campus Universitário Ondina Salvador-BA Tel.: (71) 263 - 6256 – Site: http://www.ppgll.ufba.br - E-mail: pgletba@ufba.br. Caleidoscópio: Percurso intelectual e a estréia de Heron de Alencar como crítico literário no jornal A Tarde (1947-1952) por. CARLA PATRÍCIA BISPO DE SANTANA Orientadora: Profª Drª Ivia Iracema Duarte Alves. V.1. SALVADOR 2003.

(2) 2. Universidade Federal da Bahia Instituto de Letras Programa de Pós-Graduação em Letras e Lingüística Rua Barão de Geremoabo, nº147 - CEP: 40170-290 - Campus Universitário Ondina Salvador-BA Tel.: (71) 263 - 6256 – Site: http://www.ppgll.ufba.br - E-mail: pgletba@ufba.br. Caleidoscópio: Percurso intelectual e a estréia de Heron de Alencar como crítico literário no jornal A Tarde (1947-1952) por. CARLA PATRÍCIA BISPO DE SANTANA Orientadora: Profª Drª Ivia Iracema Duarte Alves. V.1. Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Letras e Lingüística do Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre em Letras.. SALVADOR 2003.

(3) 3. BIBLIOTECA CENTRAL - UFBA S232. Santana, Carla Patrícia Bispo de, Caleidoscópio: percurso intelectual e a estréia de Heron de Alencar como crítico literário no Jornal A Tarde (1947-1952) / Carla Patrícia Bispo de Santana. - Salvador: C. P. B. de Santana, 2003. 2v. : il. Conteúdo: v.1 Dissertação e anexos. - v.2 Catálogo da produção de Heron de Alencar no Jornal A Tarde (1947-1952) e índices. Orientadora : Profª Drª Ivia Iracema Duarte Alves. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia. Instituto de Letras, 2003. 1. Alencar, Heron de, 1921-1972 – Crítica e interpretação. 2. Literatura brasileira. I.Alves, Ivia Iracema Duarte. II.Universidade Federal da Bahia. Instituto de Letras. III. Título. CDU – 821(81).09 CDD – 869.09.

(4) 4. AGRADECIMENTOS A Prof.ª Drª Ivia Alves, a mentora deste trabalho, que sugeriu o tema e indicou os caminhos. A Prof.ª Drª Doralice Alcoforado pela ajuda ainda no período da seleção. A Wanda Amorim que desde que soube da pesquisa vem dedicando seu tempo a vasculhar arquivos e a relembrar acontecimentos; que trouxe da França material significativo e passou horas comigo durante sua estadia em Salvador. E a sua filha, a Prof. Ana Maria Alencar, pelo envio de textos, pela revisão da cronologia (em parceria com sua mãe), e pela disposição em ajudar. A Adalmir da Cunha Miranda pelo farto material cedido e pelas longas e agradáveis conversas ao telefone. A Inácio Loyola de Alencar que dedicou seu tempo a reproduzir fotografias e manuscritos do seu arquivo pessoal e enviá-los por e-mail, além de ter respondido inúmeras mensagens esclarecendo minhas dúvidas, e por também ter aberto portas e indicado caminhos. A Hennê de Alencar Maia que também colaborou enviando material via Inácio. A Pedro Moacir Maia que foi muito atencioso e cedeu material. E mais aos que concordaram em dar entrevistas e/ou a responder questionário, dando seus depoimentos, além dos já citados acima: Iberê Cavalcanti, Luis Henrique Dias Tavares, Milton Carvalho, Waldir Freitas Oliveira e Antônio Barros. A Claude Santos que gentilmente disponibilizou seu acervo, cedeu imagens únicas e fotografou, entre outros, a coluna Caleidoscópio . A Geraldo Ferreira de Lima, a Sérgio Cerqueda e a Mirreille Garcia pela ajuda com as línguas estrangeiras. A Claudia T. Sobrinho que me ouviu falar a mesma coisa infinitas vezes, Franklânia Freitas que me deu as primeiras dicas de pesquisa, Gilgleide de Andrade que ajudou na primeira revisão do Catálogo, Gilmara Miranda que foi parceira da pesquisa no início deste trabalho, Margarete Carvalho sempre positiva, Renata Nascimento sempre sensata, e a Vânia Solovera pela digitalização de parte das fotografias e por intermediar as brigas com o computador. A todas essas sorridentes amigas com quem, juntas, estamos deixando de ser meninas para nos tornarmos mulheres, agradeço pelo apoio e amizade. A Vicente Ferreira de Lima, que conviveu diariamente comigo durante esses últimos dois anos, pela ajuda em momentos chaves, pela paciência e pelo amor. A Marta e Arend Becker que me acolheram quando mais precisei, e a Alba Suerdieck que me fez acreditar em mim. Ao CNPq pela concessão da bolsa..

(5) 5. A minha mãe que me ensinou a andar com minhas próprias pernas e por todo o amor que me dedica..

(6) 6. RESUMO. Esta dissertação ocupou-se, como objetivo principal, do resgate da atuação intelectual de Heron de Alencar (1921-1972), dando ênfase à sua vida na Bahia e à sua estréia como crítico literário. Portanto, centrou-se no seu trabalho no jornal A Tarde, no período que compreende os anos de 1947 a 1952, no qual foi redator da página Literária e manteve uma coluna de divulgação e crítica literária. Estabeleceu-se uma metodologia fundada na pesquisa de fontes primárias. Realizaram-se, entre outras atividades, transcrições e resumos de textos de sua autoria no referido jornal, entrevistas, e consulta a documentos (currículo, fotografias, manuscritos e outros) cedidos por familiares do crítico em questão. Como resultado reconstituiu-se parte significativa do seu percurso intelectual em diferentes lugares do País e do exterior, até o ano do seu falecimento evidenciando sua participação em projetos e iniciativas no campo da cultura. Também se mostrou, através do comentário e análise de seus textos, como operava a leitura de livros na sua coluna, situando o tipo de trabalho que realizava nas discussões sobre a crítica literária do período. Assim, foi possível fornecer um perfil crítico e ideológico desse intelectual que desempenhou um papel significativo na cena literária da Bahia de sua época.. Palavras-chave: Literatura Brasileira; Crítica Literária; Bahia; Periódicos; Memória..

(7) 7. ABSTRACT. The main focus of this dissertation is the revival of the intellectual Heron de Alencar (b. 1921 d. 1972), giving emphasis to his life in Bahia and his start as a literary critic. The central point of this approach is Alencar’s work in the newspaper A Tarde, from 1947 to 1952, in which he was the literary editor and had a column to express his criticism. In order to examine Alencar’s work it was established a methodology based on primary resource researches. So, among other activities, transcriptions and summaries of articles by him to the newspaper were made as well as interviews, and the examination of documents like curriculum vitae, photographs, manuscripts and others made available by the critic’s family. As a result, until his death, much of the way as an intellectual in different places of the country and outside was able to be rebuild, showing his participation in cultural projects and initiatives. It also showed, by means of commentaries and analyses of his texts, how he used to operate the reading of books in his column, inserting it into the literary context of the time. So, it was possible to present a critical and ideological profile of this intellectual who had a meaningful role in the literary scene of Bahia in his time.. Key words: Brazilian literature; literary criticism; Bahia; periodicals; memory..

(8) 8. ABREVIATURAS. AD – Análise do Discurso AT – Jornal A Tarde CB – Caderno da Bahia CL – Caleidoscópio HA – Heron de Alencar. SIGLAS. PCB – Partido Comunista Brasileiro UnB – Universidade de Brasília.

(9) 9. SUMÁRIO V. 1 RESUMO. 06. ABSTRACT. 07. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS. 08. INTRODUÇÃO. 11. 1. PERCURSO INTELECTUAL DE HERON DE ALENCAR. 1.1. PEREGRINAÇÕES DE JOVEM ESTUDANTE. 17. 1.2. EM DEFESA DO MONOPÓLIO ESTATAL DO PETRÓLEO. 20. 1.3. ATUAÇÃO NA UNIVERSIDADE DA BAHIA. 24. 1.3.1. O ingresso como professor na Universidade da Bahia. 24. 1.3.2. O assessor de Edgar Santos. 30. 1.3.3. O IV Colóquio de Estudos Luso-Brasileiros. 34. 1.3.4. Participação na Reforma Universitária – Bahia. 38. 1.4. ATUAÇÃO NA SORBONNE. 43. 1.5. A CONSTRUÇÃO DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA -. 1.6. A EXPERIÊNCIA DO EXÍLIO. 50. 1.6.1 1.7. Os trabalhos no IRAM e as Universidades da Argélia. 55 58. 2. A ATUAÇÃO DE. 2.1. O ESPAÇO DA LITERATURA NA IMPRENSA DO FINAL DA DÉCADA DE 40:. 2.1.1. POLÊMICAS CRÍTICAS DO PERÍODO: CRÍTICA DE RODAPÉ E CRÍTICA ACADÊMICA. 65. 2.2. A DIVULGAÇÃO DA LITERATURA POR JORNAIS. 69. 2.3. ATUAÇÃO EM JORNAIS. 72. 2.3.1. A veia jornalística. 72. 2.3.2 2.3.3. Jornal A Tarde Jornal da Bahia, O povo e outros jornais. 73 79. 2.4. REDATOR DE REVISTAS. 80. 2.4.1 2.4.2. Caderno da Bahia. 80 84. 2.5 2.5.1 2.5.2. TEXTOS DIVERSOS DE HERON DE ALENCAR EM A. UMA UTOPIA VETADA. UM MEDIADOR ENGAJADO HERON DE ALENCAR. NA IMPRENSA E NA MÍDIA BAIANAS. Outras revistas Reportagem Artigos diversos. 45. TARDE. A TARDE. 62. 86 87 90.

(10) 10. 2.5.3. Literatura. 92. 2.6. TELEVISÃO: O CLUBE DE DEBATES. 97. 3. CALEIDOSCÓPIO: “MANIFESTAÇÕES DE ATITUDE CRÍTICA” DIANTE DA LITERATURA E DA CULTURA. 3.1 3.2. O FORMATO DA COLUNA SOBRE OS MÉTODOS DE ANÁLISE DA PRODUÇÃO TEXTUAL EM CALEIDOSCÓPIO IMPRESSÕES DA COLUNA CALEIDOSCÓPIO: OS SUB-TÍTULOS MAIS FREQÜENTES. 3.3 3.3.1. 100 103 105 105. 3.3.2 3.3.3 3.3.4 3.3.4.1 3.3.4.2 3.3.5 3.3.5.1 3.3.5.2 3.3.5.3. Biografia e Miniatura: do perfil de escritores ao exercício de um procedimento de análise crítica Depoimentos: mosaico de opiniões O discurso da responsabilidade política do intelectual Textos maiores de crítica nos quais discute concepção de literatura Produção em prosa Produção poética Um olhar sobre as variações Descrição e agrupamento das Variações Variações pensadas a partir da leitura de obras literárias Variações: Impressões do mundo. 4. (IN)CONCLUSÃO. 146. 5. REFERÊNCIAS. 149. 114 116 120 121 125 128 128 130 136. ANEXOS ANEXO A. Anexo A-1- Cronologia (acompanhada de álbum). 160. Anexo A-2 – Entrevistas (retirados da versão final). 170. Anexo A-3 - Notas diversas em periódicos sobre Heron de Alencar. 229. Anexo A-4 – Seleção: Textos de HA em A Tarde utilizados nesta dissertação. 243. V.. 2. ANEXO B. 311 317. CATÁLOGO DE TODA A PRODUÇÃO EM A TARDE (1947-1952) Anexo B-1 - Índice Geral Anexo B-2 - Todos os textos por ordenamento cronológico – resumos e transcrições Anexo B-3 - Índice remissivo. 331. Anexo B-4 - Índices onomásticos. 540. Anexo B-5 - Índices das revistas. 576. 531.

(11) 11. INTRODUÇÃO. E. sta dissertação começou a ser pensada às vésperas de se completar três décadas do falecimento de Heron de Alencar. Sendo iniciada como tal,. juntamente com as aulas do curso de mestrado, nos primeiros dias de janeiro de 2002, exatamente no mês em que, trinta anos antes, aquele “baiano de coração” deixava esse mundo, em 1º de janeiro de 1972. Intitulada, Caleidoscópio: Percurso intelectual e a estréia de Heron de Alencar como crítico literário no jornal A Tarde (1947-1952), é o primeiro passo no sentido de descobrir e compreender o que fez e o que escreveu Heron de Alencar, as idéias que defendeu e como se deu o seu processo de amadurecimento intelectual. E, claro, o que representou para sua geração e o que deixou como legado para os que se interessam pelos assuntos da cultura, da educação e da literatura. Mas a pesquisa sobre esse intelectual iniciou-se ainda no curso de graduação. A proposta feita pela orientadora deste trabalho, de localizar, resumir e transcrever os textos do jornal A Tarde, foi feita já no final do curso de Licenciatura em Letras Vernáculas sendo, de pronto, aceita. Foi quando se deu a apresentação de Heron de Alencar a uma aspirante a pesquisadora. Resolveu-se, então, cursar o bacharelado para dar início a uma nova pesquisa. Aliás, se assim não tivesse sido, este trabalho não poderia ter obtido os resultados aqui apresentados em tão curto espaço de tempo, ou seja, em dois anos. Estreando na cena crítica, em 1947, com uma coluna semanal intitulada Caleidoscópio e que vai até 1952, ano em que defende sua tese de concurso para a livre docência da então Universidade da Bahia, Heron de Alencar tem sua produção inserida justamente em um momento de mudança no campo da crítica literária. Por ser um período de transição da crítica de jornal para a crítica acadêmica, torna-se importante resgatar sua atuação e analisar seus textos. Mudanças regionais marcam a Bahia daquele período, tanto no campo da literatura – com as revistas locais a exemplo de Caderno da Bahia – como na área econômica. Passando por uma etapa de industrialização e desenvolvimento, a Bahia é o primeiro Estado a produzir petróleo e a zona urbana da Cidade do Salvador experimenta um grande crescimento, configurando um ambiente propício às transformações culturais. Somam-se, a essas mudanças, as propostas de Afrânio Coutinho, justamente na década de 1950, que propõe novos métodos de análise crítica, de viés intratextual, provenientes do new criticism e defende uma maior especialização do crítico, questionando inclusive a formação dos estudiosos que.

(12) 12. faziam a crítica de rodapé nos jornais e periódicos. Para ele, a formação em um curso de Letras seria fundamental para o desenvolvimento de tal atividade. Tudo isso colocou algumas questões para este trabalho, entre elas: como se posicionou Heron de Alencar que, assim como Chiacchio e o próprio Coutinho, tinha formação de médico? E ainda: quais. os. elementos que valorizava na leitura e divulgação das obras literárias? Ao se tentar reconstituir a cena da crítica literária jornalística baiana, a chamada crítica de rodapé, entre décadas de 20 a 70 do século XX, encontra-se alguns nomes que alçaram a cena nacional. A maioria, como Carlos Chiacchio, Eugenio Gomes e David Salles, entre outros, reflete em seus textos tanto as vertentes da crítica dos centros de poder como também as nuances do lugar em que se encontram, tornando-se, assim, muito importantes para a avaliação da cena literária da região. Esses críticos já têm a análise detida de suas produções e de suas atuações. O primeiro a ser estudado detidamente foi Carlos Chiacchio, colaborador do jornal A Tarde durante o longo período de 1928 a 1946, por Dulce Mascarenhas em seu livro Carlos Chiacchio: Homens e Obras1. O estudo sobre Eugenio Gomes, que colaborou no jornal O Imparcial, a partir do ano de 1928 e que depois se transferiu para o Rio de Janeiro, foi realizado por Ivia Alves2. David Salles, que manteve a coluna “Crítica de rodapé” (mais tarde intitulada “Enfoque da crítica”) no jornal A Tarde entre 1972 a 1984, foi trabalhado por Itana Nogueira3. Reduzindo o foco da cena literária para o espaço do jornal A Tarde, percebese um intervalo entre o trabalho do primeiro e do último críticos citados. Chiacchio encerra suas atividades em 1947, ano de sua morte, e Salles inicia em 1972, interessado em reabilitar na época a crítica de jornal ou a crítica de rodapé. Nesse período alguns nomes apareceram naquele jornal. No entanto, o intelectual que substituiu e modificou a crítica jornalística do jornal A Tarde, assumindo um rodapé ou coluna de crítica e divulgação, após a morte de Chiacchio, foi Heron de Alencar. Apesar de sua intensa atuação na cena baiana, ainda permanece silenciado ou, esclarecendo, por ter atuado em um momento de intensa mudança cultural na região, diante das grandes transformações abertas nas artes, das mudanças da Educação e da consolidação da Universidade na região, ele, que participou dessas inovações, ficou com a sua atuação como literato e crítico submersa.. 1. MASCARENHAS, Dulce. Carlos Chiacchio: Homens e obras: itinerário de dezoito anos de rodapés semanais em A Tarde.Salvador: Publicações da Academia de Letras da Bahia, 1979. v.2 2 ALVES, Ivia. Visões de espelhos: o percurso crítico de Eugenio Gomes. 1996. 314f.Tese (doutorado em Letras) – USP, São Paulo, 1996 3 NOGUEIRA, Itana. David Salles. 1996. 110 p. Dissertação (Mestrado em Letras) – UFBA, Salvador, 1996.

(13) 13. Considerando que a produção de Heron de Alencar está situada em um momento de mudança para a crítica literária, é possível que sua produção apresente marcas de transformação no fazer crítico literário em grau significativo. Duas hipóteses foram colocadas logo de início, 1) se seguiu a linha de Carlos Chiacchio (seu antecessor) durante toda a sua atuação no jornal, ou 2) se, com a influência das novas teorias que estavam ressoando na Bahia, naquele momento, apresentou mudanças no seu método de análise crítica. Partiu-se da idéia de que Heron de Alencar tenha sido uma personalidade de importância significativa no cenário cultural da Bahia de sua época. Assim, resgatar a sua produção, como orientador do ideário da cultura, é uma tentativa de colaborar para o preenchimento de uma das lacunas nos estudos sobre a cultura e sobre a produção da crítica literária baiana, constituindo-se como o objetivo central deste trabalho. Outros objetivos decorreram, entre eles o de contextualizar a atuação de Heron de Alencar no campo da crítica literária e da cultura local no período correspondente ao final da década de 40 e início da década de 50 do século XX, mapeando as polêmicas que estavam em evidência nos debates sobre crítica literária naquele momento. Para obter um perfil desse intelectual buscou-se reconstituir seu percurso de vida. E para saber como desenvolvia seu trabalho no jornal A Tarde foi preciso estabelecer algumas metas: proceder ao levantamento de sua produção no referido periódico até o ano em que deixa o País para seus estudos de pós-graduação na Sorbonne, em 1954 (onde mais tarde será Leitor Brasileiro); proceder à leitura, resumo e seleção dos textos localizados nesse periódico – foram encontrados textos até o ano de 1952; assinalar as possíveis mudanças na sua escrita; identificar seu procedimento de leitura dos livros resenhados; identificar seu posicionamento diante da produção escrita na Bahia; e, finalmente, construir índices e catálogo dessa produção. A pesquisa apoiou-se na metodologia da pesquisa de fontes primárias. A primeira etapa consistiu na localização, recuperação e transcrição, em editor de texto, do material produzido por Heron de Alencar e publicado em periódicos disponíveis nas Bibliotecas e Fundações Públicas. Para os textos que tratam da produção baiana e brasileira, realizou-se a transcrição total e, para os que tratam de literatura de língua estrangeira, procedeu-se ao resumo, sendo que alguns foram selecionados para transcrição, evidenciando a posição do crítico quanto ao seu conteúdo. Seguindo a metodologia construída por José Aderaldo Castello4, reconstitui-se o itinerário intelectual de Heron de Alencar, a partir do levantamento 4. CASTELLO, José Aderaldo. Prefácio. In: NAPOLIS, Roselis Oliveira. Lanterna Verde e o Modernismo. São Paulo: ISB/ USP, 1970. p.7-17..

(14) 14. de dados realizados através das leituras e fichamentos de Histórias Literárias, Enciclopédias, Teses e Dissertações, e da realização de entrevistas com familiares e contemporâneos. De Heron de Alencar também foram pesquisados paratextos (ensaios, artigos, discursos, polêmicas, biografias) e metatextos (crítica acadêmica, crítica jornalística). Traçou-se, desde o início, um roteiro das etapas metodológicas a serem seguidas, mas impedimentos diversos impuseram atividades paralelas. Primeiro, foram efetuados localização, leitura e resumo dos textos publicados na coluna Caleidoscópio, referentes ao período compreendido entre os anos de 1947 a 1952. Em seguida, fez-se a transcrição dos textos selecionados, quais sejam, os que continham comentários mais aprofundados sobre os livros, e, em paralelo, deu-se início às entrevistas com contemporâneos de HA. Perceber-se-á que os questionários foram melhorados à medida que aconteciam as entrevistas. O desafio do primeiro capítulo desta dissertação foi reconstituir o percurso intelectual de HA, a partir do contexto nacional e do local. Para tal empreitada, foi necessário dar sentido a fragmentos, a papéis recolhidos, frases ditas e sugeridas e silêncios. Todo e qualquer material adquirido durante a pesquisa constituiu-se como documento, que diz de uma vida, de uma época e de uma dada cultura. Os dados fornecidos pelas entrevistas e conversas via e-mail, realizadas com amigos e familiares, nos documentos cedidos pelo mesmo grupo de pessoas (cartas de HA e para ele, pessoais e oficiais, atas e outros), na sua produção escrita e nos textos escritos por terceiros sobre HA, foram essenciais. O segundo capítulo dedica-se à atuação de Heron de Alencar na imprensa e na mídia baianas. Tratou-se do seu trabalho de divulgador e de incentivador das artes, e de crítico literário em jornais e em revistas. Nesse momento discutiu-se algumas das questões privilegiadas nos debates sobre a crítica literária em jornais, como ressonâncias das transformações que emergiram no cenário local advindas dos centros culturais. Particularmente a nova crítica, especialmente através da leitura dos textos de Afrânio Coutinho, publicados em Críticos & críticos, Da crítica e da nova crítica e No hospital das letras. Também se fez nesse capítulo uma apresentação comentada dos textos maiores (artigos, crônicas e outros) publicados em A Tarde, entre os anos de 1947-1952, a fim de se ter uma visão mais ampla de sua atuação naquele jornal. O terceiro capítulo dedica-se à coluna Caleidoscópio. Os textos publicados nas 53 seções do jornal foram selecionados e agrupados, alguns por subtítulos e outros por conteúdo, a fim de facilitar a compreensão do trabalho realizado. Neste momento, buscou-se a contextualização do tipo de crítica produzida por Heron de Alencar dentro de seu tempo, a compreensão de suas estratégias de legitimação como crítico. Também se discorreu sobre sua.

(15) 15. maneira de ler as obras literárias e quais os elementos que privilegiava em determinadas produções. Nos anexos, poderão ser consultados diferentes textos. Há dois anexos gerais, um está anexado ao primeiro volume da dissertação e outro em separado, compondo o segundo volume deste trabalho. No Anexo A constam: uma cronologia de Heron de Alencar, acompanhada de algumas fotografias (anexo A-1), as entrevistas (Anexo A-2), diversas notas sobre Heron de Alencar que saíram em periódicos (Anexo A-3), os seus textos publicados em A Tarde e utilizados nos Capítulos 2 e 3, separados por blocos, conforme a classificação feita naqueles capítulos (Anexo A-4); e a relação bibliográfica de seus textos, sobre literatura, educação e outros assuntos, encontrados e/ou identificados até então (Anexo A-5). O anexo B é o Catálogo de toda a sua produção em A Tarde e foi divido em cinco partes. Na primeira, Anexo B-1, está o índice geral dessa produção; no Anexo B-2 estão as transcrições e resumos desses textos; o Anexo B-3 é o índice remissivo desse material (por isso se fez necessário numerar esta parte dos Anexos); no Anexo B-4 estão os índices onomásticos de autores brasileiros e estrangeiros com respectivas obras resenhadas naquela seção; e por fim, no anexo B-5 está o índice das revistas comentadas em Caleidoscópio..

(16) 16. Revista Manchete, após 1964 Fotografia cedida por Adalmir da Cunha Miranda.

(17) 17. CAPÍTULO 1 PERCURSO INTELECTUAL DE HERON DE ALENCAR5. A perseverança é a marca dos gênios – eu lera em alguma passagem de Goethe. Mas, Heron não era gênio; perseverante, com a marca dos homens. Fincado no chão, como árvore crescendo – nas salas de aula com os estudantes, como um peixe na água. Em Paris, em Brasília ou na cidade nova de Argel. Resistiu à doença sem desespero. Quando não pôde mais escrever com a mão direita, aprendeu a fazê-lo com a esquerda. Ao voltar ao Brasil, pela mão de Oscar Niemeyer, estava morrendo. Ele e alguns dos nossos amigos já se foram. Isto é uma certeza. É preciso que alguém mais hábil do que eu escreva a história de sua vida. Porque a biografia dele é nosso maior orgulho. (Sadala Maron)6. 1.1. PEREGRINAÇÕES DE JOVEM ESTUDANTE. Baiano de atuação, Francisco Heron de Alencar7 nasceu no Ceará, Crato, em 1921. Sua vinda para Salvador deu-se pelo fato de seu pai, Sr. Loyola de Alencar, que era funcionário do Ministério da Fazenda, ter sido promovido e transferido para Salvador. A primeira transferência foi em 1933, mas durou pouco tempo. Nesse período, HA estudou no Ginásio de Bahia. No ano seguinte, seu pai é transferido para Pernambuco e HA estuda no Ginásio do Recife, onde, além de matricular-se no ginásio do Pe. Félix, faz um curso de datilografia. A família retorna à Bahia em 1935, e HA inicia o curso secundário no Ginásio Carneiro Ribeiro onde faz o bacharelado em Ciências e Letras, concluindo-o no ano seguinte. Finalizando então o curso secundário, vai ao Rio em 1937 e matricula-se no Colégio Freycinet. 5. Excetua-se aqui a sua atuação na imprensa, que será assunto do capítulo 2 deste trabalho. MARON, Sadala. Heron de Alencar. A Tarde, Salvador, p. 2, 31 dez. 1972. Sadala Maron, poeta e advogado, foi colaborador do Suplemento Literário de A Tarde. 7 Neste trabalho, o autor será tratado pelo nome mais conhecido, Heron de Alencar, ou então pelas iniciais HA. 6.

(18) 18. a fim de se preparar para o exame da escola de aviação. Em março de 1938, falece sua mãe, D. Raymunda Felício de Alencar, e HA retorna à Cidade do Salvador. Finaliza o curso no Ginásio da Bahia em 1940. De imediato, ingressa na Faculdade de Medicina da Bahia, por esse motivo permanece em Salvador quando, em 1944, sua família vai para o Rio de Janeiro ao encontro do seu pai, que lá já estava desde 1942. Heron de Alencar forma-se em Medicina, no ano de 1946, sendo escolhido o orador da turma8. Especializou-se em Obstetrícia, foi residente na Maternidade Climério de Oliveira durante dois anos, de 1945 a 1946, tendo sido o primeiro interno a fazer uma cesariana ainda cursando o quarto ano9. Mas não chegou a exercer a profissão. Ainda como estudante da Faculdade de Medicina inicia suas atividades no meio cultural. Atuou no TEB – Teatro de Estudantes da Bahia, criado por alunos do curso de Medicina. Segundo Luiz Henrique Dias Tavares, esse grupo colocava-se contra o Estado Novo e contava com a participação de um grande número de estudantes, entre os quais: José Pedro da Cruz, Judite Chicorel, Heron de Alencar, de Medicina; José Almeida Castro e Ewerton Visco, de Direito; e o próprio Luiz Henrique Dias Tavares, ainda secundarista naquele tempo. O grupo encenou Uma Casa de Boneca10, de Ibsen, além de outras peças. Tavares mostra que a passagem de HA no TEB foi importante:. No início Heron de Alencar era o diretor do TEB, mas, em setembro de 1943, afastou-se e logo depois em janeiro de 1944, após retorno de Aracaju, o grupo dissolveu-se. Alguns dos estudantes formaram-se e outros se tornaram residentes.11. As atividades do TEB foram mais intensas no ano de 1942. O grupo atuou em. 8. HA não chegou a pronunciar seu discurso. Segundo Inácio de Alencar, um de seus irmãos, por conta de alguns problemas, HA preferiu entregar o texto datilografado ao paraninfo, Almir Sá Cardoso de Oliveira, filho de Climério de Oliveira. 9 Todas essas informações foram fornecidas por duas fontes de consultas, o curriculum vitae de Heron de Alencar fornecido por sua filha Ana Maria Alencar, em 24 maio 2002, via correio, e o questionário de entrevista respondido pelo seu irmão Inácio Loyola de Alencar, enviado via e-mail em 16 ago. 2003. 10 Essa peça realista do dramaturgo norueguês Henrik Johan Ibsen (1828-1906) discute e põe em questionamento a condição da mulher na sociedade burguesa. Sites consultados: <http://www.hf.uio.no/ibsensenteret/the_ collection.html>;<http://www.indac.com.br/teatro/textos/casa%20bonecas.htm>;<http://www.jundiaoonline.com .br?artes/teatro1.asp>. Junho de 2003. 11 TAVARES, Luiz Henrique Dias. Entrevista concedida à pesquisadora em 6 jul 2001. Tavares conheceu HA em 1943 no TEB, foi redator-chefe da Revista Seiva no ano de 1950. Também manteve uma coluna no Jornal da Bahia, entre os anos de 1958 e 1963; atuou como redator no jornal O Momento, 1945/52. E no Jornal A Tarde, atuou como cronista semanal até 1995. Publicou Sete Cães e Derrubado, este publicado em 2000. É historiador e tem livros publicados na área, a 10ª edição revista e atualizada de sua História da Bahia foi lançada em 2001..

(19) 19. meio aos acontecimentos da Segunda Guerra Mundial, segundo Tavares12, quando navios mercantes brasileiros foram torpedeados em portos brasileiros. Manifestações de rua surgiram motivadas pela seqüência de agressões visibilizadas nos cadáveres e destroços que chegaram às praias após os torpedeamentos de agosto de 1942. E o TEB não deixou que tal acontecimento passasse em brancas nuvens. No meio político estudantil, Heron de Alencar era presença constante nos congressos e seminários promovidos pelas entidades. Foi assim que se deu sua aproximação com os militantes do Partido Comunista, quando então começou a se interessar pelos estudos sobre o marxismo e a dialética. É Wanda Amorim de Alencar, sua esposa, quem dá o depoimento:. Ele teve muita atuação nos meios de política estudantil, participando sempre dos congressos e das lutas estudantis. Época na qual começou a se interessar, mais profundamente, pelos estudos sobre o marxismo, a dialética, Hegel, etc. Foi muito ligado ao pessoal do jornal Momento, que era o jornal do Partido Comunista.13. Parece que tanto ele como seu irmão Humberto de Alencar já militavam no Partido Comunista em meados da década de 30. Humberto ingressara na Faculdade de Direito em 1935 e pertenceu à célula do partido daquela Faculdade, formando-se em 1939/40. Nesse período, colaborou com o jornal Unidade – órgão da Associação Universitária da Bahia – que contava com a participação de membros do PC e outros estudantes, a maioria, apartidários. Este periódico circulou sob a responsabilidade de João Falcão. Já o secundarista Heron de Alencar participou de outra célula:. 12. Idem. História da Bahia. 10 ed. São Paulo: Editora Unesp: Salvador: Edufba, 2001. p. 429 e 430. ALENCAR, Wanda Amorim de. Re: Questionário sobre Heron de Alencar. Resposta enviada à pesquisadora via e-mail em maio de 2003. Heron de Alencar casou-se com Wanda Amorim no natal de 1949, e sua primeira filha nasce em 1951. À Ângela Maria, seguem-se Ana Maria, nascida em 1952; Sílvia Maria, em 1955 e Heron de Alencar, em 1958. Wanda Amorim formou-se pela Escola de Biblioteconomia da Bahia em 1947, cuja diretora era a professora Bernadette Sinay Neves, precursora da biblioteconomia na Bahia. Foi professora nessa escola, mas solicitou afastamento para acompanhar o marido à França em 1954 e depois à Brasília. Em 1962, foi bibliotecária-chefe do Serviço de Catalogação e responsável pelo Serviço de Referência da Biblioteca Central da UnB. Em 1963, em vista do futuro lançamento da 3ª edição do livro de Nelson Werneck Sodré O que se deve ler para conhecer o Brasil foi indicada, pela Reitoria da UnB, para fazer o levantamento dos catálogos das principais bibliotecas brasileiras, a fim de atualizar e conferir as indicações dos dados bibliográficos desses livros e possibilitar suas localizações nas diversas bibliotecas do País. Sodré refere-se ao assunto em três passagens do seu livro A fúria de calibã: memórias do golpe de 64, p. 143/4, escrito em 1972. Os originais do livro e do fichário feito por Wanda de Alencar foram destruídos quando houve o golpe de 1964. Neste ano o livro estava no prelo, mas o então diretor da editora organizada pela UnB, Artur Neves, foi obrigado a deixar Brasília, o que acarretou a suspensão da publicação.. 13.

(20) 20. O Ginásio da Bahia tinha uma célula muito atuante, com jovens como Antônio Santos Morais, Célio Guedes, Mário Alves, Milton Tavares, José Schaw da Motta e Silva, Alberto Vita, Heron de Alencar, Alderico Mascarenhas e Milton da Costa Lima.14. HA continuou envolvido na política estudantil quando ingressou na Faculdade. Em 1946, fez parte da delegação baiana ao Congresso da União Nacional dos Estudantes, realizado no Rio de Janeiro. Aquele estudante de medicina desviou seu rumo. Efetivamente, HA não se dedicou à profissão de médico. Os contatos que foi estabelecendo desde sua vida estudantil foram fundamentais na escolha da carreira que seguiria. O fato de, já no quarto ano do curso de Medicina, trabalhar no DEIP (Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda) com Jorge Calmon15, aliado à sua habilidade em escrever, fez com que fosse solicitado pelo jornalismo. A imprensa diária seduzia-o porque era o veículo através do qual poderia debater as grandes causas do momento e dedicar-se à sua paixão pela literatura.. 1.2. EM DEFESA DO MONOPÓLIO ESTATAL DO PETRÓLEO. Seu engajamento político nas questões políticas nacionais continuou durante toda a sua vida. HA era decididamente um intelectual preocupado com os problemas de seu país. Em 1948, HA foi um dos subsecretários do “Centro de Estudos em Defesa do Petróleo” juntamente com os professores Waldir Freitas Oliveira, Eloywaldo Chagas de Oliveira, os deputados Carlos Aníbal, Luis Rogério e Basílio Catalá de Castro, os engenheiros Alberto Catharino e Sigfredo Sampaio; e mais Fernando Santana, Roschild Moreira, Evaldo Martins e Simão Gorender. Esse Centro foi instalado em sessão pública no Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e tinha o objetivo de “[...] sedimentar uma consciência. 14. FALCÃO, João da Costa. O partido comunista que eu conheci: 20 anos de clandestinidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1988. p. 75. 15 ALENCAR, Inácio de. Re: Questionário-depoimento sobre Heron de Alencar. Resposta enviada à pesquisadora via e-mail em 16 ago 2003..

(21) 21. nacional consubstanciada no slogan O petróleo é nosso”16. Nessa ocasião, HA proferiu um discurso17. Waldir Freitas Oliveira, em artigo publicado no A Tarde, relata a sessão de instalação do Centro de estudos e comenta o jornal que fundaram:. Uma das nossas primeiras providências foi a edição de um pequeno jornal informativo ao qual intitulamos Boletim do Petróleo, pelo qual ficou responsável uma comissão redatora, encabeçada por mim e Heron de Alencar, seguidos por Evaldo Martins e Simão Gorender. Dele circularam somente dois números – o primeiro, em junho de 1948, e o segundo em fevereiro de 1949. 18. Aqui já há indícios do que será verificado mais adiante. Heron de Alencar sempre fez parte da comissão de redação de periódicos dos quais participou, ou quando, em outras atividades e mesmo nessa, era o responsável pela elaboração de discursos. Desempenhou um papel importante na divulgação das idéias desse Centro de Estudos, utilizando inclusive sua posição de redator da página de literatura do jornal A Tarde para a veiculação da proposta do grupo. É o que afirma Waldir Freitas Oliveira ainda no mesmo artigo citado:. Um jornalzinho como aquele, com uma tiragem muito pequena e apenas quatro páginas, não poderia ter grande penetração popular, como desejávamos. Foi, então, graças a Heron de Alencar que A Tarde se tornou o principal veículo de notícia das atividades do Centro de Estudos e Defesa do Petróleo. Em A Tarde achava ele, sempre, espaço para divulgar o que fazíamos, surgindo esse noticiário, às vezes, até com fotografias, tanta era a operosidade do jornalista e a consideração que merecia por parte dos dirigentes do jornal onde trabalhava. Ali foram noticiadas instalações de torres simbólicas de petróleo em escolas, em bairros da periferia da cidade, comícios e conferências, tanto em Salvador como em cidade do interior.. 16. ALENCAR, Inácio de. Re: Questionário-depoimento sobre Heron de Alencar. Resposta enviada à pesquisadora via e-mail em 16 ago 2003. 17 É provável que tenha sido esse o texto de sua autoria publicado em A Tarde, em 29 de abril daquele ano, intitulado “Nem as honras de uma falência honesta” que será citado mais adiante. 18 OLIVEIRA, Waldir Freitas. Destaque para Heron de Alencar. A Tarde, Salvador, 10 out. 1992. Caderno Cultural, p. 5-6. p.6..

(22) 22. Naquele mesmo mês de junho, na página literária de A Tarde, sob sua responsabilidade, foi publicado, no dia 3, o meu “Poema ao petróleo Brasileiro”, minha estréia nas páginas do jornal, reproduzido, a 20 de outubro, no Rio de Janeiro, em Jornal de Debates.19. Essa campanha ultrapassou as páginas dos jornais, foi ganhando fôlego através de posições veiculadas em periódicos e mesmo em manifestações públicas nas ruas do País, até que, em 1951, o governo Vargas enviou à Câmara Federal um projeto de Lei criando uma empresa petrolífera de capital misto, segundo Tavares:. O Petróleo é Nosso ganhou as ruas, praças, salões de conferências e plenários da Câmara Federal e Assembléias Legislativas, com a participação de personalidades da política e da cultura e oficiais militares de alta patente. Tinha-se a expectativa de que a exploração industrial do petróleo brasileiro seria o grande incentivo para o desenvolvimento econômico do país. As possibilidades de produção de poços já abertos na Bahia se afirmavam com o trabalho do Conselho Nacional do Petróleo.20. Esse projeto de exploração mista foi rechaçado. Polêmicas acirraram as discussões. Alguns setores da política defendiam que as refinarias e a comercialização fossem realizadas por empresas privadas, que obviamente seriam de capital estrangeiro, e outros setores defendiam o monopólio estatal em todas as etapas da produção. HA, desde o início da campanha, em 1948, arrojadamente já explicitava sua posição ao acusar o capital internacional de boicotar o desenvolvimento e exploração do petróleo brasileiro pelo próprio país e ao criticar, acirradamente, a conveniência e submissão dos homens públicos. Seu texto publicado no Jornal A Tarde, que vale a pena ter alguns parágrafos transcritos aqui, evidencia um homem firme em suas posições:. Está na ordem do dia do debate nacional o cabuloso problema do petróleo. Não apenas o governo discute o assunto, mas o próprio público o debate também, interessado que está numa solução o quando possível urgente. A questão, agora, não se prende, simplesmente, à existência do petróleo, como há algum tempo passado, quando muitos dos mesmos senhores que hoje apregoam a entrega do minério aos monopólios estrangeiros negavam a sua existência em terras do Brasil. E como já é 19 20. OLIVEIRA, Waldir Freitas. Destaque para Heron de Alencar...., op. cit., p. 6. TAVARES, Luiz Henrique Dias. História da Bahia, op. cit., p. 468..

(23) 23. impossível negar essa existência ou dizer que o nosso combustível não é comerciável, vai sendo a questão colocada em outros termos, referente à exploração do ouro negro, com uma série mais ou menos longa de perguntas: quem deve explorar o nosso petróleo? O capital nacional ou estrangeiro? Ambos? O capital oficial ou misto? [...] [...] foi o petróleo de tantas vezes rechaçado para as profundezas da terra, com o criminoso entupimento de poços e o expediente tão em voga do retardamento burocrático. Sem se falar no desaparecimento de maquinário, em condições algo misteriosas, para as quais os interesses internacionais contribuíram de modo decisivo e definitivo... [...] Nada disso, no entanto, teria maior importância, o problema praticamente não existiria, se os nossos homens públicos, em sua maioria, estivessem habituados a uma atmosfera de independência moral; se os nossos políticos não já se houvessem viciado ao cabresto e as esporas dos chefes e dos caudilhos, se eles fossem homens livres, capazes de sentir, pensar, agir, e dizer sem receios ou temores. Mas, a regra é a do rebanho dócil, que logo atende aos primeiros sons mágicos da flauta de prata. Parece incrível que homens afirmem a impossibilidade de nós próprios explorarmos o nosso petróleo. Não nos falta dinheiro para os palácios suntuosos, onde se instala a esterilizante burocracia. Não se medem despesas, quando se trata de ostentar nas recepções oficiais. Não se procura indagar da eficiência ou deficiência dos cofres públicos, quando se aumentam os subsídios dos ilustres deputados ou os vencimentos da magistratura e das forças armadas. [...] O problema se nos afigura, tão somente, como de honestidade e independência moral. Mas, a tal ponto chegou a sem-cerimônia e ganhou foros de rotina a desonestidade, que se não hesita em proclamar uma falsa incapacidade nacional, em troca de favores milionários. [...] É possível que esse novo e mais vergonhoso capítulo da história do nosso petróleo ponha fim ao drama, com o epílogo que todos os homens honestos receiam: a intervenção do monopólio internacional na exploração do minério, o que significará, desgraçadamente, a nossa ruína econômica e o recibo melhor da nossa crise de caráter. Mas, se tal acontecer, será aconselhável que os vendilhões, uma vez feito o rendoso negócio, partam daqui para gastar o dinheiro nos cassinos que se inaugurarão em Wall Street. Antes, porém, fechem as portas do país, nas quais não poderemos colocar nem mesmo a animadora taboleta de.

(24) 24. ‘fechado para balanço’, de vez que estaremos falidos. E o que é muito pior, falidos sem as honras de uma falência honesta.21. Esse é um texto ousado. Levantar graves acusações sobre o boicote e a postura servil dos homens públicos diante do capital internacional é uma postura atrevida. Além disso, sua publicação no jornal prova o prestígio de HA que não ocupava nenhum cargo executivo nem legislativo, mas conseguiu espaço para divulgar as idéias do Centro. Após tantos esforços durante quatro anos, ao longo dos quais muitos debates foram realizados e artigos publicados, finalmente a campanha terminou vitoriosa, já que o projeto que criou a Petrobrás foi aprovado em 1953, sendo que a proposta do monopólio estatal em todas as etapas foi aprovada em detrimento da que tentava estabelecer a privatização de alguns setores.. 1.3. ATUAÇÃO NA UNIVERSIDADE DA BAHIA 1.3.1 O ingresso como professor na Universidade da Bahia. Por seu destaque na profissão e atuação na área de Letras – pelo trabalho desenvolvido no jornal A Tarde22 –, HA foi contratado para lecionar Técnica de Jornalismo e Literatura Contemporânea, na Faculdade de Filosofia da Universidade da Bahia, em 195123. No ano seguinte, ficou responsável apenas pela segunda disciplina e foi nomeado para a primeira o jornalista Raimundo Sodré da Matta que ocupou a função de professor de Técnica de Jornal. HA tornou-se professor efetivo da Universidade quando, em agosto de 1953, realizou o Concurso para Livre Docência da cadeira de Literatura Brasileira. Este concurso contou com uma prova escrita, outra de títulos, uma aula pública, e com a defesa da tese intitulada Literatura – um conceito em crise, tendo como examinadores Afrânio Coutinho, Raul Batista, Cândido Jucá Filho, Thiers Martins Moreira e Hélio Simões24. 21. ALENCAR, Heron de. Nem as honras de uma falência honesta. A Tarde, p.3, 29 abr. 1948. A parte de sua atividade jornalística será objeto de análise no capítulo 2 deste trabalho. 23 Conseguimos, por intermédio da pesquisadora Lizir Arcanjo Alves, cópia das aulas deste curso que eram datilografas. Porém não houve tempo para uma análise mais amadurecida desse material, recebido quando a primeira parte da dissertação já estava praticamente concluída. 24 Obteve nota máxima em quase todos os quesitos, prova escrita, prova oral (aula pública) e defesa de tese, a exceção foi a prova de títulos para a qual foi concedida nota oito. Todos os argüidores deram as mesmas notas. Como o regimento que estabelecia as regras para concurso na Universidade naquele período estabelecia a 22.

(25) 25. No primeiro dia do concurso, realizou-se a prova escrita. Essa prova foi incluída no volume 2 da Revista Arquivos da Universidade da Bahia, em virtude da deliberação da Congregação da Faculdade sobre a publicação das provas escritas classificados com nota máxima em concurso. Com o título “O Romance Modernista e Contemporâneo”, começa definindo os conceitos de moderno e de contemporâneo como ponto de partida para escrever sobre romance. Configurando-se como um exercício prático de análise literária, essa prova analisa, de forma panorâmica, já que uma prova não é o espaço adequado para análises mais detalhadas, a moderna ficção brasileira, dando ênfase à produção de Mário de Andrade, especificamente sua obra Macunaíma:. Bebida nas fontes puras do folclore, e tentando projetar simbolicamente o drama de uma nacionalidade perdida ao longo de uma estreita e prolongada convivência com culturas estrangeiras – e convivência vai aqui como atenuação do que deveria ser chamado dependência – Macunaíma é, além disso, a desesperada aventura em busca de uma linguagem brasileira.25. Além disso, esboça comentários sobre as obras de Oswald de Andrade, José Américo (A Bagaceira), Rachel de Queiroz (O quinze), José Lins do Rego, Jorge Amado, Graciliano Ramos. É claro que não foi possível abranger todos os autores que poderiam figurar nessa abordagem, assim, alguns são apenas citados:. Objetar-se-á que aí há omissões. Direi que essas omissões são voluntárias – Teixeira e Souza, Macedo, Távora, Pompéia, e haverá até quem lembre, como infelizmente lembrou o Sr. Tristão de Atayde, d. Tereza Margarida da Silva Orta, a irmã de Matias Ayres escondida sob o pseudônimo de Teodora Engrácia. São voluntárias essas omissões, por mais que elas possam significar um adiantamento de juízo de valor. Antes disso, porém, deverão significar um desejo de ser preciso e exato no estabelecimento de uma linha de tradição da qual “Macunaíma”, por mais estranho e paradoxal que pareça, não é senão um resultado. A rapsódia de Mário de Andrade tem sido dada como singular na literatura brasileira, isto é, fruto. disponibilização de 100 cópias da tese pelos candidatos, a tese foi impressa em formato de livro e pôde ser encontrada na Biblioteca Central da Universidade. Inicialmente só encontramos uma única cópia no setor de memória, mas ao final dessa pesquisa outras foram disponibilizadas para consulta pelo sistema informatizado da Biblioteca Central. 25 ALENCAR, Heron de. O romance modernista e contemporâneo. Arquivos da Universidade da Bahia – Faculdade de Filosofia, Salvador, Bahia, Vol. 2, p.157-164, 1953. Os exemplares da revista podem ser encontrados na Fundação Clemente Mariani. À pesquisadora, Inácio Loyola de Alencar doou o vol 2 e o vol 4, nos quais há textos de HA..

(26) 26. apenas do modernismo e, dentro deste, do talento e da cultura de seu autor. [...] Os que aí ficam, porém, acredito que representam a moderna ficção brasileira, cujo florescimento representa o ponto alto da literatura brasileira. Já foi dito que a nossa novelística é a mais importante do continente, só ultrapassada pela norte-americana. E os nomes citados são realmente os mais representativos dessa novelística.26. No segundo dia do concurso, realizou-se a defesa da tese Literatura: um conceito em crise. Nessa tese, HA afirma que o conceito da literatura sofria uma crise decorrente das mudanças ocorridas na sociedade, que por sua vez passava por uma importante revisão de valores desde o advento do romantismo, que corresponde a um período histórico de particulares transformações sociais. O romantismo seria a origem aparente dos sintomas da crise, já que não é possível determinar as origens reais. Para o autor, essas origens “São como as nascentes reais de certos rios, perdidos em florestas virgens, inacessíveis, ainda hoje, aos exploradores mais ousados e aventurosos. Seu estudo, acreditamos, não poderá ser feito senão por uma equipe de grandes estudiosos da literatura e da sociedade [...]”27. Essa afirmação está em sintonia com a atmosfera cultural do Ocidente na época, e com a proposta de Afrânio Coutinho, que vinha de um longo período nos EUA e já atuava fervorosamente em jornais do Rio de Janeiro, tentando derrubar as bases de uma crítica subjetiva e judicativa. Vem desse encontro o convite de Coutinho, que chegou a publicar um artigo sobre o concurso de HA28, para que este participasse da equipe de críticos responsável pela elaboração de A Literatura no Brasil, integrando o grupo que iria trabalhar com o romantismo. A abordagem nova de HA sobre José de Alencar, ponto de sua prova oral, deve ter impressionado o crítico, radicado no Rio, pois o convite foi especificamente para elaborar o estudo sobre José de Alencar e os romancistas românticos29. Convite esse que foi noticiado pelo jornal A Tarde:. 26. ALENCAR, Heron de. O Romance Modernista e Contemporâneo. Op.cit., p. 159. Id. Literatura: um conceito em crise. 1953. 109 p. Tese (Concurso para Livre-docência) Universidade da Bahia. Salvador, 1953. p.31. 28 Não houve tempo para buscar esse artigo. Provavelmente foi publicado no Rio de Janeiro, já que consultamos o jornal A Tarde do período e não o encontramos. 29 HA também recebe o convite de Isaias Alves, então Diretor da Faculdade de Filosofia, para desdobrar aquela aula em três conferências a serem proferidas na Universidade. 27.

(27) 27. O Professor Heron de Alencar vem de receber um convite da Instituição Larragoiti para escrever um capítulo sobre os nossos romancistas românticos para a História da Literatura Brasileira, que essa organização do sul do país editará brevemente. Essa obra, das mais completas no gênero de quantas já se escreveram, será elaborada por um grupo de intelectuais patrícios, dos mais profundos conhecedores da literatura nacional. Apresentará dados biográficos e cronológicos apenas como complemento, pois será um trabalho de interpretação, tendo, inclusive, objetivos didáticos. Há pouco, em concurso prestado para a livre docência de Literatura Brasileira, da Faculdade de Filosofia da Universidade da Bahia, o jornalista Heron de Alencar, a par do talento de que é portador, demonstrou, na sua tese e respectiva defesa, aprimorado senso crítico e grande conhecimento da cultura brasileira. O convite, que lhe vem de ser dirigido, é, portanto, o reconhecimento de seus dotes intelectuais, feito que foi por intermédio de um dos seus mais brilhantes examinadores, o professor e crítico Afrânio Coutinho.30. Atendendo ao convite, preparou o capítulo intitulado “José de Alencar e a ficção romântica”, que se destaca pela abordagem a partir da própria obra (tomando como ponto inicial os paratextos e prefácios de Alencar). Esse capítulo foi considerado por Eduardo Portella um dos pontos altos do volume:. O ponto mais alto do volume é, realmente, o trabalho do professor Heron de Alencar sobre "José de Alencar e a ficção romântica". Um trabalho onde ao pesquisador rigoroso, compreensivo historicamente, se alia uma admirável vocação de crítico literário preocupado com a razão interna da obra de arte, mas sem que se deixe perder na minúcia; pelo contrário: com uma noção nítida e clara do conjunto, realizando um trabalho integral. E nele, a crítica literária atende ao seu critério tridimensional. O julgamento da obra é uma conseqüência lógica da aproximação intuitiva e do conhecimento científico. Daí que seja o seu estudo sobre "José de Alencar e a ficção romântica" dos mais completos e mais seguros daqueles que, sobre um romancista, já foram publicados no Brasil. Trabalho onde não falta aquela qualidade indispensável ao crítico, a que. 30. HERON de Alencar. A Tarde, Salvador, p.5, 12 nov. 1953..

(28) 28. o Sr. Otto Maria Carpeaux resumiu numa palavra de feição impressionista, mas ainda rica de força e conteúdo: o talento.31. Parte desse estudo sobre o romance romântico no Brasil foi publicado no volume 4 da revista Arquivos Universidade da Bahia, em 1955. Na sua tese de concurso, HA procede a um balanço das posições que discutem a interdependência entre literatura e sociedade, citando e discutindo a posição de diferentes estudiosos32. Não defende um novo conceito de literatura que substitua as antigas conceituações já propostas, pois para ele, em primeiro lugar, a literatura não existe em função de um conceito prévio, e, em segundo, porque se for para falar em conceito o melhor seria colocar a palavra no plural, afinal “Não há um conceito de literatura. Há conceitos”33. Além disso, contesta os críticos que agem como se o conceito fosse de “importância subalterna” no estudo da literatura. Defende o estudo da problemática da literatura e de que para tal o primeiro passo seria uma revisão dos currículos das Faculdades de Filosofia, que distinguisse o estudo da literatura do ensino da história literária.. A omissão de um tema tão fundamental quanto apaixonante, como é o da problemática da literatura, falseia toda e qualquer perspectiva na análise dos assuntos literários. Quando se inicia um estudo cientifico, a atitude prévia, e obrigatória, deve ser a de fixar o objeto e o método desse estudo. Sem isso, permanecerão frustrados os nossos propósitos, uma vez que não se sabe como estudar nem o que se pretende estudar.34. Nessa questão de um olhar científico, anuncia mais uma concordância com idéias que vinham sendo defendidas por Afrânio Coutinho no que se refere ao estudo literário e ensino da literatura. Assim como do “movimento renovador” que Coutinho vinha dirigindo no campo da crítica e história literárias35. O autor da tese estabelece cinco dominantes que determinam essa crise ou revolução do conceito, entre elas, “a ampliação do campo de influência e dos limites da literatura”, decorrente de alguns fatores como “[...] o aumento do 31. PORTELLA, Eduardo. Em torno de um conceito de crítica literária. In:______Dimensões I. Rio de Janeiro: José Olympio, 1958. p. 50. 32 Procede-se aqui apenas a um esclarecimento das idéias gerais que atravessam o texto de HA. Um estudo mais aprofundado de sua tese será realizado em outro trabalho. 33 ALENCAR, Heron de. Literatura: um conceito em crise, op.cit., p.81 34 Id., ibid., p.16. 35 Não se pretende aqui fazer um estudo do posicionamento de HA frente às idéias de Afrânio Coutinho, para tal seria necessário um outro momento especifico que abordasse as transformações experimentadas pela crítica literária no Brasil, com ênfase nas décadas de 40 e 50 do século XX..

(29) 29. público, a transformação do livro em mercadoria, as mudanças processadas pelo jornal no campo da literatura com a fundação dos suplementos, as influências das criações cinematográficas, as novelas radiofônicas”, entre outras. Demonstra, assim, consciência de que seu trabalho no jornal contribui para as transformações no campo literário e cultural. Por isso, para HA, qualquer conceito de literatura que viesse a ser formulado deveria levar em consideração esse fatores, se não quisesse correr o risco de se invalidar. Durante o processo de escritura desse trabalho, HA afastou-se do centro da cidade indo morar com a família no bairro de Itapuã. Seu amigo e vizinho na época, Sadala Maron, recorda o fato:. Um dia deu aula sobre José de Alencar, numa das provas do concurso. Mesmo com os aplausos dos examinadores (entre eles Afrânio Coutinho e Cândido Jucá Filho), quis saber dos amigos a crítica, observação aos erros e acertos. Importava-lhe o que diriam Pedro Moacyr, Carlito Maia, Mesquita, todos os que a ele envolvemos com amizade, envolvidos pelo carinho singular de um amigo raro.36. Inicia-se também, a partir da admissão como professor efetivo, seu engajamento na Reforma dos Currículos das Faculdades de Filosofia. Essa postura fomenta posteriores reflexões sobre papel e função a serem desempenhados pela Universidade a fim de formar sujeitos que pensassem a realidade nacional. Sua tese foi considerada um marco naquele momento, segundo vários depoimentos, e talvez sua perspectiva não esteja muito longe do que, contemporaneamente, se faz no campo da literatura e da cultura. Seu extraordinário concurso facilita-lhe a obtenção de uma bolsa de estudos para cursos de especialização na França. No ano seguinte ao concurso, em 1954, afasta-se das suas funções no AT e segue para a França. No retorno, assume a cadeira de Professor Titular de Literatura Brasileira, em 1961. Também ensinou no curso de Biblioteconomia da Universidade da Bahia, nos anos de 1952, 1953 e 1961.. 1.3.2. O assessor de Edgar Santos. HA foi assessor do Reitor da Universidade da Bahia, Edgar Santos. Desde 1952, quando ocupava a função de professor contratado de Técnica de Jornalismo, até 1961, quando 36. MARON, Sadala. Heron de Alencar. A Tarde, Salvador, p.2, 2 jan. 1972..

(30) 30. se transferiu para Brasília37. Nessa função, envolveu-se em diversas atividades promovidas pelo Reitor, como a organização dos institutos universitários. Foi na gestão do citado reitor que foram criados os Institutos de Matemática, Física e Química, a Escola de Geologia e a de Administração, entre outros. HA foi responsável pelos relatórios enviados à Reitoria da Universidade da Bahia sobre a reorganização do Curso de Jornalismo da Faculdade de Filosofia e a organização de um Instituto de Ciências Sociais, ambos em 1961. Também foi o responsável, em 1961, pelo Relatório à Reitoria sobre a organização e o funcionamento do Fórum Universitário dos Seminários Internacionais de Música, e ainda naquele ano enviou o relatório sobre a organização e o funcionamento da Universidade Internacional de Estudos Brasileiros. Também se preocupou com as publicações da Universidade. Foi responsável pelo plano de organização do Boletim Informativo da Universidade da Bahia e das “Publicações da Universidade da Bahia”, em 1952. Anos depois, é ele quem apresenta à Reitoria o projeto de organização da Editora da Universidade da Bahia (atual EDUFBA), que teve suas atividades iniciadas em 1959 com a publicação da revista Universitas, e do Jornal da Universidade38 . A gestão de Edgar Santos está inserida em um momento singular vivido pela Bahia. A década de cinqüenta representa o tempo em que, segundo Risério, “[...] a Cidade da Bahia foi tomada pelo ímpeto da renovação cultural, dispondo-se a se constituir em pólo irradiador ou plataforma de lançamento de signos na vida estético-intelectual do país”39, e Edgar Santos com sua capacidade de enxergar à frente, contribuiu, e muito, para que os frutos desse ambiente fossem abundantes. Um poderoso agente transformador da realidade envolvente40, Santos foi um homem de realizações. Sempre disposto a ouvir as propostas dos jovens e as experimentações, com ele a avant-gard pôde ser efetivada na Bahia. “Sem a presença de Edgar, muitas águas poderiam ter rolado, sob e/ou sobre as pontes – mas não do modo como rolaram”41.. Conseguia agregar os que, apesar das diferenças, desejavam. concretizar seus sonhos.. 37. Informações colhidas no seu currículo fornecido por sua filha, a Prof. Dra. Ana Maria Alencar, via correio. Na verdade, são três currículos datilografados pelo próprio HA. Como há sutis diferenças entre eles, optamos por arrumá-los em um único documento a fim de facilitar a consulta. Para maiores informações poder-se-á consultar a cronologia que fizemos e que consta no Anexo A deste trabalho. 38 Para breves informações sobre a história da Editora da UFBA – EDUFBA, consultar: RODOLFO FILHO. Antes de existir TV. Disponível em: <http://www.tv.ufba.br/sinapse/011212/edufaba.html>. Acesso em mar 2003 39 RISÉRIO, Antônio. Avant-gard na Bahia. São Paulo: Instituto Lina Bo e P.M. Bardi, 1995. p.16. 40 RISÉRIO, Antônio. Avant-gard na Bahia. São Paulo: Instituto Lina Bo e P.M. Bardi, 1995. p.23 41 Id., loc. cit..

(31) 31. Apontando a importância da abertura política experimentada pelo Brasil a partir de 45, Risério mostra que a atuação da ala esquerda, especificamente do Partido Comunista, desempenhou um papel importante no cenário cultural do período por sua característica contestadora. Aliás, se nos detivermos em alguns dos nomes que figuram entre aqueles que contribuíram com as revistas literárias que circularam no Estado entre fins de 40 e início de 50, como as que serão comentadas mais adiante, perceberemos que muitos deles são militantes ou simpatizantes do comunismo e do socialismo e desenvolviam a luta contra o fascismo, a exemplo de Cláudio Tuiuti Tavares, Jacinta Passos, João Falcão e Luiz Henrique Dias Tavares. Não é à toa que Risério vai afirmar, citando Otto Maria Carpeaux, que aqui na Bahia “todo mundo” era de esquerda. E HA não fugia à regra. Seria curioso, se Edgar Santos não fosse quem era, que um homem como HA, um jovem professor, envolvido com os comunistas, fosse escolhido para assessorá-lo. Mas, para o então Reitor, a filiação ideológica seria questão secundária, se a pessoa escolhida aderisse ao seu projeto cultural suprapartidário, e foi assim que HA agiu. Dedicou-se a esse trabalho com apuro, prova disso são os inúmeros relatórios sobre diversas atividades enviados à Reitoria e listados aqui. Até mesmo quando esteve fora do País, primeiro como aluno e depois como professor da Sorbonne entre os anos de 1954 a 1960, continuou colaborando com os trabalhos do Reitor. Vem ao Brasil, especialmente, colaborar com os trabalhos de realização do IV Colóquio de Estudos Luso-Brasileiros, no ano de 1959. A Universidade da Bahia foi a grande patrocinadora do evento que reuniu centenas de estudiosos de diferentes Estados e países na capital, por isso essa participação de HA exige um tópico à parte que virá adiante. Mas é preciso ressaltar, logo aqui, que HA participou do III Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros, realizado no ano de 1957 em Lisboa, com a seguinte comunicação: “Esquema para o estudo do tema do índio na literatura brasileira”42. Também relatou à Universidade as atividades desse evento. Por isso a hipótese de que tenha sido um dos mentores da proposta de realização do quarto evento em Salvador, sendo possível que a idéia tenha sido gestada durante aquele Colóquio. Adalmir da Cunha Miranda foi um dos que presenciaram a dedicação de HA para a realização do Colóquio e sua assessoria na gestão de Edgar Santos:. Heron de Alencar foi conselheiro daquele reitor, em vários períodos dos anos 50. E prestou colaboração pessoal para a execução de projetos de 42. ALENCAR, Heron. Esquema para o estudo do tema do índio na literatura brasileira. Separata de: Colóquio Internacional Estudos Luso-Brasileiros, 3, 1957. Actas III. Coimbra. 1960..

(32) 32. Edgard Santos. Heron enviava-me notícias sobre os êxitos desses planos e eu os divulgava com notícias e artigos no Suplemento Literário do jornal O Estado de S. Paulo. Antes de regressar a São Paulo visitei Edgard Santos para relatar o que fizera para divulgar o IV Colóquio. E dele ouvi palavras de reconhecimento e gratidão a respeito do trabalho de Heron de Alencar para assegurar o sucesso do Colóquio.43. Além disso, ainda na França, não deixou de se preocupar com os problemas da Universidade brasileira e contribuir para sua melhoria. Foi como professor em Paris que sugeriu a criação dos Laboratórios de Pesquisa, através de relatório enviado à Reitoria, em 1957. Além de tratar, segundo informa em entrevista ao jornal O Filósofo (1961), da necessidade de instalação de um Laboratório de Geomorfologia, indicou Milton Santos como a pessoa responsável para conduzir os trabalhos, pois realizava pesquisas vinculadas aos problemas do desenvolvimento regional. Também cuidou do relatório sobre o Laboratório de Fonética Experimental, o primeiro a ser instalado no Brasil, em 1955, criando possibilidades para a realização do Atlas Prévio da Bahia o qual, afirma HA, ainda na mesma entrevista, já estava pronto para publicação e contou com uma equipe de pesquisadores única no Brasil, sob a direção de Nelson Rossi. Declara HA: “Eu me sinto muito feliz de ter colaborado para a instalação, em nossa faculdade, desses dois importantes centros de pesquisa. Sei que ainda é pouco isso que lhe citei. E nem me serve de consolo o fato de que outros, que hoje trazem a reforma na boca, nada tenham feito”44. Além desses relatórios, preocupou-se em descrever a importância de um Congresso Nacional de Língua Falada no Teatro, ocorrido em 1956. A gestão de Edgar Santos findou-se em 1961. Para HA, a substituição do reitorfundador pelo professor Albérico Fraga, por nomeação do então Presidente Jânio Quadros, em desrespeito à deliberação do Conselho Universitário que havia escolhido o nome de Edgar Santos para continuar o trabalho que vinha desenvolvendo, foi um duplo erro. Em primeiro lugar, o Presidente desrespeitou a autonomia universitária ao não nomear o primeiro nome da lista tríplice, o Conselho havia decidido manter o atual reitor no cargo. E em segundo lugar, HA acreditava que era preciso que o então reitor pudesse concluir sua obra, “[...] especialmente no setor de renovação dos métodos de ensino e de aprendizado”45.. 43. MIRANDA, Adalmir da Cunha. Re: Questionário-depoimento sobre Heron de Alencar. Resposta enviada à pesquisadora via e-mail em 28 jul 2003. 44 ALENCAR, Heron. Sobre a Reforma Curricular (entrevista). O Filósofo: órgão oficial dos alunos da Faculdade de Filosofia da Universidade da Bahia, Salvador, ano 11, n.15, 1961. Não foi possível ter acesso ao exemplar completo do jornal, não será possível indicar páginas. Waldir Freitas Oliveira, gentilmente, nos cedeu a página inicial e a entrevista de HA. 45 ALENCAR, Heron. Sobre a Reforma Curricular (entrevista), op. cit., loc.cit..

Referências

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