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A emergência de interesses de Mercado no regime de Esporte em Sociedade Civil

CAPÍTULO 2. A CONSTRUÇÃO DO REGIME DE FUTEBOL DE ESTADO NO BRASIL

2.2. A emergência de interesses de Mercado no regime de Esporte em Sociedade Civil

Um dos primeiros dirigentes brasileiros a dar-se conta do problema da evasão de jogadores brasileiros para o exterior foi Arnaldo Guinle, importante figura ligada ao Fluminense Football Club (também só “Fluminense” daqui em diante).

Arnaldo Guinle não era um idealista do profissionalismo no futebol, tanto que foi um dos principais idealizadores da exclusão do então campeão Vasco123 (o primeiro a adotar a prática do profissionalismo marrom) do campeonato carioca de 1924 por meio da criação de uma nova entidade para o futebol carioca em 1924, a amadora AMEA.

A principal diretriz das ações de Guinle era sua própria manutenção no comando da direção do esporte brasileiro. Dessa forma, manteve-se firme na amadora AMEA até 1932, quando o comando da entidade passou para as mãos de Rivadávia Meyer, vinculado ao Botafogo.

Rivadávia chegou ao comando da entidade com o apoio de uma série de pequenos clubes, com a promessa de que ampliaria a quantidade de disputantes do Campeonato Carioca de modo a promover a participação de todos. A ideia de inflar a quantidade de participantes do torneio da AMEA, desagradava aos dirigentes dos maiores clubes da cidade, como Fluminense, Flamengo, Vasco da Gama, América, Bangu e São Cristóvão124, pois com esse expediente as médias de arrecadação com bilheteria de jogos tendia a despencar.

Tendo em vista os interesses de seu clube, o Fluminense125, e também seus interesses pessoais, Guinle decidiu juntar seus aliados, abandonar a AMEA e abandonar o regime de Futebol em Sociedade Civil, criando a Liga Carioca de Futebol (LCF), um torneio de futebol com orientação francamente profissionalista.

A LCF, criada por Guinle com o apoio dos outros grandes clubes do Rio de Janeiro, causou uma divisão do futebol carioca no ano de 1933, conhecida como o “dissídio esportivo”. De um lado, reuniram-se Fluminense, Flamengo, América e Vasco com orientação profissionalista; de outro, ficaram Botafogo e uma série de clubes pequenos com orientação amadora.

123 SOUZA, Denaldo Alchorne de. O Brasil entra em campo! – Construções e reconstruções da identidade nacional (1930-1947). São Paulo: Annablume, 2008, p. 42.

124 Cf, Souza, op. cit., p. 43. 125 Cf, Souza, op. cit., p. 43.

O dissídio esportivo escancarou a existência de duas concepções antagônicas e inconciliáveis para o esporte brasileiro: de um lado, os defensores do amadorismo, vinculados a uma concepção de Esporte em Sociedade Civil, advogando a manutenção de uma moral aristocrática nos esportes brasileiros; do outro, os defensores do profissionalismo, mais simpáticos a um modelo de Futebol para Mercado, advogando a legitimidade do uso de dinheiro como forma de montar equipes de futebol mais competitivas.

O ano de 1933 marcou, portanto, o início da batalha entre amadoristas e profissionalistas pelo controle do esporte em nível nacional. O confronto entre ideais amadores e profissionais no futebol é uma metáfora para o conflito entre dois regimes distintos de futebol que se apresentavam: o regime de Futebol em Sociedade Civil, defendido pelos amadoristas, e um regime de Futebol para Mercado ainda incipiente, defendido pelos profissionalistas.

Ao mesmo tempo em que a oposição entre Futebol em Sociedade Civil e Futebol para Mercado estava presente na cabeça dos dirigentes de clubes, a mesma oposição passou a orientar alguns setores da mídia esportiva no início dos anos 1930. Possivelmente o maior expoente dessa oposição pelo lado do Mercado foi o jornalista Mário Filho.

Mário Leite Rodrigues Filho (somente Mário Filho, daqui em diante) nasceu em uma família de jornalistas. Seu pai, Mário Leite Rodrigues (somente Mário Rodrigues, daqui em diante) era o dono do jornal A Crítica, de perfil francamente sensacionalista. Mário Filho dedicava-se à seção esportiva do jornal da família e reproduzia tal perfil à cobertura esportiva de A Crítica, algo bastante incomum no jornalismo esportivo da época.

Durante a campanha presidencial de 1930, A Crítica recebeu recursos publicitários para apoiar o paulista Júlio Prestes contra Getúlio Vargas. Com a vitória da Revolução de 1930, no dia 24 de outubro deste ano, a redação do jornal foi invadida e depredada, e o periódico nunca mais voltou a circular126.

Um ano após a tragédia familiar e profissional sofrida pela família Rodrigues127, Mário Filho começou a trabalhar para Roberto Marinho na página de esportes de O Globo. Marinho contratou Filho consciente de seu ato: estava colocando numa posição de destaque de sua seção de esportes um jornalista cujo principal apelo era o sensacionalismo e o pouco apreço pela

126 Cf. A Crítica. Verbete do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, da Fundação Getúlio Vargas. Disponível em: http://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira- republica/CR%C3%8DTICA.pdf, acesso em 09/10/2015.

127 No início de 1930, publicou-se nas páginas de A Crítica o caso de infidelidade conjugal de Sylvia Serafim Thibau, que, após ter sido exposta, invadiu a redação do jornal armada para matar seu dono. Como ele estava ausente, atirou em Roberto Rodrigues, filho de Mário Rodrigues e irmão de Mário Filho. O assassinato de Roberto lançou Mário Rodrigues na depressão e no alcoolismo, e ele veio a falecer ainda em março daquele ano. O julgamento de Sylvia foi o primeiro do Brasil a ser transmitido ao vivo pelo rádio.

escrita imparcial. Isso ocorreu em maio de 1931. Até então, a seção era comandada por Netto Machado, representante do estilo clássico de jornalismo imparcial, que naquele momento era o mainstream.

Netto Machado era defensor da moral amadorista cara ao regime de Esporte em Sociedade Civil, tal como todos os principais veículos da mídia brasileira até este período. Em sua seção n’O Globo, Netto Machado dedicava mais atenção ao futebol do que a outros esportes, mas enaltecia-o como uma atividade que promovia a sociabilidade entre os sócios de diferentes clubes, num registro aristocrata da prática esportiva frequente nos anos 1910 e 1920.

Conforme as primeiras práticas de Mercado foram sendo deflagradas no futebol carioca, Netto ainda manteve sua linha de destaque aos eventos sociais dos grandes clubes, e em suas reportagens sobre jogos estavam presentes críticas ao mau comportamento de atletas e torcedores, o que muitas vezes era reputado à origem humilde deles. A linguagem utilizada por Netto era livre da terminologia inglesa comum à década de 1910, mas ainda possuía um “tom empolado e laudatório, repleto de maneirismos retóricos de estilo bacharelístico”128.

Mário Filho começou a trabalhar na redação esportiva d’O Globo, no segundo semestre de 1931, e então duas linhas editoriais francamente antagônicas começaram a se digladiar. De um lado, colocava-se129 uma orientação profissionalista e favorável a práticas de Mercado no futebol, cujo representante era Mário Filho; do outro, colocava-se uma orientação amadorista de apologia ao regime de Esporte em Sociedade Civil, cujo representante era Netto Machado. Roberto Marinho, dono do jornal, aparentemente não se importou que duas visões de mundo francamente opostas e incongruentes dividissem meio a meio a seção de esportes d’O Globo, a qual tinha duas páginas: a página 7, de Netto Machado, e a página 8, de Mário Filho. Sensacionalismo e passionalidade de um lado, razoabilidade e imparcialidade do outro.

Machado era abertamente contra análises passionais e distorcidas da realidade. Prezava pela busca da verdade por meio da racionalidade e desprezava o viés que Mário Filho dava ao noticiário esportivo. Por outro lado, o que Mário Filho promovia era exatamente a polêmica, a distorção e o sensacionalismo, elementos que são atrativos para os leitores da seção esportiva de O Globo.

Mário Filho tornou-se uma atração no jornalismo esportivo do jornal de Roberto Marinho. Sua dedicação à construção de histórias grandiosas, aumentadas e não necessariamente conectadas com a realidade era um sucesso de vendas. Ao trazer o público

128 SILVA, Marcelino Rodrigues da. Mil e uma noites de futebol: O Brasil moderno de Mário Filho. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006, p. 101.

consumidor da seção esportiva de A Crítica para O Globo, Mário Filho incorporou um novo público consumidor ao jornal de Roberto Marinho que, como qualquer empresário, queria obter retorno financeiro por meio de sua empresa.

A vitória de Mário Filho sobre Netto Machado nas páginas do d’O Globo se deu, portanto, porque, do ponto de vista do Mercado, o filho de Mário Rodrigues era mais interessante para o jornal do que Netto Machado, que perdeu definitivamente a guerra após pouco mais de seis meses. Ao perceber que a luta contra o ingresso de práticas de Mercado não somente nos clubes de futebol mas também na seção esportiva d’O Globo era perdida, Machado publicou um texto, do qual extraímos o seguinte excerto: “[...] é preciso que a imprensa, que tem consigo o elevado papel orientador, não descambe também para o terreno das paixões adulterando os fatos e descrevendo a seu modo acontecimentos para tomar partido”.130

Saído vitorioso da disputa com Machado, a página 7 d’O Globo foi definitivamente designada a Mário Filho, já em fevereiro de 1932, ao passo que o espaço de Netto Machado foi reduzido a uma seção no meio da página oito, além de duas páginas nas edições de segunda- feira.131

O comando de Mário Filho fez que a seção esportiva de O Globo se diferenciasse de toda a mídia esportiva nacional. Em vez de buscar a informação imparcial – o que fez fracassar Netto Machado –, ele dava espaço a opiniões, emoções e expectativas de atletas e torcedores, detalhes cômicos ou dramáticos dos treinos e dos jogos, às polêmicas que agitavam os bastidores dos clubes e mesmo à vida privada dos jogadores. A partir da influência Mário Filho, O Globo passou a enviar repórteres não só aos jogos, mas também aos treinos dos times, vestiários dos jogos, às casas dos atletas e aos bares e cafés frequentados por eles. A fórmula do sucesso de Filho foi aplicar aos esportes o método agressivo de investigação jornalística, característico de periódicos sensacionalistas132.

Nas antigas análises das atuações de times e atletas, os cronistas buscavam atenuar o clima de conflito, sobrepondo aos interesses e paixões clubísticas um critério imparcial, que deslocava a atenção para valores que deveriam ser compartilhados pelos adversários. Nas páginas dirigidas por Mário Filho, todo o esforço se destinava justamente a estimular a disputa, explorando o caráter conflituoso do esporte e a subjetividade dos personagens esportivos.133

130 O Globo, 07/10/1931, página 7. Apud Silva, op. cit., pp. 103-4. 131 Cf. Silva, op. cit., p. 104.

132 Cf. Silva, op. cit., p. 108. 133 Silva, op. cit., p. 114.

A substituição de Netto Machado por Mário Filho no comando da seção de esportes d’O Globo evidencia que tanto o filho de Mário Rodrigues quanto Roberto Marinho estavam muito mais preocupados com a venda de jornais e a produção de conteúdos que atraíssem o público consumidor do que com a manutenção da moral amadora característica do regime de Esporte em Sociedade Civil. Isso significa que ambos operavam dentro de uma lógica de Mercado.

No início dos anos 1930, o tema mais palpitante no esporte carioca era exatamente o dilema entre profissionalismo e amadorismo no futebol. As polêmicas e as distintas opiniões sobre o tema eram um prato cheio para a abordagem entusiasmada de Mário Filho, que na seção esportiva d’O Globo não possuía nenhum pudor em dar igual ou maior espaço para opiniões pró-profissionalismo em relação a opiniões pró-amadorismo134.

A abertura de Mário Filho em relação à livre defesa da legalização do futebol profissional no Brasil trouxe-lhe a simpatia de uma série de dirigentes que se empenhavam na defesa da mesma causa. Arnaldo Guinle, presidente do Fluminense, foi um dos primeiros dirigentes a aliar-se a Mário Filho. José Bastos Padilha135, presidente do Clube de Regatas do Flamengo (apenas “Flamengo”, daqui em diante) chegou em sequência.

Ao contrário de Guinle, cujas principais motivações davam-se no âmbito pessoal da conquista de poder e comando da direção dos esportes no Brasil, as motivações de Padilha eram majoritariamente clubistas. O profissionalismo entrava na agenda de Padilha não como uma ferramenta para a conquista de poder no âmbito da dirigência do futebol carioca e/ou brasileiro – o que o tornaria um concorrente de Guinle, aliás – mas sim como uma ferramenta para fazer que seu clube ganhasse importância não somente na capital federal, mas em todo o país.

A trajetória de Padilha à frente do Flamengo começou em 1932, quando o clube era referido pela mídia local como o clube da fina flor carioca136. Nesse período o clube passava por uma severa crise financeira, o que gerava instabilidade política interna e uma série de questionamentos em relação à diretoria do clube137. Em janeiro de 1933, houve eleições para a

134 A visão profissionalista era extremamente mal vista no meio esportivo do início dos anos 1930, e poucos eram aqueles que tinham coragem de defendê-la publicamente.

135 Coutinho, op. cit., p. 31.

136 Apud Coutinho, Renato Soares. Um Flamengo grande, um Brasil maior: o clube de Regatas do Flamengo e o imaginário político nacionalista popular (1933-1955). Tese de doutorado. Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2013. P. 31. Apud Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 15/11/1912.

Presidência do Flamengo, e o eleito, Paschoal Segretto Sobrinho, renunciou ao cargo antes mesmo de concluir o primeiro mês de seu mandato devido à falta de recursos em caixa.

Enquanto no Flamengo a política interna pegava fogo, no futebol carioca Arnaldo Guinle estava implodindo a AMEA e criando uma associação na qual a prática de futebol profissional seria permitida, a LCF. Guinle estava plenamente interessado na saída do Flamengo dos quadros da AMEA e em seu ingresso nos quadros da recém-fundada LCF. Dessa forma, foi levado ao Conselho Deliberativo a proposta de ruptura com a AMEA e adesão à LCF. Essa pauta causou grande polêmica na instância deliberativa do clube, que acabou por recusar a troca. Coincidentemente ou não, apenas dois dias depois dessa decisão Segretto Sobrinho anunciou sua renúncia do cargo138, o que deixou uma lacuna na estrutura de poder do clube, que acabou por ser preenchida justamente por José Bastos Padilha.

Padilha, empresário do ramo da litografia, era extremamente bem-relacionado na cidade do Rio de Janeiro. Era, por exemplo, concunhado de Mário Filho, o jornalista esportivo mais prestigioso da cidade. Era também amigo pessoal de Roberto Marinho, o dono do jornal O Globo139. Ao assumir a Presidência do Flamengo, seu primeiro desafio era eliminar as chances de ser defenestrado da mesma forma que Segretto fora. O principal recurso utilizado para conseguir estabilidade política dentro do clube foi apelar a seus contatos fora dele, especialmente no alto escalão de todas as esferas de governo.

Uma das primeiras conquistas de Padilha na presidência do Flamengo foi a doação pública de um terreno na Gávea para a construção de um estádio para o clube, que já não possuía um lugar para jogar desde 1932. O incremento do patrimônio do clube após pouco tempo de mandato e a possibilidade da construção de um campo de futebol próprio foram suficientes para que Padilha obtivesse no Conselho do clube apoio suficiente para aceitar o convite de Guinle e migrar da AMEA para a LCF, a liga profissional, ainda em 1933.

Além da conquista do terreno da Gávea, em 1933, Padilha ainda viabilizou, por meio da ação do interventor Pedro Ernesto, em 1934, um empréstimo para a realização das obras no estádio140. Tendo todas as questões relativas ao futebol equacionadas, em 1935, Padilha conseguiu mais uma doação de terreno por parte do governo Federal: tratava-se de alguns lotes de terra no Morro da Viúva, cuja finalidade seria a construção de uma piscina e de um ginásio poliesportivo para o clube141.

138 Cf. Coutinho, op. cit., p. 61. 139 Cf. Coutinho, op. cit., p. 55. 140 Cf. Coutinho, op. cit., p. 69. 141 Cf. Coutinho, op. cit., p. 69.

Amparado numa série de benesses estatais cedidas a seu clube, Padilha conseguiu em seus três primeiros anos de gestão ampliar e modernizar o clube de modo a fazer com que o número de sócios disparasse de pouco mais de seiscentos, no início de sua gestão, para mais de sete mil142, no início de 1936.

Padilha, homem de rara visão empresarial, enxergou um nicho de mercado totalmente inexplorado no futebol brasileiro: a despeito do rápido crescimento do interesse popular pelo futebol, a Nação que tomava forma nos discursos do presidente Getúlio Vargas ainda não tinha seu clube, já que todos os clubes de futebol existentes até então eram veículos ou para a afirmação de diferentes identidades comunitárias ou para a simples afirmação da distinção social de seus associados.

O projeto de Padilha era dar ao Flamengo uma roupagem popular totalmente distinta da aristocrata que vigorava inquestionada no clube até o começo da década. Em poucas palavras, o projeto do dirigente para o Flamengo era convertê-lo no clube da Nação, exatamente no sentido varguista da palavra.

Padilha foi o homem que se propôs a entregar à população brasileira interessada em futebol, mas até então alijada de uma instituição que a representasse no campo de jogo, um clube para chamar de “seu”. Para conquistar seu novo público-alvo, Padilha precisava fazer que a mensagem do “Flamengo da Nação” chegasse da forma mais simples e contundente possível à maior quantidade de pessoas. É nesse ponto que os interesses de Padilha interseccionaram-se com os de Guinle, os de Roberto Marinho e os de Mário Filho:

José Padilha era, em 1936, o presidente do clube mais rentável da capital nacional – após a explosão do número de sócios, produzida pelas melhorias nas instalações físicas do clube – e tinha em mente tornar seu clube numa máquina de fazer dinheiro, contando para isso com o apoio popular. Mas qual seria o caminho para chegar ao “povo”? – A resposta é simples: um jornal barato, de linguagem popular, cuja pauta básica era o esporte que mais interessava ao povo – o futebol.

Arnaldo Guinle estava interessado em afirmar-se como o mais poderoso dirigente do esporte nacional. Para isso precisaria derrotar toda a estrutura amadora que ainda vigorava no comando do esporte brasileiro em nível nacional. Sendo ele um proponente da ruptura do status quo, necessitava de um meio alternativo à mídia tradicional para defender suas posições pró- profissionalismo no futebol sem restrições e também enfraquecer as posições de seus adversários.

Mário Filho, com sua cobertura diária sobre as atividades dos clubes – inclusive, nos dias sem jogos – criou um público interessado em ver o conflito, a batalha, dentro e fora de campo. Desde A Crítica, nunca esteve preocupado com a imparcialidade. Enquanto os outros jornais esportivos – com exceção de O Globo – olhavam para o futebol como um esporte de cavalheiros, onde a boa educação deveria prevalecer em relação à passionalidade gerada pelo espetáculo, Filho fomentava a emotividade no jogo. O público das páginas esportivas de Filho não era aquele que tradicionalmente consumia jornais na cidade do Rio de Janeiro, mas sim aquele que se interessava pelo esporte como uma expressão das emoções, das subjetividades e das paixões humanas. O jornalista esportivo convidava seus leitores a tomarem parte do dia a dia dos jogadores, dirigentes, das atividades dos clubes, etc.

Por fim, Roberto Marinho, dono d’O Globo, viu as vendas de seu jornal dispararem com a entrada de Mário Filho na editoria de esportes do periódico. O empresário tinha ciência do talento do jovem jornalista e do potencial de vendas que um jornal esportivo dirigido por ele poderia ter em nível nacional.

Os quatro homens mencionados tinham em comum uma agenda de interesses relacionada com o Mercado: os dirigentes Padilha e Guinle eram, por razões distintas, os dois principais advocantes da causa profissinalista no futebol brasileiro. O profissionalismo é, por definição, uma prática de Mercado. Os jornalistas Roberto Marinho e Mário Filho estavam interessados na maior vendagem possível de jornais com vistas à obtenção de lucro e prestígio no mercado editorial nacional.

2.3. O Jornal dos Sports e a defesa de interesses de Mercado no futebol

A intersecção dos interesses dos quatro atores mencionados levou à constituição de um jornal diário que se dedicaria exclusivamente à cobertura esportiva sob a perspectiva profissionalista e parcial, uma junção do estilo editorial de Mário Filho com os interesses de Marinho, Guinle e Padilha143. O Jornal dos Sports (daqui em diante, também somente “JS”), comprado de