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Da década de 80 ao início da década de 90, ocorrem profundas mudanças na configuração política mundial. No contexto da América Latina, assiste-se a queda de quase a totalidade dos regimes autoritários. Já na Europa o destaque é a desintegração do chamado bloco socialista.

Em que pese às profundas diferenças entre esses dois contextos e os respectivos processos desencadeadores de tais mudanças, um elemento central da questão que os aproxima, ao mesmo tempo em que os desafia é o papel do Estado nessa nova configuração.

São muitas as alternativas teóricas de interpretação da crise de modelo de Estado, seja no campo econômico, político ou sociológico, o que ilustra fortemente a complexidade do desafio da tarefa de análise, especialmente ao se explorar os vínculos existentes entre mudanças políticas e econômicas e as relações entre Estado e sociedade. Wilheim (2001, p. 20), defende a necessidade de se colocar o problema das reformas em perspectiva histórica. Segundo ele, “é mais fácil traçar o seu passado e descrever os fenômenos, sejam de ajustes, sejam de descontinuidade e ruptura, que caracterizam o atual momento, do que lançar hipóteses alternativas para o futuro. Para esse autor, o esgotamento das ideologias que permearam o século XX, a decepção pelo fracasso do planejamento estatal soviético, considerado durante certo tempo sinônimo de socialismo, e o acúmulo e entrelaçamento de inovações em todos os campos de nossa vida cotidiana substituem as diversas “certezas” de ontem pela perplexidade e insegurança de hoje, quanto ao futuro. Sola (1999, p. 25), argumenta que quando se tem o Estado por um dos protagonistas centrais de um processo de transformação, envolvendo seu modo de relação com a sociedade, está-se diante de uma questão que é política por excelência. Nesse sentido, defende que é relevante, portanto, responder preliminarmente à seguinte pergunta: de que forma a(s) crise(s) incidiu (ram) sobre o Estado e sobre seu modo de relação com a sociedade? Por outro lado,

compreensão de Estado como entidade autônoma, desvinculada das múltiplas relações com a sociedade. Para Sola (1999, p. 26), “Estado e sociedade são considerados lócus privilegiados, onde predominam determinadas configurações de atores, integrados por diferentes arenas decisórias, nas quais se observam diferentes estratégias para definir/alterar o processo de formação das políticas públicas”. O Estado, ainda segundo Sola (1999, p. 26), age através de grupos humanos (agentes fiduciários) que tem a capacidade de agir em nome do Estado, ou porque foram autorizados a tanto por regras, ou por sua apropriação de fato dos símbolos do Estado (ou por uma mistura de ambos).

Para compreender a crise de Estado impõe-se a necessidade de uma perspectiva de análise ampla que extrapole as explicações a partir de aspectos isolados da crise, como por exemplo, a crise fiscal do Estado ou a crise do modo de gestão. O foco político, portanto mais amplo, aponta para a necessidade de se deslocar a análise, situando a problemática, segundo Sola (1999, p.26), em termos da crise de legitimação do Estado, da qual, tanto a crise fiscal quanto a crise no modo de intervenção do Estado na economia e na sociedade são as dimensões econômica e socialmente relevantes.

Na perspectiva de análise de Sola (1999, p. 26) o problema não se esgota aí. É necessário determinar as características distintas da crise de legitimação de que se fala, pois essa categoria abstrata é válida para identificar tanto as crises do welfare-state na Europa ou mesmo nos Estados Unidos, como as crises políticas que antecederam a instauração de regimes autoritários, no Brasil em 1964 ou no Chile em 1973. Para essa autora, a nota específica que, em termos comparativos, permite singularizar as conjunturas críticas que sucederam desde a crise da dívida externa de 1982 – e que ao mesmo tempo as unifica - consiste na articulação simultânea de três dimensões, distintas (apenas) analiticamente. São elas: 1. a crise de legitimação de um tipo de Estado característico de um capitalismo incompleto, desigual e combinado; 2. a crise de Estado como efetividade da lei; 3. a crise do Estado enquanto estado nacional.

A primeira dimensão é, segundo Sola (1999, p. 27), histórica e cultural. Trata-se de crise de legitimação de um certo tipo de Estado, ou seja, das formas que esse assumiu historicamente, enquanto ator constitutivo do processo de acumulação capitalista e de uma ordem social estabelecida nos quadros de um capitalismo que, além de periférico era (e ainda é) incompleto e internamente desigual, no que se refere aos níveis de desenvolvimento e, portanto de diversificação estrutural.

Do ponto de vista cronológico esse momento do capitalismo variou em cada país da América Latina, tendo no Brasil se configurado no início da década de 1930. As formas assumem contornos variados em função da natureza e do alcance das estratégias utilizadas em cada país, particularmente no que se refere à regulação da ordem social na perspectiva da formatação de um Estado nacional.

É contra esse pano de fundo que se torna inteligível o caráter transformador da mudança de regime político na década de 1980, em particular, a adesão (pelo menos nominalmente) aos princípios que regem um tipo de democracia de cepa liberal, a democracia representativa. Segundo Sola (1999, p. 27), a importância do estado de direito, do pluralismo político, das regras processuais que devem reger as formas de interação política; e, sobretudo, do sistema de representação do qual o sistema partidário passou a ser o canal efetivo de reestruturação das relações entre Estado e sociedade, correspondem a uma verdadeira transformação na agenda de mudança dos setores democráticos na América Latina.

A segunda dimensão apontada, ou seja, a crise de Estado como efetividade da lei, está relacionada à incapacidade ou insuficiência do Estado na América Latina, enquanto estado democrático. Ou como afirma Sola (1999, p. 29), em sua capacidade de exercer sua autoridade política, de modo a garantir a efetividade da lei, universal e equitativamente, por todo o território sob sua jurisdição.

fato histórico e tradicional na região, inclusive anterior às ditaduras aqui implantadas. Referimo-nos, não somente a vivência de igualdade política entre os cidadãos, mas, sobretudo, a capacidade de o Estado agir como mediador e garantidor dos direitos civis, o que, Sola (1999, p. 30), destaca como uma conexão entre déficit de democracia e déficit de cidadania, no que diz respeito às condições que definem a responsabilização (política, ética, legal) seja do cidadão, seja do Estado.

Quanto à terceira dimensão, a crise de legitimação do Estado enquanto Estado nacional, está relacionada, como afirma Sola (1999, p. 31), a transformação das funções, da estrutura e das capacidades governativas do Estado, o que representa uma ruptura de época que tem sido abordada de um ponto de vista que privilegia as forças estruturais de mudança, como os processos de integração econômica, financeira e tecnológica.

Nesse sentido, argumenta a autora, a análise de seu impacto na estrutura, na morfologia e nos padrões de vida das sociedades envolvidas abrem espaço para uma revisão da própria teoria social. (idem, p. 32). É possível afirmar que as relações entre Estado e sociedade passam por profundas transformações, sem precedentes na história, o que impacta substancialmente a ordem política, notadamente pela expansão da democracia em escala global.

As democratizações, afirma Sola (1999, p. 32), desenvolveram-se em contextos de profunda crise econômica, da qual a crise fiscal do Estado e do modo de intervenção deste na economia e na sociedade são dimensões mais importantes. Essa modalidade de crise está na raiz do processo de liberalização do regime econômico e tem sido objeto de extensa literatura. No entanto, o fato de que as reformas econômicas orientadas para o mercado tenham sido iniciadas e eventualmente levadas a cabo nessas condições e, sobretudo, a partir de uma ordem social previamente centrada no Estado, tem implicações para a trajetória de mudança.

Esse cenário conduz à necessidade de ampliação da análise conjuntural do que se convencionou chamar de ruptura de época4 provocada pela globalização5 e seus impactos, em especial no que se refere à maior fluidez das fronteiras nacionais, onde, tradicionalmente, se afirmava e se legitima o exercício da autoridade política.

Para Sola (1999), não se trata apenas de suas funções como garantia última da ordem social, mas seu papel histórico, como princípio de coesão social por excelência. Sobretudo onde as dimensões do território, as disparidades sociais e a incorporação apenas parcial das massas aos sistemas

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Bruseke (2007), argumenta que, “Um clima de crise teórica espalhou-se desde o final dos anos de 1970, cujas causas uns detectaram na "incredulidade nas metanarrativas" (Lyotard, 1979), outros na "crise do marxismo" (Althusser, 1978), outros simplesmente na "mudança paradigmática". Paralelamente foram constatados o "fim da história", o "fim da utopia" e o "fim do comunismo", a ponto de Robert Kurz exclamar: "nunca houve tanto fim!" (Fukuyama, 1992; Kurz, 1991). Estas afirmações, por vezes com uma existência passageira, por vezes em circulação até hoje, estão intimamente interligadas com eventos históricos das últimas três décadas. O mais marcante para as ciências sociais não foi o "colapso da modernização", título do livro publicado em 1991 por Robert Kurz, mas o colapso da União Soviética, no mesmo ano. Já desde a publicação de Lyotard sobre a "condição pós-moderna", em 1979, surgiram inúmeras publicações que levantaram, de uma forma ou de outra, a hipótese de que a formação sociohistórica contemporânea não seria mais compreensível se ela fosse entendida exclusivamente como sociedade moderna. Surgiu uma variedade de conceitos que tentaram transmitir a emergência de algo novo, algo tão radicalmente novo que legitimaria falar até de uma

ruptura de época, como sugere a postulação da emergência de uma "pósmodernidade". (Grifo nosso). 5 Para Ianni (1998), “A globalização do mundo pode ser vista como um processo histórico-social de

vastas proporções, abalando mais ou menos drasticamente os quadros sociais e mentais de referência de indivíduos e coletividades. Rompe e recria o mapa do mundo, inaugurando outros processos, outras estruturas e outras formas de sociabilidade, que se articulam ou impõem aos povos, tribos, nações e nacionalidades. Muito do que parecia estabelecido em termos de conceitos, categorias ou interpretações, relativos aos mais diversos aspectos da realidade social, parece perder significado, tornar-se anacrônico ou adquirir outros sentidos. Os territórios e as fronteiras, os regimes políticos e os estilos de vida, as culturas e as civilizações parecem mesclar-se, tencionar-se e dinamizar-se em outras modalidades, direções ou possibilidades. As coisas, as gentes e as ideias movem-se em múltiplas direções, desenraizam-se, tornam-se volantes ou simplesmente desterritorializam-se. Alteram-se as sensações e as noções de próximo e distante, lento e rápido, instantâneo e ubíquo, passado e presente, atual e remoto, visível e invisível, singular e universal. Está em curso a gênese de uma nova totalidade histórico-social, abarroando a geografia, a ecologia e a demografia, assim como a economia, a política e a cultura. As religiões universais, tais como o budismo, o taoismo, o cristianismo e o islamismo, tornam- se universais também como realidades histórico-culturais. O imaginário de indivíduos e coletividades,

econômico e político poderiam facilitar a ação das forças centrífugas, como é o caso do Brasil6.

Importa ressaltar, ainda, como afirma Sola (1999, p. 33), que a incerteza associada ao enfraquecimento do Estado, de suas capacidades governativas e de proteção social tem, por isso, características distintivas, afetando também os critérios pelos quais suas funções são legitimadas.

Para Melo (1999, p. 13) A grande transformação – para recorrer a uma linguagem Polanyana, a que se assiste nas duas últimas décadas do século XX, está associada ao ocaso do estado intervencionista, nas várias formas que ele assumiu: estado Keynesiano, estado de bem-estar social, estado desenvolvimentista. Assiste-se efetivamente ao trunfo de uma nova ordem liberal. Para esse autor, a reforma do Estado, na América Latina – convertida em laboratório de experimentos de inspiração neoliberal – e, particularmente no Brasil, inscreve-se nesse duplo movimento de redefinição do papel do estado na economia e de reconversão das bases de intervenção deste na esfera social.

O surgimento dos primeiros e significativos exemplos de estados neoliberais ocorre no final da década de 70. Na Inglaterra, em 1979, com a eleição de Margareth Thatcher para liderar a Inglaterra como Primeira-Ministra; Nos Estados Unidos Ronald Reagan, assume, um ano depois, movido pelo mesmo discurso; Helmut Khol, em 1982, assume o poder na Alemanha, derrotando o regime social liberal, baseando suas propostas de governo por linhas ideologicamente neoliberais.

Nesse ritmo, o neoliberalismo, espalha-se por toda Europa Ocidental e América do Norte assumindo importância cada vez maior como tendência ideológica.

No Brasil, a chegada ao poder do presidente Fernando Collor de Melo em 1989, materializa em nosso ambiente as teses neoliberais, fortalecidas no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), onde essas tomam maior

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Diferentemente dos Estados Unidos, por exemplo, onde prevaleceu o mercado como princípio de coesão e secundariamente a comunidade local (Sola, 1999, p.33).

substância, especialmente pelo caráter formulador da equipe daquele governo, constituída, em boa parte, por intelectuais, oriundos de partidos de esquerda e centro-esquerda.

Para Sader (2007, p. 152), o primeiro projeto neoliberal coerente foi posto em prática no Brasil por Fernando Collor de Melo, eleito em 1989, mas deposto pelo Congresso por corrupção, em 1992, deixando interrompido o processo de abertura da economia, de privatização, de diminuição do tamanho do Estado e de desregulação econômica – pilares do Consenso de Washington.

No caso de Fernando Henrique Cardoso, analisa Sader (2007, p. 151), A promessa que galvanizou a maioria dos eleitores brasileiros, permitindo a eleição e reeleição de Fernando Henrique Cardoso nos primeiros turnos das eleições presidenciais de 1994 e 1998, respectivamente, era de que a estabilidade monetária – como resultado do combate à inflação, definido como objetivo prioritário do país – abriria as portas do Brasil para a retomada do desenvolvimento econômico interrompido uma década antes, para a chegada de investimentos estrangeiros portadores da modernidade tecnológica, para a geração de empregos, para uma política de redistribuição de renda – terminando com a inflação, definida como “um imposto contra os pobres” – e, finalmente, para o acesso do país ao primeiro mundo.

No plano concreto, não foi isso o que se observou. Segundo Sader (2007, p. 151), a crise financeira com que terminou o governo Fernando Henrique Cardoso, levando-o a dois sucessivos empréstimos do Fundo Monetário Internacional, apenas no seu último ano de governo – um de 10 bilhões e outro de 30 bilhões de dólares -, simplesmente para garantir que o país não recaísse numa crise similar à argentina, revela como aquelas promessas se demonstraram falsas e as transformações operadas no Brasil foram de outra ordem.

De uma maneira geral, as ações desenvolvidas por governos neoliberais apresentaram como consequências mais marcantes, como frutos de suas políticas de ajuste, em quase todos os países, a ampliação das diferenças

desigualdades nas condições de renda e o incremento substancial da pobreza. O desemprego e o subemprego tornam-se elemento principal da paisagem, o que pode ser observado pelo grande aumento desse índice nesses países entre as décadas de 70 e 80. Em 1974, o economista Edmar Bacha, um membro destacado da intelectualidade ligada ao presidente Fernando Henrique Cardoso, cunha a frase muito difundida no país, "O Brasil é uma Belíndia", para descreve os grandes contrastes vividos no país. Compara Brasil a uma junção entre Bélgica e Índia. De um lado, o Brasil é uma nova potência. Conseguiu conter o crescimento populacional (menos filhos, melhor qualidade de vida e reduziu a mortalidade infantil). Inflação sob controle, escola para 95% das famílias, (nesse item, sem questionar a qualidade da escola), uma agroindústria produtiva e competitiva, em alguns casos, a mais eficiente do mundo, fabrica aviões a jato, é autossuficiente em produção de petróleo e referência mundial em exploração de poços de petróleo em grandes profundidades, o que implica um domínio de tecnologias avançadas. Nesse sentido é á Bélgica, uma pequena, rica e desenvolvida nação europeia. Por outro lado e, ao mesmo tempo, possui os maiores índices de criminalidade, graves problemas relacionados aos direitos humanos, índices de saneamento básico inexpressivos, malha rodoviária em estado calamitoso, saúde pública caótica, qualidade educacional das piores do mundo, enorme e crescente déficit previdenciário, exploração predatória de recursos naturais, ineficiência dos serviços públicos de uma maneira geral e os juros mais elevados do mundo. Nesse sentido é a Índia, um imenso, mas pobre subcontinente.

O dito “sucesso” alcançado pelo modelo neoliberal, pode ser compreendido como, no máximo, uma pseudo-vitória, principalmente pelo fato de o mote principal da proposta teórica alardeada em todos os discursos: a retomada de altas taxas de crescimento estáveis e a reanimação do capitalismo avançado, não ocorre.

Como explicar, então, a incongruência entre a proposta e seus resultados práticos? Boa parte dos analistas aponta para alguns elementos principais. Em primeiro lugar, o aumento do lucro das empresas que, por seu turno, não é

convertido em investimentos em infraestrutura produtiva. 7 Não se pode deixar de destacar que um dos pilares mais apregoados pela proposta neoliberal é a desregulamentação das atividades econômicas e sociais pelo Estado, baseada na superioridade da eficiência do mercado em relação ao burocratismo do Estado8.

Outros elementos a serem destacados são o desvio crescente de recursos para a especulação, que acrescenta ao modelo ares de loteria e, somando-se a isso e impondo-lhe, talvez, sua face mais cruel, pelo menos na percepção cotidiana da população mais pobre, a incapacidade crescente de absorção de mão-de-obra, o que, em última análise, torna impossível a elevação e até mesmo a manutenção do ritmo de crescimento. Em outras palavras, diferentemente da retórica que lhe dá sustentação, o modelo neoliberal, na prática, não demonstra ser o melhor caminho para se chegar a um Estado mais democrático e mais justo. O que se observa é a exacerbação de problemas sociais, obviamente já conhecidos, porém, assumindo proporções de calamidade, absolutamente distante do proposto pelo modelo, a saber: desigualdade exacerbada de renda, o que leva a desníveis sociais cada vez mais acentuados; aumento vertiginoso das taxas de desemprego, o que leva a uma convulsão social e ao incremento dos níveis de miserabilidade urbana.

7 Na verdade, o discurso do empresariado é de que é papel do Estado os grandes investimentos em

infra-estrutura, paradoxalmente ao discurso de diminuição de suas atribuições. Agora, suas funções seriam de garantir o terreno para a ampliação dos lucros das empresas privadas. De resto, o Estado deveria ficar de fora.

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Faria (2009, p. 25) destaca que os liberais clássicos defendem a concepção de Estado Mínimo, da não intervenção do Estado na economia e da livre concorrência. O mercado é a entidade divina em que todos os problemas, todos os desequilíbrios e todas as crises se resolverão graças ao processo naturalizado de seleção competitiva. Bava (2000, p. 44), destaca que, para eliminar ou reduzir as regulações democráticas construídas no último século, o Estado se transforma em Estado Mínimo. Mínimo no que diz respeito à defesa dos interesses coletivos, do interesse geral. Mas que atual fortemente em defesa dos interesses do mercado, especialmente do capital financeiro.

Borón (1995, p. 71) sintetiza dizendo que "a liberdade não pode sobreviver onde o cidadão indigente está disposto a vendê-la por um prato de lentilhas. (...) quando os pobres se transformam em indigentes e os ricos em magnatas, sucumbem à liberdade e a democracia, e a própria condição do cidadão".

As consequências das mudanças no modelo de Estado, como se observa, são trágicas, em especial para a população mais pobre, desprotegida e agora órfã desse Estado, o que chega a pôr em risco a própria democracia, uma vez que aumenta substancialmente as tensões sociais, movidas pela necessidade primária de sobrevivência. Como afirma Borón (1995): "Para que a democracia sobreviva se requer que na sociedade prevaleça um grau mínimo de justiça distributiva”.

É nesse contexto, através da mobilização da sociedade civil, em busca da garantia de direitos mínimos, que surge o Terceiro Setor. Não é mais suportável um Estado que se concentre em atender as necessidades das classes dominantes, com limitado senso de justiça e que ignora as camadas menos favorecidas da população.

Para atingir esse propósito, no entanto, não se trata de concretizar a minimização do Estado, mas sim na sua reconstrução.