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A Importância do Sistema Nacional de Inovação

PARTE II – PATENTES E O FOMENTO DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DE PAÍSES EM

6. O FOMENTO DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

6.1 As Patentes e os Sistemas Nacionais de Inovação

6.1.2 A Importância do Sistema Nacional de Inovação

Diante da realidade, é necessário que arranjos institucionais sejam criados para impulsionar o progresso tecnológico através da criação de um fluxo necessário de informações ao processo de inovação, pois, tais fluxos de informação teriam um funcionamento subótimo336 se dependessem apenas de mecanismos de mercado. O conjunto destes arranjos institucionais é conhecido como sistema nacional de inovação.

Segundo ALBUQUERQUE337, esses arranjos institucionais envolvem firmas, redes de interação entre empresas, agências governamentais, universidades, institutos de pesquisa, laboratórios de empresas e atividades de cientistas e engenheiros. É necessário também o envolvimento entre esses arranjos e o sistema educacional, o

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ALBUQUERQUE, E. M. Sistemas nacionais de inovação e direitos da propriedade industrial: notas introdutórias a um debate necessário. Op.cit.

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Apud. ALBUQUERQUE, E. M. Sistemas nacionais de inovação e direitos da propriedade industrial: notas introdutórias a um debate necessário. Op.cit.

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ALBUQUERQUE, E. M. As múltiplas dimensões das patentes. Análise Econômica, ano 16, nº29, p.87-102, março, 1998.

setor industrial e o empresarial, instituições financeiras, completando o circuito dos agentes responsáveis pela geração, implementação e difusão de inovações.

Os sistemas nacionais de inovação338 podem ser classificados em três estágios de evolução: 1) sistemas de inovação não-maduros; 2) sistemas de inovação intermediários. Enquadram-se os países: Coréia, Taiwan e Singapura; e 3) sistemas de inovação maduros. Do qual são exemplos os Estados Unidos, o Japão, a Alemanha, a Suécia e a Holanda.

No caso dos países com sistemas de inovação não-maduros, sugerem- se três subdivisões: a) PICTPE (Países com uma Infra-estrutura de Ciência e Tecnologia Pouco Eficaz): Índia, Brasil, México e África do Sul; b) Países do Sudeste Asiático (Tailândia, Malásia, Indonésia e Filipinas), que compartilham uma realidade de crescimento recente que sugere uma categoria comum; e c) Países com um sistema de inovação inexistente, que não possuem sequer o começo de um sistema nacional de inovação (Turquia, Afeganistão, entre outros).

ALBUQUERQUE339 observa o caráter imaturo do sistema de inovação PICTPE- e do caso brasileiro, verificando a baixa eficiência da relação entre gastos em pesquisa e desenvolvimento e produção científica (P&D/papers). Segundo Albuquerque isto é devido à limitada e desigual infra-estrutura científica, ao número restrito de disciplinas que alcançam os padrões internacionais e que se encontram bem conectado com a comunidade científica mundial. Verifica ainda como principal fraqueza a pobre interação da comunidade científica com a base industrial e tecnológica.

Os PICTPE, onde se inclui o Brasil, parecem “estar gerando informações e conhecimentos não utilizados de forma apropriada pelo setor industrial e tecnológico”340. Outra característica dos PICTPE seria o pequeno envolvimento do setor privado e o reduzido número de pesquisas voltadas para objetivos diretamente

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ALBUQUERQUE, E. M. As múltiplas dimensões das patentes. Análise Econômica, ano 16, nº29, p.87-102, março, 1998.

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ALBUQUERQUE, E. M. As múltiplas dimensões das patentes. Op.cit. 340

ALBUQUERQUE, E. M. Sistemas nacionais de inovação e direitos da propriedade industrial: notas introdutórias a um debate necessário. Op. Cit., p.178.

tecnológicos, exigindo maior participação da infra-estrutura pública em relação à dos sistemas maduros.

A diversidade de sistemas de inovação é fruto da multiplicidade de caminhos históricos que levaram à constituição de diferentes arranjos institucionais em diferentes países, evidenciando a necessidade de um longo processo de construção de cada sistema. É necessário ressaltar um aspecto histórico dos sistemas nacionais de inovação: à exceção da Grã-Bretanha, todos os países que estão hoje com sistemas de inovação maduros iniciaram o processo de desenvolvimento através da imitação e importação de tecnologia341. A imitação representou uma etapa necessária à posterior condição de líder tecnológico. Porém, devido ao caráter cada vez mais dependente da ciência que constitui as tecnologias atuais, a imitação se tornou procedimento muito mais complexo e dependente de acumulação tecnológica prévia.

Cabe lembrar que ainda em 1886, foi realizado na Suíça, a primeira conferencia internacional sobre direitos autorais e de copyrights, a qual termina pela adoção de convenção de Berna, que vem completar o Sistema de Paris, com a adesão do Brasil. Contudo, não houve adesão por parte dos EUA. É interessante, neste ponto de reflexão, sublinhar a diferença de postura adotada pelos diferentes países em relação à recém-criada norma internacional.

Os Estados Unidos nascem da ambição industrialista dos colonos. A legislação norte-americana nega expressamente proteção patentária a cidadãos estrangeiros. Como importadores de saber, utilizaram-se de sua influência econômica e política para adquiri-lo gratuitamente. Como exportadores, a venda é realizada nas melhores condições possíveis e pressionam pela criação de leis retentoras do conhecimento, dificultando seu acesso e criando situações monopolisticas, para forçar a alta dos preços e chamando de piratas os que fazem como fez durante duzentos anos342.

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ALBUQUERQUE, E. M. Sistemas nacionais de inovação e direitos da propriedade industrial: notas introdutórias a um debate necessário. Op. Cit., p.178.

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LAMBERT, Jean Marie. Curso de Direito Internacional Público: A Regência Neoliberal. volume III, Goiania:Editora Kelps, 2000, p.220.

Os norte-americanos foram perfeitamente lúcidos em cada momento de sua historia tecnológica. Não se pode falar a mesma coisa do Brasil. Antes mesmo de dar o primeiro passo na caminhada desenvolvimentista, engessou sua capacidade cientifica e empresarial pela adesão a um sistema que faz graça aos interesses estrangeiros, inibindo ao mesmo tempo a iniciativa nacional.

A norma geral adotada pelos países desenvolvidos consiste em mudar gradativamente os sistemas legais, sempre em processos negociados, com salvaguardas, aceitando finalmente quando a relação “custo-beneficio” se torna favorável à indústria local.

Num primeiro momento, os países desenvolvidos negaram a proteção de patentes aos estrangeiros. Mas, após se estabelecerem como exportadores de inovações e tecnologias passam a concedê-las. Adotam, nesse momento, o princípio da reciprocidade pelo qual não se pode exigir uma proteção que não se está pronto a conceder. As nações inteligentes dão o mencionado passo quando em consciência contábil, constatam que têm mais a vender que a comprar do mundo externo, percebendo, portanto, uma relação “custo x beneficio” favorável ao reconhecimento mutuo de direitos patentários.

Os países desenvolvidos demonstraram uma cautela extrema, aderindo paulatinamente às políticas de reconhecimento de privilégios, depois de consolidar suas próprias indústrias e de dominar as tecnologias sensíveis. O Japão só autorizou as patentes de fármacos em 1976, quando já era o segundo maior produtor mundial343. No mesmo sentido, atuou a Inglaterra que saiu por mais de trinta anos do sistema internacional de patentes (1919 – 1949), voltando a reconhecê-lo somente depois de considerar que a sua indústria nacional estava pronta para suportar esse passo.

Outro exemplo é verificado na França que até hoje, prevê a suspensão das patentes para produtos farmacêuticos, quando as quantidades ou as qualidades ofertadas são consideradas inadequadas ou os preços são considerados abusivos.

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LAMBERT, Jean Marie. Curso de Direito Internacional Público: A Regência Neoliberal. Op.cit., p.220.

O fato emerge com clareza em 1961, quando a delegação brasileira na ONU manifesta seu interesse por um estudo abrangente sobre os efeitos inibidores das patentes para o progresso industrial dos países em desenvolvimento – pesquisa que ficou pronta em 1964, recomendando a ONU a não-aceitação de praticas comerciais restritivas nos acordos internacionais de patentes e de transferência de tecnologia344.

É de se notar que o Brasil não ficou sempre alheio às preocupações aqui aludidas. Teve momentos de nacionalismo, e pode-se observar que certos setores tentaram reagir em diversas oportunidades contra a lógica entreguista dominante.

Um aspecto importante sobre as legislações de patentes, assim como sobre os sistemas nacionais de inovação, é que à medida que os países hoje situados na fronteira tecnológica superaram o estágio de imitação. Nesse sentido, suas legislações e seus sistemas de inovação acompanharam essa mudança tecnológica. ALBUQUERQUE345 faz uma crítica às pressões que os países desenvolvidos faziam sobre os não-desenvolvidos para que adotassem a Convenção Internacional de Patentes (Genebra e Paris à época), não fazendo nenhum esforço para compreender as circunstâncias especiais que envolviam esses países, embora muitas das economias atualmente desenvolvidas tivessem reservas parecidas quanto à adesão à Convenção em seus dias iniciais.

Um exemplo de utilização livre de patentes de outros países é dado pelos Estados Unidos que, durante a Primeira Guerra Mundial, aboliram as patentes alemãs no país, possibilitando enorme avanço da indústria química norte-americana, que encontrava dificuldades de acesso a este setor346. Outro exemplo é fornecido pelo Japão que, após anos de não reconhecimento de patentes em seu setor farmacêutico, passou a lutar pela adoção de uma legislação protegendo seus produtos.

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LAMBERT, Jean Marie. Curso de Direito Internacional Público: A Regência Neoliberal. Op.cit., p.220.

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ALBUQUERQUE, E. M. Sistemas nacionais de inovação e direitos da propriedade industrial: notas introdutórias a um debate necessário. Estudos Econômicos, São Paulo, v. 26, n.2, p.171- 200, maio-agosto, 1996.

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É possível distinguir dois sistemas de patentes, de um lado, tem-se os sistemas que incentivam a difusão do conhecimento, voltando-se para articular os Direitos de Propriedade Intelectual de modo a incentivar a imitação e melhoramentos incrementais (caso do Japão); e de outro lado, tem-se os sistemas que visam proteger a invenção (caso dos Estados Unidos)347.

Considerando que a relação entre os sistemas nacionais de inovação e as patentes já foram abordadas no presente capítulo, resta agora, relacionar as patentes como ferramentas no processo de desenvolvimento de forma a evidenciar a necessidade de se aliar as mudanças associadas ao paradigma técnico-econômico com as mudanças em sua estrutura institucional e econômica de forma a possibilitar o progresso do país.