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2.2. A teoria da agência e a remuneração dos gestores

2.2.2. A remuneração dos gestores

2.2.2.1. A importância dos incentivos na remuneração dos gestores

A teoria da agência proporciona a base teórica mais comummente utilizada na análise das questões relacionadas com a definição da estrutura e dos componentes da remuneração dos gestores. A estruturação dos planos de remuneração tem por base, normalmente, os seguintes pressupostos: os accionistas são indiferentes ao risco; os gestores, pelo contrário, são avessos ao risco e ao esforço pessoal; as cotações das acções no mercado dependem da actuação dos gestores e de outros factores exógenos, que não são controláveis pelos executivos; e, as acções dos gestores não são directamente observáveis. Todavia, os accionistas observam as medidas de desempenho (valores de mercado ou contabilísticos) as quais fornecem sinais, ainda que ruidosos (noisy), da actuação dos gestores (Banker e Datar, 1989; Holmström, 1979; Holmström e Milgrom, 1987).

Se os accionistas tivessem informação completa sobre as actividades dos gestores e sobre o conjunto de oportunidades de investimentos, o contrato celebrado com os executivos exigiria que os mesmos actuassem de uma dada forma para cada uma das diferentes situações em troca de uma remuneração fixa e predeterminada. Porém, a qualidade das actuações dos gestores e o conjunto de oportunidades de investimento que estes enfrentam não são perfeitamente observáveis. Face a tais circunstâncias, a teoria da agência prevê a atribuição de uma remuneração aos gestores que crie incentivos conducentes ao aumento da riqueza dos accionistas (Anderson et al., 2000; Jensen e Murphy, 1990; Scott, 2003). Um plano de compensação que baseie parte da remuneração ao desempenho da empresa, (por exemplo, resultados contabilísticos e/ou preço de mercado das acções) criará incentivos para que o gestor tome decisões que originem um

aumento no valor da empresa (Grossman e Hart, 1983; Holmström, 1979). Neste ponto de vista, quanto menor for a possibilidade de observar ou controlar as actividades dos gestores, maior deverá ser a probabilidade de a remuneração ser baseada em medidas de desempenho da empresa. Assim, se ignorarmos o risco, o sistema de remuneração que permitirá potenciar um adequado comportamento por parte dos gestores será aquele que ligue a riqueza destes à dos accionistas.

A remuneração óptima para os gestores avessos ao risco, de acordo com o princípio da informatividade (informativeness principle), deve ser baseada não só no objectivo dos accionistas (maximização da sua riqueza) mas simultaneamente em variáveis que proporcionem informação adicional da actuação dos executivos (Banker e Datar, 1989; Holmström, 1979; Pavlik et al., 1993). A avaliação dos gestores efectuar-se-á com base no

output (variação na riqueza dos accionistas) e no input (actuações dos gestores). A

consideração do output no sistema de remuneração, será tanto maior quanto mais elevada for a assimetria de informação relativa às acções dos gestores. A literatura contabilística enfatiza normalmente o princípio da controlabilidade (controllability principle) como fundamental no desenho dos sistemas de avaliação de desempenho. O princípio da controlabilidade estabelece que os gestores devem ser avaliados por medidas de desempenho que possam controlar ou influenciar de forma significativa (Antle e Demski, 1988; Demski, 1997; Horngren et al., 2006; Indjejikian, 1999)7.

A aversão ao risco por parte dos gestores tem reflexos ao nível da estruturação do plano de remuneração, explicando o facto de muitos preferirem as suas remunerações estruturadas de forma a suportarem o menor risco pessoal possível (Mehran, 1995). De forma a minimizar o seu risco pessoal associado à remuneração, os gestores podem levar a cabo actividades que reduzam o risco da empresa (Jensen e Meckling, 1976). Estas actividades podem ter consequências negativas na riqueza dos accionistas, os quais são normalmente indiferentes ao risco, já que podem minimizar o risco específico da empresa mediante a detenção de uma carteira diversificada de acções.

Em suma, a parte atribuída a cada uma das diversas medidas de desempenho (baseadas em valores de mercado ou contabilísticos) nos contratos de remuneração deve

7 Note-se no entanto que o princípio da informatividade e o princípio da controlabilidade podem levar à escolha

implicar um balanceamento entre alinhamento de interesses e repartição do risco entre gestores e accionistas (Holmström, 1979; Horngren et al., 2006; Kim e Suh, 1993; Pavlik et al., 1993; Prendergast, 1999; Smith e Watts, 1982; Zhou, 2006). Ao estabelecer-se um contrato onde a remuneração do gestor é parcialmente condicionada a medidas de desempenho da empresa, o risco será de alguma forma repartido entre o gestor e os accionistas.

O sistema de remuneração constitui um mecanismo de controlo contratual que visa minimizar os custos de agência derivados da separação entre propriedade e controlo (Lewellen et al., 1992). Segundo Smith e Watts (1982) podem ser atribuídos, entre outros, os seguintes efeitos aos planos de remuneração: redução do problema do horizonte temporal; minimização dos custos de renegociação e o controlo da aversão do risco dos gestores.

O problema do horizonte temporal pode ser reduzido através da implementação de um pacote de compensação que ligue parte da remuneração a uma medida de valor da empresa e pelo diferimento da remuneração, de forma a que o gestor tenha que suportar um custo elevado, caso rescinda o seu contrato com a empresa. O diferimento dos incentivos atribuídos pode ajudar a controlar os incentivos gerados pelos planos de remuneração baseados nos resultados anuais e evitar políticas de investimento que favoreçam a eleição de projectos, os quais gerem resultados positivos nos primeiros exercícios, independentemente de se o seu valor actual líquido é positivo ou negativo.

Para além de controlarem o problema do horizonte temporal associado a remunerações fixas (salários), os planos de incentivos podem também reduzir o problema dos custos de renegociação. O gestor estará normalmente interessado numa renegociação frequente. Contudo, quanto maior for a frequência de renegociação mais elevados serão os custos de renegociação para a empresa. Desta forma, o sistema de incentivos, deve ligar a remuneração a uma medida de valor da empresa, de forma a que o processo de renegociação seja automático, minimizando deste modo os custos de renegociação.

Os planos de incentivos podem também ajudar a controlar a aversão ao risco dos gestores. Se o gestor tem uma remuneração garantida independente do valor da empresa, ele tem um incentivo de evitar projectos de investimento que impliquem um aumento do risco da empresa, de forma a proteger o valor do seu capital humano e financeiro na

empresa (Smith e Stulz, 1985). Deste modo, os gestores avessos ao risco "have incentives

to turn down risk-increasing, positive NPV projects if the negative effect on their expected utility of an increase in total firm risk is larger than the positive effect of an increase in firm value" (Cohen et al., 2000, p. 5). Contrariamente, os accionistas, ao possuírem uma

opção de compra sobre os activos da empresa, preferem projectos de investimento que originem um aumento do risco da empresa, na medida em que tal aumento maximiza o valor da sua riqueza (Jensen e Meckling, 1976). Uma forma de minimizar a aversão do risco do gestor consiste na inclusão de opções de acções no pacote de remuneração, uma vez que aumentos na volatilidade das acções originam aumentos no valor das opções de acções. As opções de acções podem incentivar os gestores a optar por projectos de investimento que impliquem aumentos na volatilidade dos fluxos de caixa da empresa. Neste sentido, Cohen et al. (2000), Coles et al. (2006a), Hjortshøj (2007) e Rajgopal e Shevlin (2002) documentam que as opções de acções incentivam os gestores a tomar decisões que aumentam o risco da empresa. Contudo, a inclusão de componentes no plano de remuneração que visem minimizar a aversão do risco dos gestores pode criar o problema de aumentar a exposição do gestor ao risco. Este facto implica custos para as empresas e, portanto, para os accionistas, uma vez que o gestor exigirá uma remuneração adicional para compensar o acréscimo no risco. Assim, "the cost of imposing risk on

workers is reflected in higher wages" (Prendergast, 1999, p. 8). Neste sentido, Rajgopal e

Shevlin (2002, p. 162) documentam "a strong positive association between cash

compensation and ESO risk incentive suggesting that firms pay CEOs greater cash compensation if they impose more risk on them via ESO risk incentives".

Em síntese, a questão fundamental torna-se a de saber como motivar os gestores e minimizar a sua aversão ao risco. Neste aspecto, o desenho dos planos de remuneração pode assumir um papel relevante para a redução dos custos de agência, e os accionistas devem utilizar incentivos que induzam os gestores a realizar actividades que maximizem o valor da empresa. "Empirical evidence suggests that relatively large reductions in agency

costs are derived from the mere introduction of financial incentives, or from relatively small levels of incentive alignment" (Westphal, 1999, p. 10).