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3 CURADORIA DE CONTEÚDO

3.3 Âmbitos de aplicação

O processo de curadoria de conteúdo se mostra útil em distintos contextos e possibilita alcançar diferentes objetivos. Nesta seção, trataremos de como se aplica a curadoria de conteúdo em âmbitos nos quais esse processo passa a ter grande preponderância atualmente, são eles: a comunicação, o marke- ting, a educação e as bibliotecas.

No que se refere ao campo da comunicação, percebe-se que há fortes conexões com a curadoria de conteúdo. Guallar e Leiva- Aguilera (2014) afirmam que a curadoria de conteúdo pode ser localizada no ponto de interseção entre a Ciência da Informação e a Comunicação.

Para Correa (2012), a curadoria de conteúdo é uma neces- sidade para a comunicação contemporânea, pois “possibilita uma dinâmica de mediação/re-mediação contínua entre públicos, fontes, sistemas, ferramentas e sociabilidades”. No que se refere especificamente ao jornalismo, a importância da curadoria de conteúdo é expressa por Castilho e Coelho (2014, p. 310), quando

socialmente relevante que havia sido negligenciada quando as indústrias da comunicação jornalística privilegiaram o valor de troca do produto noticioso”.

May et al. (2014) analisam o impacto da curadoria de conteúdo realizada coletivamente sobre a escolha das notícias que os usuários leem. De acordo com os autores, embora a maioria das pessoas ainda dê mais credibilidade aos conteúdos produzidos por jornalistas, por sua precisão e imparcialidade, cada vez mais a decisão sobre quais conteúdos dar atenção é influenciada por outros usuários de mídias sociais, os quais atuam como referenciadores e intermediários de conteúdos mediante a crowd curation, uma curadoria de conteúdo realizada coletivamente. Mais recentemente, Mello (2015), ao comparar a curadoria usada em aplicativos mobile com a curadoria fundamentada nos critérios jornalísticos tradicionais, evidenciou a importância de combinar curadorias humanas e algorítmicas para o consumo de informação no contexto atual.

A aplicação da curadoria de conteúdo no âmbito do marke-

ting é essencial, uma vez que permite sistematizar o processo de

seleção, criação, atribuição de sentido e compartilhamento de conteúdo digital mediante ao qual são estabelecidas e mantidas as relações entre organizações e marcas e seus públicos no cenário atual. Assim, a curadoria de conteúdo contribui para compor a imagem, ampliar a visibilidade, obter notoriedade na web como referência em um tema e melhorar o posicionamento nos buscadores, objetivos que se inserem na interseção entre o marketing digital, o de conteúdo e o de relacionamento. Como afirma Handley (2012), a curadoria de conteúdo pode se adequar perfeitamente à estratégia de conteúdo de uma organização. Adicionalmente, Holtz (2012) esclarece que o conteúdo que serve ao marketing precisa ter visibilidade e ser compartilhável, além de entreter, educar e inspirar.

Chamando a atenção para ações antiéticas, por vezes associadas à curadoria de conteúdo no âmbito do marketing, Cramer (2016) apresenta algumas regras que possibilitam colocar a curadoria de conteúdo como uma estratégia que auxilie os usuários no caótico contexto informativo atual e não como um elemento que aumenta esse caos. As regras são: a) considerar a diferença entre curar e roubar conteúdos, o que implica dar crédito às fontes consultadas; b) criar conteúdo novo e original tanto quanto curar conteúdos publicados por outros; e c) utilizar fontes de informação consistentes e confiáveis.

No âmbito educacional, há publicações que apontam para os benefícios que a curadoria de conteúdos pode oferecer, uma vez que se trata de um processo que pode contribuir para explorar adequadamente a informação on-line e auxiliar a realização de pesquisas bibliográficas para fins de atualização, de pesquisa e de elaboração e publicação de trabalhos acadêmicos. A esse respeito, De Benito et al. (2013) propõem uma estratégia para o uso de ferramentas informáticas em cada uma das etapas do processo de curadoria de conteúdo com vista à atualização profissional do docente, com impacto positivo tanto em seu aprendizado individual quanto no de seus alunos.

Mais recentemente, Hernández Campillo, Carvajal Hernández e Legañoa Ferrá (2018) realizaram uma pesquisa com o objetivo de avaliar a importância da curadoria de conteúdos cien- tíficos como ferramenta para a gestão da informação na atividade de professores universitários cubanos. As conclusões do estudo evidenciaram a pertinência da curadoria de conteúdo como uma alternativa para o refinamento das buscas, a difusão de informação e a atualização científica.

de curadoria como uma prática pedagógica dirigida ao estudante e à criação de conteúdos, de modo a propiciar a educação em compe- tência digital e midiática. Os autores entendem que a curadoria de conteúdo pode ser utilizada para ensinar sobre pensamento crítico, análise e expressão on-line.

Merece destaque também a curadoria de conteúdo realizada para a composição do canal YouTube Educação. Para a realização desse projeto, a Google e a Fundação Lemann estabeleceram uma parceria para a disponibilização de conteúdos educacionais gratuitos, de qualidade e em português sobre as disciplinas Língua Portuguesa, Matemática, Química, Física, Biologia, História, Geografia, Língua Espanhola e Língua Inglesa. Os vídeos passam por um processo de curadoria realizado por professores especia- listas nos conteúdos e são voltados para professores, gestores e alunos dos níveis de Ensino Fundamental e Médio.

A aplicação da curadoria de conteúdos em bibliotecas já é realidade para diversas bibliotecas no mundo que recorrem a esse processo para produzir os conteúdos que partilham nas mídias sociais no âmbito de sua atuação como bibliotecas 2.0. Elaborados por bibliotecários, pela equipe de comunicação das bibliotecas, por especialistas convidados ou pelo público em geral, esses conteúdos conferem nova dimensão e atualidade aos acervos e aos serviços das bibliotecas, ampliando sua visibilidade e relevância social.

Como afirma Parra Valero (2016), o contexto virtual amplia e complementa permanentemente os serviços das bibliotecas, o que demanda pensar em conteúdos digitais que captem a confiança de novos usuários. Nesse artigo, além de analisar as competências do curador de conteúdo, o autor analisa o uso da curadoria por bibliotecas e apresenta os seguintes exemplos de boas práticas: a) British Library: usa o Pinterest para promover o uso comunitário de seus recursos de informação e estimular o uso de tais recursos como

insumo para a criação de novos negócios e produtos; b) Biblioteca de Traducción y Documentación da Universidad de Salamanca: publica um blog com mais de três mil posts que representa uma referência para bibliotecários e documentalistas; e c) Biblioteca Municipal de Muskiz (Vizcaya) que aplica a ferramenta Fipbloard para construir, em conjunto com a comunidade local, revistas sobre as caracterís- ticas e a memória dessa pequena localidade espanhola. As revistas comentadas no artigo contemplam os seguintes temas: seleção de leituras, o escritor Terry Pratchett, o ecossistema local, os ferreiros e os mineiros, o Castelo de Muñatones e notícias sobre o município.

Complementando os exemplos já mencionados, é emblemá- tico o uso da curadoria de conteúdo que a Biblioteca Nacional da Espanha (bne.es) tem feito. Uma das aplicações da curadoria é a elaboração e publicação em seu blog de conteúdos sobre diferentes temáticas a partir da exploração de itens do seu acervo. Exemplo disso é a utilização de coleções gráficas da BNE para subsidiar e complementar ensaios sobre a cultura do vinho ou a criação de linhas do tempo sobre mapas utilizando a ferramenta TimeMapper para geolocalizar desenhos, fotografias e gravados de cidades espa- nholas constantes da Biblioteca Digital Hispánica. Outra ação de curadoria de conteúdo realizada pela BNE foi a que se deu em 24 de fevereiro de 2015 para celebrar o nascimento de Carlos V. Nessa ocasião, a BNE e o Museu do Prado mantiveram um diálogo sobre Carlos V no Twitter fundamentando-se nos itens de seus acervos e contaram a história da conversa na plataforma Storify.

Outra biblioteca que usa consistentemente a curadoria de conteúdo é a Library of Congress (loc.gov) que, entre outras ações, compõe conjuntos de imagens vinculadas a temas específicos para fomentar o uso e o reuso das versões digitais de tais itens

um novo critério. Algumas coleções temáticas de imagens digitais produzidas referem-se a: Guerra Civil, Abraham Lincoln, livros clássicos infantis, fotos do século XIX etc.

No cenário nacional, Pereira (2017) analisa a curadoria de conteúdo realizada na Biblioteca Central do IFRN e apresenta uma proposta de melhoria baseada nos seguintes tópicos: a) como delimitar os objetivos e o público-alvo da curadoria; b) quais temáticas se mostram mais adequadas; c) como selecionar fontes de informação para alimentar o processo; d) como, mediante quais etapas e atividades, pode ser feita a curadoria de conteúdo por bibliotecas; e) quais ferramentas informáticas podem contribuir em cada uma das etapas do processo de curadoria; f) qual deve ser a frequência de publicação; e g) quais critérios podem ser utilizados para avaliar os resultados do processo de curadoria.

Diante da baixa incidência de atuação como curadores de conteúdo, os bibliotecários que participaram como informantes da pesquisa de Bezerra (2018) indicam a necessidade de que a curadoria de conteúdo, entre outras novas vertentes de atuação no mercado de trabalho, seja contemplada. Assim, a curadoria de conteúdo aplicada por bibliotecas possibilita aliviar a sobrecarga de informação de seus usuários, criar vínculo com eles por meio do compartilhamento de conteúdo relevante e do estabelecimento de diálogo, partindo de tais conteúdos, a fim de ser reconhecida como referência nos temas sobre os quais realiza o processo de curadoria. Além disso, as bibliotecas encontram na curadoria de conteúdo a forma de evidenciar itens de seu acervo mediante o estabelecimento de conexões novas, implicando agregação de valor para seu público e ampliação do valor do seu acervo. Nesse sentido, percebe-se a necessidade e a importância de se incluir a curadoria de conteúdo na estrutura curricular dos cursos de Biblioteconomia, como afirma Bezerra (2018).

As reflexões sobre a curadoria de conteúdo e as experiên- cias de aplicação do processo nos âmbitos da comunicação, do marketing da educação e das bibliotecas oferecem uma imagem caleidoscópica que possibilita aprofundar o conhecimento da curadoria de conteúdo como tema de estudo e prática profissional. Ademais, como num caleidoscópio, os elementos presentes nesses quatro âmbitos permitem compor diferentes imagens que ampliam e enriquecem a percepção sobre o tema.

4 A CURADORIA DE CONTEÚDO E