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CAPÍTULO 3 A organização espacial dos fluxos de IDE e F&A da cadeia de petróleo e gás

3.4. Resultados e discussão

3.4.2. A centralidade do Rio de Janeiro

A centralidade do Rio de Janeiro confere uma posição de poder à cidade dentro da rede, uma vez que ela é a líder isolada na origem dos investimentos em petróleo e gás na América do Sul. Dessa forma, o número de canais para outros fluxos estabelecidos entre esta cidade e outros locais da rede é o mais alto. Assim, devido à sua grande conectividade, o Rio

de Janeiro é classificado como um forte conector dentro dessa rede (BARABÁSI, 2009). A posição da cidade dentro da rede é explicada com base na perspectiva de Dicken et al (2001), ou seja, são enfatizados os recursos que a cidade detém, e que contribuem para a sua centralidade, tornando-a um conector forte.

Um dos fatores que explicam a centralidade do Rio de Janeiro é que esta cidade sedia a Petrobras. A empresa é responsável pela exploração de grande parte dos campos de petróleo do país e responde por quase 90% do petróleo produzido no Brasil (ANP, 2016). A Petrobras é a maior companhia de petróleo da América do Sul, segundo ranking divulgado pela consultoria Platts, que avalia critérios como valor de ativos, receita, lucro e retorno de capital. A empresa ocupou essa posição desde 2002, quando foi criado o ranking (Revista Exame, disponível em http://exame.abril.com.br/negocios/petrobras-perde-o- posto-de-maior- da-américa-do-sul-veja-o-ranking/). O papel da Petrobras na rede de fluxos de investimentos em petróleo e gás na América do Sul é visto na tabela 9, que mostra as principais empresas investidoras da rede.

Tabela 9 - Principais empresas investidoras na cadeia de petróleo e gás da América do Sul, no período 2007 – 2016

Empresa Número de

projetos Cidade sede

Principal atividade na cadeia

Petrobras 38 Rio de

Janeiro E&P

PDVSA 25 Caracas E&P

Repsol 11 Madrid E&P

Ultrapar 10 São Paulo Distribuição/

especialidades químicas

Braskem 10 São Paulo Petroquímica

Fonte: FDI Markets e Zephyr.

A Tabela 9 mostra que, dentro dos fluxos de IDE e F&A na América do Sul, a Petrobras é a empresa com a maior participação, com um número de projetos 50% maior que a segunda colocada, a venezuelana PDVSA. Também é possível observar que as três

principais empresas da tabela são grandes petroleiras. Como já mencionado, a cadeia do petróleo é do tipo orientada pelo produtor. Assim, grandes e integradas empresas petrolíferas desempenham um papel central nessa rede.

A Petrobras atua em diversas partes do globo, incluindo África, América, Ásia e Europa, em diferentes etapas da cadeia (COSTA E PESSALI, 2009). No entanto, sua atuação internacional é mais intensa na América do Sul. Em 2015, quase 47% das reservas provadas internacionais da Petrobras estavam localizadas na região. A empresa atua em diferentes áreas em muitos países. No Chile, Paraguai e Uruguai, com comércio e distribuição, sendo líder no setor. No Peru e na Bolívia tem negócios de exploração, produção e transporte por oleodutos. Na Venezuela e na Colômbia, existem parcerias no setor de distribuição. Este segmento também está presente no Chile, onde existem 279 postos; na Argentina, com 265 postos; no Paraguai, com 180 postos; no Uruguai, com 87 postos. A participação de mercado da empresa em cada um desses países é de 12,5%, 6,1%, 19,5% e 22,7%, respectivamente (PETROBRAS, 2015). Entretanto, esse quadro vem passando por mudanças, com a nova estratégia de desinvestimento adotada pela empresa.

Além da Petrobras, empresas privadas de petróleo também estão presentes no Rio de Janeiro. De acordo com o relatório de 2016 da ANP (Agência Nacional do Petróleo), das 104 concessionárias de E&P que operavam nos poços de petróleo brasileiros, 65 delas estavam sediadas no Rio de Janeiro, e várias dessas empresas eram multinacionais. Segundo Costa e Pessali (2009), uma vez que o sistema de licitação para a concessão de blocos de exploração foi instituído pela ANP, em 1999, a Petrobras tem participado ativamente, e as empresas estrangeiras participam frequentemente em parceria com ela. Essa relação próxima que muitas empresas estrangeiras desenvolveram com a Petrobras - desde a liberalização do setor petrolífero nacional brasileiro - motivou a instalação dessas empresas no Rio de Janeiro, para explorar vantagens oriundas da proximidade geográfica e institucional (BOSCHMA, 2005).

Vale destacar que o Rio de Janeiro não é a única cidade da América do Sul que abriga escritórios de empresas multinacionais de petróleo e gás. Essas empresas estão localizadas em várias cidades, refletindo a descentralização desse setor, que é fortemente influenciado pelo marco regulatório e pela agenda nacional de segurança energética dos países (MARTINUS E SIGLER, 2017), além das relações usuário-produtor, que motivam as empresas parapetrolíferas a se instalarem próximas às empresas petroleiras. Essas empresas parapetrolíferas também estão fortemente concentradas no Rio de Janeiro (ROCHA E URRACA-RUIZ, 2011).

Além da concentração de empresas, o Rio de Janeiro também concentra esforços significativos de pesquisa na área. Primeiro, há o Cenpes, centro de pesquisa da Petrobras. Este centro - que é o principal, mas não o único da empresa - foi fundamental no desenvolvimento de tecnologias de perfuração em águas profundas, o que garantiu a liderança tecnológica nessa área à Petrobras (COSTA E PESSALI, 2009), o que foi discutido em mais detalhes no capítulo 1.

Ademais, alguns centros de P&D de empresas transnacionais envolvidas na fase de exploração de petróleo e gás também estão instalados no Rio de Janeiro. Dados apresentados em Piquet et al (2016) mostram que, dos 18 novos centros de P&D de petróleo e gás que foram instalados no Brasil nos últimos dez anos, 15 estão localizados na cidade, sendo que a maioria desses centros está localizada numa área de propriedade da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). A instalação desses centros de P&D de empresas transnacionais no Rio de Janeiro é motivada, entre outros fatores, pela descoberta do pré-sal em 2007, proveniente das bacias sedimentares, que vão do litoral do Espírito Santo até São Paulo (PEDROSA JR. E CORREA, 2016). A exploração da camada exige novas tecnologias, adaptações às já existentes e soluções logísticas (PIQUET, 2012). Portanto, a demanda por novas tecnologias e soluções adaptadas, além da importância do pré-sal como novo depósito com grande potencial produtivo, estimularam o investimento estrangeiro em P&D na cidade (BELLUZZO et al, 2014 apud PIQUET, 2016).

As atividades de P&D realizadas por empresas estrangeiras no Rio de Janeiro e no Brasil também se devem à legislação do setor que, desde 2005, determina que 1% da produção bruta total de campos altamente produtivos seja investido em P&D. Parte desse 1% pode ser aplicado em centros próprios de P&D ou no Cenpes, e outra parte deve ser aplicada em instituições sem fins lucrativos, como universidades e institutos públicos de pesquisa (OLIVEIRA, 2016; TORDO et al, 2013).

Assim, o Rio de Janeiro é um centro do estágio upstream da rede de petróleo e gás. Essa centralidade se materializa na concentração da origem dos fluxos de IDE e F&A da rede sul-americana naquela cidade. Tal concentração é explicada em grande parte pela presença da Petrobras, que detém um papel de liderança na região. O fato de o Rio de Janeiro abrigar a sede da empresa motiva outras empresas, que buscam atuar em parceria com a Petrobras, a se instalarem no Rio de Janeiro, informação confirmada em entrevistas10.

10 Entrevistas realizadas no âmbito do projeto “Gateway cities and their hinterland: global cities from the Global