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Procuramos aqui referir o uso da HFC na educação em ciências a partir de duas orientações diferentes. Uma, as vantagens assinaladas na literatura que decorreriam do seu uso, outra a situação atual. Do confronto destas duas posições partiremos para a utilização da HFC na literatura sobre mudança conceptual, que iniciará a nossa discussão deste assunto.

2.5.1 Vantagens assinaladas ao ensino da ciência com história e filosofia da ciência

Encontramos em Sequeira e Leite (1988) uma resenha histórica da utilização da HFC em sala de aula com o primeiro apoio político-institucional à integração da HFC nos curricula a surgir em 1917:

Nos finais do século XIX alguns professores ingleses incluíam já alguma História da Ciência nas suas aulas pois acreditavam que isso constituía uma motivação para os seus alunos. A atitude destes professores viria mais tarde a ser apoiada e reforçada pela British Association for the Advancement of Science (BAAS) (p. 30)

40 Mas foi com o Project Physics Course, que “o movimento atingiu o seu auge” (id., p.31)13,

acreditando os autores do Project Physics que “a apresentação dos temas numa perspetiva histórica e cultural ajudaria os alunos a encarar a Física como atividade humana, multifacetada e maravilhosa, que ela realmente é” (id., ibid.). Passados mais de 20 anos sobre o trabalho de Sequeira e Leite (1988), a constatação da existência de cursos de formação de professores onde a HFC não era contemplada mantém toda a atualidade.

Gerald Holton (1978, pp. 295–298) ao descrever a filosofia educativa do Project Physics Course salienta:

Professores e cientistas, sendo membros de um grupo que desempenha um papel fundamental na vida cultural de uma nação, devem estar orgulhosos da existência desta tapeçaria de ideias interligadas, tanto mais que o seu campo, a física, tem um papel central nesta estrutura orgânica da história intelectual. (p. 298)

A imagem da “tapeçaria de ideias interligadas” que Holton (ibid.) refere na passagem acima é construída por um ensino onde um conceito, lei ou teoria é ensinado realizando ligações com conceitos, leis ou teorias temporalmente precedentes e/ou sucedâneas bem como estabelecendo ligações com áreas do conhecimento diversas.

Ao ensinar a Mecânica Newtoniana, por exemplo, realizamos várias ligações: com a matemática, em épocas de desenvolvimento distintas (cálculo diferencial, contemporâneo de Newton, cálculo vetorial, contemporâneo de Galileu); com a astronomia, também em várias épocas da humanidade (astronomia de posição e astronomia observacional); com a sociedade e a tecnologia (colocação em órbita de satélites, e organização do empreendimento científico), com a filosofia (atomismo), etc. Por outro lado, a Mecânica Newtoniana tem uma conexão íntima com a física galilaica, o trabalho astronómico e matemático de Kepler bem como com a Teoria Cinética dos Gases e a Relatividade Restrita.

A rede de ligações que resulta daqui, constitui a tapeçaria referida por Gerald Holton, e permite o estabelecimento de ligações curriculares significativas entre campos do conhecimento e épocas históricas divrsas.

Galili (2012b) como referimos na nossa discussão de ciência como cultura, aproxima-se desta abordagem de Holton (1978). Para Galili (2012b):

13 Pela mesma altura, o Biological Science Curriculum Study (BSCS) foi desenvolvido para a

Biologia. Joseph Schwab que ficou intimamente ligado a este projeto teve uma importância maior no desenvolvimento do inquiry na educação em ciências (Rudolph, 2003; Wang & Marsh, 2002)

41 A disciplina científica, usualmente centra-se em determinadas teorias e ignora teorias alternativas, tanto históricas como contemporâneas. Por exemplo, o curso padrão em mecânica clássica ignora as suas predecessoras (como a mecânica aristotélica) bem como sucessoras (como a mecânica quântica ou relativista) e disciplinas paralelas (como a termodinâmica ou eletromagnetismo). (p. 1288)

Vemos também aqui uma teia de relações a emergirem. É esta teia, promotora da emergência de referências culturais e de um ensino rico e enriquecedor, que a HFC pode ajudar a tecer.

O ensino-aprendizagem da ciência com o uso da HFC dá ênfase à ciência como um processo, promove a compreensão da sua natureza e leva ao desenvolvimento do interesse e de atitudes positivas dos alunos em relação à ciência. Por outro lado o uso da HFC no processo de ensino-aprendizagem é mais suscetível de promover a mudança conceptual bem como um conhecimento mais sólido de conteúdos científicos ao mesmo tempo que se apresenta como o processo mais adequado para uma sustentar uma linha curricular “ciência para todos” potenciando uma cidadania responsável (Höttecke, Henke, & Riess, 2012; Höttecke & Silva, 2011; Kolstø, 2008; Matthews, 1994; Rudge & Howe, 2009) No entanto os obstáculos têm-se revelado significativos e persistentes.

Apesar das vantagens assinaladas ao ensino-aprendizagem da ciência através da HFC verifica-se uma muito fraca implementação desta metodologia sendo possível identificar quatro obstáculos fundamentais que têm dificultado essa introdução (Höttecke & Silva, 2011; Monk & Osborne, 1997): a) falta de interesse e/ou competências por parte dos professores em ensinar com HFC, b) não existência de uma ideia clara do professor relativamente à ajuda que a HFC pode dar para o ensino dos conteúdos, c) existência marginal em manuais, livros de texto e curricula oficiais desprovidos de conteúdos significativos de HFC e por último, d) falta de materiais didáticos de qualidade.

Este último fator é especialmente relevante no contexto português por duas ordens de razões. Primeiro, para que a aprendizagem seja significativa seria de relevar o contexto português, que está frequentemente ausente, como se em Portugal nunca nada se tivesse passado. Segundo, existe em língua inglesa, material didático e histórico para o ensino da ciência com HFC de muito boa qualidade. Veja-se por exemplo os estudos de caso e outro material didático produzido pelo projeto International History, Philosophy and Science Teaching [IHPST] (Höttecke et al., 2012). No entanto, mesmo ao ensino superior, os alunos, futuros professores do 1º e 2º CEB chegam com crescentes dificuldades de leitura e interpretação de textos em inglês, pelo

42 que é crescente o número de professores a facilitarem uma aprendizagem através do estudo de material em língua portuguesa.

2.5.2. Mudança concetual e evolução do conhecimento do aluno com a instrução

O modelo padrão, ou clássico, da mudança concetual (MC) (G. Posner, Strike, Hewson, & Gertzog, 1982; Strike & Posner, 1992), surgiu na literatura a partir da história e filosofia da ciência. Posner et al. (1982) explicitam a influência determinante de Thomas Kuhn (1996) ‒ mas também dos programas de investigação de Lakatos (1968) ‒ com os conceitos de ‘ciência normal’ como o modo de investigação dentro de um paradigma (Kuhn) ou dentro de um programa de investigação (Lakatos) ou, então, de modificação radical de estruturas concetuais no quadro de uma revolução científica (Kuhn) ou mudança de programa de investigação (Lakatos).

No seu trabalho inicial, Posner et al. (1982, p. 211), começam por dizer que “se tornou um lugar-comum acreditar que a aprendizagem é o resultado da interação entre o que é ensinado ao estudante e as suas ideias ou conceitos atuais” acrescentando que, de modo algum, se constitui como uma nova visão da aprendizagem, tendo antes origens no início do século com os psicólogos da Gestalt e depois com Piaget.

Os trabalhos de Jean Piaget (e.g. 1952, 2002) no final dos anos vinte e anos trinta, sobre as explicações dadas por crianças de diferentes idades em torno dos fenómenos da natureza, tiveram uma influência maior no estudo dos quadros interpretativos que os alunos detêm antes da instrução (dos Santos, 1991; Driver, Asoko, Leach, Scott, & Mortimer, 1994; Posner et al., 1982; Scott, Asoko, & Leach, 2007). A conceptualização dos estádios de desenvolvimento de Piaget, os quais são independentes do domínio (e.g. Piaget, 2002, pp. 131 – 170), surge com David Ausubel (2000) e depois com Joseph Novak (1977), como domínio-dependentes.

Como afirma Ausubel (2000, p. 40), novas aprendizagens (significativas) são o produto de uma integração ativa entre novos conteúdos e ideias relevantes já existentes na estrutura do conhecimento do aluno. Mais, as aprendizagens adquiras num determinado domínio, constituem-se como a mais significativa variável independente que influencia a aprendizagem de novo conteúdo (ibid., p 42)14, tornando-se numa

máxima que se encontra repetida n vezes na literatura.

A introdução dos conceitos de ‘assimilação’, para referir a reorganização da estrutura mental de modo a incorporar novos conceitos, e de ‘acomodação’, para referir a substituição de uma estrutura por outra, emerge também com Piaget e torna-se parte

43 fundamental do modelo padrão da MC (Garrison & Bentley, 1990; Posner et al., 1982; Scott et al., 2007). Segundo Garrison e Bentley (1990, p. 25), no quadro concetual de Piaget, a aprendizagem inicial em ciência é em larga medida uma tarefa de acomodação concetual, um processo mais difícil, radical, que o de assimilação.

Como referem Stella Vosniadou e Christos Ioannides (1998, p. 1213), os trabalhos de Joseph Novak, Rosalind Driver e Jack Easley (1978) bem como de Laurence Viennot (1979) são marcos significativos na investigação em educação em ciências no domínio da MC: “eles estiveram entre os primeiros a prestar atenção ao facto de os estudantes trazeram para as tarefas de aprendizagem de ciência quadros concetuais alternativos ou conceções erradas que são robustas e difíceis de erradicar através do ensino.”

O estudo da natureza e da estrutura, destes quadros concetuais prévios à instrução e da sua mudança com a instrução, bem como as implicações pedagógicas decorrentes, ocuparam parte substancial da investigação em MC nas últimas décadas, de caráter eminentemente multidisciplinar, envolvendo as ciências da educação, psicologia e a história e filosofia da ciência (Duschl, Hamilton, & Grandy, 1992). Segundo Vosniadou e Ioannides (1998):

Em anos recentes, a investigação na área do desenvolvimento cognitivo, tem tentado encontrar caminhos para reconciliar o construtivismo piagetiano com os resultados experimentais que mostram, por um lado, que as crianças são muito mais aptas cognitivamente do que Piaget originalmente pensou e, por outro, que as estruturas concetuais iniciais experienciam mudanças radicais durante o desenvolvimento (p. 1214) Um resultado que parece assente, e que vem já dos trabalhos de Ausubel e de Novak é que as estruturas mentais têm um carater modular e não global, i.e., são específicas do domínio ou área do conhecimento (domain-specific) e não independentes do domínio do conhecimento.

Várias críticas têm sido apontadas à proposta de Posner et al. (1982) que já denominámos, seguindo aliás a literatura, de modelo padrão ou clássico de MC. Este modelo entra em conflito com evidências abundantes de que a mudança concetual é difícil de conseguir, pelo menos de modo completo, e mesmo muito difícil de alcançar em algumas áreas do conhecimento científico. De facto, como nos diz Michelene Chi (2008, p. 72) o problema da conceção errada (misconception)15 robusta, ou seja, a

15 Chi e Roscoe (2002) utilizam o termo conceção errada (misconception) para referir aquelas

conceções persistentes mesmo após instrução adequada. O termo conceções prévias (preconceptions), por sua vez, é utilizado para referir as conceções presentes no aluno e mais facilmente alteradas ou removidas após instrução. O nosso uso vai depender muito do contexto, mas, regra gera, evitamos usar o termo conceções erradas.

44 existências de conceções erradas, não apenas em conflito com as cientificamente aceites mas, além do mais, difíceis de rever ou superar, está hoje documentado em “literalmente milhares” de estudos sobre os mais variados conceitos e fenómenos científicos (Pfundt & Duit, 1994).

Ora, segundo Posner et al. (1982, pp. 216 – 222), para que ocorra a mudança concetual é necessário e suficiente a satisfação de quatro condições: a) insatisfação (racional) com a conceção existente, b) inteligibilidade da nova conceção, c) plausibilidade (ou seja, a nova conceção encaixa na ecologia concetual16 do aluno), d) a nova conceção

deve deter uma heurística positiva. Este modelo da MC exige um conjunto de pressupostos puramente racionais, sem elementos afetivos, culturais ou emocionais, que não permitem explicar o problema das conceções prévias persistentes.

Como afirmam Vosniadou e Ioannides (1998), o modelo padrão da MC:

Centra-se na incompatibilidade entre dois sistemas explicativos distintos e igualmente bem organizados, um dos quais necessita ser abandonado em favor do outro. Os resultados [da investigação em MC], no entanto, sugerem que a mudança concetual é uma lenta revisão de um sistema concetual inicial através de incorporação gradual de elementos das explicações científicas correntemente aceites. (p. 1222)

Deste modo Vosniadou e Ioannides (1998) atacam o modelo padrão, por um lado, sugerindo que seria ilusório supor que o conhecimento prévio do aluno e o conhecimento científico a ensinar tenham um nível de organização semelhante, e por outro, defendendo que a mudança radical de conceções é apenas um dos tipos de mudança e que a investigação tem revelado que em geral não é a que se encontra como resultante dos processos de instrução. Ainda Vosniadou e Skopeliti (2014) salientam que a teoria da MC padrão de Posner et al. (1982) é o “resultado de um processo racional de substituição de teorias por alunos que se comportam mais ou menos como cientistas”, conceção que tem a firme oposição de vários autores (e.g., Greiffenhagen & Sherman, 2008).

Este problema, da mudança concetual como um processo puramente racional como defende o modelo padrão, ou como um processo onde elementos afetivos,

16 Como afirmam Posner et al. (1982, pp. 212–213) “acreditamos que o inquiry e aprendizagem

ocorrem contra um fundo de conceitos existentes no aluno. Sempre que o aluno encontra um novo fenómeno, tem de se apoiar nos seus conceitos já existentes para organizar a sua investigação. Sem tais conceitos é impossível ao aluno elaborar uma questão sobre o fenómeno, saber o que conta como resposta à questão, ou distinguir aspetos relevantes dos irrelevantes. Sem conceitos, o mundo é e permanece o “extremo zumbido da desordem” (blooming buzzing confusion) de William James. Pedindo emprestado uma frase de Stephen Toulmin, referimo-nos a esses conceitos que orientam a mudança concetual como uma ‘ecologia conceptual.’”

45 emocionais, culturais, não puramente lógicos, em qualquer dos casos, desempenham um papel relevante, deve então ser objeto de análise. Vários autores exploram este assunto, tai como Vosniadou e Skopeliti (2014), Peter Hewson (1981, 1992), George Zhou (2010) e Pintrich, Marx e Boyle (1993).

Vosniadou e Skopeliti (2014) fazem uma distinção entre conceções iniciais antes de instrução, e conceções sintéticas construídas após os alunos serem expostos ao ensino e que resultam das tentativas de reconciliarem as suas conceções iniciais com as científicas. A conceção sintética resultaria assim de um processo pessoal e social de construção de conhecimento em sala de aula na presença de um esforço de manutenção das estruturas concetuais prévias.

Hewson (1981), – integrando a sua análise numa extensão da teoria padrão da MC ‒ refere a importância para a MC de cada aluno, da força dos seus compromissos metafísicos. Como exemplo, a vinculação de um aluno a um compromisso ontológico de espaço absoluto ‒ e supondo que esse aluno não teve qualquer contato com a relatividade restrita, é certamente diferente da de um aluno que já tenha estudado o assunto. Em particular, e elaborando em torno da individualidade/partilha da ecologia concetual, Hewson (1992) refere:

O conhecimento que um aluno ganha apenas tem validade em termos da, e é portanto relativo, à sua ecologia conceptual. Uma vez que a ecologia concetual de um aluno é um produto de todas as suas experiências e interações sociais, terá muitos elementos em comum com a [ecologia concetual de] outras pessoas (p. 9)

Por sua vez, Paul Pintrich et al. (1993), propõem que o fracasso do modelo padrão em explicar a persistência de conceções erradas apesar de vários anos de instrução pode ser devida ao enfoque, apenas, em estruturas cognitivas e ao “evitar de constructos tais como objetivos individuais, intenções, propósitos, expetativas ou necessidades” (p. 168).

Por outro lado Zhou (2010), após uma breve análise de estudos empíricos que parecem trazer evidências contra a teoria padrão da MC, e partindo do princípio largamente reportado na literatura que releva como fundamental o papel do argumento e da argumentação tanto na ciência como na educação em ciência, fundamenta uma proposta que ultrapassa processos puramente lógicos.

Nesse mesmo sentido, Driver, Newton e Osborne (2000) referem:

Ao contrário do conteúdo da ciência (…) existe grande discordância relativamente ao modo que a ciência é trabalhada. Apesar disto, nós defendemos que tem havido uma tendência global no último meio século, de afastamento em ver a ciência como um processo empírico, onde reivindicações sobre a verdade estão fundadas na observação.

46 Em seu lugar, a mudança de posição tem sido em direção a uma visão da ciência como um processo social de construção do conhecimento que envolve a conjetura, retórica e argumento (p. 295)

Antes, já Driver et al. (1994) haviam reportado a importância da argumentação, agora na educação em ciência, pois “as atividades e intervenções dos professores são (…) retratadas como promovendo o pensamento e a reflexão da parte do aluno com pedidos de argumento e evidência como suporte das suas afirmações” (p. 7), acrescentando que constatavam “uma significativa omissão desta perspetiva na construção do conhecimento [do aluno].” Isto porque:

O desenvolvimento das estruturas cognitivas dos alunos são vistas como desenvolvendo-se através da interação dessas estruturas com aspetos de uma realidade física externa, com a construção de significado a ser estimulado por interação com os pares. O que não é considerado de modo relevante é a interação dos alunos com realidades simbólicas, as ferramentas culturais da ciência. [ênfase nossa] (id., ibid.) Assim, se o modelo padrão da MC continua a funcionar como pivot em torno do qual muito do estudo sobre a aprendizagem em ciências se desenvolve, já não pode ser sustentado quando confrontado com estudos teóricos ou empíricos.

47 Framework theory

Pressupostos Ontológicos - Existem objetos físicos; - Existe luz;

-Os objetos físicos podem ser vistos; - A luz tem propriedades

- Existem fontes e recetores de luz; - Ser vista é uma das propriedades da luz; - etc.

Pressupostos Epistemológicos

- Os fenómenos físicos podem ser explicados - As propriedades da luz são acessíveis aos sentidos;

- etc.

Teoria específica

Observações ou informações obtidas no contexto cultural

O Sol é fonte de luz. Os corpos mais luminosos são mais claros, etc.

Conjuntos de p-prims

Crenças

A distância percorrida pela luz aumenta quando a intensidade da fonte aumenta;

A luz pode ser vista de lado desde que nada bloqueie a visão.

Modelo mental A luz é reificada

Aspeto 1 Aspeto 2 Aspeto 3

A distância percorrida pela luz aumenta quando a

intensidade da fonte aumenta.

Os raios de luz assemelham-se a

fios de uma corda. O que se propaga quando a luz se propaga são ‘raios de luz’

48

Para além do modelo padrão de mudança concetual

Stella Vosniadou (1994)17, trabalhando o domínio da física, argumenta que os

conceitos estão imersos em estruturas mais vastas que denomina de framework theory18

e que são constituídas por pressupostos epistemológicos e ontológicos (Figura 3). Ainda que Vosniadou et al. (1998, p. 1216) defenda que a framework theory “constrange o processo de aquisição de conhecimento sobre o mundo físico em modos análogos àqueles que os programas de investigação e paradigmas” constrangem o desenvolvimento de teorias científicas, pensamos que esta analogia ou é errada (Greiffenhagen & Sherman, 2008), ou deve ser tomada apenas como um recurso heurístico para a exposição da sua teoria de MC. De facto, é a própria Vosniadou (1998) a admitir que “o uso do termo ‘teoria’ pode ser enganador”, explicando:

O que queremos significar por framework theory é uma estrutura concetual esquemática que fornece o fundamento para os nossos compromissos ontológicos mais profundos e nos termos dos quais nós compreendemos o mundo. Uma framework theory é muito diferente de uma teoria científica. Não é explícita, bem formada e socialmente partilhada, não tem o poder explicativo e consistência interna de teorias científicas, não é sujeita a reflexão metaconcetual, e não é sistematicamente testada para confirmação ou falsificação19.

No entanto, Vosniadou e colegas escolheram chamar ‘teoria’ “pois é um sistema baseado em postulados, o qual é caraterizado por uma distinta ontologia e causalidade e que é generativo no sentido de que pode realizar previsões e explicações” (id., ibid.). Para além da framework theory, é defendido por Stella Vosniadou (1994) a existência de uma teoria específica (specific theory), usada para explicar um conjunto limitado de fenómenos, consistindo num “conjunto de proposições interrelacionadas ou de crenças.” Estas crenças, por sua vez, são geradas através da observação e/ou através de informação disponibilizada pelo meio cultural. As crenças surgem assim como constrangimentos de segunda ordem (onde os compromissos ontológicos e epistemológicos são os constrangimentos de primeira ordem) que “surgem da própria estrutura do conhecimento adquirido, à medida que essa estrutura impõe a sua própria influência no processo de aquisição do conhecimento.” (id., p. 48)

17 Uma abordagem recente com novos resultados teóricos e empíricos da abordagem à MC

proposta por Stella Vosniadou e colegas pode ser consultada em e.g. Vosniadou (2014).

18 Por não encontrarmos tradução que possa referir satisfatoriamente a ideia de Vosniadou,

deixamos no original. Segundo a autora, por framework theory quer significar um quadro explicativo causal para organizar os fenómenos físicos. Em particular uma framework theory não é suscetível de uma perceção consciente nem de teste de hipótese.

19 Ignoramos esta passagem infeliz de Vosniadou pois só utilizando as palavras