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CAPÍTULO III – ESTATUTO DA CIDADE E O TRATAMENTO

2. Uma análise das Diretrizes Gerais da Política Urbana que se direcionam às

2.2. O Planejamento das cidades

O Estatuto da Cidade trata do planejamento (art. 2°, IV) como diretriz da política urbana, na qual se vislumbra importantes atuações públicas em prol da preservação ambiental. Em estudos ao regime jurídico do planejamento urbanístico, José Afonso da Silva define o planejamento como: “... um processo técnico instrumentado para

transformar a realidade existente no sentido dos objetivos previamente estabelecidos”.167

A atividade de planejar, inicialmente era correlata às atividades da administração. Hoje, todavia, o planejamento se confirma como instituição jurídica e vem disposto no art. 21, IX da Constituição, como competência da União para: “Elaborar e executar

planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social”; no art. 25, § 3°, que estabelece que “...os Estados poderão

instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões... para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum”; o art. 30, VII, que, conforme já dito, estatui que: “compete ao Município promover o

adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso do solo...”; o art. 174, § 1°, que dispõe: “a lei estabelecerá as diretrizes e bases do

planejamento e desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento”; e o art. 182, que estabelece o Plano Diretor como instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.

O planejamento angariou, portanto, posição normativa constitucional e não poderá ser renegado na atividade do Poder Público, conforme se pode verificar do caput do

mencionado art. 174 da Constituição Federal: “Como agente normativo e regulador da

atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado”. Luís Alberto de Mattos Freire de Carvalho168, em comentários ao

art. 143, IV da Constituição Federal de 1967, ao tratar do tema do planejamento, asseverou:

“O legislador constitucional, ainda, coloca o planejamento sob a tutela do princípio da legalidade, ao estabelecer a necessidade do Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, dispor sobre essa matéria (art. 143, IV).

Da análise do texto constitucional forçosas tornam-se as seguintes conclusões:

- o planejamento constitui-se em um dever do Estado. É ônus do Estado planejar e promover o desenvolvimento nacional.

- o planejamento é lei federal que estabelece diretrizes a serem alcançadas.

- É obrigatório aos Estados e Municípios planejarem a utilização de recursos oriundos da União.

- As diretrizes consagradas pelo plano nacional não podem ser contrariadas pelos programas econômicos ou financeiros adotados pelos Estados ou Municípios”.

A Constituição de 1967 já imprimia o caráter vinculativo da atividade de planejamento para o Poder Público. Num conceito simplista, Lílian Regina aduz que o planejamento “... é um método onde se processa o modo de executar para o alcance de

certos objetivos”.169 A idéia de planejamento, todavia, busca um fim maior que é o desenvolvimento. A consolidação do planejamento instrumentalizado por meio de planos é um caminho para que o Estado possa se organizar, a fim de se atingir objetivos maiores como crescimento sustentável, a concretude de políticas públicas tendentes à geração de renda, a preservação do meio ambiente, a qualidade de vida, etc. Neste sentido, observa Eros Grau:

“A idéia de desenvolvimento supõe dinâmicas mutações e importa que se esteja a realizar, na sociedade por ela abrangida , um processo de mobilidade social contínuo e intermitente. O processo de desenvolvimento deve levar a um salto, de uma estrutura social para

168 CARVALHO, Luís Alberto de Mattos Freire de. Temas de Direito Urbanístico I. In DALLARI,

Adilson Abreu; FIGUEIREDO, Lúcia Valle (coords). Aspectos Jurídicos do zoneamento (art.) São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 1987, p. 148

169 PIRES, Lílian Regina Gabriel Moreira. Função social da propriedade urbana e o plano diretor. Belo

outra, acompanhado da elevação do nível econômico e do nível cultural – intelectual comunitário”.170

Acrescenta-se ainda que:

“O planejamento não pode ser entendido como uma atividade técnica de organização do processo decisório (ênfase da razão técnica). Na concepção contemporânea, o planejamento é visto como um processo de negociação e decisão política, envolvendo diferentes atores e grupos sociais, portadores de interesses diversos e capacidade de influenciação e poder também distintos (Matus, 1989).

O processo de planejamento organiza o círculo decisório, que é alimentado e fundamentado por recursos e instrumentos técnicos e organizacionais, mas seu caráter é essencialmente político. No planejamento governamental, o Estado é ator estratégico da implementação de um projeto dominante e um lócus importante da luta social. O processo de planejamento incorpora as decisões que resultam de negociação técnico política. Essa concepção do planejamento tem uma importância fundamental na estruturação do sistema institucional encarregado de produzir planos, programas e projetos. Ela impede a reprodução da experiência de livros-planos, meras declarações de intenções, produtos de elaborações tecnocráticas, sem força nem patrocínio político”.171

O planejamento, portanto, desenvolverá processos técnicos que serão tratados por meio de lei, da qual constarão caminhos mais eficientes e eficazes ao alcance de objetivos previamente fixados, e que se instrumentalizará através de planos. O Estatuto da Cidade estabelece entre suas diretrizes gerais o “planejamento do desenvolvimento

das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente”.

A referida diretriz apresenta grandes temas que por si só podem conduzir a importantes pesquisas de Direito Urbano/Ambiental: o planejamento como norte para o desenvolvimento das cidades, a ordenação do território e da atividade econômica e a possibilidade dessas interferências determinarem a preservação do meio ambiente. Entretanto, interessa afirmar que o planejamento como um processo técnico e direcionado à ordenação do território, poderá determinar, em especial, usos compatíveis com o meio ambiente equilibrado. Neste sentido:

170 GRAU, Eros Roberto. Elementos de Direito Econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981, p. 7 171 Ibidem.

“Conforme dissemos alhures, o Estatuto da Cidade, mediante instrumentos próprios, dá ênfase ao planejamento como indutor do desenvolvimento e da expansão urbanos, para alcançar o equilíbrio social e ambiental. Longe de ser uma panacéia, a Lei nº 10.257/01 credencia -se a tutelar o meio físico natural, cultural e artificial, ao dispor que o uso da propriedade urbana deve ser exercido em prol do bem coletivo, do equilíbrio ambiental (parágrafo único do art. 1º) e respeitar sua função social”.172

O planejamento se consubstancia por meio de planos. No caso da Política Urbana, o Plano Diretor será o instrumento para determinar o planejamento da cidade em prol do cumprimento da função sócio-ambiental da propriedade. A partir do Capítulo IV, será dada ênfase ao Plano Diretor e às possibilidades desse instrumento de planejamento estabelecer a preservação do meio ambiente.