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A influência da doutrina Norte-Americana

No documento EsAO Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (páginas 35-39)

Cap Art Eduardo da Cruz Oliveira

A influência da doutrina norte-americana na EsAO

Até a década de 1930, o pensamento militar e a dou-trina militar do Exército Brasileiro eram predomi-nantemente influenciados pelos modelos francês e prussiano. Esse quadro começou a mudar a partir do momento em que o Exército deu início a uma aproximação mais intensa dos militares norte-ame-ricanos.

Em 1934, o governo brasileiro decidiu contratar a Missão Militar Americana (MMA). Essa ação se configurou como o ponto de partida para o estrei-tamento das relações militares entre os Exércitos do Brasil e dos Estados Unidos da América.

A chegada da Missão Militar Americana deu iní-cio a um importante processo de mudanças em toda a estrutura do Exército. A partir do entrosamento entre os militares dos dois países e, especialmente, dos novos conhecimentos trazidos pela MMA, sur-giram novas ideias sobre organização, currículos, emprego de armamentos padronizados e maneiras de realizar o trabalho.

Passou a ocorrer uma série de mudanças no pensamento militar e na doutrina militar brasileira. A influência da doutrina norte-americana, “[...] foi aos poucos substituindo o pensamento doutrinário prussiano e o francês”.1

No fim da década de 1930, o mundo se deparou com o início de um novo conflito global. A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) foi o mais terrível, mais devastador e mais brutal conflito da história huma-na. Como saldo, o conflito teve milhões de pessoas mortas, dentre as quais, grande parte eram civis.

1RODRIGUES, F. S. Da Chegada da Missão Militar no

Brasil em 1936 à Dominação Total da Influência doutri

-nária do Exército do Tio Sam no Exército do Zé Carioca. Cadernos da Fadel. v. 1, p. 1-15, 2008 (VER CITAÇÃO).

Entretanto, no que tange especificamente a evolu-ção dos métodos de combate, de maneira geral, a Se-gunda Guerra trouxe consequências revolucionárias para o pensamento militar e para a doutrina militar.

Foi um período dinamizador para o Exército Bra-sileiro, de embate de influências, com o aumento significativo da preponderância da doutrina militar norte-americana e de métodos e processos de ensi-no moderensi-nos, incitados pelo empenho na mobiliza-ção e preparamobiliza-ção para a guerra por parte de nações do mundo inteiro.

O aumento do contato com esses novos métodos e processos de ensino decorrentes da doutrina nor-te-americana continuou influenciando significativa-mente o Exército Brasileiro e, consequentesignificativa-mente, as suas escolas militares.

No campo político-militar, o fato que concretizou a cooperação bélica entre Brasil e Estados Unidos da América foi à criação da Comissão Militar Mista Brasil-EUA (CMMBEU), no ano de 1942. A Comissão era dividida em duas outras comissões, a Comissão Conjunta de Defesa Brasil Estados Unidos e a Comis-são Militar Conjunta Brasil Estados Unidos.

As duas juntas foram compostas por militares de ambas as nações e contribuíram para o aprofundamen-to dos laços político-militares entre Brasil e EUA. Uma de suas principais finalidades era permitir que os acor-dos militares firmaacor-dos entre os dois países, ao longo da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), pudessem ser colocados em prática de forma eficiente e oportuna.

A partir da CMMBEU, foi possível à execução da denominada Lei de Empréstimo e Arrendamento (Lend-Lease Act) estabelecida em meados do ano de 1941. Essa lei permitia ao governo norte-americano negociar materiais de emprego militar e informa-ções reservadas sobre defesa com países aliados.

Sendo assim, o Brasil passou a adquirir materiais de emprego militar norte-americanos que permitiram a transformação de vários aspectos doutrinários das Forças Armadas nacionais, em particular do Exército.

Como exemplo, pode-se citar a Força Expedi-cionária Brasileira (FEB), que recebeu uma grande quantidade de materiais militares estadunidenses para combater no segundo conflito mundial.

A participação da FEB na referida Guerra repre-sentou um divisor de águas em toda a concepção estrutural, organizacional e doutrinária do Exército Brasileiro. Ao longo do conflito, os militares brasilei-ros adquiriram inúmebrasilei-ros ensinamentos relativos à arte da guerra e ao pensamento militar.

Toda essa conjuntura permitiu que a influência estadunidense sobre o Exército Brasileiro, iniciada em meados da década de 1930, se estendesse pe-los anos da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e fosse além, presente ao longo de boa parte dos anos referentes ao período da Guerra Fria (1945-1991).

Esse contexto de transformações político-milita-res estabeleceu uma ligação direta com a Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO). Isto se deu pelo fato de que, como parte fundamental da Força Ter-restre brasileira, a referida Escola não poderia ficar imune a esse profundo processo de modificações que o Exército vivenciava.

Quanto a Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, é oportuno dizer que alguns anos antes do segundo conflito mundial, mas precisamente em 1936, foi de-terminado que a EsAO fosse reestruturada. A Escola passou a ser denominada Escola das Armas (E.Arm), e vivenciou uma reformulação organizacional, admi-nistrativa e em toda a sua estrutura de ensino.

A Escola das Armas passou a ser destinada a ofi-ciais e sargentos de infantaria, cavalaria, artilharia e engenharia. Em função dessas novidades,

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naram-se algumas mudanças estruturais nas depen-dências internas e passaram a existir quatro cursos regulares durante o ano de instrução.

O primeiro curso era de aperfeiçoamento para 1° tenentes e capitães, com duração de oito meses, cujo fim era preparar bons comandantes de subu-nidades. O segundo era o curso para sargentos, também com duração de oito meses, cuja finalidade era a preparação dos sargentos para as funções de comandantes de pelotão e seção.

O terceiro era o curso de aperfeiçoamento para majores, que extinguiu o antigo curso de aperfeiço-amento de oficiais superiores e tinha a duração de quatro meses, com o objetivo de ensinar o emprego

conjunto das armas. Finalmente, o último curso era de informações para tenentes-coronéis e coronéis, com duração de dois meses, cujo propósito era habilitar os discentes a algumas funções inerentes ao comando.

Durante o período da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), em particular no ano de 1942, houve uma grande falta de oficiais nos corpos de tropa brasileiros. Em função disto, o comando do Exército determinou que as unidades militares brasileiras permanecessem com o seu efetivo o mais completo possível.

Diante dessa conjuntura, visto que a Escola das Armas absorvia, anualmente, um grande número de oficiais em seus corpos discente e docente, foi de-cidido pelo ministro da Guerra que a instituição de

ensino seria fechada provisoriamente, até que as con-junturas mundial e nacional voltassem à normalidade. Com o fim do conflito mundial, ocorreu a norma-lização do cenário nacional e global. Dessa forma, as autoridades militares brasileiras optaram por reali-zar uma reconfiguração do ensino militar.

Sendo assim, por meio do Decreto-Lei nº 7888, de 21 de agosto de 1945, estabeleceu-se que a Escola das Armas, que estava fechada, seria novamente re-estruturada e que seu nome voltaria a ser Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais.

A partir da recriação da EsAO, a influência norte--americana passou a ser uma realidade cotidiana na instituição. Tal ingerência ocorreu por intermédio de

militares da Missão Militar Americana, por meio de oficiais da Escola que foram enviados aos EUA, me-diante o uso de manuais militares norte-americanos, dentre outras formas.

Com a influência estrangeira, houve o surgimen-to de novas normas, documensurgimen-tos foram criados, ocorreram mudanças na instrução, novos ensina-mentos foram adquiridos e efetuou-se a aquisição de novos materiais de emprego militar.

Durante alguns anos após 1945, oficiais norte-a-mericanos da Missão Militar Americana estiveram presentes na Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais e cooperaram diretamente com a instrução militar desenvolvida no estabelecimento de ensino. Além disso, visitas de membros da MMA à Escola eram atividades frequentes.

Alguns oficiais instrutores da EsAO realizaram visitas, estágios e cursos no EUA com a finalidade de adquirir os conhecimentos doutrinários norte-a-mericanos e os reproduzir na Escola. Quando esses militares retornaram ao Brasil, eles inseriram esses ensinamentos nas instruções ministradas aos seus alunos, e foram veículos de propagação da influên-cia norte-americana.

Também a partir de 1945, diante das novas con-cepções sobre o combate, o Estado-Maior do Exér-cito aprovou novos manuais militares que substituí-ram em grande parte àqueles que estavam em vigor até então. Esses manuais eram baseados na doutrina militar norte-americana.

Dentre eles, podem-se relacionar os manuais “Artilharia de Campanha” (C 6-40), “A Divisão Blin-dada” (C 7-100), “Operações Especiais” (C 31-50), “Serviço em Campanha e Suprimentos” (C 3-15), Estado-Maior e Ordens (C101-5) e o Manual de Ope-rações (C100-5), traduzidos literalmente, a partir do modelo original estadunidense.

A EsAO passou a utilizar esses manuais em suas instruções e fundamentou neles seus ensinamentos militares. Como consequência, as práticas e méto-dos de combate brasileiros passaram a adquirir as características defendidas pelos estadunidenses.

Outro fato interessante é que por meio das relações com os norte-americanos, novas normas foram estabe-lecidas na Escola. Antes da influência estadunidense, o comandante da EsAO não se envolvia nos assuntos ligados ao ensino, limitando-se unicamente aos pontos de caráter disciplinar e administrativo. Diante das no-vas concepções isso mudou, e o comandante passou a ser também o diretor de ensino da Escola.

Além disso, cabe citar a instituição do Prêmio Ge-neral Nestor Penha Brasil no ano de 1964. Essa distin-ção foi uma iniciativa norte-americana por intermé-dio do chefe da Seção do Exército dos Estados Unidos da América da Comissão Militar Mista Brasil-EUA e era destinada ao oficial aluno que mais se destacasse pelas qualidades de liderança e pelos atributos mili-tares. De acordo com os registros históricos da EsAO, a premiação ocorreu até meados da década de 1970.

Na instrução propriamente dita, a partir dos en-sinamentos norte-americanos, a Escola chegou ao entendimento da necessidade de uniformização de seus métodos de ensino. Com isso, foram estabele-cidos cursos de atualização de métodos e processos de instrução para os instrutores, em acordo com o que os estadunidenses defendiam.

Além do mais, diante das mudanças que acon-teciam no Exército, em função da influência norte-americana, criou-se, em 1964, o chamado curso de preparação. Inicialmente, esse curso foi estabeleci-do em caráter experimental e tinha duração de cerca de cinco meses. O curso representa o pioneirismo do ensino a distância na Escola, uma vez que era ministrado por meio de correspondências.

Seu objetivo principal era a atualização e a complementação dos conteúdos teóricos e práticos fundamentais para o cumprimento das atribuições de um comandante de subunidade. Seu conteúdo didático era composto por assuntos que abrangiam pontos comuns a todas as armas e ao serviço de in-tendência, mas também possuía conteúdos específi-cos de cada especialização militar.

Após o curso de preparação, por ocasião da che-gada à EsAO, os alunos faziam uma avaliação inicial que contemplava todos os assuntos ministrados du-rante o curso a distância. No ano de 1967, foi decidi-do que o curso de preparação deveria ser mantidecidi-do pelos anos subsequentes, tendo em vista que os

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sultados observados durante o período experimen-tal alcançaram um nível além do esperado.

No que tange aos ensinamentos adquiridos, em função das ideias defendidas e empregadas nas es-colas militares norte-americanas, houve a mudança do método de avaliação do ensino na EsAO. Com isso, substitui-se a avaliação por meio de graus nu-méricos pelo uso de menções sintéticas.

A partir de então, a principal forma de avaliar os alunos passou a ser por meio de menções, que eram definidas em excepcional, muito bem, bem, regular e insuficiente.

Também por causa dos ensinamentos estaduni-denses, o comando da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, passou a dar maior importância a uma seleção e preparação rigorosa daqueles militares que se tornariam instrutores do estabelecimento de ensino.

Ainda sobre ensinamentos adquiridos, também é conveniente dizer que nas manobras escolares realizadas nas décadas de 1940, 1950 e 1960,

pra-ticavam-se inúmeros ensinamentos provenientes do convívio com a doutrina militar norte-americana.

Dentre esses ensinamentos, pode-se citar: a prá-tica de operações em conformidade com as lições adquiridas no segundo conflito mundial, o emprego da combinação de armas e serviços, o estudo das operações nos escalões exército de campanha, cor-po de exército, divisão, grucor-pos táticos, regimento e batalhão e a ênfase na redação detalhada de docu-mentos de planejamento, ordens de execução, or-dens de operações e demais documentos de rotina.

Com relação à aquisição e utilização de novos materiais de emprego militar, o Exército Brasileiro adquiriu uma série de armamentos e equipamentos militares dos Estados Unidos da América. Alguns desses materiais foram incorporados às Unidades da Vila Militar e passaram a ser objeto de ensino para os cursos das armas da EsAO.

Dentre esses materiais, pode-se citar: fuzis Ga-rand, morteiros 60 mm e 81 mm, bazuca, metralhado-ras leve .30 e .50, canhão anticarro 57 mm, minas

an-tipessoal e anticarro, bombas de gasolina gelatinosa, obuses 105 mm e 155 mm, obuses autopropulsados, radares, sonares, canhões antiaéreos, carros de com-bate Sherman, viaturas blindadas de transporte de pessoal (VBTP) Scout car e Half-track, dentre outros.

Com isso, também houve a influência da doutri-na militar norte-americadoutri-na doutri-na EsAO por meio dos materiais de emprego militar estadunidenses, adqui-ridos e utilizados pelos militares da Escola, a partir de meados da década de 1940.

Finalmente, no período entre a recriação da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, em 1946, e meados da década de 1960, a influência norte-ame-ricana no Exército e, consequentemente, na EsAO, ocorreu de diversas formas. Essa influência se deu em maior intensidade nas décadas de 1940 e 1950.

A partir do final da década de 1960, as autorida-des militares brasileiras passaram a buscar o autorida- desen-volvimento de uma doutrina militar própria. Sendo assim, iniciou uma gradativa diminuição da influên-cia estadunidense sobre as tropas brasileiras.

Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (1920-1933)

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