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1.4. A questão da participação

1.5.3. A extensão universitária em cursos de Educação Física: da ação

Por sua própria natureza, o espaço universitário pressupõe diversas possibilidades de atividades; a extensão é uma delas, que, a partir de sua institucionalização enquanto prática curricular materializa a possibilidade imperiosa de se extrapolar os limites e mesmo a compreensão tradicional de sala de aula circunscrita a um espaço físico, imprimindo um novo sentido ao processo ensino-aprendizagem, diferente deste realizado majoritariamente com essa antiquada e limitada referência e concepção espacial.

No caso da formação profissional em Educação física, a extensão universitária pode ser entendida e utilizada em sua vasta gama de

possibilidade, diferentemente do que ocorre tradicionalmente que tem como marca a oferta das limitadas escolinhas esportivas, como se fossem essas a únicas possibilidades existentes. Esse cenário se amplia com o avanço das discussões no Brasil sobre a questão da pessoa com deficiência e do idoso, por exemplo, agregando ao tradicional repertório o atendimento a essa clientela, majoritariamente referenciado no modelo das escolinhas esportivas e estas, por sua vez, tendo como referência o esporte de rendimento, em patente incongruência com o que define o Plano Nacional de Extensão, onde é possível perceber o ampliado leque de possibilidades e o alargamento da compreensão da ação extensionista.

Como destaca o documento, “Esse tipo de extensão - que vai além de sua compreensão tradicional de disseminação de conhecimentos (cursos, conferências, seminários), prestação de serviços (assistências, assessorias e consultorias) e difusão cultural (realização de eventos ou produtos artísticos e culturais) - já apontava para uma concepção de universidade em que a relação com a população passava a ser encarada como a oxigenação necessária à vida acadêmica”.

Dentro desses balizamentos, afirma o documento do Fórum, “a produção do conhecimento, via extensão, se faria na troca de saberes sistematizados, acadêmico e popular, tendo como consequência a democratização do conhecimento, a participação efetiva da comunidade na atuação da universidade e uma produção resultante do confronto com a realidade”.

Essa perspectiva pode ser uma importante estratégia nos cursos de Educação Física visando à melhoria na formação dos graduandos, algo realçado no Projeto Santo Amaro, alvo de nossa investigação nesse trabalho.

Para o Fórum, “A Extensão é uma via de mão-dupla, com trânsito assegurado à comunidade acadêmica, que encontrará, na sociedade, a oportunidade de elaboração da práxis de um conhecimento acadêmico. No

retorno à Universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à reflexão teórica, será acrescido àquele conhecimento”.

Esse fluxo, que estabelece a troca de saberes sistematizados, acadêmico e popular, terá como consequências a produção do conhecimento resultante do confronto com a realidade brasileira e regional, a democratização do conhecimento acadêmico e a participação efetiva da comunidade na atuação da Universidade. Portanto, não se trata mais de um simples ato de oferecer a possibilidade de a comunidade participar de escolinhas esportivas; a ação extensionista coloca-se como uma grande oportunidade de reflexão e de aprimoramento da prática pedagógica docente e de laboratório de vivências, reflexões e produção do conhecimento.

Nesse particular, pode-se, mais uma vez, destacar os argumentos expressos no Plano Nacional de Extensão ao referir-se à pesquisa quando esta assume interesse especial na possibilidade de produção de conhecimento na interface universidade/comunidade, priorizando as metodologias participativas e favorecendo o diálogo entre categorias utilizadas por pesquisados e pesquisadores, visando à criação e recriação de conhecimentos possibilitadores de transformações sociais, em que a questão central será identificar o que deve ser pesquisado e para quais fins e interesses se buscam novos conhecimentos.

A questão fundamental extrapola a visão tradicional de formação profissional e enxerga o campo da extensão enquanto possibilidade de formação de um outro matiz de profissional: o profissional cidadão.

Para o Fórum, tem-se hoje como princípio que, para a formação do profissional cidadão, é imprescindível sua efetiva interação com a sociedade, seja para se situar historicamente, para se identificar culturalmente e/ou para referenciar sua formação técnica com os problemas que um dia terá de enfrentar.

Nesse sentido, defende o Fórum no Plano Nacional de Extensão, a extensão, entendida como prática acadêmica que interliga a universidade nas suas atividades de ensino e de pesquisa com as demandas da maioria da população, possibilita essa formação do profissional cidadão e se credencia cada vez mais junto à sociedade como espaço privilegiado de produção do conhecimento significativo para a superação das desigualdades sociais existentes.

Nas palavras de Boaventura de Souza Santos (1997), numa sociedade cuja quantidade e qualidade de vida assenta em configurações cada vez mais complexas de saberes, a legitimidade da universidade só será cumprida quando as atividades, hoje ditas de extensão, se aprofundarem tanto que desapareçam enquanto tais e passem a ser parte integrante das atividades de investigação e de ensino.

O desafio, portanto, no âmbito da Educação Física, como em outras áreas, é um desafio hodierno, que impõe aos profissionais da área e, mais especificamente às instituições formadoras, à necessidade de permanente debate, visando o aprimoramento conceitual e estratégico.

No campo da extensão universitária torna-se necessário extrapolar a prática tradicional, notadamente vinculada a uma compreensão limitada desse campo de atuação, na maioria das vezes, resumido a realização de cursos de curta duração, assessorias e consultorias.

Em nossa percepção, a alternativa de qualidade que se impõe está relacionada à construção de uma extensão universitária fortemente caracterizada pelo seu caráter acadêmico e comprometido com a busca da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e a articulação destes com as demandas sociais.

Não é demais lembrar, destaca Moreira (1999), que é este desenho da extensão que faz com que a intervenção social da universidade seja estrutu-

ralmente diferente da intervenção dos demais órgãos públicos. Esses têm como objetivo a prestação de um serviço específico à população, sendo julgados pela eficiência com que executam as suas ações. Já a ação da universidade, ainda que busque a eficiência, não pode a ela se restringir. Pois o que deve caracterizá-la não é a ação pela ação, mas esta enquanto mediadora de uma interlocução, fonte de um conhecimento novo que carregue a marca da mudança e da transformação. É nesse diálogo permanente com a sociedade, mediado pela ação, que a universidade encontrará a sua legitimação.

Para esse autor, a extensão universitária, ao favorecer aos jovens estudantes e aos professores a possibilidade de um contato crítico e reflexivo com a realidade, constitui-se em um elemento fundamental no processo de formação para a cidadania que irá permitir mais do que a formação de um pensamento contestatório e libertário, pois ensejará o engajamento efetivo na contestação das estruturas injustas e na ação solidária pela sua transformação.