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PARTE II – PATENTES E O FOMENTO DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DE PAÍSES EM

6. O FOMENTO DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

6.1 As Patentes e os Sistemas Nacionais de Inovação

6.1.1 As patentes e o atual paradigma tecnológico

As economias modernas industrializadas destinam parcela significativa de sua renda para as pesquisas científicas, que chegam a corresponder até vinte e cinco por cento da renda auferida. Grande parte das inovações decorrem do “learning by doing” e “learning by using327”. A importância atribuída às pesquisas varia em intensidade de acordo com o estágio tecnológico328.

A inovação é vista como solução de paradigmas tecnológicos, ou seja, após definir-se as necessidades que precisam ser preenchidas, estabelece-se princípios científicos e formulam-se, por conseguinte, modelos de solução com regras específicas. Em outras palavras uma “inovative solution” para um determinado problema envolve descoberta e criação. Certamente a solução para problemas tecnológicos envolve informação baseada em experiência e conhecimento formal.

Um olhar nas patentes de mudança tecnológica sugere a existência de paradigmas com diferentes níveis de generalidade, em vários setores industriais. Um paradigma tecnológico é um exemplar, e cada paradigma tecnológico envolve uma mudança específica de tecnologia.

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As expressões “learning by doing” e “learning by using” significam, respectivamente, o aprendizagem pela execução e a aprendizagem pelo uso do invento.

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DOSI, Giovanni. “Sources, Procedures, and Microeconomic Effects of Innovation”. Journal of

Cada paradigma tecnológico sugere um equilíbrio entre determinantes exógenas de inovação (p.ex. avanços no campo universitário baseado em pura ciência) e determinantes que são endógenas ao processo de competição e acumulação tecnológica de firmas e indústrias. Ademais, cada paradigma envolve modelos específicos de pesquisa, bases de conhecimento, e combinações entre propriedade e formas públicas de conhecimento tecnológico.

O progresso técnico é endogenamente conduzido pelo processo competitivo onde as firmas constantemente tentam melhorar suas tecnologias. Nesse contexto, a evolução do meio econômico é um instrumental na seleção de novos paradigmas tecnológicos e na seleção de direções e procedimentos da pesquisa inovadora.

O processo de inovação tem como base as relações entre público e propriedade, formas de conhecimento, e diferentes combinações entre noções de oportunidades, capacidade das firmas e incentivos econômicos329. Tais diferenças existem e ajudam a compreender e explicar a estrutura interna de economias não concentradas que continuamente geram novos produtos e processo produtivo.

A inovação e as mudanças na indústria são resultado de um processo de aprendizagem e seleção. Ao longo do tempo novos produtos surgem e são posteriormente imitados por outras firmas. A performance das indústrias e as estruturas são endógenas ao processo de inovação, imitação e competição e são geradas por pela estrutura da demanda natureza das oportunidades para avanços tecnológicos e pela a habilidade das firmas para investir em pesquisa e desenvolvimento - P&D.

Na busca pela inovação, e dada a característica de permanente concorrência capitalista, em que as firmas são premiadas com lucros acima da média ao introduzirem inovações tecnológicas, diferentes mecanismos de apropriação das invenções são utilizados na tentativa de prolongar o que Schumpeter chamava de

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DOSI, Giovanni. “Sources, Procedures, and Microeconomic Effects of Innovation”. Journal of

“monopólio temporário” do inovador. Entre esses mecanismos destacam-se o segredo comercial, a evolução na curva de aprendizado330 e as patentes.

Pode-se dizer que cada fase do capitalismo conheceu diferentes formas de garantir a apropriação de bens intangíveis de acordo com os diferentes paradigmas tecnológicos. Para que um novo paradigma tecnológico possa surgir é necessária a compatibilidade com as instituições que organizam a sociedade. É dentro da relação entre um paradigma e as instituições de uma sociedade que estão as formas de apropriação de inovações tecnológicas331. A patente é uma dessas formas.

Ao se relacionar o desenvolvimento dos sistemas de patentes com as diferentes fases do capitalismo, identifica-se que na primeira fase se deram a reforma e o fortalecimento dos sistemas de patentes no interior dos países pelos quais se disseminou originalmente a revolução industrial – principalmente a Inglaterra.

Na fase seguinte, houve uma internacionalização dos sistemas de patentes, com a realização da Convenção de Paris de 1883, originando a União Internacional para a Proteção da Propriedade Intelectual. Na terceira fase, em que as indústrias elétricas e químicas eram lideres, houve uma mudança de enfoque do sistema de patentes norte-americano visando a proteção das grandes corporações deste país em detrimento dos inventores individuais, mais protegidos na fase anterior. Desta forma, ocorre a passagem das patentes para o papel de um dos principais mecanismos de apropriação das invenções; e como indício dessa passagem, está a prioridade atribuída

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A teoria da função de aprendizagem nos ajuda a resolver um conjunto de problemas que se tem delineado ao se falar da mão-de-obra, de forma primordial, quando se aplicam novos processos de produção, principalmente quando são processos muito complexos, caracterizados por um alto grau de especialização. O aprendizado humano, considerando-o como um fato muito importante e significativo, porque à medida que realiza uma mesma atividade um número maior de vezes, menor será o tempo empregado em sua realização, já que o aprendizado representa um papel primordial. Esta idéia advém da conclusão de uma série de estudos empíricos, realizados sobre os custos históricos, onde se enunciou uma regra que dizia que, à medida que as unidades produzidas se duplicam, o tempo médio calculado unitário se reduz numa determinada porcentagem. A curva de aprendizagem expressa a relação existente entre as horas de mão-de-obra direta requeridas por unidade de produto e o número de unidades produzidas. Baseia-se na existência de uma redução percentual constante no consumo de mão-de-obra por unidade de produto, à medida que o volume de produção total aumenta, ou seja, relaciona dois fatores básicos como o tempo empregado para a fabricação de cada unidade e o número de unidades produzidas.

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ALBUQUERQUE, E. M. Sistemas nacionais de inovação e direitos da propriedade industrial: notas introdutórias a um debate necessário. Estudos Econômicos, São Paulo, v. 26, n.2, p.171- 200, maio-agosto, 1996, p.130.

aos Direitos de Propriedade Intelectual pelos principais países capitalistas na Rodada Uruguai do GATT, atual OMC332.

Para alguns setores industriais a patente sequer representa um mecanismo importante de apropriabilidade, devido às diferentes propensões a patentear de diferentes setores333. Levando-se em consideração a importância estratégica crescente dos setores que dependem das patentes na atual fase do capitalismo, fica mais clara a relação existente entre a patente e seu peso no atual paradigma técnico 334.

Considerando o ângulo da economia da informação, as modernas tecnologias da comunicação (redes de transferência de dados, comunicação eletrônica, etc.) e a tecnologia da informação (computação, criação de bancos de dados, etc.) facilitam a codificação e ao mesmo tempo facilitam o acesso a informações codificadas. Devido a essa retenção dessas informações ficariam mais dependentes de instrumentos artificiais de retenção de informações, como as patentes e outros direitos de propriedade intelectual - DPIs.

Outro ângulo a ser analisado é o da internacionalização da comunidade científica. Há um estímulo contínuo a divulgar conhecimentos e descobertas, pois para ganhar legitimidade o cientista deve convencer seus pares de sua descoberta ou invenção em seminários, congressos ou periódicos especializados. O impacto dessa internacionalização pode ser sentido graças à crescente inter-relação entre desenvolvimento científico e desenvolvimento industrial. A necessidade de geração de conhecimentos públicos choca-se com os interesses do setor industrial, para o qual são essenciais a apropriação privada de conhecimentos e o segredo. Ademais, a crescente importância da ciência na dinâmica industrial atual traz conflitos no que tange à apropriação de novos conhecimentos. Esta visão reforça a anterior, argumentando pela necessidade da imposição de barreiras artificiais para dificultar o acesso à informação.

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ALBUQUERQUE, E. M. Sistemas nacionais de inovação e direitos da propriedade industrial: notas introdutórias a um debate necessário. Estudos Econômicos, São Paulo, v. 26, n.2, p.171- 200, maio-agosto, 1996, p.131.

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Sobre as diferentes propensões de patentes nos diferentes setores, ver artigos disponíveis em http:www.INPI.gov.br/.

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Apud. ALBUQUERQUE, E. M. Sistemas nacionais de inovação e direitos da propriedade industrial: notas introdutórias a um debate necessário. Op.cit., p.132-3.

Em síntese, deve-se reconhecer o crescente peso do conhecimento na dinâmica capitalista, pois é crescente a importância dos setores intensivos em informação e em conhecimento. Assim, a comunidade científica tem importante papel na dinâmica industrial, colocando os pesquisadores em posição de follower and leader da tecnologia apreendida por intermédio de patentes.

Cabe aqui ressaltar o papel da ciência nos países em desenvolvimento. Visando o processo de desenvolvimento, a ciência é um instrumento hábil para focalizar a direção do progresso tecnológico. Ao invés de constituir uma fonte de oportunidades tecnológicas, como nos sistemas maduros de inovação, na periferia a infra-estrutura científica ajudaria na identificação correta de oportunidades geradas internacionalmente, adaptando-as às especificidades locais335. Outras contribuições da ciência para os países em desenvolvimento são a participação em processos locais de acumulação tecnológica e o fornecimento de um mínimo de informação científica pública para o aproveitamento das oportunidades que surgirem.