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A importância do ídolo

No documento Futebol : mitos, idolos e herois (páginas 120-124)

5 Sobre ídolos e heróis

5.1 A importância do ídolo

O sonho de muitos meninos brasileiros certamente passa pelo esporte mais popular do planeta. Como já foi dito, o futebol está presente no imaginário do povo brasileiro. Freqüentemente, jogadores são eleitos ídolos e passam a servir de modelo para a sociedade.

A sociedade valoriza o vencedor, a vitória, a ascensão, impondo um padrão de comportamento que reconhece o mais forte e o mais habilidoso. Aquele que chegar ao topo servirá como exemplo para os demais (RUBIO, 2001). Num país em que a desigualdade social61 é um dos grandes problemas a ser resolvido, valoriza-se aquele que é bem sucedido, famoso e conhecido, enfim, aquele que deu certo financeiramente.

O futebol, visto como o esporte nacional que atinge todas as classes sociais, regularmente produz atletas que serão o modelo para muitos brasileiros. Por isso, não é de se estranhar que muitos ídolos e heróis brasileiros pertençam ao campo esportivo, especialmente ao futebol.

Tornam-se pessoas públicas. Saem do anonimato e entram no rol dos astros mais bem pagos do mundo. Os jogadores que conseguem tal façanha participam de um processo que muitos sonham e poucos conseguem. Portanto, os famosos, os ídolos e heróis constituem uma exceção da exceção. Em outras palavras, para ser jogador de futebol é preciso passar por longas etapas e muitas angústias, é preciso conviver com a possibilidade de ser dispensado em qualquer fase das categorias de base. Ser jogador de futebol é pertencer a uma pequena parcela, se comparada com o número de muitos meninos que ficam pelo caminho.

Por isso, pode-se dizer que ser jogador de futebol profissional é uma exceção dentro de um processo de exclusão. Uma vez conseguido o objetivo de ser jogador profissional, chegar à condição de ídolo e/ou herói de seu clube ou mesmo da seleção de seu país compõe outra exceção. Isso porque o contingente total de jogadores é muito grande se comparado aos que chegam a tal condição. Para se ter uma idéia, hoje são 9.95962 atletas brasileiros que possuem contratos ativos com clubes no país e uma grande quantidade atletas que atuam no exterior. E desses quase 10 mil jogadores, por volta de uma centena, ao longo dos anos de preparação para uma Copa do Mundo, é que chegarão à seleção brasileira.

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Apesar dos dados serem da Grande São Paulo, esta informação permite uma análise da realidade brasileira: 14% da população vive abaixo da linha da pobreza (menos de meio salário mínimo); 48,9% da renda concentra-se nas mãos dos 10% mais ricos e 2,1% da renda está nas mãos dos 20% mais pobres (O Estado de S. Paulo, 26 de setembro de 2004, p. H3, caderno Dossiê Estado). No futebol essa desigualdade também acontece (ver a tabela abaixo).

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Portanto, pode-se dizer que são poucos os jogadores que gozam do status de ídolo, de representar a seleção brasileira e até mesmo de jogar pelos clubes considerados grandes. Os que não compõem esse seleto grupo, convivem com baixos salários e com uma realidade de vida muito diferente daqueles que integram esses times. Em razão desse caminho tortuoso, chegar a uma condição de destaque dentro do mundo do futebol é muito difícil. Cada vez que ocorre um avanço rumo ao profissionalismo e ao estrelato, um sistema de “funil” estreita cada vez mais o caminho. Ao analisar a trajetória de alguns ídolos recentes, como, por exemplo, o percurso do Ronaldo63 (Fenômeno) e do Ronaldinho Gaúcho, é possível ver uma mobilidade e uma ascensão social. Em suas origens, pertenciam a uma classe menos favorecida da sociedade, excluídos socialmente, ou seja, pertenciam à classe social mais pobre e em pouco tempo, cerca de 10 a 15 anos, se tornaram os homens mais bem pagos do mundo.

Isso pode ser visto numa divulgação sobre os atletas mais bem pagos do planeta64:

Tabela 2 - Os jogadores mais bem pagos do mundo em 2004 e 2005

Pos. Valores em milhões de DÓLARES 200465 Valores em milhões de EUROS 200566

1º Beckham/ING (Real Madrid) 26,8 Ronaldinho Gaúcho (Barcelona) 23

Ronaldo (Real Madrid) 19,8 Beckham/ING (Real Madrid) 18

3º Zidane/FRA (Real Madrid) 16,8 Ronaldo (Real Madrid) 17,4

4º Vieri/ITA (Inter de Milão) 13,3 Rooney/ING (Manchester United) 16,1

5º Del Piero/ITA (Juventus) 12,1 Vieri/ITA (Monaco) 16

Ronaldinho Gaúcho (Barcelona) 12 Zidane/FRA 15

7º Raúl/ESP (Real Madrid) 11,1 Del Piero/ITA (Juventus) 11,5

8º Owen/ING (Liverpool) 10,9 Lampard/ING (Chelsea) 9,8

9º Kahn/ALE (B. Munique) 10,5 Henry/FRA (Arsenal) 9,8

10º Figo/POR (Real Madrid) 10,2 Terry/ING (Chelsea) 9,7

O que precisa ser destacado no discurso dos astros do futebol não é a possibilidade de se tornar mais um ídolo/herói dentro do processo e sim que eles constituem uma exceção à regra e que os contratos e o sucesso no futebol são estabelecidos a partir do referencial do talento. Possuem um prazo de validade, estabelecido pelo desempenho, competência e

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Principalmente de Ronaldo (Fenômeno). Ronaldinho Gaúcho tinha uma condição de vida melhor, garantida por seu irmão Assis que foi jogador de futebol profissional.

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O ranking leva como base os salários, luvas e as receitas publicitárias dos jogadores de futebol. 65

O Estado de S. Paulo, 4 de maio de 2004, p. E3. 66

juventude. Quando ficam mais velhos, têm seu “talento” contestado, já que, em termos futebolísticos, não conseguem desempenhar o papel de outrora.

Um exemplo dessa situação foi o que aconteceu com o jogador Ronaldo, chamado de Fenômeno, devido às suas atuações em campo. Ele é tido como um caso de sucesso no futebol brasileiro. Não é por menos, jogou por grandes clubes europeus e tornou-se um dos homens mais bem pagos do mundo do futebol.

De promessa na Copa de 1994 quando ainda era um menino com 17 anos (foi reserva e não entrou em nenhuma partida); conheceu na Copa de 1998 o peso da cobrança e da responsabilidade e teve um mal-estar horas antes da partida final, a qual o Brasil viria a perder; na Copa de 2002, após passar por uma série de cirurgias no joelho, retornou como o grande astro e conheceu o auge da fama, ser campeão e artilheiro da Copa do Mundo. Quatro anos mais tarde, apesar de toda experiência adquirida, foi alvo de inúmeras e fortes críticas sobre sua condição física.

Figura 6 - Ronaldo é substituído e passou por uma situação inédita dentro da seleção brasileira: teve sua condição de jogador titular contestada pelos críticos e pela torcida, muitas vezes chamado pejorativamente de

gordo e velho

(Fonte: O Estado de S. Paulo, 19 de junho de 2006, E.3)

A cada jogo a imprensa perguntava onde estava o jogador apelidado corretamente de Fenômeno. Pela primeira vez, teve sua posição de titular absoluto questionada.

Parece que o prazo de validade que os ídolos possuem chegou a Ronaldo. Aos 29 anos67, chegou a ser chamado de velho, seu desempenho não é o mesmo de anos atrás, conseqüentemente, sua competência passou a ser questionada.

No início de 2007, após ser preterido pelo novo técnico, foi vendido do Real Madrid (Espanha) para o Milan (Itália) por US$ 9,5 milhões68. Claro que os valores são altíssimos, mas, se comparados ao investimento feito pela equipe espanhola (US$ 45 milhões) quando o contratou junto ao Internazionale (Itália), representa uma desvalorização de 79%. Embora continue jogando nos grandes centros europeus, Ronaldo já tem sua qualidade contestada, algo que era impensável há alguns anos. Como os jogadores são vistos como mercadorias, tão logo não correspondam ao mercado, são descartados como se nunca tivessem sido importantes para o clube.

No documento Futebol : mitos, idolos e herois (páginas 120-124)