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A Educação Física em Portugal no período de 1974 aos nossos dias

2.3. O Nascimento da Educação Física

2.3.2. A Educação Física em Portugal

2.3.2.4 A Educação Física em Portugal no período de 1974 aos nossos dias

A episteme, de acordo com Rosário (2006, p.10) representa a “estrutura inconsciente de uma determinada cultura, que designa o campo no qual as diversas disciplinas representativas desta cultura estão em relação recíproca de significação e configuração”. De uma forma mais simples, ainda na esteira de Rosário (2006), episteme é o palco onde se vê o mundo de uma determinada forma e que singulariza uma determinada época histórica.

Se tivermos como referência o golpe militar de 25 de abril de 1974, que determinou a substituição de um regime ditatorial por um regime democrático, pode-se afirmar que Portugal mudou, significativamente, a sua episteme.

Desde 1926 até 1974, os órgãos de comunicação social, os espetáculos culturais, o sistema de ensino, entre outros, eram permanentemente controlados por um sistema de censura, que lhes limitava a liberdade de expressão. Num plano mais individual, o cidadão português estava sujeito a um escrutínio por parte de uma polícia do estado, PIDE, que, para além de lhe incutir medo e impor represálias, cerceava a sua iniciativa. Este poder totalitário do Estado Novo, na ânsia de perpetuar a sua influência, utilizava todos os meios com o objetivo de “construir” homens acríticos. Daí, não ser por ingenuidade que na educação física se privilegiassem os exercícios mecânicos, analíticos e militaristas dirigidos ao músculo e à disciplina. A metodologia escolhida tinha, forçosamente, que estar alinhada com o objetivo político pretendido. A ginástica de Ling preenchia esses requisitos e, por conseguinte, era um dos instrumentos da disciplina que, como refere Foucault (1999), possibilitava a sujeição do corpo a uma «anatomia política», que é simultaneamente uma «mecânica do poder». Ao poder, ainda na senda de Foucault (1999), já não lhe interessava apenas ter domínio sobre o corpo dos outros, interessava-lhe, também, que as pessoas

37 fizessem o que se pretendia e da maneira com se queria, segundo a rapidez e a eficácia pretendida.

A partir do 25 de Abril, com a instauração de um regime democrático, constataram-se profundas alterações na sociedade portuguesa: terminou a guerra colonial; fundaram-se inúmeros partidos e associações; foi abolida a censura; passou a haver eleições livres; é aprovada uma nova Constituição da República Portuguesa, que restitui aos cidadãos direitos e liberdades fundamentais, de que o pluralismo de expressão é um exemplo.

É, portanto, uma nova sociedade que começa a emergir e, em vários aspetos, com caraterísticas opostas àquelas que vigoraram durante 48 anos.

Os responsáveis pela área da educação física em Portugal, segundo Pereira (2011), procuraram apoios e exemplos em países com ideologias políticas semelhantes. Portugal, referindo ainda Pereira (2011), passa de um desporto elitista, próprio de um Estado Novo, para um desporto para todos e, durante um período, o desporto foi mais discutido e praticado em pequenas aldeias e bairros, do que em qualquer momento da sua existência.

Esta nova episteme vai criar condições para que na área educativa a educação física se liberte duma conceção racionalista, cartesiana, militarista e médico positivista. No INEF, aproveitando esta onda transformista, observou-se, após o 25 de abril, e de acordo com Rosário (1996), uma eclosão de modelos pedagógicos. Serpa (2011) refere que foi na década de 70 e através de Nélson Mendes que teve o 1º contacto com um ensino baseado na psicomotricidade de Le Boulch, na não diretividade de Carl Rogers, nas Teorias de Reich, na autoaprendizagem.

Aliás, já na década de sessenta, aproveitando o desgaste progressivo do regime ditatorial, Nélson Mendes, de acordo com Rosário (1996), procurou educar os alunos para um novo olhar sobre o corpo e a educação física: insurgiu-se contra a ginástica de manutenção, por entender que a filosofia que a consagrava se alicerçava num modelo mecanicista e, portanto, contrário à conceção de um homem total; em 1965 compila um conjunto de elementos de apoio à cadeira de Teoria de Ginástica e titula-os “Porquê a Minha Oposição aos Métodos Tradicionais de Educação da Atitude”; em 1968, segundo Sérgio (2003), lança um livro onde defende que o INEF deveria chamar-se Instituto Superior de Cinesiologia.

Todavia, se esta conceção de Nélson Mendes, na década de sessenta, devido à episteme existente, estava longe de ser a perspetiva dominante, permitiu, contudo, lançar as bases, em que se pretendeu apoiar o novo ensino da educação física a partir da década de setenta.

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O surgimento de novas perspetivas metodológicas na educação física deriva, para Feio (1981, p. 268), em grande parte, da “crise doutrinária que, a partir da década de sessenta, atingiu o corpo das disciplinas, nomeadamente nos países latinos da europa: mergulhados numa crise em grande parte provocada pela falência dos métodos mecanicistas, onde muitas vezes os grandes objetivos de caráter higiénico e corretivo se diluíram na pseudo- disciplina de uma repetição gestual sem significado científico ou pedagógico mas, apenas, espetacular ou militarista, como aconteceu ao denominado método da ginástica sueca, que durante décadas vigorou em Portugal”.

No entanto, após o 25 de abril, outras alterações merecem destaque, já que indiciam que são consequência de uma nova episteme: o INEF é extinto e é criado através do Decreto- Lei 675/75, de 3 de dezembro, os Institutos Superiores de Educação Física de Lisboa e do Porto. Pela primeira vez, cursos de educação física passam a integrar as respetivas Universidades. Reconhecia-se, deste modo, à área da educação física uma importância semelhante às outras áreas e a Universidade, que, até aqui, tinha sido um bastião da alma, percebia que tinha que se dirigir à totalidade do corpo. Socialmente era dado um passo importante para a renúncia de uma conceção dualista do corpo.

É aproveitando o pensamento crítico sobre os fundamentos cartesianos da educação física, especialmente a obra de Merleau-Ponty e a ideia de Homem Total de Nélson Mendes, que Manuel Sérgio defende, no Jornal da Educação em outubro de 1979, o surgimento de uma ciência: a ciência da motricidade humana.

Para Tavares (2001), a obra de Merleau-Ponty, especialmente a Fenomenologia da perceção, constituem a base da fundamentação da ciência da motricidade humana. Manuel Sérgio reconhece essa influência e afirma no livro “Um Corte Epistemológico, da educação física à motricidade humana” (2003), que ninguém excedeu Merleau-Ponty na preocupação de realçar o papel gnosiológico do corpo. Neste livro dedica-lhe, por inteiro, o capítulo 7. O mesmo acontece no livro “Para uma Epistemologia da Motricidade Humana” (1994). Aliás, é raro encontrar um livro de Manuel Sérgio, sobre a motricidade humana, em que não se encontre referências a este filósofo francês.

Merleau-Ponty, ao longo da sua obra, opôs-se, convictamente, à conceção cartesiana de corpo. Relembra-se que Descartes defendeu ser o corpo constituído por uma substância diferente da alma. Esta distinção originou que o atributo pensar ficasse exclusivo da alma e ao corpo ficasse entregue a um funcionamento mecânico. O corpo do Homem assemelhava- se ao de uma máquina, caso esta possuísse órgãos e a figura de um homem. Ao nível das perceções, Descartes (1984), também considerou existir duas espécies, umas tendo por base a alma e outras o corpo.

39 Para Merleau-Ponty (2002, p.32), “ o Homem não é um espírito e um corpo, mas um espírito com um corpo, e que só acede à verdade das coisas porque o seu corpo está como que nelas implantado”. É, pois, pelo corpo que o Homem acede à realidade que o circunda. Corpo esse que, segundo Merleau-Ponty (2002), surge revestido de atributos humanos que fazem dele uma combinação de corpo e espírito. Daí não ser correto dizer que o Homem tem um corpo, no sentido de ter um carro ou uma casa, mas sim que o Homem é um corpo. O corpo surge, assim, como sinónimo de Homem ou totalidade de corpo.

Mas na interação corpo-realidade ou corpo-fenómeno/objeto, o ser humano, para Merleau-Ponty (2002), capta a essência das coisas em função das suas próprias particularidades: da sua ontogénese, do contexto específico em que se encontra, etc. Deste modo o significado que cada ser humano dá às coisas está dependente de múltiplas condicionantes. O significado de cadeira, para além de um sentido comum, está muito dependente, para cada ser humano, da maneira como a cultura que o rodeia o educou, bem como da sua própria experiência pessoal. Alguém que é filho de um marceneiro, e que toda a vida assistiu à construção de cadeiras, ao olhar para uma retira um conhecimento e atribui-lhes um significado muito diferente de outra pessoa, que tem um percurso de vida distinto. Esta perspetiva de Merleau-Ponty, para além de colocar em causa o conhecimento objetivo que Descartes e o Positivismo tanto propalaram, e que influenciou decisivamente várias áreas da sociedade, como a educação, a ciência e a medicina, entre outras, valoriza a componente da subjetividade.

É através da subjetividade que o Homem apreende a essência das coisas. À procura de interpretar o mundo, à atitude dirigida à realidade, Tavares (2001), chamou-lhe subjetividade ativa. É um sinónimo daquilo que constitui um dos conceitos base da fenomenologia de Merleau-Ponty, a intencionalidade operante. No fundo, é a conduta voluntária e orientada que o ser humano tem para apreender um fenómeno ou um objeto. Há, pois, na fenomenologia de Merleau-Ponty, como refere Tavares (2001), um aspeto basilar: só existe conhecimento se houver intenção.

Esta intenção, este querer de perceber um fenómeno só é, no entanto, possível, como refere Sérgio (2003), se o corpo for o sujeito da perceção, pois só percebemos através da carne e dos órgãos sensoriais. Perceção é, assim, indissociável do corpo. É neste sentido que a consciência da realidade em Merleau-Ponty, segundo Sérgio (2003), é uma consciência incarnada. O corpo, incluindo a sua componente material – músculos, ossos, vísceras, etc., - surge, assim, como um meio imprescindível na aquisição do conhecimento.

É partindo da obra de Merleau-Ponty que Manuel Sérgio propõe substituir uma educação física cartesiana por uma ciência da motricidade humana. Esta ciência, segundo Tavares

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(2001), com o objetivo de romper com a conceção cartesiana do corpo e implementar uma renovação metodológica, preconiza, numa 1ª fase, uma estratégia de negação: negação absoluta do corpo-alma; negação do corpo da ciência objetiva, fechado, anatómico, fisiológico e maquinal. Nega-se esse corpo que, em Descartes, era mera res extensa, desprovido de alma, simples máquina condicionada pelas leis da natureza. Nega-se esse corpo-objeto que, de acordo com Sérgio (2002), com Descartes foi fundamentado e integrado no sistema geral do saber e cujo método, no prosseguimento do ensino cartesiano, consistiu em analisar, descrever ou sistematizar o mecanismo da máquina corporal. Nega-se esse corpo mecânico e obediente que as Linhas Doutrinárias da educação física ajudaram a moldar. Nega-se, portanto, uma conceção de corpo cartesiano e uma metodologia a ela associada.

Para a ciência da motricidade humana, segundo Sérgio (2003), o corpo humano não é só o que a fisiologia descreve, nem o que a anatomia desenha, ele é uma unidade estrutural e através do seu esquema corporal realiza, não só a unidade do seu mesmo ser, mas também a unidade dos sentidos e do objeto.

É tendo em vista esta conceção de corpo que, para a motricidade humana, o movimento não pode ser descrito apenas no plano mecânico e/ou físico. Ao negar-se um corpo dualista negou-se, como refere Tavares (2001), uma prática acéfala e ateorizante, na qual os atletas repetem automatismos de forma contínua, mas sem a mínima preocupação de reflexão.

Quando um corpo se movimenta, de acordo com Tavares (2001), não ocorre apenas a mudança de uma massa no espaço, mas sim uma intenção. É por isso que o movimento, de acordo com Sérgio (1979, p, 16, citado por Rosário, 1996) “ permite o desenvolvimento motor e psíquico da criança. A inteligência radica no movimento”.

Deixa, por isso, de fazer sentido perspetivar o exercício na educação física no plano meramente físico. O aluno é um todo e é a esse todo que o professor se dirige.

Manuel Sérgio (2003) propõe, então, de acordo com a fenomenologia de Merleau-Ponty, que no âmbito da motricidade humana se deve estudar o movimento intencional da transcendência. Cada pessoa representa um ser único, com potencialidades e limitações específicas, mas com possibilidades de ser cada vez mais.

Estas novas ideias do corpo e do movimento, como já se viu, foram favorecidas pelo surgimento de uma nova episteme que, apesar de ter começado a germinar durante a década de sessenta, teve a sua eclosão após o derrube de um regime ditatorial e o aparecimento de um regime democrático.

41 Contudo, o que é importante compreender é em que medida estas novas ideias se limitaram a ser unicamente uma novidade, uma moda, com um prazo de validade curto ou, pelo contrário, se enraizaram na sociedade portuguesa, destronando uma conceção racionalista-cartesiana-positivista-capitalista-médico analista e fazendo prevalecer, como lhe chamou Nélson Mendes, uma ideia de Homem Total.

Através da análise de diversos documentos que, na área da educação física, servem de referência à sociedade portuguesa, e abaixo mencionados, constata-se que a conceção racionalista-cartesiana-positivista-capitalista-médico analista, longe de ter sido refutada e abandonada, ainda prevalece numa posição dominante:

a) A Constituição Portuguesa (1976), no seu artigo 79º, ponto 1, faz referência ao direito de todos os portugueses, à cultura física e ao desporto. No ponto 2 estipula que compete ao Estado promover e estimular a prática e a difusão da

cultura física e do desporto.

b) Na Carta Internacional da Educação Física e do Desporto da Unesco também se recorre aos termos condição física, atividade física e aptidão física. É certo que quer no seu preâmbulo, quer no ponto 1.1 se procura fazer uma ligação entre a educação física e o desporto e as aptidões físicas, intelectuais e morais, mas sem conseguir ultrapassar uma visão compartimentada das qualidades do ser humano. Repare-se como estas aptidões são apresentadas de uma forma separada, como se elas realmente existissem no corpo humano como entidades independentes. É esta visão dualista do corpo que justifica que no ponto 2.3 se diga que à educação física e ao desporto deve, num sistema educativo, ser reservado um lugar e uma importância, que permitam um equilíbrio nas relações entre as atividades físicas e os outros elementos de educação. Por outros elementos de educação, para além daqueles que dizem respeito às atividades físicas, entende-se os que correspondem à atividade intelectual. Confirma-se, assim, uma dicotomia corpo/mente, que corrobora uma visão cartesiana do corpo.

c) No Livro Branco do desporto, cuja autoria pertence à União Europeia, também se recorre, frequentemente, ao termo atividade física, para justificar a importância do desporto na melhoria da saúde dos cidadãos.

d) A Lei de Bases do Sistema Educativo, Lei nº 46/86 de 14 de Outubro, que ainda se mantém em vigor, apesar de ter sido sujeita a algumas alterações, refere no seu artigo 7º que um dos objetivos do ensino básico é assegurar o desenvolvimento

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Atente-se que nesta alínea se juntam caraterísticas, que dizem respeito á parte física do corpo e que, socialmente, se convencionou serem a área de intervenção da educação física, educação visual e educação tecnológica. Omite-se qualquer ligação entre esta componente física e o desenvolvimento da capacidade de raciocínio, da criatividade e do espírito crítico. Estas são caraterísticas que, por regra, aparecem em alíneas independentes. Isso mesmo se constata no artigo 9º, alínea a), página 157, quando se define que um dos objetivos do ensino secundário é “assegurar o desenvolvimento do raciocínio, da reflexão e da curiosidade científica e o aprofundamento dos elementos fundamentais de uma cultura humanística, artística, científica e técnica que constituam suporte cognitivo e metodológico apropriado para o eventual prosseguimento de estudos e para a inserção na vida ativa”. Atente-se que quando se fala de desenvolvimento intelectual, raramente se encontra, de uma maneira explícita, qualquer referência à educação física e/ou ao desporto.

e) Em 16 de Janeiro de 2007 entrou em vigor a Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto. Para além do próprio nome já indiciar uma conceção dualista do corpo, repare-se na definição de desporto contido no Decreto-Lei nº10/2009, de 12 de janeiro, página 221, que, referindo-se à Lei supracitada, visava estabelecer o regime jurídico do seguro desportivo obrigatório: “O desporto, até por definição, é uma atividade predominantemente física, exercitada com caráter competitivo”.

f) Ao ler-se a legislação subjacente à Reorganização Curricular do Ensino Básico, Porto Editora (2002), constata-se o uso de uma linguagem própria da conceção cartesiana do corpo: às modalidades desportivas como a ginástica, badminton ou o hóquei em patins, chama-se atividades físicas desportivas. Os termos aptidão física, condição física, cultura física são termos várias vezes referidos e servem, também, como referência para definir objetivos gerais ou específicos de uma determinada área. À semelhança de Descartes que, perante um problema complexo utilizava a análise, no sentido de decompor progressivamente em elementos cada vez mais simples até encontrar a solução, o programa de educação física utiliza a mesma metodologia no sentido de simplificar os problemas complexos, que dizem respeito ao ser humano. É também de acordo com esta conceção cartesiana que Marschner (1982, citado por Marques, 1988) divide a capacidade de prestação corporal em capacidades condicionais (energético-funcionais), capacidades coordenativas (sensório-motoras) e de natureza psíquica. As capacidades condicionais, ainda de acordo com Marques (1988), podem, por sua vez, ser divididas em força, velocidade, resistência e mobilidade articular e

43 flexibilidade ou souplesse. No programa de educação física para o ensino básico, Porto Editora (2002), a força ainda pode ser dividida em força resistente e força rápida, a resistência em geral de longa e média durações e a velocidade em reação simples e complexa, de execução, de deslocamento e de resistência.

As capacidades coordenativas, por sua vez, de acordo com Batista, Rêgo e Azevedo (2012) podem ser divididas em destreza, orientação espacial, equilíbrio, diferenciação cinestésica, reação e ritmo.

Atente-se na quantidade de divisões e subdivisões que são feitas e que acabam por atomizar as caraterísticas do ser humano.

Ao consultar-se o programa de educação física para o ensino secundário, Porto Editora (2004), constatamos as mesmas caraterísticas do programa para o ensino básico. Não é, pois, de admirar que, no material considerado indispensável ao desenvolvimento do programa, se encontre cordas de saltar, halteres, bolas medicinais, ciclo ergómetro e material necessário ao protocolo de avaliação da aptidão física adotado. Este material, à luz da educação física cartesiana, serve essencialmente para um trabalho físico, dirigido ao músculo e à quantificação do movimento.

No século XXI a educação física, à semelhança dos primeiros métodos de Basedow (1723-1790), Ling (1776-1823) e Amorós (1770-1848), continua a separar o corpo e a mente. É esta separação, como já se viu, que permite depois justificar um trabalho essencialmente mecânico do corpo.

g) Os manuais de educação física, tendo a obrigatoriedade de respeitar os programas em vigor, evidenciam as mesmas caraterísticas destes. No livro “Em movimento” de Batista, Rêgo e Azevedo (2012, p.28) reduz-se a ação motora a uma ação que provoca contração muscular; por sua vez as capacidades condicionais, que são consideradas uma subdivisão das ações motoras, são consideradas como tendo um caráter unicamente quantitativo.

Isso mesmo se constata no livro “Educação Física” de Costa e Costa (2012, p.54), quando circunscreve todos os registos dos testes de avaliação da aptidão física a números: distância em centímetros para o teste do senta e alcança; número de execuções para os abdominais; distância em centímetros para a extensão do tronco; número de execuções para a extensão de braços; número de execuções para as flexões dos braços; tempo em segundos para a flexão de braços em suspensão;

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tempo em minutos para a corrida da milha; tempo em segundos para a corrida dos 40 metros e tempo em segundos para a agilidade (shuttle run).

É esta necessidade de tudo quantificar que leva a considerar que para se avaliar a aptidão física de um aluno se deve ter em conta os testes do Fitnessgram. Estes testes, oriundos dos Estados Unidos, pretendem avaliar através da quantificação diversas capacidades motoras: aptidão aeróbia, força média, força superior, flexibilidade dos membros inferiores e do tronco e, também, as medidas antropométricas e a composição corporal.

Uma conceção com estas caraterísticas enquadra-se na conceção cartesiana e positivista que tudo objetivava e quantificava e legitima, como refere criticamente Santos (1993) e como se referiu na página 13, que o corpo humano só possa ser