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O Contributo da Conceção de Corpo de Damásio para uma Prática da Educação

2.4. O Contributo de António Damásio Para a Compreensão da Problemática

2.4.4. O Contributo da Conceção de Corpo de Damásio para uma Prática da Educação

A conceção de corpo de Damásio difere, como temos, visto substancialmente da de Descartes. Ao dualismo cartesiano, onde corpo e alma são duas substâncias distintas, Damásio (1994, 2000, 2004, 2010) contrapõe uma conceção holística do corpo, onde todas as suas partes interagem e influenciam-se reciprocamente, tendo em vista a sobrevivência do organismo.

A conceção de corpo de Descartes originou uma educação física cartesiana. Ela alicerça a sua metodologia num conjunto de procedimentos redutores, como a análise e o mecanicismo. Damásio (1994, 2000, 2004, 2010) ao propor uma conceção de corpo holística criou condições para se alterar conceptualmente e metodologicamente a educação física. Importa, pois, perceber que disciplina se pode edificar:

a) Em primeiro lugar é importante referir que Descartes (1977, 1984, 2006) e Damásio (1994, 2000, 2004, 2010) utilizam, por vezes, os mesmos termos. Contudo, o significado destes não deve ser confundido. Deve, isso sim, ser interpretado à luz das respetivas conceções de corpo. Um dos termos que importa clarificar é “físico”.

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Para Descartes (1977, 1984, 2006) sempre que se fala em físico referimo-nos à parte corpórea; à matéria; o seu principal atributo é a extensão, largura e altura; este físico é desprovido, completamente, do atributo, pensar.

Para Damásio (1994, 2000, 2004, 2010) o termo físico designa também a matéria, o corpóreo, mas numa perspetiva holística. Isto significa que é físico não só o músculo, o fígado, o coração, como os neurónios, o cérebro e, inclusive, a mente ou a consciência. Damásio (2010) argumenta que estamos habituados a atribuir caraterísticas físicas, como a massa, dimensões ou carga, aos objetos materiais. Na impossibilidade de o fazermos à mente, devido ao seu caráter privado, recusamo- nos a reconhecer a sua natureza física. Com o objetivo de clarificar esta sua posição Damásio (2010) dá como exemplo o movimento da mão: este gesto representa um acontecimento físico no espaço; o cérebro no sentido de se informar do que aconteceu, vai mapear esse gesto; mapear significa criar um padrão neural; um padrão neural, por sua vez, é resultante de uns neurónios, ou circuito de neurónios, se terem ativado e outros não; os neurónios são células, estruturas físicas. Constata- se, deste modo, que o padrão neural, assente na atividade dos neurónios são tão físicos como os objetos ou as ações a que corresponde.

O mesmo acontece com a mente, com os pensamentos e com a consciência. São processos físicos resultantes da atividade de células físicas – neurónios. Só assim se compreende, de acordo com Damásio (2010), que a mente consiga exercer influência em diversos órgãos físicos, de que é exemplo o músculo. Aliás, para Damásio (2004), foi o facto de Descartes retirar à mente qualquer propriedade física, no sentido de a tornar imortal, que o impediu de propor um mecanismo plausível de interações entre o corpo e a mente. Nem a célebre glândula pineal conseguiu suprir essa lacuna. Portanto, para Damásio (2004, 2010) o corpo humano é todo ele, inclusive a mente, matéria, físico. É no entanto importante, termos presente, que é muito diferente o termo “física” na designação educação física, consoante estamos a falar na conceção de corpo de Descartes ou de Damásio. É imprescindível que os professores de educação física tenham esta noção e substituam a conceção de físico de Descartes pela de Damásio. Esta mudança implicará uma profunda alteração quer ao nível conceptual da disciplina, quer ao nível da sua operacionalização: quando se falar em educação física pensar-se-á não numa área dirigida essencialmente ao músculo, mas numa área dirigida à totalidade do homem. Deixará, então de fazer sentido falar em atividades intelectuais e/ou atividades físicas cartesianas. Quando o professor de educação física pensar num exercício,

69 também não o estruturará somente em função do músculo, da resistência ou da força, mas também do cérebro e da mente. Ou seja de um corpo que funciona como um todo.

Contudo, falar em educação física, tendo em conta a conceção de corpo de Damásio, só nos diz que é o corpo todo que participa na atividade. Não nos elucida se estamos a cozinhar, a tocar piano ou a subir escadas. Pires (2001) refere que se olharmos para os programas de educação física o que vemos, em termos substantivos é desporto. O facto de ser este o objeto de estudo da disciplina, enquanto componente de um currículo escolar, é que leva, ainda Pires (2001) a defender que a disciplina de educação física se deveria chamar educação desportiva. E nesta é que faz todo o sentido contemplar a conceção de corpo de Damásio.

b) Outro aspeto importante, e que os professores de educação física, deverão ter em conta, resulta da negação cartesiana de corpo concebida por Damásio (1994, 2000, 2004, 2010): ao determiná-la, ao defender a indissociabilidade do corpo, Damásio também determina a impossibilidade de num exercício separarmos o corpo da mente. Para se perceber melhor aonde queremos chegar atente-se nos seguintes exemplos: um aluno lança, com os braços, repetidamente, uma bola medicinal contra a parede ou um aluno fortalece o quadríceps numa máquina apropriada para o efeito. Estes são exemplos típicos, no âmbito de uma educação física cartesiana, de exercícios dirigidos a uma parte do corpo - músculo.

O que nos diz a conceção de corpo de Damásio, é que mesmo nestes exercícios, que partem de uma conceção mais analítica, é o corpo todo que participa e não somente uma parte. Apesar de exteriormente termos a ilusão que é só o músculo que “trabalha”, Damásio (1994, 2000, 2004, 2010) diz-nos que o cérebro e a mente vão mapear todas as alterações do corpo resultantes das interações com o meio e desencadear respostas. O próprio processo da consciência está presente quer num caso, quer noutro. Ele não distingue se estamos a pontapear uma bola, a martelar um prego ou a ler Vergílio Ferreira. Para o corpo, a bola, o martelo, o prego, e o livro são objetos em interação com o organismo. Ele não tem preconceitos. A sobrevivência é a sua preocupação central, daí responder como um todo perante exercícios analíticos ou exercícios complexos.

Mas se o corpo humano age deste modo perante contextos tão diferentes é pertinente questionar-se o porquê da nossa preocupação de, ao longo desta

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investigação, darmos voz aqueles que contestam os exercícios físicos cartesianos, os exercícios mecânicos, os exercícios estereotipados.

Damásio (1994) refere que ao longo da nossa filogénese e ontogénese, o sucesso da nossa sobrevivência não depende unicamente de caraterísticas inatas. Aliás, se estivéssemos programados exclusivamente a nível genético teríamos respostas padrão independentemente do contexto com o qual interagimos. Imagine-se que perante situações diferentes que requerem soluções diferentes, o nosso corpo responde da mesma maneira. Esta caraterística diminuiria, significativamente, a nossa capacidade de sobrevivência. Não foi este o caminho escolhido pela nossa natureza. O ser humano é dotado, entre outros, de capacidade de aprendizagem, de memória e de criatividade. Estas caraterísticas implicam que o nosso corpo possua uma elevada plasticidade. É desta forma que aprendemos línguas ou outro género de competências que os nossos familiares nunca adquiriram. No entanto, esta capacidade de aprendizagem do ser humano implica que as experiências que tem ao longo da vida não são inócuas. Elas deixam marcas no corpo. Damásio (1994) refere que o perfil de experiências individual tem uma palavra a dizer no design dos circuitos neurais. Inclusive dos circuitos inatos. As sinapses (ligações entre neurónios) que se estabelecem e se reforçam em detrimento de outras que são abandonadas resultam de caraterísticas das interações que temos com o meio. Esta modulação dos neurónios, como refere Damásio (2010), apesar de ser mais notória a nível dos microcircuitos também é sentida a um nível macroanatómico. Portanto, a forma do nosso cérebro também é determinada, em parte, pelas nossas experiências. O que estamos a referir para o cérebro tem, também, analogia com o restante corpo. Repare-se como os futebolistas têm uma forma peculiar de andar ou como os locutores de rádio têm uma forma peculiar de falar.

c) Quando o professor de educação física propõe exercícios físicos cartesianos, exercícios mecânicos ou exercícios estereotipados, requisita no aluno respostas automáticas e sem grande interpretação do contexto. É isso que se passa quando se lança uma bola medicinal contra a parede ou reforçamos o quadríceps numa máquina. Através da prática regular destes exercícios há um reforço dos circuitos neurais responsáveis por estes movimentos. O corpo passa a ter tendência a fazer isto. Cria-se um hábito. Não é portanto surpreendente que, quando um aluno, rotinado neste tipo de exercícios cartesianos está perante um contexto que requeira uma resposta criativa tem tendência para atuar com o hábito que está instalado. É

71 como se o corpo estivesse desequilibrado por um atractor. Observa-se então um movimento desadequado.

Costa (2013) ao falar sobre ações automáticas e ações intencionais e da forma como se passa de uma ação para a outra elucida-nos sobre os efeitos que os exercícios cartesianos podem ter no nosso corpo: em primeiro lugar é relevante referir que as ações feitas de uma forma intencional ou de forma automática requerem circuitos neurais diferentes. Consideremos o toque no botão do elevador para escolher o andar para onde queremos ir: inicialmente esta ação era intencional, mas ao fim de algumas repetições, em dias diferentes, passa a automática. As ações automáticas, como refere Costa (2013), estão associadas a um gânglio de base chamado estriado lateral enquanto as ações intencionais estão associadas em maior grau ao córtex orbito-frontal e a um gânglio da base chamado estriado medial e em menor grau ao estriado lateral. É relevante afirmar que o córtex orbito-frontal projeta terminações nervosas para os dois gânglios da base o que estabelece uma rede de interação entre estas estruturas nervosas.

É pertinente referir que as ações automáticas têm implicações positivas no corpo humano, pois permitem ao cérebro diminuir o gasto energético e concentrar-se em atividades não apreendidas. O problema é quando elas são dominantes e condicionam o aparecimento das ações intencionais. É disso exemplo, como refere Costa (2013), as perturbações obsessivo-compulsivas e as adições (alcoolismo ou dependência de drogas): As pessoas, nestes casos, estão conscientes que estas ações lhes são nocivas mas não as conseguem impedir. Contudo, é na forma como Costa (2013) propõe o tratamento destas patologias que poderemos aprender algo para melhorar o ensino da educação física: convencionalmente os comportamentos repetitivos e as compulsões tratavam-se através da inibição dos respetivos circuitos. Costa (2013) defende que se pode obter bons resultados através do reforço dos circuitos responsáveis pelas ações intencionais.

Damásio (2010) é da mesma opinião e adianta que a nossa constituição biológica leva-nos a consumir, por vezes, o que nos faz mal. Tal facto é agravado pela exploração que as tradições e o lado publicitário fazem deste nosso lado automático. A única forma, para Damásio (2010), de se conseguir ultrapassar este controlo natural que o lado automático tem é criar uma força oposta e muito bem treinada: o dispositivo não-consciente tem de ser treinado pela mente consciente (lado intencional).

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Transpondo este “tratamento” para a área do ensino da educação física é importante ter em conta que o professor deve evitar exercícios físicos cartesianos, mecânicos e estereotipados, pois conduzem ao exacerbamento do lado automático e à instalação de hábitos com pouco ou nenhum valor pedagógico.

Ao constatar-se que o aluno apresenta ações automáticas descontextualizadas, é possível ao professor minimizar ou ultrapassar a situação propondo exercícios que solicitem ações intencionais. Nestes exercícios é pertinente que o aluno seja solicitado a refletir, a decidir constantemente e em situações, mesmo que parecidas, diferentes. Os jogos desportivos, pelas suas caraterísticas de imprevisibilidade, de constante solicitação de decisão e de criatividade, conseguem responder a esses pressupostos e representam um ótimo recurso educativo.

d) Ao longo da sua história, a educação física cartesiana sobrevalorizou constantemente, a componente muscular e as capacidades condicionais, nomeadamente a força e a resistência. Houve, e há, uma necessidade de se prestar atenção ao lado motor. Esta exagerada atenção deriva, como vimos, da obsessão pela objetivação. Só aquilo que vemos é que passa a ser possível de ser quantificado. Mas, se tivermos em conta a filogénese do ser humano, constatamos que a natureza escolheu um caminho muito diferente. Com a intenção de aumentar a adaptação do ser humano ao meio envolvente e deste preservar o maior valor que nós temos, a própria vida, a natureza dotou-o de um cérebro, de uma mente e de uma mente consciente. Não foi pela valorização da hipertrofia muscular nem exclusivamente pela sua função motora que garantimos a sobrevivência nem o nível de desenvolvimento que experimentamos hoje em dia. Para o ser humano estar adaptado a um contexto, significou, em primeiro lugar, percecionar esse contexto. O caminho que a natureza escolheu, promoveu, então, o aparecimento, no ser humano, de um sistema sensorial que captasse as caraterísticas do meio envolvente. Estas caraterísticas vão provocar alterações no corpo que vão ser mapeadas pelo cérebro. Damásio (2004) alerta que as imagens mentais de uma bola ou de um livro são construções de acordo com as capacidades do organismo e não imagens em espelho desses objetos. É o sistema sensorial que vai reproduzir o contexto exterior num contexto interior, através das alterações do corpo. O cérebro só consegue fazer um mapeamento correto do contexto se o sistema sensorial for competente a captar as suas caraterísticas. A resposta motora, sem uma reprodução correta do meio que nos circunda, é “cega”.

73 É crucial que o professor de educação física entenda isto. É um erro sobrevalorizar a resposta motora e subestimar a componente sensorial. Que adianta dar um pontapé forte se a situação pedir um toque subtil. O próprio músculo, como refere Fonseca e Mendes (1988), não é só um órgão motor é, também um órgão sensitivo. Só o messianismo do músculo, caraterístico de uma educação física cartesiana, é que impede esta perceção.

Nas aulas de educação física deve-se, pois, propor exercícios que incrementem a capacidade de percecionar contextos, reflexão, antecipação de situações e a criatividade. Estas são aquisições, na nossa filogénese, que, para além de serem recentes, nos distinguem enquanto seres humanos. Há, pois, que saber aproveitá- las.

e) Para finalizar, mas não tendo a veleidade de esgotar, o conjunto de contributos que resultam da conceção de corpo de Damásio é pertinente salientar que, como vimos ao longo desta investigação, uma das caraterísticas principais da educação física cartesiana é a sua obsessão pela objetividade. Com a finalidade de responder a esta necessidade são eleitos um conjunto de exercícios que requisitam parcelas do corpo. Trata-se, no fundo, de aplicar o segundo preceito, proposto por Descartes (1977): dividir, neste caso o corpo, em tantas parcelas quanto fosse possível para as resolver melhor. É assim que aparece, entre outros, os exercícios específicos da resistência aeróbia, da força rápida e da resistência de força. Outra necessidade, intimamente ligada à objetividade, é a quantificação. Para cada exercício, o aluno tem de atingir um conjunto de objetivos numéricos: número de voltas percorridas; tempo total ou parcial de cada volta; número de abdominais executados, número de flexões executadas; número de passes realizados; densidade motora, etc.. Esta objetividade/quantificação facilita, realmente, a tarefa do professor. É fácil contar o número de passes ou cronometrar a densidade motora. Mas o que nos diz isso acerca da capacidade de aprendizagem do aluno.

Damásio (1994, 2010), para além de refutar a visão parcial do corpo, refere que há processos no organismo humano que são determinantes para a sua sobrevivência mas que são impossíveis de serem observáveis. Dizem respeito a cada ser humano. São do domínio privado. Incluem-se neste âmbito os mapeamentos cerebrais; as imagens mentais; os sentimentos e a subjetividade. Esta, por representar um processo que incluiu todos os outros, é um bom exemplo de um processo privado.

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Damásio (2010) entende que a subjetividade surge no ser humano quando é adicionado um processo do Eu a um processo mental. A partir deste momento surge uma consciência individual. O ser humano sente que é um organismo com necessidades próprias, independentes de outros seres humanos. Encontramos uma situação análoga quando evidenciamos a conceção de Damásio (2004, 2010) relativamente às emoções e aos sentimentos. Enquanto alguns dos primeiros podem ser visíveis, como o corar, os segundos por serem processos mentais, dizem respeito a algo inacessível para terceiros. O surgimento da subjetividade, e dos sentimentos, foram muito importantes para o corpo humano pois permitiram-lhe percecionar, classificar e canalizar conscientemente as suas ações para necessidades específicas do organismo – homeostasia. Damásio (2010) define a homeostasia como o conjunto de condições que asseguram a existência da vida e é ela a principal responsável pelo aparecimento do cérebro, dos sentimentos, da mente e da subjetividade. Existem, para Damásio (2010), dois géneros de homeostasia: uma básica ou automática e outra sociocultural ou reflexiva; a primeira, acompanha-nos há mais tempo e guia as nossas ações para repor necessidades do corpo como a fome e a sede; a segunda deriva do aparecimento de funções neurais mais recentes como a mente e a subjetividade.

Para Damásio (2010), a partir do momento que os cérebros adquiriram determinadas caraterísticas mentais, puderam detetar subjetivamente (conscientemente) necessidades homeostáticas. Com o objetivo de repor o equilíbrio o corpo humano vai, ainda segundo Damásio (2010) inventar a religião, a cultura, as regras morais, o sistema de justiça. Criou-se, pois, um conjunto de referências sociais que educaram, e educam, o nosso comportamento com o objetivo de assegurar a sobrevivência e o bem-estar do corpo humano. Neste âmbito Damásio (2010) dá particular destaque às artes: a música, a dança, a pintura e a escultura surgiram como dispositivos homeostáticos de compensação de desequilíbrios emocionais causados pelo medo, ódio, desejo, etc.. Foi esta a forma que o ser humano encontrou para ultrapassar determinadas instabilidades no seu corpo, ao mesmo tempo que a comunicava aos outros o que é estar triste ou alegre, estar em perigo ou em conforto, estar com dores ou com prazer (Damásio, 2010).

Mas, se as causas das nossas ações, seja na pintura, na música, na literatura ou na medicina, residem, também, em necessidades subjetivas, específicas de cada corpo humano, é expectável admitir que o mesmo se passe na educação física. No decurso de um exercício é importante que o professor perceba que o desempenho

75 do aluno não obedece só a objetivos definidos pelo professor mas é, também, resultante da interação entre esses objetivos e as necessidades homeostáticas do organismo: quando um aluno se encontra diante da baliza, em condições de ter êxito, o sentimento de emoção associado ao contexto vai influenciar a qualidade da sua execução. Se a emoção sentida for de medo poderá influenciar negativamente o desempenho. Mas o medo não é sentido pelo ser humano sempre da mesma maneira. Há uma infinidade de “comprimentos de onda” para o medo ou para as outras emoções, e cada uma pode influenciar de maneira diferente a tomada de decisão. Também não é difícil de admitir que o aluno perante o mesmo contexto, possa experimentar não uma mas várias emoções, o que complexifica em muito a interpretação. E tudo isto tem um lado inacessível (subjetivo) muito significativo.

Correia (1998, p.590 citando Nigel, 1991) apresenta um exemplo pertinente sobre o caráter privado da subjetividade: “Imaginemos um neurologista louco que quer apreender objetivamente o sabor subjetivo da minha experiência de comer chocolate. Se este cientista abrir o meu crânio e olhar para o meu cérebro quando estou a comer um chocolate, verá apenas uma massa cinzenta de neurónios. Se utilizássemos instrumentos de medição sofisticadíssimos, como os atuais scanners cerebrais, detetaria as principais áreas do meu cérebro ativadas pela minha gula. No entanto, desesperado por não encontrar a experiência subjetiva de saborear um chocolate decide, em pleno ato de insanidade mental, lamber o meu cérebro. Provavelmente, diz-nos Nagel, o meu cérebro não lhe saberia a chocolate. Mas, e este é um ponto capital, mesmo que lhe soubesse, o que ele obteria era apenas a sua experiência subjetiva de saborear chocolate que nunca seria a minha.”

É, pois, imprescindível que o professor de educação física entenda que a tomada de decisão no ser humano é complexa e engloba aspetos privados. Esta inacessibilidade deve fazer com que o professor relativize os dados objetivos; desenvolva uma capacidade de perceção (subjetiva) sobre o nível de desempenho dos alunos e abra canais de