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A escola e o desenvolvimento das Funções Psíquicas Superiores

CAPÍTULO 2 AS INTERAÇÕES NA SALA DE AULA: A IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM NO DESENVOLVIMENTO DO

2.3 A escola e o desenvolvimento das Funções Psíquicas Superiores

Para Duarte (1999), um dos campos mais importantes da Teoria Histórico-Cultural em relação à formação do indivíduo é o do trabalho educativo realizado pela escola. Para ele, é de fundamental importância a “apropriação pelo indivíduo, da experiência histórico-social, dos conhecimentos produzidos historicamente já existentes objetivamente no mundo no qual o indivíduo vive.” (1999, p. 91).

Além disso, são fundamentais para o desenvolvimento das funções psíquicas superiores “os processos de aprendizagem conscientemente dirigidos pelo educador [que são] qualitativamente superiores aos processos espontâneos de aprendizagem.” (DUARTE, 1999, p. 91).

Partindo do pressuposto de que o homem é capaz de acumular e transmitir experiências, a idade escolar foi considerada por Vigotski como ótima para a atividade de estudo, principalmente quando o professor leva em conta o que o aluno já sabe e as funções que ainda estão em processo de maturação.

Conforme afirma Elkonin (1987, p. 119), a atividade diretora do período escolar se caracteriza por ser uma etapa em que as atividades escolares mediatizam as relações dos alunos com os adultos (no caso da escola o professor é o adulto que realiza essa mediação). Essa relação permite ao aluno a aquisição de uma grande quantidade de conhecimentos, que sustentam a formação de “forças intelectuais e cognitivas das crianças.” (ELKONIN, 1987, p. 119).

Além disso, o aluno tem a tendência de se sair melhor quando trabalha em colaboração com o professor e os demais alunos da sala. Porém, segundo o pesquisador, existe um parâmetro para essa aprendizagem conjunta: “sempre existe uma determinada distância, estritamente regulada, que determina a divergência entre o trabalho independente e o em cooperação.” (VYGOTSKI, 1993, p. 240). Esse limite é diferente, para os diferentes alunos.

Essa mesma diferença determina então as limitações de um trabalho sempre coletivo em sala de aula, e o trabalho em colaboração tem a característica de permitir à criança a solução de “tarefas que estão mais próximas de seu nível de desenvolvimento.” (VYGOTSKI, 1993 p. 240). Sob esse ângulo, é possível entender duas vias possíveis para o aprendizado e o desenvolvimento:

A maior ou menor possibilidade que tem a criança para passar do que pode fazer por si mesma ao que é capaz de fazer em colaboração constitui o sintoma indicador mais sensível para caracterizar a dinâmica do desenvolvimento e do êxito em sua atividade mental. (VYGOTSKI, 1993, p. 240. Tradução nossa.).

Essas duas vias são determinadas pela existência de uma zona de desenvolvimento real, ou seja, o nível de desenvolvimento já conquistado pela criança, com foco no passado, e a zona de desenvolvimento proximal, com foco no futuro, ou seja, o nível em que a criança realiza hoje com a ajuda do professor aquilo que irá resolver, depois de um tempo, sozinha. (VYGOTSKI, 1993, p. 241).

A existência desses dois níveis de aprendizagem e de desenvolvimento representa um aspecto importante para a prática pedagógica, como nos alerta o próprio Vigotski:

A instrução é válida unicamente quando precede ao desenvolvimento. Então desperta e engendra toda uma série de funções que se achava em estado de maturação e permaneciam na zona de desenvolvimento próximo. Nisso consiste precisamente o papel principal da instrução no desenvolvimento. Nisso se diferencia a instrução da criança do adestramento dos animais [...] A instrução seria totalmente inútil se só pudesse utilizar o que já amadureceu no desenvolvimento, se não se constituísse ela mesma uma fonte de aparecimento de algo novo. (VYGOTSKI, 1993, p. 243. Tradução nossa. Grifos no original.).

O professor em sala de aula uma fonte, um lugar para atuar com os alunos, e os movimentos da interação que ali se realizam representam ou podem representar as

possibilidades dadas de antemão pela ZDP. Sem ser determinante de como atuar, a descoberta da ZDP por Vigotski permite ao professor saber o que é necessário conhecer para poder atuar nessa zona.

Os alunos, como se sabe, estão em diferentes momentos de seu desenvolvimento, e por se tratar, geralmente, de mais de trinta alunos por classe (na escola elementar brasileira), não é fácil para o professor determinar o nível de desenvolvimento de cada um.

Ao professor cabe, então, a tarefa de conhecer os seus alunos e organizar os conteúdos escolares para atingir a ZDP, pois o ensino realizado tendo por base o que o aluno já sabe é, segundo Vigotski, “ineficaz” para o desenvolvimento do ponto de vista do aluno. Tendo como objetivo a atuação na ZDP, o professor deve ter claro que ele é o promotor do desenvolvimento de seus alunos. Uma pergunta surge então: como atuar na ZDP? Outras questões surgem a partir desta: como se dá o acesso ao conhecimento na sala de aula? Como se realizam as interações entre professor e alunos e entre alunos e os outros alunos? Que sentido os conhecimentos têm para os alunos?

Além dessas questões, há outras que estão presentes em todos os momentos de interação na sala de aula, uma vez que as relações mediadas pela linguagem não são estáticas, e tampouco perenes. O processo de ensino e aprendizagem é permeado por tensões resultantes de busca por sentidos ou, ainda, pela falta total deles. No espaço da sala de aula, a produção de sentido depende do conhecimento que cada um tem dos outros, do compartilhamento ou não dos mesmos universos de conhecimento, do pertencimento ou não ao mesmo grupo social. É preciso pensar em crianças em constante mudança e em constante aprendizagem. Na escola, de modo específico, as interações entre professor e alunos representam o adulto e crianças interagindo, mediados por signos.

Vigotski (1935) considera, como já foi citado neste texto, que os significados das palavras têm estruturas diferentes e não coincidem entre adultos e crianças. Então, por não possuírem um sistema de comunicação compatível com o dos adultos, crianças em diferentes idades e em diferentes etapas do seu desenvolvimento reagem de forma diferente em diferentes momentos.