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5. O CICLO DE APRENDIZAGEM EXPANSIVA: UMA ANÁLISE MACRO EM

5.1 QUESTIONAMENTO DA SITUAÇÃO

5.1.3 A estrutura da atividade: suas ações e operações

Como vimos em 3.2, um sistema de atividade se realiza por meio de ações direcionadas a metas que, por sua vez, são implementadas por operações. Assim, a divisão do trabalho dentro do sistema de atividade aula de inglês na escola é percebida por meio das ações de todos os atores que compõem a comunidade da atividade, mas, sobretudo, das ações dos sujeitos protagonistas, ou seja, professora e alunos.

Com o intuito de identificar a metáfora epistemológica que guia o processo ensino- aprendizagem no contexto escolar onde a presente pesquisa foi feita, realizei um levantamento das ações mais comuns no cotidiano das minhas aulas e as classifiquei de acordo com os dois paradigmas sugeridos por Sfard (1998), ou seja, ações orientadas para a transmissão e aquisição de conhecimento e ações orientadas para a aprendizagem participativa e colaborativa.

AÇÕES ORIENTADAS PARA A TRANSMISSÃO E AQUISIÇÃO DE CONHECIMENTO

AÇÕES DO PROFESSOR AÇÕES DOS ALUNOS

- Explicar o conteúdo - Esclarecer dúvidas

- Dar instruções sobre as tarefas de classe ou de casa

- Verificar o entendimento dos alunos - Corrigir as tarefas dos alunos

- Avaliar o aprendizado dos alunos (avaliar se o aluno adquiriu os conteúdos)

- Selecionar o conteúdo e o material didático

- Prestar atenção às explicações do professor

- Copiar as anotações do quadro

- Fazer as tarefas no caderno ou no livro - Corrigir as tarefas de aula ou de casa - Responder às perguntas do professor - Tirar dúvidas

- Fazer avaliações individuais

Quadro 2: Ações do sistema de atividade aulas de inglês na escola, orientadas para a transmissão e aquisição do conhecimento

As ações descritas acima demonstram a relação assimétrica entre professor e alunos, que se engajam em uma relação de dependência, o que não contribui para promover a autonomia do aluno. Além disso, elas também reforçam as ideias de consumo (prestar atenção para assimilar) e reprodução de conhecimento (mostrar na prova o conteúdo assimilado), em um plano de conquista individual.

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AÇÕES ORIENTADAS PARA A APRENDIZAGEM PARTICIPATIVA E COLABORATIVA:

AÇÕES DO PROFESSOR AÇÕES DOS ALUNOS

- planejar atividades para os alunos fazerem em grupo

- pedir a colaboração dos alunos em algumas tarefas da aula

- estimular os alunos a pedirem ajuda - estimular os alunos a ajudar os colegas - oferecer suporte aos alunos com dificuldades

- pedir ajuda aos colegas ou professor - oferecer ajuda aos colegas

- oferecer ajuda ao professor durante as aulas

- fazer projetos/trabalhos em pares ou grupos

- discutir o assunto da aula com os colegas

Quadro 3: Ações do sistema de atividade aulas de inglês, orientadas para a aprendizagem participativa e colaborativa

Essas ações geralmente giram em torno de uma ideia: ajudar e ser ajudado. Elas estão centradas nas interações entre todos os atores envolvidos na aula e não promove a dependência unilateral do aluno em relação ao professor. O trabalho é, portanto mais compartilhado do que dividido e a agência colaborativa do aluno é mobilizada (cf. capítulo 3, seção 3.2.2).

Como vimos no capítulo 3 (seção 3.2), toda atividade é direcionada para satisfazer um motivo, enquanto as ações que a compõem são direcionadas a atingir metas. Para Leontiev (1978), as atividades se realizam através de ações orientadas por metas conscientes. Cabe aqui perguntar: que metas orientam as ações de alunos e professores na sua prática escolar?

Com base na observação da minha própria prática, percebi que as ações mais comuns entre os professores de inglês do contexto observado (nos quais me incluo) se encaixavam dentro do paradigma da aquisição e transmissão de conteúdos. Da mesma foram, a maior parte das ações dos alunos também parecia se encaixar dentro desse paradigma, pois, aparentemente, elas tinham como meta a assimilação daqueles conteúdos para sua reprodução posterior.

No entanto, eu buscava com alguma frequência me engajar em ações mais alinhadas com o paradigma da participação, cuja meta era promover um ambiente mais colaborativo nas turmas e proporcionar aos alunos uma experiência de aprendizado menos individualista.

Penso que as metas que orientavam os alunos a se engajarem espontaneamente nas suas ações colaborativas também estavam associadas a valores que se distinguiam da lógica individualista da cultura escolar.

Vale ressaltar que, embora a colaboração estivesse sempre presente entre os alunos em várias situações dentro da escola, as ações colaborativas voltadas para o aprendizado não pareciam ser muito comuns.

O fato de maior parte das ações dos alunos pertencer ao modelo da aquisição torna-se compreensível, se levarmos em conta que o sistema de atividade aulas de inglês dentro desse contexto é mediado pelas normas culturais de um sistema de atividade maior, ou seja, a própria escola na sua configuração sócio-histórica que, por sua vez, está inserida no contexto educacional do país. Esses dois contextos macro têm contribuído para formar uma cultura escolar baseada no individualismo.

Essa cultura tem implicações no estilo de aprendizagem dos alunos. Por exemplo, em uma consulta formal com três turmas do 9º ano e duas turmas do 1º ano do ensino médio, no início do ano letivo de 2011, para investigar se gostariam de contar com “um parceiro de estudos” durante as aulas (ANEXO 7), 53% dos alunos do ensino médio responderam que preferiam trabalhar sozinhos, pois não precisavam de ajuda e isso geraria muita conversa e atrapalharia o rendimento, como exemplificado nas palavras de dois alunos:

“Não, porque isso atrapalharia a aula, já que isso pode gerar muita conversa.” (depoimento 1, ANEXO 25)

“Não gostaria! Porque eu sei muito bem inglês e consigo entender sozinho. Já faço curso há 8 anos.” (depoimento 2, ANEXO 25)

Já entre os alunos do 9º ano esse percentual foi menor: 34% deles disseram preferir trabalhar sozinhos durante as aulas (ANEXO 7), o que pode nos induzir à conclusão de que os alunos do ensino médio estão mais preocupados com seu desempenho individual devido à proximidade com o vestibular/ENEM. Uma nova consulta, realizada em 2012 com 44 alunos de diferentes turmas do 9º ano, sob a forma de atividade pedagógica na internet (ANEXO 8) mostrou que 76% desses alunos preferiam estudar sozinhos, reforçando a presença da cultura individualista na escola.

Kuutti (1996) explica que as ações de uma atividade são realizadas por operações, entendidas como rotinas habituais bem definidas usadas como respostas às condições encontradas durante a realização da ação. Jonassen e Murphy (1999) afirmam que há uma relação dinâmica entre as ações e as operações, pois:

Inicialmente as operações são ações conscientes com suas fases de orientação e execução. Com o passar do tempo, a fase de orientação é eliminada e a ação se transforma em operação. (JONASSEN & MURPHY, 1999, p.73)

Entre as operações que os professores realizam e que compõem a atividade em questão se encontram atos burocráticos e automatizados, como fazer anotações no diário de classe (notas, chamada etc.) e até práticas docentes automatizadas como “passar dever de casa” ou seguir a sequência didática imposta pelo livro. Vale ressaltar que tais operações somente são entendidas como tal quando não envolvem a consciência. Assim, o ato de “passar dever de casa” pode se constituir em uma ação, se for conscientemente realizado ou uma operação, quando o professor apenas indica as páginas do livro que o aluno deve fazer.

Entre as operações mais comumente observadas entre os alunos durante as aulas podemos dar como exemplo: copiar a matéria e corrigir os exercícios do livro. Na verdade, tudo o que o aluno e o professor fazem em sala de aula de maneira mecânica e sem se apropriar do seu verdadeiro sentido constitui-se em operações.