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Mobilidade Metropolitana e Utilização Energética

1. Energia e urbanização

1.3. A expansão do modelo de desenvolvimento

A partir da associação da indústria petrolífera com a produção de automóveis, o sistema produtivo que foi a base da expansão econômica ame- ricana se deu a partir de um sistema produtivo da indústria automotiva. No começo do século, Henry Ford, um dos pioneiros do setor, substituiu a pro- dução de tipo artesanal, então característica da indústria automobilística, pela produção em massa. Desta forma a indústria conseguiu se tornar, nos EUA e, posteriormente, em âmbito mundial, o setor de maior peso em volume de produto e de valor adicionado. As inovações de Ford visaram a eliminação dos tempos mortos no processo de trabalho a fim de alcançar grande volume de produção a custos baixos (GORENDER, 1997).

Segundo Gorender, dois fatos se destacam na conjuntura imediata do segun- do pós-guerra e que foram decisivos para a expansão do modelo fordista. O primeiro refere-se ao Plano Marshall – instrumento de norte-americanização da

Europa Ocidental. O Plano Marshall teve influência decisiva na aceleração da recuperação dos países europeu-ocidentais. Os Estados Unidos financiaram a prosperidade europeia a fim de que pudessem escoar capitais excedentes e mercadorias exportáveis e barrar a expansão do comunismo. O segundo fato diz respeito à aceitação generalizada da doutrina de Keynes. A adoção do Estado do Bem-Estar Social permitiu a expansão da demanda pela produção em massa característica do fordismo, elevou gradualmente o padrão de vida

dos trabalhadores, ganhou consenso uma política de tipo social-democrata e fortaleceu a Europa Ocidental contra a ameaça comunista.

A partir dos anos 1950 o American way of life acabou sendo exportado am-

plamente, através do cinema, da televisão, da propaganda, da música e do investimento de suas empresas. O automóvel, elemento central deste estilo de vida, se expandiu mundialmente4.

Os EUA viviam uma explosão demográfica e imobiliária que se seguiu ao fim da Guerra. A frota de automóveis norte-americana passou de 49,3 milhões de

4 Na América latina o padrão

fordista de sistema produtivo teve sua inserção ensaiada pela difusão do estilo de vida americano. Gerson Moura (1993) trata da ostensiva campanha de penetração cultural norte-americana no Brasil desencadeada no início dos anos 40 onde o American way of life foi conquistando seu espaço na sociedade brasileira. Era uma estratégia dos EUA de promover a cooperação interamericana e a solidariedade hemisférica, com o intuito de enfrentar o desafio do Eixo na Segunda Guerra. Um dos principais passos foi a criação, em agosto de 1940, de uma superagência de coordenação dos negócios interamericanos, sob a chefia de Nelson Rockefeller (Nelson Aldrich Rockefeller era o segundo filho de John Davison Rockefeller, que fundou a a Standard Oil Company, em 1882.) , chamada Office of the Coordinator of Inter-American Affairs (OCIAA), diretamente vinculada ao Conselho de Defesa Nacional dos Estados Unidos.

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1. Energia e urbanização

unidades no início da década de 50 para 73,8 milhões em seu final, e as casas de subúrbios se espalharam por todo o país, introduzindo métodos fordistas também em sua construção. Foi nesta época que se inicia a consolidação de um estilo disperso de moradia para as classes média e alta nos EUA.

Com seu poder hegemônico a partir do pós-guerra, os EUA puderam deter- minar em grande medida as características da organização e funcionamento do capitalismo nesta sua nova fase. Dentre as características podemos desta- car (SUNKEL, 1981):

• utilização massiva do petróleo como fonte energética, descartando outras fontes;

• crescimento relativamente mais rápido das indústrias mais estreitamente ligadas com esta fonte de energia: a petroquímica, a automotiva, a dos meios de comunicação, a de artefatos eletrodomésticos;

• o aumento na densidade de capital por homem empregado, no tamanho e na concentração geográfica da atividade econômica;

• em geral, o desenvolvimento de tecnologias de uso muito intensivo de energia (petróleo) e capital na construção e nos serviços, assim como na agricultura, caracterizada nesta última sobretudo por fortes insumos químicos.

Até 1974 a energia petrolífera era uma base de produção extraordinariamen- te barata em função principalmente das políticas de preços. Este foi o fator técnico principal que viabilizou a generalização nos países industrializados de um estilo de produção e de consumo, assim como uma organização social que girava em torno da disponibilidade desta energia barata. Este estilo se refletiu em vários processos:

• a predominância do que se chamou de tecnologia de bulldozer, ou de má-

quinas pesadas automotivas (tratores, esteiras, tanques), altamente depen- dente dos combustíveis fosseis e com escassa integração à natureza; • tecnologias que operam em grande escala e possibilitam a dilatação ter-

ritorial;

• artificialização dos produtos, onde se substitui os produtos com uma base natural por produtos com uma base petroquímica.

Entretanto, ao longo de todo o ano de 1950, enquanto a Ford americana pro- duziu 7.000 carros/dia, a indústria japonesa tinha outra realidade. Fundada em 1918, a Toyota Motor Co., no contexto do pós-guerra, produziu apenas 2.685. Nesta época, a Toyota lidava com uma economia japonesa em recessão

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Mobilidade urbana e utilização energética

e devastada pelo conflito mundial. O mercado interno era pequeno e segmen- tado. Este cenário extremamente adverso, exatamente o oposto do vivido naquele momento pelos Estados Unidos, fez com que a empresa buscasse consolidar-se, dando os primeiros contornos do que viria a ser o toyotismo. Em

negociação com o sindicato dos trabalhadores, 25% de sua força de trabalho foi demitida. Para isso, a empresa garantiu aos trabalhadores remanescentes emprego vitalício e aumentos salariais a partir do tempo de serviço. Iniciava- -se então um processo de introdução de novas formas de organização da produção, diferentes da produção fordista americana. Este sistema se conso- lidou sobretudo a partir da Guerra da Coréia, quando a indústria japonesa foi aquecida pelas encomendas militares americanas. Já nos anos 1960, quando a economia japonesa recuperou-se, os automóveis japoneses penetraram o mercado interno americano. Neste mesmo período o próprio fordismo ame-

ricano começaria a dar sinais de fragilidade. A ordem estabelecida pelo New Deal do pós-guerra se esgarça. Assim, todo o quadro da regulação fordista se

altera, quando também as empresas americanas foram, cada vez mais, ado- tando os métodos japoneses, rompendo assim seus compromissos com o sindicato (LIMONCIC, 2001).

Com a ascensão do toyotismo, a nova ofensiva empresarial global, baseada no

princípio da flexibilização, volta a acelerar a economia, rompe os pactos po- líticos e sociais nacionais estabelecidos no pós-guerra. Criam-se núcleos re- duzidos de trabalhadores estáveis e altamente qualificados, circundados por trabalhadores precários aptos a serem desmobilizados com baixos custos sempre que a demanda flutuar.

A partir da década de 1970, e intensificado no final do século, consolida-se um processo que articula internacionalização e flexibilização das economias como elemento da estratégia competitiva dos diferentes países em sua busca por construir vantagens comparativas que atraiam o investimento das grandes empresas. As metrópoles tornam-se espaços privilegiados de acumulação e reprodução desta economia flexível. Inseridas numa rede internacional, pas- sam a sofrer uma gradativa influência destes capitais na sua configuração. Para a América Latina, a criação de espaços urbanos de padrão global segue paralelo ao processo de urbanização precária em regiões não valorizadas por esta lógica econômica. A inserção de lugares e cidades nesta rede global de conexões depende da capacidade de mobilidade de pessoas e informações em um determinado circuito econômico. Assim, a relação entre a urbanização e seu padrão de mobilidade começa a se difundir como eixos estruturantes da metrópole a partir de uma necessidade ou possibilidade de inserção econô- mica das porções urbanas seguindo um mesmo padrão de desenvolvimento, gerado historicamente ao longo do século XX.

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1. Energia e urbanização

A indústria automobilística no século XX era vista como indutora de cresci- mento econômico, por seus efeitos-cascata sobre outros setores da economia. O setor automotivo era percebido como estímulo ao processo de acumulação privada, da mesma forma como as sucessivas febres ferroviárias que assola- ram a Grã-Bretanha a partir da década de 1840, que visavam organizar novas formas de investimento do capital. Apesar de que o mercado nacional britâ- nico já estava em grande medida integrado por sistemas baratos de canais e rios, entre 1830 e 1850 foram construídos mais de 9.650 km de estradas de ferro na Inglaterra.

O estilo de desenvolvimento americano, por sua vez amparado na indústria automobilística e petrolífera, começou a ser fortemente perseguido pelo Bra- sil, e por toda a América Latina, a partir da década de 1950 (SUNKEL, 1981). Já em 2006, o setor automotivo respondeu por 5,4% de todo o PIB brasileiro (Anfavea, 2009). Se considerado apenas o PIB industrial, o setor automotivo chegou a quase um quarto do total, com 22,1% de participação em 2007, um recorde, segundo a Anfavea. Segundo a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), o mês de fevereiro de 2008 foi recor- de em todos os segmentos. As vendas totais de veículos do mês cresceram 33,7% em relação a fevereiro de 2007. O acumulado de veículos (automóveis, comerciais leves, caminhões, ônibus, motos e implementos rodoviários) ven- didos em 2008 atinge o volume de 713.273 unidades, o que reflete um cresci- mento de 32,7% sobre o acumulado do ano anterior, com 537.274 unidades. O modelo de economia industrial destes países que se ancoraram na indústria automotiva internacional e na matriz energética do petróleo se consolida e caracteriza a sociedade de forma generalizada. Esta opção se refletiu nos pro- cessos de produção do espaço urbano e de sua apropriação.