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A indicação de instrumentos urbanísticos e sua aplicação na preservação do

CAPÍTULO III – ESTATUTO DA CIDADE E O TRATAMENTO

4. A indicação de instrumentos urbanísticos e sua aplicação na preservação do

O Estatuto da Cidade previu em seu artigo 4° instrumentos que se ligam diretamente à preservação do meio ambiente. Não sem menos importância para o tema da preservação do meio ambiente, o mesmo artigo apresenta, dentre os instrumentos jurídicos e políticos, uma série de temas que levarão a possibilidades de auxiliar a gestão ambiental do Município. Pretendeu o legislador dar possibilidades de aplicação ao Estatuto da Cidade, elencando diversas ferramentas ao Poder Público em prol da concreção das cidades sustentáveis.

216 PEDRO, Antônio Fernando Pinheiro. O Licenciamento Ambiental e a Autonomia Municipal. In

Muitos desses instrumentos foram analisados com maior atenção neste estudo devido a sua relação direta com a preservação do meio ambiente, como por exemplo, o zoneamento ambient al, a instituição de unidades de conservação, determinando espaços a serem especialmente protegidos no território municipal e o estudo de impacto ambiental. Todavia, instrumentos como o direito de superfície e direito de preempção, outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso, transferência do direito de construir estudo de impacto de vizinhança também podem servir de ferramentas em prol da preservação do meio ambiente.

Sem a pretensão de aprofundar nos temas, mas pretendendo-se apontar possibilidades factíveis, tratar-se-á de forma simplificada de como referidos instrumentos serão aplicados em prol da preservação ambiental. O direito de superfície tem previsão no artigo 21 do Estatuto da Cidade, que estabelece: “o proprietário

urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de imóveis”. Pelo direito de superfície, os poderes do proprietário de usar da coisa podem ser transferidos a outrem, sem que a propriedade como direito em si, seja alienada.

O direito de preempção tem previsão no artigo 25 do Estatuto da Cidade e possibilita que o Município possa ter preferência na aquisição de imóvel urbano em caso de alienação. Caberá ao Plano Diretor do Município definir as propriedades que estarão sujeitas ao direito de preempção. Lecionando sobre o direito de preempção, a doutrina explicita:

“Ao conferir ao Poder Público municipal preferência para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares, o direito de preempção é meio para ampliar o acesso à terra legal e urbanizada de forma a assegurar a implantação de equipamentos urbanos de interesse coletivo e espaços comunitários, a regularização fundiária , a preservação do meio ambiente natural e o planejamento do processo de urbanização, contribuindo para a sustentabilidade das cidades.

(...)

O plano diretor, por sua vez deverá indicar quais tipos de áreas sobre as quais deverá incidir o direito de preempção, de acordo com as prioridades e metas da política urbana prevista. A necessidade do Poder Público na delimitação do direito de preempção está vinculada à consecução de regularização fundiária, de programas habitacionais de interesse social, constituição de reserva fundiária, ordenamento e direcionamento da expansão urbana, implantação de equipamentos urbanos e comunitários, criação de espaços públicos de lazer, de

áreas verdes, de unidades de conservação ou proteção de áreas de interesse ambiental, histórico, cultural ou paisagístico, no termos do artigo 26.

(...)

Sob este prisma, o direito de preempção configura-se como importante instrumento que poderá ser utilizado pelos municípios para ordenação do crescimento de seu território, tanto do ponto de vista urbano quanto ambiental”.217

A outorga onerosa do direito de construir, ou o solo criado, tem previsão no artigo 28 do Estatuto da Cidade e trata da possibilidade de autorizar o proprietário do terreno a construir além do coeficiente básico de aproveitamento, mediante aquisição desse direito pelo proprietário, aopelo Poder Público. O solo criado surgiu da possibilidade de se aproveitar o terreno além do seu limite natural, ou seja, de se aproveitar a ocupação do espaço aéreo e o espaço do subsolo. Caberá ao Plano Diretor estimular ou não o adensamento populacional de certas áreas, a partir de possibilidades de ampliação ou não do potencial construtivo de cada terreno.

Assim, o Poder Público poderá determinar o uso e a ocupação do solo do território municipal, determinando um zoneamento que atenda ao interesse público. Como exemplo, se a região é atendida com uma infra-estrutura urbana e pouca adensada, poderá ser estimulado o seu adensamento populacional com a ampliação do potencial construtivo de cada terreno. Todavia, em locais de saturamento da infra-estrutura urbana, o potencial construtivo poderá ser reduzido ao seu coeficiente básico.

Ligado ao tema da outorga onerosa do direito de construir, o Estatuto da Cidade apresenta ainda a ferramenta da transferência do direito de construir, que significa:

“... a transferência do direito de construir constitui instrumento jurídico de natureza urbanística, destinado a compensar o proprietário de imóvel afetado ao cumprimento de uma função de interesse público ou social, dele desincorporando o direito de construir, segundo o coeficiente de aproveitamento previsto no plano diretor, para ser exercitado em outro local ou alienado a terceiros”.218

Vislumbra-se a utilização de referidos institutos para diversos fins ligados diretamente à preservação do meio ambiente. A título de exemplo, pode-se olvidar o interesse do Poder Público em determinar o direito de preempção em áreas de especial

217 OSORIO, Letícia Marques (Org). Estatuto da Cidade e Reforma Urbana: Novas Perspectivas para as

Cidades Brasileiras. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002, p. 190-197

218 DALLARI, Adilson Abreu; FERRAZ, Sergio (Orgs). Estatuto da Cidade: comentários à lei

interesse ambiental, como áreas propensas a instituição de unidades de conservação. Caberá ao Plano Diretor delimitar as áreas de interesse do Poder Público, bem como, se naquele local poderá ser utilizado o instrumento urbanístico do direito de preempção.

Vê-se, ainda, a possibilidade do instrumento do direito de superfície ser utilizado e oferecido por particulares para cumprimentos de compensações ambientais, termos de acordos administrativos e judiciais em prol da preservação do meio ambiente. Assim, aqueles que por alguma razão estiverem obrigados a assumir obrigação de natureza ambiental, poderão negociar com proprietários particulares o direito de explorar a propriedade e nela instituir e plantar espécies nativas, constituir reservas, etc.

A outorga onerosa do direito de construir e a transferência do direito de construir também são instrumentos que podem corroborar na gestão ambiental do município, na medida em que o Poder Público poderá determinar o uso do solo urbano, limitando os direitos do proprietário em prol do interesse maior de preservação. Dessa maneira, o potencial construtivo de certa região poderá ser reduzido em favor do estímulo, da indução ou da ampliação de unidades de conservação.

Outro importante instrumento da política urbana criado pelo Estatuto da Cidade é o Estudo de Impacto de Vizinhança, que tem por fundamento o princípio da função social da propriedade e visa evitar o desequilíbrio no crescimento urbano, garantindo condições mínimas de ocupação dos espaços habitáveis. O EIV vem disposto no art. 36 do Estatuto da Cidade e tem por objetivo limitar a liberdade de construção, em razão da possibilidade de conseqüências negativas com sua implementação. A Administração Pública, por meio do EIV, intervirá de maneira a evitar que haja prejuízo dos interesses coletivos em função do empreendimento.

O artigo 36 do Estatuto da Cidade, esclarece que lei municipal disporá sobre os empreendimentos e atividades que dependerão de EIV para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público Municipal. Portanto, a competência para obrigar ao EIV é do Município, através de lei municipal.

Nos termos do artigo 37 do Estatuto da Cidade, o EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das seguintes questões: I – adensamento populacional; II – equipamentos urbanos e comunitários; III – uso e ocupação do solo; IV – valorização imobiliária; V – geração de tráfego e demanda por transporte público; VI – ventilação e

iluminação: VII – paisagem urbana e patrimônio natural e cultural. É necessário frisar que o artigo não esgotou a matéria, tendo em vista que no mínimo devem se analisar no EIV as questões descritas acima. Portanto, cada Município poderá regulamentar a matéria, que deverá conter as condições acima expostas.

Seguindo a diretriz geral da política urbana, instituída no artigo 2º, o parágrafo único do artigo 37 também torna obrigatória a participação popular no processo de expedição da licença urbanística e do respectivo estudo de impacto de vizinhança. Diz o parágrafo único do artigo 37: “Dar-se-á publicidade aos documentos integrantes do

EIV, que ficarão disponíveis para consulta, no órgão competente do Poder Público Municipal, por qualquer interessado”.

O Plano Diretor de cada Município poderá indicar os empreendimentos ou atividades que estarão sujeitas ao EIA e, de uma forma ou de outra, haverá relação do referido estudo com as questões ambientais do meio urbano. O EIA não pode deixar de ter em conta os aspectos do ambiente natural, por previsão expressa do Estatuto da Cidade (artigo 37, VII). Por meio do EIA podem ser identificadas as fontes de poluição, danos efetivos e potenciais de respectivo empreendimento ou atividade e medidas mitigadoras e compensatórias ao meio ambiente urbano.

Enfim, embora de forma simplificada, entende-se que os instrumentos urbanísticos ora citados são de grande aplicação na órbita da preservação do meio ambiente e de uma gestão municipal dos assuntos urbanos/ambientais.

CAPÍTULO IV – PLANO DIRETOR E SUA CONTRIBUIÇÃO NA