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Mobilidade Metropolitana e Utilização Energética

5. Mobilidade e novas formas de desigualdade

5.1. Igualdade de quê?

Quando falamos de desigualdade ambiental urbana, estamos falando sobre as diferentes condições ambientais resultantes da construção social da cidade. Ambiente é aquilo que está ao entorno do homem, não se trata de condição ecológica, mas da interação entre a sociedade e a base física. E esta relação parte de uma organização social. Assim, a questão ambiental é antes de tudo uma questão social.

Todas as teorias sobre o igualitarismo remetem à necessidade de testemunhar uma consideração igual a todas as pessoas envolvidas: não comprometer a “aceitabilidade social” do projeto (SEN, 2001). E esta aceitabilidade, no caso da nossa abordagem, se refere ao projeto de cidade e o seu padrão de mobili- dade, que resulta num ambiente urbano metropolitano.

A sorte geográfica não pode ser determinante na condição social de uma pessoa. As circunstâncias externas, para o caso do contexto urbano, e não as internas ao indivíduo – que são a todo momento desiguais, devem ser pensa- das para a igualdade. As desigualdades ambientais contribuem negativamente no propósito de uma metrópole que libere as capacidade humanas e possi-

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bilite liberdade para cada indivíduo, no desenvolvimento daquilo que deseja. Mesmo considerando a desigualdade social como a origem dos problemas que vamos tratar neste estudo, a desigualdade que será nosso foco é aquela que se refere às condições ambientais urbanas, tanto pela inviabilidade de tratar todos os sistemas complexos ligados à desigualdade social, como pela compreensão da importância e peso dos assuntos urbanos para as questões ambientais emergentes.

A desigualdade possui diferentes origens, onde podemos classificar teorica- mente em três dimensões distintas (BIRH, 2008):

• A natural • A individual • A social

As diferenças naturais são aquelas relacionadas com a condição biológica, tanto do ser vivo quanto de seu meio, aquelas relacionadas com as caracterís- ticas genéticas e condições geográficas. As diferenças individuais são aquelas relacionadas com as escolhas pessoais, o comportamento e atitudes, gosto e preferências, aptidões etc.

As desigualdades sociais são aquelas produzidas pela sociedade e dentro da sociedade (BIRH, 2008). Bihr salienta em sua teoria sobre os sistemas de desigualdade que a s causas dos sistemas de desigualdade social se amparam na estrutura:

• Regime de propriedade dos meios de produção; • Divisão social do trabalho;

• Estrutura do poder político.

A desigualdade social tem ainda a característica de amenizar ou agravar as diferenças individuais e naturais entre as pessoas ou territórios, sendo afetada e afetando as várias dimensões da desigualdade. Muitas diferenças individuais podem ser geradas no contexto social. Da mesma forma, muitas diferenças naturais podem corresponder a uma desigualdade social. A separação das di- ferenças entre as três dimensões é um recurso teórico para a compreensão da inter-relação entre os três contextos e a desigualdade.

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Da identificação destas dimensões, para a proposta de igualdade em alguns aspectos, estamos igualmente aceitando a desigualdade em outros aspectos. Assim, quando falamos de igualdade das condições ambientais resultantes do padrão de mobilidade estamos induzindo a uma aceitação da desigualdade das regiões naturais, dos estilos de vida, das origens culturais e étnicas, e das condições físicas individuais. Assim, a igualdade social requer a aceitação das desigualdades individuais e naturais.

A principal característica relacionada com a desigualdade social é a distribui- ção dos recursos produzidos socialmente e dos seus custos. Os recursos po- dem ser identificados nas dimensões (BIHR, 2008):

• a dimensão do ter: a distribuição dos recursos materiais;

• a dimensão do poder: distribuição dos recursos sociais e políticos e da capacidade de defender seus direitos;

• a dimensão do saber: distribuição da capacidade de elaborar conhecimen- to e dar sentido ao mundo, de legitimar definições e práticas.

Desigualdade Natural

Figura 5.01 Dimensões da desigualdade Fonte: BIHR (2008)

Desigualdade Individual Desigualdade Social

PODER

Distribuição de recursos sociais e políticos: • poder;

• capacidade de defender seus direitos; • capacidade de influenciar na organização social;

• influenciar na história da sociedade. TER

Distribuição de recursos materiais da sociedade

SABER

Distribuição das matrizes do saber: • capacidade de elaborar conhecimento;

• capacidade de dar sentido ao mundo; • capacidade de influenciar na organização social;

• capacidade de impor definições de coisas, situações e práticas. Figura 5.02

Corelação das dimensões da desigualade Fonte: elaboração própria.

características genéticas • condições fisiológicas • condições geográficas • etc. características psicológicas • atitudes • preferências características sociais • regime de propriedade

dos meios de produção • divisão social do trabalho • estrutura do poder

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Estas dimensões estão fortemente correlacionadas entre si, onde uma desi- gualdade de recursos agrava a desigualdade de defender seus direitos e tam- bém sua capacidade de elaborar conhecimento. Da mesma forma, uma forte desigualdade na dimensão do saber pode levar a uma desigualdade na dimen- são do ter e do poder.

Os custos sociais distribuídos podem ser de diversas naturezas, das quais po- demos citar principalmente:

• O tempo social: o tempo gasto para a reprodução da vida social, como o trabalho, o tempo para a organização de grupos, etc.;

• A segurança: os riscos externos e à saúde individual em que são exaustos grupos ou indivíduos;

• A degradação ambiental: a destruição de condições naturais de vida e de reprodução da vida;

• A destruição de valores culturais: a destruição das condições culturais da organização e reprodução da vida humana.

Todos estes custos, distribuídos de forma desigual, contribuem da mesma forma para aumentar a desigualdade nas várias dimensões. A desigualdade so- cial é um sistema, que envolve e interfere em várias dimensões da vida social. Desta perspectiva, os estudos sobre a desigualdade na mobilidade urbana partem de uma abordagem crítica sobre as leituras técnicas (ou tecnicistas) sobre ambientes urbanos ou ecologia urbana de um lado, e de outro a leitura qualitativa do padrão de mobilidade das metrópoles dispersas, considerando o ambiente urbano como uma construção social e um sistema complexo entre as características materiais e sociais.

Nas pesquisas sobre a desigualdade na mobilidade cotidiana, a compreensão metodológica parte da noção de que esta característica faz parte por sua vez de um sistema de desigualdades.

Desigualdade na Mobilidade • A quantidade de espaço e tempo requerida (a quantidade de tempo individual e social empregado para a mobilidade, ou seja, energia social, trabalho social); • A quantidade de energia e matéria empregada; • A quantidade de resíduo e impacto gerado. AMBIENTE URBANO TRABALHO/ RENDA MORADIA DESLOCAMENTO/ TRANSPORTE Figura 5.03 Desigualdade na mobilidade Fonte: elaboralçao própria.

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