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DataGramaZero - Revista de Informação - v.13 n.3 jun/12 ARTIGO 01

A mão invisível que controla o sujeito contemporâneo

The invisible hand that controls the contemporary subject

por Patrícia Fernanda Dorow e Maurílio Tiago Brüning Schmitt e Gertrudes Aparecida Dandolini

Resumo: A preocupação acerca de como os saberes aparecem e se transformam têm sua origem nos filósofos franceses, que iniciaram seus estudos sobre a reflexão dos discursos fazendo análises críticas sobre o saber, o poder e a ética. Desde então, as correntes filosóficas tentam explicar suas origens e fundamentos. Pêcheux (1969) sugere que as ciências se confrontem, particularmente a história, a psicanálise e a linguística, já Foucault , propõem a arqueologia do saber. Esse trabalho traz algumas considerações acerca das análises dos discursos segundo o pensamento de Foucault e Deleuze. A subjetividade do sujeito é primeiramente apresentada por meio de um panorama histórico de sua evolução, observando-se o conjunto de estratégias que fazem parte das práticas sociais. Posteriormente estes autores fazem comparação entre o presente e o passado dos sujeitos, demonstrando mecanismos responsáveis pela manipulação do sujeito contemporâneo, concluindo que o próprio ser humano é o produtor e produto desta sociedade que o instituiu. Nesse jogo de forças, além de fantoches somos co-autores de nosso silêncio na espontaneidade com que encaramos as condições das coisas.

Palavras-chave: Saberes, Discurso; Contemporâneo; Mecanismos; Origens; Arqueologia. .

Abstract: The concern about how the knowledge appears and transform itself has their origin in the French philosophers, who began their studies of discourses by making critical analysis on the knowledge, power and ethics. The subject subjectivity is first presented through a historical overview of its evolution, observing the strategies set that are part of social practices. Later these authors make comparison between present and past of the subjects, demonstrating the mechanisms responsible for handling the contemporary subject, concluding that human being himself is the producer and product of this society that establishes him.

Keywords: Knowledge; Speech; Contemporary; Mechanims; Source; Arqueology.

Introdução

Desde a sociedade primitiva, os homens eram obrigados a viver e a trabalhar em conjunto, e o trabalho em comum gerava a propriedade comum dos meios de produção e dos frutos do trabalho. O que os homens obtinham conjuntamente pertencia à coletividade. Nessa época ainda não se tinha ideia alguma da propriedade privada dos meios de produção, da exploração do homem pelo homem e nem das classes como a burguesia e o proletariado. Já na antiguidade podemos perceber o início do estado devido aos agrupamentos sucessivos e cada vez maiores de seres humanos, onde tiveram origens nos séculos VIII-VI a.C, as cidades-estados, as quais foram a certa altura da história colocadas sob a tutela

do governo de um reino ou império, seja por interesses econômicos mútuos ou até mesmo por dominação por meio de força. Desde então a instituição estatal, que possui uma base de prescrições jurídicas e sociais a serem seguidas, evidencia-se como casa forte das leis que devem regimentar e regulamentar a vida em sociedade.

Esse aumento de pessoas refletiu em uma maior complexidade das sociedades e alagou as diferenças entre os indivíduos, o que trouxe a urgência de se constituir regras de conduta mais eficazes, como o suplício. Punição pública essa utilizada até o início de século XVIII e aplicada a infrações tidas como graves na época. (Foucault, 2004a). Na segunda metade do século XVIII surge outra forma de punição,

fruto de idéias humanistas contrárias ao suplício, a prisão. Para Foucault (2004a) o que é fascinante nas prisões é que nelas o poder não se mascara, se mostra como tirania e, ao mesmo tempo, é puro, é inteiramente “justificado”, sua tirania brutal aparece como dominação serena do Bem sobre o Mal, da ordem sobre a desordem.

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que as escolas se parecem um pouco com as prisões. Para compreensão e problematização das

complexas práticas nas relações, de arqueologia (saber), genealogia (poder) e ética (subjetivação), será necessária a reflexão por meio do recorte dinâmico da história por Foucault (1972). Nesse sentido ele faz a análise desses três elementos, o primeiro é o estudo dos saberes e como eles procuram alcançar o estatudo de ciência. O segundo é o estudo da forma como os sujeitos são postos em relação às

instituições e como podem ser divididos de acordo com sua subjetividade como (os criminosos e os bons indivíduos, etc). E, por fim, um estudo sobre o modo como os seres humanos tornam-se sujeitos por meio de “técnicas de si”, sendo a maneira com que os sujeitos lidam com sua própria

subjetividade. Discurso: “cada sociedade tem seu regime de verdade, sua política geral de verdade: isto é, os tipos de discurso que aceita e faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e instâncias que permitem distinguir entre sentenças verdadeiras e falsas, os meios pelos quais cada um deles é sancionado; as técnicas e procedimentos valorizados na aquisição da verdade; o status daqueles que estão encarregados de dizer o que conta como verdadeiro” (Foucault, 1993, p.131).

Os conjuntos de diferentes verdades formam então um discurso e conforme essas verdade

transformem-se mentiras de acordo com cada época, novos discursos são criados refletindo o que cada momento histórico concede como certo ou errado. Esses diferentes discursos são observados em certos momentos históricos. Por exemplo, na Idade Média, ocorrem as heresias que demonstram o

descontentamento com o monopólio da verdade por parte da Igreja. Mas adiante no século XIX e início do séulo XX, temos as lutas operárias ou camponesas em várias partes do mundo contra o monopólio da riqueza. Em meados do século XX, prevalecem os combates contrários aos modelos de subjetivação, ou seja, submissão das subjetividades. Momentos históricos visualizados nos diferentes discursos. Nesse sentido Foucault (1996) discorre acerca das relações de poder visualizadas na relação discurso-instituição, dos determinismos locais, em que se desenrola a verdadeira microfísica do poder.

Essas constantes transformações da sociedade ocorrem por meio dos múltiplos discursos utilizados e de diferentes táticas utilizadas na domesticação do indivíduo. Desse modo, analisa-se a verificação do poder do discurso em moldar diferentes subjetivações do sujeito de acordo com cada época em um dado momento histórico. A fim de que se entenda como funciona esse processo, pelo qual a relação de sujeição pode fabricar os sujeitos e os mecanismos responsáveis por essas transformações dos

diferentes saberes do indivíduo, traz-se o conceito de arqueologia. A arqueologia é uma disciplina que possibilita o estudo de diferentes culturas e modos de vida do passado a partir de análises dos vestígios materiais. Para Morin: “é necessário ver não só o tecido determinista mas também as falhas, os

buracos, as zonas de turbulência, os cachões da cultura onde, efectivamente, brota no novo” (Morin, 1980, p.28).

Foucault (1972), chama de arqueologia a análise do discurso em sua modalidade de arquivo, ou seja, seu objetivo está em seus diferentes discursos e não na linguagem. Em seu livro - A "Dobra Leibniz e o Barroco", Deleuze (1991), analisa o trabalho de seu amigo Foucault e menciona que não se deve pesquisar os autos, ou autores; fichários, documentos oficiais, arquivos, e sim, as transversalidades que afetam esses documentos as suas fragmentações, os discursos isolados não oficiais, os conceitos do contexto datados na época em que são passadas, as rupturas longas ou curtas. Para o filósofo o

conjunto de relatos de pessoas e impressões de anônimos, é o que írá construir um discurso, um saber.

Foucault (1996) analisa o saber na orientação dos comportamentos, das lutas, das batalhas, das

decisões e das táticas. Para a análise da estratégia do discurso ele examina perguntas e respostas feitas pelos indivíduos em seus discursos, ou seja, a estratégia do discurso de um sujeito em relação a outro, os mecanismos utilizados para obter uma verdade. Demonstra em seus recortes a execução simultânea desses discursos e as alterações que dão conta de suas reformas visíveis. Acredita que enunciados e visibilidades, textos e instituições, falar e ver constituem práticas sociais por definição

permanentemente presas, amarradas às relações de poder, que as supõem e as atualizam. Para ele, os discursos possuem uma materialidade, são feitos para obedecer e fazer obedecer.

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tentam falar dentro de um determinado campo discursivo” (Foucault, 1986, p.70). Ou seja, ninguém diz nada sem ter ouvido dizer e sem estar neste ou naquele lugar, por consequencia o discurso é uma relação complicada e essa relação explica as próprias regras de aplicação ou de realidade da

enunciação e dos enunciados.

Um exemplo para a citação acima é observado em fins do século XVIII, quando a loucura entra no campo do saber médico, se tornando objeto de saber; assim a loucura se torna corpo alvo de saber médico/científico; outra constatação é a formação discursiva da biologia, onde surge o objeto vida, o ser vivo como tendo uma estrutura invisível e uma história evolutiva. Conforme Foucault (1996), em a Ordem do Discurso: “ninguém entrará na ordem do discurso se não satisfazer a certas exigências ou se não for, de início, qualificado para fazê-ló”. Diante disso, vemos que a humanidade constrói sua própria realidade e na intenção de aproximar-se a essa sensação, presente em diferentes momentos históricos, Foucault (1992), nos alerta para jamais interpretar, mas experimentar.

Ou seja, revelar-se as pluralidades e intensidades que passam, arrastam-se, através de nossa pele. Seguindo o mesmo pensamento Deleuze diz que: não há nenhuma forma de interpretar: “...os

conceitos são exatamente como sons, cores ou imagens, são intensidades que convêm a você ou não, que passam ou não passam ... Não há nada a compreender, nada a interpretar” (Deleuze, 1977, p.10). Na tentativa de visualizar como os saberes aparecem e se transformam, Foucault (1972), tenta realizar a formação histórica de um indivíduo de conhecimento por meio de um discurso capturado como um conjunto de táticas que fazem parte das práticas sociais. Seu propósito foi produzir um relato dos múltiplos modos de sujetivação do ser humano em nossa cultura.

Utilizando o procedimento arqueogenealógico de Foucault (1972), é possível mostrar que muitas coisas que constam na paisagem de mundo do sujeito e acredita-se serem verdades podem ser criticadas e destruídas a qualquer tempo. O autor faz uso da arbitrariedade das instituições para elucidar qual é o espaço de liberdade que se pode desfrutar, e que mudanças se pode realizar. Posterior a todo saber, a todo conhecimento, o que está em jogo é um combate de poder. O poder político não está afastado do saber, ele é entrelaçado com o saber. Para Foucault (1996), é o discurso que constitui a fonte do sentido e o lugar da dispersão do sujeito. Ele cita como exemplo o discurso médico do séc. XIX que é determinado por um feixe de relações que se encontra em jogo e que acontece pelo “status” dos médicos, pelo lugar institucional ocupado pelos mesmos, assim como pelo posicionamento do médico como sujeito que percebe, observa, descreve, enfim, prescreve o que deve ser feito. Novamente podemos observar que a verdade não existe fora do poder ou sem poder. Ela é produzida no mundo graças às multiplas limitações e nele produz efeitos de poder.

Cada sociedade tem portanto, seus regimes de verdades, discursos que ela acolhe e faz funcionar como verdadeiros. São nessas relações de poder que a genealogia está inserida, tenta recorrendo à essas relações, descrever aquilo que estaria ao alcance da arqueologia. A genealogia se apresenta mais apropriada para pensar práticas como loucura, a medicina, a prisão, a sexualidade. São práticas não discursivas que submetem os indivíduos a artifícios de poder, o sujeito moderno tem suas origens nas ligações de saber e poder.

A análise genealógica de Foucault (1993), narra o funcionamento de uma série de dispositivos disciplinares nas sociedades modernas. Esses mecanismos se qualificam, por tornar as ações dos indivíduos cada vez mais eficazes, por meio de um controle constante e calculado. A disciplina

“adestra” os corpos no objetivo de tanto multiplicar suas forças, a fim de que se produza riqueza, quanto amenizar sua tendência de resistência política. É nessa interpretação, que a missão da disciplina não pode ser confundida com a da opressão. Enquanto esta pode arruinar o corpo; a disciplina, por sua vez, pretende lucra-ló ao supremo, como se ele fosse uma máquina.

Em sua obra Vigiar e punir, o autor: cita o “indivíduo como objeto descritível e analisável” (Foucault, 2004a, p.169); como algo que separa, ordena e classifica, tornando homogêneos os grupos, para que o mesmo estatuto normalizador vigore; idéia de um conjunto organizado e, desta forma, controlado, de forma imposta (repressão) ou consentida (estimulação). Entendida como dispositivo responsável pela

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forma permanente, tudo vê, para: “agir sobre aquele que abriga, dar domínio sobre seu

comportamento, reconduzir até eles os efeitos do poder, oferecê-los a um conhecimento, modificá-los”

(Foucault, 2004, p. 154-5).

Como exemplo desse conceito de disciplina observa-se a escola, quando coloca os enfileirados, nesse conjunto de alinhamentos, cada estudante segundo a sua idade, desempenho, comportamento, ora ocupa uma fila, ora outra, ele desloca-se todo o tempo numa série de posições que marcam uma hierarquia. Foucault (1996) aponta que essas práticas de poder que adiante forma diferentes tipos de disciplina, nasceram no fundo das prisões, das escolas, das igrejas, das fábricas, dos asilos, dos quartéis, transformando-se em comportamentos das ciências humanas.

A disciplina caracteriza o poder pela distribuição em ordem dos indivíduos no meio que se encontram e essa divisão para Foucault (1996), é elaborada por meio de estratégias combinadas tais como: a utilização da cerca, o quadriculamento do espaço interno, as localizações funcionais, a formação de quadros vivos. Um modelo dessa tática é o Panóptico ver sem ser visto, é uma forma de prisão em que as celas estão dispostas circularmente, de maneira que os guardas em uma torre central têm total visibilidade, ou seja, controle dos prisioneiros, Foucault (1996), ilustra essa técnica de observação como símbolo da sociedade disciplinar. Cita ainda outras táticas de comando, moral e obediência orientadas por sinais (sirenes, apitos, sinetas) utilizados para uma resposta pronta e ordenada. Seria uma ordem que não necessita de explicação, uma reação rápida para o comportamento desejado.

Entender essas articulações de poder e de práticas disciplinares, possibilita construir uma genealogia das relações de poder-saber. Baseado nessa genealogia contata-se que essas ações de um passado institutivo, continuam presentes no cotidiano do sujeito, em suas ações educativas contemporâneas, doutrinadas pelo passado. Para Foucault (2001, p.86): “No pensamento e na análise política ainda não cortaram a cabeça do rei”. Para que o poder deixe de ser visto como algo negativo, para que deixe de ser relacionado com repressão é necessário que o mesmo deixe de ser visto como lei, como direito, é preciso uma ruptura com essa visão jurídica.

Esse encontro entre práticas de dominação exercidas sobre os outros e as práticas de si Foucault (1990), chama de governabilidade. A noção do filósofo insere novas possibilidades na análise do poder, enfocando principalmente as instituições e o modo como estas guiam indivíduos e grupos, ligados por diferentes relações de poder, que articulam a área possível de atividade dos outros. Para ele, a governabilidade dos outros é criadora de subjetividade, no sentido de que dá forma à ação através da qual o sujeito experimenta a si mesmo. Assim, como campo de possibilidades de ação, as ligações de poder nas instituições atuam no plano da indeterminação, da construção dos possíveis. A racionalidade do governo está na escolha de ações entre as várias disponíveis. Deleuze aponta que é próprio à subjetivação resistir à sujeição e que ela não deixa de relançar a relação consigo redobrando-se, desdobrando-redobrando-se, metamorfoseando-se. (Deleuze, 1996).

A criação de subjetividade acontece por meio da condição da existência da liberdade, em que a resistência com a autoridade tem um papel fundamental. Segundo Foucault (2004a), as formas de poder sobre a vida dos homens, que se estabeleceram desde o século XVIII são praticadas por duas modalidades de tecnologia de poder: as disciplinas e a biopolítica da população, a governabilidade que se desempenha sobre o corpo-espécie.

De acordo com Foucault (2004), novas formas de domínio, e novas tecnologias articuladas dentro do centralizado poder político e administrativo executaram essa junção entre Estado e indivíduos. A primeira técnica passou a ser, denominada de polícia, a segunda seria a tecnologia diplomático-militar que se baseia em garantir e desenvolver as forças de Estado por um sistema de alianças.

A busca de interesses comuns, a construção de um meio de criação e de solidariedade, a articulação das metas individuais com as metas sociais, podem ser passos para a construção da democracia, fundada nos direitos de cada um para com todos e de todos para com cada um. Repõem-se, então, o sujeito de conhecimento no mundo, em seu novo lugar. É necessário submissão defronte de seu reconhecimento da ignorância, do não saber. É preciso flexibilidade diante das dúvidas e das

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(Marshall, 1994, p.28). O filósofo nos mostra em Vigiar e punir como as técnicas disciplinares por meio dos controles microfísicos foram e ainda são utilizadas principalmente para individualizar e normalizar os seres humanos.

Sociedade de controle

A passagem da modernidade para a contemporaneidade promoveu a mudança de um modelo de sociedade. De uma sociedade vista por Foucault (2004), como disciplinar, para um modelo de

sociedade identificada por Deleuze (1992), como de controle. A primeira pode ser situada num período que vai do século XVIII até a Segunda Grande Guerra, já os anos da segunda metade do século XX estão marcados por seu declínio e pela respectiva ascensão da sociedade de controle. Hoje o indivíduo está na transição entre esses dois modelos, está a sair de um modo de enclausuramento completo para uma espécie de controle aberto e contínuo, ou seja, o indivíduo não pertence a nenhuma identidade e pertence a todas. Mesmo fora do seu local de trabalho, continua a ser intensamente

governado pela lógica disciplinar.

Essa sociedade de controle é um passo à frente da sociedade disciplinar. Não que está não exista mais, porém, foi difundida para o campo social de produção. Segundo Foucault (1979) a disciplina é

interiorizada, e é exercida por três meios globais absolutos: o medo, o julgamento e a destruição. Seguindo análises de Foucault (1993) e Deleuze (1992). Eles percebem no encarceramento a operação fundamental da sociedade disciplinar, com sua repartição do espaço em meios fechados, e sua

ordenação do tempo de trabalho. É o que chamam de moldagem, no entanto a sociedade de controle seria marcada pela interpenetração dos espaços, por sua suposta falta de limites orientados (a rede) e pela instauração de um tempo contínuo, o qual os indivíduos nunca conseguiriam terminar coisa alguma, já que estariam sempre enredados numa espécie de formação permanente, prisioneiros de um campo aberto.

Para Deleuze (2006), seria uma espécie de modulação constante e universal que atravessaria e

regularia as malhas do tecido social. Há uma vigilância contínua realizada pela infiltração de câmaras espalhadas por toda a parte: no comercio, bancos, escolas e até mesmo nas ruas. Seria uma reinvenção do Panóptico, que atua com o objetivo de modificar, de maneira extensiva e intensiva, as formas de viver, pensar e agir dos indivíduos. Deleuze sugere que as sociedades disciplinares possuem dois pólos:, “a assinatura que indica o indivíduo, e o número de matrícula que indica sua posição numa massa” (Deleuze, 1990, p.34).

Já nas sociedades de controle: “o essencial seria uma cifra: a cifra é uma senha ... A linguagem digital do controle é feita de cifras, que marcam o acesso ou a recusa a uma informação” (Deleuze, 1990, p.52). Nesse sentido, as massas, tornam-se amostras, dados, mercados, que necessitam ser rastreados, cartografados e analisados com o intuito de se perceber padrões de comportamento repetitivos. Esse controle na sociedade contemporânea é realizado de forma glamourizada, pela indústria cultural. O que aconteceu foi a troca do patíbulo e da violência física por meios de controle instituídos dentro das ciências humanas e sociais, pela psicologia, psiquiatria e mais atual pelos meios de comunicação de massas, que produzem uma certa espécie de ser, de viver, de pensar e de sentir. Segundo Foucault (2004), o poder moderno se exerce na produção e na repressão.

Esta sociedade implica uma existência aliada à visibilidade, por conseqüência à celebridade, porém, só faz aumentar a vigilância e o controle acerca de cada indivíduo. A transparência passa assim, a

perfeição. Freud (1980) chama a instância desse olhar atribuído ao outro de superego, que tem como objetivo vigiar e punir o indivíduo. Essa convicção acabou por sustentar uma série de reflexões sobre a hipotética transparência que a internet nos ofereceria, e sua consequente força em frente aos

obscurantistas que protegem os velhos esquemas de poder. Há uma alteração de natureza em meio ao próprio poder, que não é mais hierárquico, e está disseminado numa rede mundial, prolixa. Isso pode exprimir que a antiga, dicotomia opacidade-transparência, não seja mais concernente.

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indivíduos. Hoje, o essencial parece ser essa atividade de modulação contínua dos diversos fluxos sociais, seja no comando do fluxo financeiro internacional, seja de reativação constante do consumo

(marketing) para regular os fluxos do desejo, ou seja, o aumento incontrolável dos fluxos de comunicação.

Conclusão

Se no passado o terrorismo foi resultado do terror imposto pelo Estado, hoje as formas de atuação do poder são visualizadas na ação não encontrada dos hackers, que produzem disfunções e rupturas nas redes. Nenhuma forma de poder parece ser tão requintada, como aquela que modela os elementos imateriais de uma sociedade tais como: informação, conhecimento, comunicação. Nessa sociedade de controle, o controle do indivíduo está migrando de estratégias de interceptação de mensagens ao rastreamento de padrões de comportamento.

Percebe-se que a visibilidade total a que se submete um sujeito nesses tempos pode ser uma emboscada. Essa sociedade contemporânea vem aumentando a construção de uma condição de transparência dos seus cidadãos e, várias vezes o sujeito reclama para ser moderno, a observação ampliada, sendo um direito de alguns que ficam escondidos e à margem da história recente ou em um passado visto como longínquo. No entanto, é importante lembrar que o próprio indivíduo controla essa sociedade que originou, ou seja, somos produtores e produtos de nós mesmos. Não somos apenas peças desse tabuleiro em um jogo de forças, mas também ordenamos essas peças em silêncio, sem questionamentos a este estado das coisas. Diante das futuras formas de controle em espaço aberto, talvez os antigos meios de clausura nos pareçam melhores.

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Sobre o autor / About the Author:

Patrícia Fernanda Dorow e Maurílio Tiago Brüning Schmitt patriciad@ifsc.edu.br e maurílio.tbs@gmail.com

Mestrado em Engenharia e Gestão do Conhecimento da UFSC.

Gertrudes Aparecida Dandolini ggtudes@gmail.com

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