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A Conquista do Mal

No documento John Stott - A Cruz de Cristo (páginas 125-139)

Impossível que alguém leia o Novo Testamento sem se impressionar com o ambiente de confiança alegre que o penetra, o qual se destaca contra a religião um tanto insípida que muitas vezes passa por Cristianismo hoje. Não havia derrotismo nos cristãos primitivos; antes, falavam de vitória. Por exemplo: "Graças a Deus que nos dá a vitória. , ." Novamente: "Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores. . ." Uma vez mais: "Deus. . . nos conduz em triunfo. . ." E cada uma das cartas de Cristo às sete igrejas

da Ásia termina com uma promessa especial "ao vencedor".1

Vitória, conquista triunfo — era esse o vocabulário dos primeiros seguidores do Senhor ressurreto. Pois se falavam de vitória, sabiam que a deviam ao Jesus vitorioso. Afirmaram tal fato nos textos que eu de forma truncada citei até agora. O que Paulo, na realidade, escreveu foi: "Deus nos dá a vitória por intermédio de nosso Senhor Jesus Cristo", "somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou", e: "Deus que em Cristo nos conduz em triunfo". É ele quem "venceu", "triunfou", e além do mais o fez "pela cruz".2

É claro, qualquer observador contemporâneo de Cristo que o viu morrer, teria ouvido com incredulidade e espanto a reivindicação de que o Crucificado saiu Vencedor. Não havia ele sido rejeitado pela sua própria nação, traído, negado e abandonado por seus próprios discípulos, e executado por autoridade do procurador romano? Olhe para ele, pregado na cruz, despido de toda liberdade e movimento, pregado com pregos ou amarrado com cordas, ou ambos, preso e impotente. Parece derrota total. Se houver vitória, é a do orgulho, prejuízo, inveja, ódio, covardia e brutalidade. Contudo, o cristão afirma que a realidade é o oposto das aparências. O que parece (e deveras foi) a derrota do bem pelo mal, também é, e mais certamente, a derrota do mal pelo bem. Vencido, ele estava vencendo. Esmagado pelo poder inflexível de Roma, ele mesmo estava

esmagando a cabeça da serpente (Gênesis 3:15). A vítima era o vencedor, e a cruz ainda

é o trono do qual ele governa o mundo.

Eis mais um motivo na realização da cruz de Cristo. Além da salvação dos pecadores (como indicado pelas quatro imagens que examinamos no capítulo 7) e a revelação de Deus (especialmente de seu santo amor, como visto no capítulo anterior), a cruz garantiu a conquista do mal.

Foi Gustav Aulen, um teólogo sueco que, através do seu influente livro Christus Victor, trouxe à lembrança da igreja essa verdade negligenciada. O título original do livro em sueco significa algo como "O Conceito Cristão da Expiação", mas Christus Victor capta melhor

a sua ênfase. A tese dele, num estudo mais histórico que apologético,

é que a reconstrução tradicional de duas teorias principais é errônea, a saber, a visão "objetiva" ou "legal" (a morte de Cristo reconciliando o Pai), relacionada com Anselmo, e a perspectiva "subjetiva" ou "moral" (a morte de Cristo inspirando-nos e transformando- nos), associada com Abelardo. Pois há um terceiro ponto de vista ao dual Aulen denomina "dramático" e "clássico" ao mesmo tempo. É "gramático" porque concebe a expiação como um drama cósmico no qual Deus em Cristo luta com os poderes do mal e ganha a vitória. É "clássico" porque, diz ele, foi a "idéia dominante da Expiação nos primeiros mil anos da história cristã".

De modo que Aulen se esforçou por demonstrar que esse conceito da expiação como uma vitória sobre o pecado, a morte e o diabo era a visão dominante do Novo Testamento; que era mantido pelos pais gregos, desde Irineu, no final do segundo século, a João de Damasco, no início do oitavo, e é, portanto, sustentado pelas igrejas ortodoxas orientais hoje; que a maioria dos pais ocidentais também cria nele (embora com freqüência lado a lado com o ponto de vista "objetivo"), incluindo-se Ambrósio e Agostinho, e os papas Leão, o Grande, e Gregório, o Grande; que se perdeu no escolasticismo medieval; que foi recuperado por Lutero; mas que subseqüentemente o escolasticismo protestante o perdeu de novo e voltou à noção anselmiana da satisfação.

Aulen, portanto, é muito crítico da doutrina da "satisfação" desposada por Anselmo, a qual ele chama de "latina" e "jurídica". Ele se desfaz dela, com um pouco de desprezo, dizendo que é "na realidade um desvio na historia do dogma cristão". Porém, a crítica que ele faz de Anselmo não é totalmente justa. Ele sublinha corretamente a verdade de que no conceito "clássico" a "obra da expiação é vista como realizada pelo próprio

Deus", que "ele mesmo é o agente efetivo na obra redentora, do começo até o fim", e

que, de fato, "a expiação é, acima de tudo, um movimento de Deus para o homem, não primariamente um movimento do homem para Deus". Mas ele comete injustiça ao dizer que o conceito de Anselmo da morte de Cristo contradiz isso, a saber, como "uma oferta feita a Deus por Cristo como homem", "como se fosse de baixo", ou "uma obra humana de satisfação realizada por Cristo". Pois, como vimos no capítulo 5, Anselmo enfatizou claramente que, embora o homem deva fazer satisfação pelo pecado, ele não pode fazê- la, pois são seus os pecados pelos quais se deve fazer a satisfação. Deveras, somente o próprio Deus pode, e portanto, a faz, através de Cristo. A despeito do que Aulen escreveu, o ensino de Anselmo é que, através da obra do singular Deus-homem Cristo Jesus, não é somente o homem quem fez a satisfação; foi o próprio Deus que tanto satisfez como foi satisfeito.

Entretanto, Gustav Aulen tinha razão ao chamar a atenção da igreja para a cruz como vitória, e mostrar que por sua morte Jesus nos salvou não somente do pecado e da culpa, mas também da morte e do diabo, de fato, também de todos os poderes maus. A tese dele também foi importante num século despedaçado por duas guerras mundiais e uma cultura européia consciente de forças demoníacas. Ele também tinha razão em ressaltar que "a nota de triunfo", que "soa como o toque da trombeta através do ensino da igreja primitiva", em grande parte estava ausente da lógica fria do Cur Deus Homo? de Anselmo. Lutero, por outro lado, tocou essa nota novamente. Seus hinos e

quele "monstro" ou "tirano", o diabo, que antes nos mantinha no cativeiro do pecado, da lei, da maldição e da morte.

Outra crítica justa da tese de Aulen é que ele fez um contraste por demais pronunciado entre os motivos da "satisfação" e da "vitória", como se fossem alternativas mutuamente incompatíveis. Mas o Novo Testamento não nos obriga a escolher entre eles, pois inclui a ambos. Assim, Deus tomou a iniciativa e ganhou a vitória por meio de Cristo, mas um

dos tiranos dos quais ele nos libertou foi a própria culpa, a qual, segundo Anselmo, ele morreu a fim de expiar. John Eadie, um comentarista escocês do século dezenove, fez uma tentativa admirável para combinar os dois conceitos:

Nossa redenção é uma obra ao mesmo tempo de preço e de poder — de expiação e de conquista. Na cruz fez-se a compra, e na cruz ganhou-se a vitória. O sangue que apaga a sentença que havia contra nós foi aí derramado, e a morte que era o golpe

de morte do reino de Satanás foi aí suportada.3

De fato, as três maiores explicações da morte de Cristo contêm verdade bíblica e podem, em certo grau, ser harmonizadas, especialmente se observarmos que a diferença principal entre elas é que dirigem a obra de Deus em Cristo a uma pessoa diferente. No conceito "objetivo" Deus satisfaz-se a si mesmo, no "subjetivo" ele nos inspira, e no "clássico" ele vence o diabo. Assim, Jesus Cristo é, sucessivamente, o Salvador, o Mestre e o Vencedor, porque nós mesmos somos culpados, apáticos e cativos. P. T. Forsyth chamou a atenção para esse fato no último capítulo do seu livro A Obra de Cristo, ao qual ele intitulou "O Cordão Tríplice". Ele se refere aos aspectos "satisfacionário", "regenerador" e "triunfante" da obra de Cristo, e sugere que estão entrelaçados em 1 Coríntios 1:30, onde Cristo é feito "justificação, santificação e redenção" por nós. E embora "algumas almas, gravitem para a grande Libertação, algumas para a grande Expiação, e algumas para a grande Regeneração", contudo, todas são partes da realização total do Salvador, "a destruição do mal, a Satisfação de Deus, e a santificação dos homens".

Enquanto nos concentramos agora no tema da "conquista", pode ser útil olharmos primeiro para a vitória histórica de Cristo na cruz, e então para a vitória do seu povo, a qual a vitória dele torrou possível.

A vitória de Cristo

O que o Novo Testamento afirma, de modo franco, é que na cruz Jesus desarmou o diabo e triunfou sobre ele, e sobre todos os "principados e poderes" que estão ao seu comando. Os ouvintes do evangelho do primeiro século não teriam tido nenhuma dificuldade em aceitar essa verdade, pois "talvez seja difícil para o homem moderno

conceber quão cheio de feitiçaria era o mundo a que Cristo veio".4 Ainda hoje em muitos

países o povo vive com pavor de espíritos maus. E no Ocidente supostamente sofisticado tem-se desenvolvido uma fascinação nova e alarmante pelo ocultismo, a qual é duplamente documentada por Michael Green em seu livro Creio na Queda de Satã. E, contudo, ao mesmo tempo muitos ridicularizam como um anacronismo a crença contínua num diabo pessoal, que possua espíritos maus sob seu controle. A afirmativa dogmática de Rudolf Bultmann é bem conhecida: "é impossível usarmos a luz elétrica e o rádio, e servir-nos das modernas descobertas médicas e cirúrgicas, e, ao mesmo tempo, crermos

no mundo de demônios e espíritos do Novo Testamento".5 Michael Green resume a

anomalia da coexistência da curiosidade com a incredulidade sugerindo que duas atitudes opostas seriam igualmente agradáveis ao diabo: "A primeira é de preocupação excessiva com o príncipe do mal. A segunda é de excessivo ceticismo acerca da sua própria existência". Michael Green prossegue a dar sete razões pelas quais ele crê na existência desse ser imensamente poderoso, mau e astucioso chamado Satanás ou diabo. Relacionam-se com a filosofia, com a teologia, com o ambiente, com a experiência, com o ocultismo, com a Escritura e, acima de tudo, com Jesus. E um caso válido; nada tenho que lhe acrescentar.

Mas como é que Deus, por meio de Cristo, ganhou a vitória sobre o Maligno? Embora a derrota decisiva de Satanás se tenha dado na cruz, a Escritura representa o desenvolvimento da conquista em seis etapas.

A primeira é a predição da conquista. A primeira predição foi dada pelo próprio Deus no Jardim do Éden como parte de seu juízo sobre a serpente: "Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe

ferirás o calcanhar" (Gênesis 3:15). Identificamos o descendente da mulher como o Messias, por meio de quem o reino justo de Deus será estabelecido e o reino do mal erradicado. Sendo assim, todos os textos do Antigo Testamento que declaram o reino atual de Deus (exemplo: "Tua, Senhor, é a grandeza, o poder. . . teu, Senhor, é o reino. . .") ou o seu reino futuro sobre as nações mediante o Messias (exemplo: "Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz") podem ser compreendidos

como profecias do esmagamento final de Satanás.6

A segunda etapa foi o início da conquista no ministério de Jesus. Reconhecendo-o como seu futuro conquistador, Satanás fez muitas tentativas diferentes para se livrar dele. Por exemplo, através do assassínio das crianças de Belém, ordenado por Herodes, por meio das tentações no deserto com o objetivo de evitar o caminho da cruz, por intermédio da resolução do populacho em forçá-lo a um reinado político-militar, através da contradição de Pedro acerca da necessidade da cruz ("Para trás de mim, Satanás!"), e mediante a

traição de Judas em quem Satanás na realidade havia "entrado".7

Porém Jesus estava decidido a cumprir o que dele estava escrito. Ele anunciou que por seu intermédio o reino de Deus tinha chegado àquela geração, e que as suas obras de poder eram evidência visível desse reino. Vemos o reino dele avançando e o de Satanás retrocedendo, à medida que demônios são expulsos, enfermidades são curadas e a

própria natureza desorganizada reconhece o seu Senhor.8 Além do mais, Jesus enviou os

seus discípulos, como seus representantes, a pregar e a curar, e quando voltaram, emocionados porque os demônios se lhes haviam submetido em nome do Mestre, ele respondeu que tinha visto a "Satanás caindo do céu como um relâmpago".

Aqui, contudo, está sua afirmativa mais admirável acerca desse tema: "Quando o

valente, bem armado, guarda a sua própria casa, ficam em segurança todos os seus bens. Sobrevindo, porém, um mais valente do que ele, vence-o, tira-lhe a armadura em que confiava e lhe divide os despojos". Não é difícil reconhecer o valente como um quadro do diabo, o "mais valente do que ele" como Jesus Cristo, e o dividir dos despojos

(ou, em Marcos, o saque da sua casa) como a libertação dos seus escravos.9

Contudo, o "vencer" e o "amarrar" ao valente não aconteceram até a terceira e decisiva etapa, a realização da conquista, na cruz. Três vezes, segundo João, Jesus referiu-se ao diabo como "o príncipe deste mundo", acrescentando que ele estava prestes a "vir" (isto

é, lançar sua última ofensiva), mas que seria "expulso" e "julgado".10 Evidentemente ele

estava antecipando que por ocasião da sua morte realizar-se-ia o concurso final no qual os poderes das trevas seriam desbaratados. Seria através da sua morte que ele destruiria "aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo", e, assim, libertaria os cativos (Hebreus 2:14-15).

Talvez a passagem mais importante do Novo Testamento que apresenta a vitória de Cristo seja Colossenses 2:13-15.

E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões, e pela incircuncisão da vossa carne, vos deu vida juntamente com ele, perdoando todos os nossos delitos; tendo cancelado o escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz; e, despojando os principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz.

Aqui Paulo une dois aspectos diferentes da obra salvadora da cruz de Cristo, a saber, o

perdão dos nossos pecados e a subversão cósmica dos principados e potestades.11 Ele

exemplifica a libertação e a graciosidade do perdão divino (charizomai) usando o antigo costume do cancelamento de dívidas. "O escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças" dificilmente poderia ser uma referência à própria lei, pois Paulo a via como santa, justa e boa (Romanos 7:12). Pelo contrário, deve referir-se à lei quebrada que, por isso mesmo, "era contra nós" com o seu juízo. A palavra que Paulo usa como "escrito de dívida", cheirographon, era "um documento escrito à mão, especificamente um certificado de dívida", ou "uma confissão assinada de dívida, a qual

permanecia como testemunha perpétua contra nós."12 O apóstolo, então, com a finalidade de descrever como Deus desfez a nossa dívida, emprega três verbos. Ele "cancelou" o escrito de dívida, "removendo-o inteiramente", e, a seguir, "encravando-o na cruz". J. Jeremias acha que a alusão é ao titulus, o tablete afixado acima da cabeça da pessoa crucificada no qual se escreviam os seus crimes, e que no titulus de Jesus eram

os nossos pecados que estavam inscritos, não os dele.13 De qualquer modo, Deus nos

livra da falência somente por meio do pagamento de nossas dívidas na cruz de Cristo. Mais do que isso. Ele "não apenas cancelou a dívida, mas também destruiu o documento

no qual ela estava registrada".14

Paulo agora passa do perdão de nossos pecados à conquista dos poderes malignos, e usa três verbos gráficos para retratar a derrota deles. O primeiro podia significar que Deus em Cristo os "desnudou" de si mesmo como roupa imunda, porque o estavam apertando, e, portanto, desfez-se deles. Ou, melhor, pode significar que ele os

"desnudou" ou das suas armas ou da sua "dignidade e poder",15 dessa forma degradando-

os. Segundo, ele "publicamente os expôs ao desprezo", exibindo-os como os "poderes

impotentes"16 que são, e assim, terceiro, "triunfando deles na cruz", o que provavelmente

seja referência à procissão de cativos que celebrava a vitória. Assim, a cruz, comenta Handley Moule, foi "de um ponto de vista o seu cadafalso, e de outro, a sua carruagem

imperial".17 Alexandre Maclaren sugere um quadro unificado de Cristo como "o vencedor

despindo os seus inimigos de armas, ornamentos e vestes, então exibindo-os como seus

cativos, e a seguir arrastando-os nas rodas de seu carro triunfal".18

Tudo isso são imagens vividas, mas o que realmente significa? Devemos visualizar uma batalha cósmica real, na qual os poderes das trevas cercaram e atacaram a Cristo na cruz, e na qual ele os desarmou, desacreditou e derrotou? Se tivesse sido invisível, como certamente teria de ser, como foi que Cristo os expôs publicamente? Parece que devemos pensar na vitória dele, embora real e objetiva, em outros termos.

Primeiro, certamente é significativo que Paulo compare o que Cristo fez ao

cheirographon (cancelamento e remoção) com o que ele fez aos principados e potestades

(desarmando-os e os vencendo). O título ele pregou na cruz; os poderes ele derrotou por meio da cruz. Não parece necessário insistir em que este último seja mais literal do que o primeiro. O ponto importante é que ambos aconteceram juntos. Não foi o pagamento das nossas dívidas o modo pelo qual Cristo subverteu os poderes? Liberando-nos destas, ele nos libertou daqueles.

Segundo, ele venceu o diabo mediante a resistência total a suas tentações. Tentado a evitar a cruz, Jesus perseverou no caminho da obediência, e tornou-se "obediente até à morte, e morte de cruz" (Filipenses 2:8). A sua obediência foi indispensável à sua obra salvadora. "Porque, como pela desobediência de um só homem muitos se tornaram pecadores, assim também por meio da obediência de um só muitos se tornarão justos" (Romanos 5:19). Se ele tivesse desobedecido, desviando-se um pouquinho que fosse do caminho da vontade de Deus, o diabo teria ganho um ponto e frustrado o plano da salvação. Mas Jesus obedeceu, e o diabo foi derrotado. Provocado pelos insultos e pelas torturas a que foi submetido, Jesus absolutamente se recusou a retaliar. Mediante o seu amor autodoador, ele venceu "o mal com o bem" (Romanos 12:21). Novamente, quando os poderes combinados de Roma e de Jerusalém se dispuseram contra ele, ele poderia ter enfrentado poder com poder. Pois Pilatos não tinha autoridade última sobre ele; mais de doze legiões de anjos ter-se-iam apressado ao seu resgate, caso ele as tivesse

convocado; ele poderia ter descido da cruz, como, escarnecendo, desafiaram-no a fazer.19

Mas ele se recusou recorrer ao poder mundano. Ele foi crucificado em fraqueza, embora a fraqueza de Deus fosse mais forte do que a força do homem. Assim, ele se recusou a desobedecer a Deus, ou a odiar os seus inimigos, ou a imitar o uso que o mundo faz do poder. Mediante sua obediência, amor e mansidão, ele ganhou uma grande vitória moral sobre os poderes do mal. Ele permaneceu livre, incontaminado, descomprometido. O

Enquanto ele estava ali suspenso, amarrado de pés e mãos ao madeiro em aparente fraqueza, eles imaginaram que o tinham à sua mercê, e lançaram-se sobre ele com

intenção hostil. . . Mas ele lutou com eles e os venceu.21

De modo que a vitória de Cristo, predita imediatamente depois da Queda e iniciada durante o seu ministério público, foi decisivamente ganha na cruz.

Quarto, a ressurreição foi a confirmação e o anúncio da conquista. Não devemos ver a cruz como derrota, e a ressurreição como vitória. Antes, a cruz foi a vitória ganha, e a ressurreição a vitória endossada, proclamada e demonstrada. "Não era possível fosse ele retido" pela morte, pois ela já havia sido derrotada. Os principados e os poderes do mal, que haviam sido privados de suas armas e sua dignidade na cruz, agora, como

conseqüência da derrota, foram colocados sob os pés de Cristo e feitos sujeitos a ele.22

Quinto, a extensão da conquista à medida que a igreja sai para executar a sua missão no poder do Espírito, pregar a Cristo crucificado como Senhor, e convocar o povo a se arrepender e crer nele. Em toda conversão genuína há um voltar-se não apenas do pecado para Cristo, mas também "das trevas para a luz", "do poder de Satanás para Deus", e dos ídolos para servir o "Deus vivo e verdadeiro"; há também um resgate do

domínio das trevas para o reino do Filho a quem Deus ama.23 De modo que a conversão

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