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Caleidoscópio A Tarde, Salvador, p 9, 28 abr 1951.

“ MANIFESTAÇÕES DE ATITUDE CRÍTICA ” DIANTE DA LITERATURA E DA CULTURA

3.1 O FORMATO DA COLUNA

Caleidoscópio, a coluna crítica de Heron de Alencar, é iniciada em 29 de nov de 1947 e, com intervalos, deixa de ser publicada em 28 de abril de 1951. Pode-se afirmar que o título é sugestivo porque indica a postura desejada pelo novo crítico. Caleidoscópio significa um “[...] aparelho óptico formado por um tubo com pequenos fragmentos de vidro colorido que se refletem em pequenos espelhos inclinados, apresentando, a cada movimento, combinações variadas e agradáveis”211. No seu sentido metafórico, implicaria a idéia de um mosaico, conjunto de pequenas peças, de gêneros, de formas, de notícias, de resenha, de resenha crítica e até de comentários subjetivos em um só espaço.

Através do formato dessa coluna, é possível visualizar uma variedade de elementos construídos tanto pelas palavras quanto por retratos de escritores(as) que, geralmente, acompanhavam os textos, e pelas ilustrações de paisagens que aparecem nos textos de abertura da coluna. A denominação de Caleidoscópio servia também como um índice de esclarecimento ao leitor do que seria aquela coluna de crítica literária e política. Nesse espaço, caberiam impressões de leitura, divulgação de lançamentos e acontecimentos culturais, criações artísticas – não apenas literárias mas também das artes plásticas, e que podem ser percebidas pela atenção dada aos ilustradores e aos eventos acontecidos nesse campo –, além

210 SOUZA, Antônio Loureiro de. Heron de Alencar. A Tarde, Salvador, p. 3;10, 7 jan. 1972. 211 MICHAELIS. Dicionário eletrônico. UOL. 2000.

de julgamento de obras. Ali estaria um olhar variado sobre a cultura. Além disso, tal espaço cumpriria a função de possibilitar ao leitor uma ampla visão da cultura nacional, provavelmente um dos intentos de HA. E nisso se assemelhava a Chiacchio, já que segundo Jorge Calmon212, os rodapés de Chiacchio, intitulados “Homens e Obras”, tinham o feitio de resumo de acontecimentos sob diversos subtítulos, mas apresentavam também apreciações mais profundas, perfis de escritores, juízos sobre livros, e eram especialmente, uma forma de participação na vida cultural, de difundir a cultura, além de servir como instrumento de efetivação de idéias. Tudo isso poderá ser encontrado também no trabalho de HA, o que não significa que tenha feito da mesma forma, afinal, seu momento era outro, seus métodos e ideologia diferentes.

Em formato alongado, situava-se no canto direito (de quem lê) da página, e suas medidas eram fixas: seu comprimento tomava sempre toda a altura do jornal, exceto as primeiras colunas (1947), e sua largura era de 16,6 cm; o seu interior era subdividido em duas colunas, cada uma com 8,1 cm de largura, com 0,4 mm de espaçamento entre ambas. O que variava dentro da seção era a posição das fotografias e caricaturas, algumas colocadas no início e outras no meio do texto, mas sempre à esquerda, como apelo ao leitor. O tamanho dessas imagens era semelhante, em média mediam 2,6 cm de largura, já a altura apresentava, geralmente, 3,6 cm, e era nesta que o autor efetuava uma alteração maior, algumas alcançavam 4,1 cm. Tais mudanças eram propositais, pois a gravura garantia que o tamanho das colunas internas fosse mantido, já que alguns blocos de textos apresentavam uma quantidade maior de palavras que outros. E isso era importante porque o linotipista do jornal ganhava por linhas, como assim afirmou HA213, um aumento no número de linhas encarecia a publicação, por isso, tudo era milimetricamente arrumado. Como era o redator da página, tinha uma responsabilidade a mais, cabia-lhe preparar o “[...] espelho – cálculo das matérias que era mandado para as oficinas”214. Ressalta-se que nem sempre a coluna era internamente subdividida no todo. Às vezes, esse procedimento era efetuado na sua parte superior, com seu meio apresentando um único texto nos seus 16,6 cm, voltando-se a se subdividir na parte inferior. Noutras, essa divisão em colunas internas ocupava cerca de 70% do espaço, o restante era reservado a um bloco único intitulado Flagrantes ou No prelo e nas vitrinas. Mas

212 CALMON, Jorge. Reencontro com Chiacchio. In: MASCARENHAS, Dulce. Carlos Chiacchio: Homens e obras. Itinerário de dezoito anos de rodapés semanais em A Tarde. Salvador: Academia de Letras da Bahia,

1979. p. 7-11.

213 ALENCAR, Heron de. Técnica de Jornalismo – aulas no curso de Jornalismo da Universidade da Bahia, 1950. Material cedido pela Profª. Drª. Lizir Arcanjo. [datilografado]

nada disso era fixo, tudo era muito cambiante, pois dependia do material que HA tinha em mãos.

A disposição dos textos da coluna, em pequenos blocos, acompanhados por uma fotografia ou desenho, não implicava em uma leitura, necessariamente, seqüenciada. Ao contrário, o leitor poderia ir e vir, subir ou descer, ler da direita para a esquerda ou vice-versa, o entendimento jamais seria prejudicado por isso. A idéia de movimento dos olhos e de interesses do leitor, do movimento de vaivém, já estava ali configurada.

Até as sílabas do título principal sofreram modificações. A partir de 1950, passaram a ser de cor clara em fundo escuro e em formato sobrescrito e subscrito, dando a impressão de deslocamento215.

Muitas vezes, HA iniciava a coluna com um texto de sua autoria denominado “Variações”, que tomava a forma de gênero ambíguo, entre a crônica e a crítica. Operava, no entanto, o olhar crítico no restante da coluna, nos espaços das divulgações e resenhas críticas. Na subsecção denominada “Flagrantes”, anunciava os lançamentos do mês. Este era o espaço mais específico de divulgação do que estava ocorrendo na cena literária, onde eram noticiados, rapidamente, os lançamentos de livros nacionais e estrangeiros, chegava a ressaltar quando os livros eram oferecidos a “preços módicos”, com o objetivo de facilitar o acesso.

Foram publicadas, no total, 53 colunas216, nestas estão comentados, resenhados, analisados e divulgados cerca de 479 livros de 205 autores brasileiros, e mais outros 366, aproximadamente, títulos de escritores estrangeiros que correspondem a análise, comentário e biografias de 206 autores de diferentes nacionalidades217.

Apesar de, em Caleidoscópio, o número de autores brasileiros ser quase o mesmo de autores estrangeiros, a quantidade de textos de análise e constituição de perfis sobre os nacionais é muito maior. Neste trabalho, os textos que tratam da literatura estrangeira não foram analisados com mais cuidado, apenas alguns poucos foram tomados para comentário por servirem de exemplo da concepção de HA sobre literatura. A descrição mais detalhada e

215 O sobrescrito aqui é proposital, a intenção é exemplificar como o título da coluna aparecia no jornal.

216 Além das colunas ainda há mais onze (11) textos, dentre crônicas, artigos e crítica, publicados no AT entre 1947 e 1952. Foram consultadas 53 colunas, mas há a possibilidade da existência de mais uma nos últimos dias do mês de março de 1950. Esse período não foi consultado porque no exemplar disponível na Biblioteca Pública do Estado, nos Barris, faltam as páginas dos dias 25 a 30 deste mês; e o exemplar existente do IGHB não está em condições de uso.

217 Para se ter acesso aos nomes, é possível verificar os índices onomásticos que constam do Anexo B dessa dissertação. Ressalta-se que este é um momento de muita tradução de livros e autores estrangeiros e HA passa, como outros críticos, a ser um divulgador. Nesse sentido, a biografia, as referências a outros livros, a citação ou paráfrase de críticos renomados estrangeiros facilitam o interesse e o conhecimento do leitor médio brasileiro. Não iremos discutir se havia interesse financeiro das editoras brasileiras porque este problema faz parte das relações de poder das editoras, o que não nos interessa no momento, além disso seria assunto para uma outra dissertação.

análise dos textos da coluna serão realizadas no momento em que tratarmos das subseções de Caleidoscópio.