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CAPÍTULO III – ESTATUTO DA CIDADE E O TRATAMENTO

2. Uma análise das Diretrizes Gerais da Política Urbana que se direcionam às

2.4. Proteção, preservação e recuperação do meio ambiente

O Estatuto da Cidade trata como diretriz geral que deve reger a política urbana (art. 2°, XII), o dever de proteger, preservar e recuperar o meio ambiente natural e construído, assim como o patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e ecológico. Em razão do presente estudo se direcionar a ações do Município na preservação do meio ambiente, acredita-se que as normas do Estatuto da Cidade também se apresentam como mais um viés normativo, da obrigatoriedade de execução de políticas ambientais nos Municípios Brasileiros.

Ainda existem poucas iniciativas dos Municípios no sentido de incorporar ao seu ordenamento jurídico regras de proteção ao meio ambiente, principalmente em razão dos problemas de ordem administrativa e financeira. Outras vezes, quando se vê atuação municipal, estas se restringem a casos expressos de invasão dos limites constitucionais de sua competência, mormente, legislando de maneira mais branda que os demais entes federativos.

Todavia, existe a possibilidade jurídica de o Município tratar de aspectos setoriais do meio ambiente sem, contudo, esbarrar nas competências da União e dos Estados para legislar sobre a matéria. A doutrina de Paulo Afonso Leme Machado, mencionando

184 ALFONSIN, Betânia de Moraes. Políticas de Regularização Fundiária: Justificação, Impactos e

Sustentabilidade. In FERNANDES, Edésio. Direito Urbanístico e Política Urbana no Brasil. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2001, p. 246

sobre a competência privativa da União legislar sobre águas, nos termos do art. 22, IV da Constituição, aduz:

“Não se pode, contudo, esquecer que a quantidade e a qualidade das águas dos rios, ribeirões, riachos, lagos e represas, vão depender da implementação da política ambiental e da legislação existentes, com referência notadamente, ao ordenamento do território do Município. Os efluentes domésticos e industriais são matéria de inegável interesse local. Assim, o Município pode suplementar, mais restritivamente, as normas de emissão federais e estaduais como, também, poderá ter norma autônoma, desde que comprove o interesse local e estejam, a União e o Estado, inertes no campo normativo”.185

A mesma doutrina186 defende que sobre aspectos ambientais de controle do uso de agrotóxicos e da poluição atmosférica poderá o Município, através do zoneamento, suplementar as normas federais e estaduais e expedir lei visando atender o interesse local.

Assim como na consecução da preservação do patrimônio histórico-cultural, o ente municipal deve ser mais do que cooperador pela prevalência de seu patrimônio. O patrimônio cultural e histórico representa a identidade de um povo e deve ser tutelado pelo Poder Público Munic ipal como bem ambiental de natureza difusa, sendo indisponível, imprescritível e inalienável. A Constituição determina a tutela do patrimônio cultural brasileiro, na forma de seu art. 216, in verbis:

“Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiros os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I – formas de expressão;

II – os modos de criar, fazer e viver;

III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artísticos-culturais;

V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

§ 1° O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.

(...)”.

185 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2005,

388

Em matéria de preservação do patrimônio cultural, a Constituição fala do tombamento ou “forma de intervenção do Estado na propriedade privada, que tem por

objetivo a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional...”187 em que “... o

Poder Público protege determinados bens, que são considerados de valor histórico ou artístico, determinando a sua inscrição em Livros do Tombo, para fins de sua sujeição a restrições parciais...”188 A pertinência do tombamento na preservação do patrimônio cultural vem também expressa no Estatuto da Cidade, que o elenca como um de seus instrumentos jurídico políticos, inscrito na alínea “d”, para consecução de uma política urbana em prol da preservação.

Importante citar ainda, para o tema da preservação ambiental, a possibilidade do Município estabelecer legislação para proteção de sua flora, levando-se em conta sempre o seu interesse local e respeitando-se normas gerais de competência da União. Destacando a possibilidade do Município legislar em prol da flora, dispõe o art. 2º do Código Florestal:

“no caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, observar-se-á o disposto nos respectivos planos e leis de uso do solo, respeitando os princípios e limites a que se refere este artigo”.

O Município poderá determinar situações e locais de seu território em que é imprescindível uma maior proteção ambiental e, em razão de seu interesse local, estabelecer legislação mais restritiva do que as da União, bem como desapropriar, instituir servidão, enfim, determinar usos que atendam ao interesse público. A regulamentação municipal de regras de preservação, recuperação e aquelas tendentes a evitar a degradação ambiental, deve ser matéria constante da lei do Plano Diretor - instrumento maior de aplicação e execução de políticas de desenvolvimento urbano, regulamentado pelo Estatuto da Cidade.

Lecionando sobre diretrizes ambientais, Plano Diretor e plano da bacia hidrográfica, a doutrina de Paulo Afonso Leme Machado afirma que:

“A propriedade urbana e a cidade têm funções sociais, e estas funções serão cumpridas pela política urbana quando, no que diz respeito ao

187 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Editora Atlas, 2002, p. 133 188 Ibidem

meio ambiente, se observarem as diretrizes gerais de: 1) garantir-se o direito ao saneamento ambiental; 2) realizar-se o planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente; 3) ordenar-se e controlar-se o uso do solo, de forma a evitar a poluição e a degradação ambiental; 4) adotarem-se padrões de produção e consumo de bens e serviços compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental do Município; 5) proteger-se, preservar-se e recuperar-se o meio ambiente natural e construído e o patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico (art. 2°, I, IV, VI, VIII e XII da Lei 10.257/01).189

Acrescenta o autor que, “Ao se elaborar o plano diretor, providências específicas

deverão ser inseridas sobre cada um dos aspectos”190. Após uma introdução à matéria de preservação do meio ambiente, inscrita no Estatuto da Cidade, adentrar-se-á nos instrumentos típicos de preservação ambiental introduzidos pela Lei Federal n° 10.257/01.