• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO I O DIREITO, O PROCESSO E ALGUNS INSTITUTOS

2.8 A Interdependência entre Direito e Processo e a Efetividade

A tutela jurisdicional precisa tornar-se cada vez mais flexível, no sentido de adaptá-la às necessidades do desenvolvimento eficaz do processo, como instrumento efetivo de proteção das situações de direito substancial.61

Para Pisani, a previsão de tutela jurisdicional para determinar a situação de vantagem sobre o bem da vida não é o bastante. É imprescindível que o titular dessa situação de vantagem, e que precise da tutela estatal jurisdicional para assegurá-la, possa valer-se dela e ver satisfeito o seu direito62. Dessume-se disso que os questionamentos dos processualistas não podem limitar-se ao aspecto puramente processual. A elaboração de conceitos e regras de processo deve atender à realidade social e às necessidades dos jurisdicionados.63

Sobre a referida flexibilização encontram-se evidentes exemplos em novos instrumentos processuais como mandado de injunção, ação civil pública para a defesa dos interesses difusos e coletivos e os Juizados Especiais Cíveis e Criminais.64

Verifica-se, pois, a necessidade premente de conscientização do processualista no sentido de que sua ciência só tem sentido se servir de maneira eficaz a seu objeto. Segundo Proto Pisani, pode se afirmar, mesmo, ser o direito substancial indispensável ao direito processual, que não existiria sozinho. Tal circunstância não o coloca, todavia, em situação de inferioridade, pois também não se pode conceber o direito material sem o instrumento para torná-lo efetivo. Existe evidente relação de interdependência entre os dois ramos do Direito.65

O processo é instrumento e, como tal, deve ser moldado de maneira a melhor proporcionar o resultado pretendido pelos que dele necessitam. Isso somente é possível se for concebido a partir da realidade verificada no plano das

61

BIDART, Adolfo Gelsi. Tutela procesal diferenciada, Revista de Processo 44/104. 62

Appunti sulla Giustizia Civile, p. 11. 63

CAPELLETTI, Mauro. Algunas reflexiones sobre el rol de los estudios procesales en la actualidad. Revista de Processo 64, p. 148-149.

64

GRINOVER, Ada Pelegrini. A tutela jurisdicional dos interesses difusos do consumidor brasileiro. Comunicação apresentada nas XIII Jornadas Ibero-Americanas de Direito Processual, de 9 a 13/8/92. Cuernavaca, México, p. 3. “A preocupação do legislador, nesse passo, é com a efetividade do processo destinado à proteção do consumidor e com a facilitação do seu acesso à Justiça. Isso demandava, de um lado, o fortalecimento do consumidor em juízo – até agora pulverizada, isolada, enfraquecida perante a parte contrária que não é, como ele, um litigante meramente eventual – exigindo um novo enfoque da par conditio e do equilíbrio das partes, que não fossem garantidos no plano meramente formal; e, de outro lado, exigia a criação de novas técnicas que, ampliando o arsenal de ações coletivas previstas pelo ordenamento, realmente representassem a desobstrução do acesso à Justiça e o tratamento coletivo de pretensões individuais que isolada e fragmentariamente poucas condições teriam de adequada condução. Isso tudo, sem jamais olvidar as garantias do “devido processo legal”.

65

relações de direito material. As necessidades encontradas em sede das relações substanciais devem nortear o processualista na construção de sua ciência.66

Impossível negar a integração existente entre o direito substancial e processo, posto que é parâmetro para o exercício da ação e da jurisdição67. Nos dias atuais não se discute mais sua independência e autonomia. Debate-se, todavia, a respeito da sua efetividade, que, em última análise, significa que o processo deve proporcionar a total proteção ao direito substancial.

Somente se pode falar em efetividade do processo se o seu resultado for socialmente útil, proporcionando ao titular de uma pretensão, em cada caso concreto, o acesso à ordem jurídica justa.

Questiona-se sobre adequada proteção jurídica como um dos direitos inalienáveis da pessoa humana, incluindo-se nesse rol o direito a um processo adequado e justo, que assegure ao titular da pretensão fundada no direito material a possibilidade de tutela efetiva.68

O instrumento somente será eficaz se ele for adequado ao fim pretendido. A utilidade do ordenamento jurídico material está intimamente relacionada com a eficácia do processo, que constitui um meio para garantir a aplicação do direito. De acordo com Pisani, o Estado deve, pois, apresentar um meio idôneo para assegurar a efetividade da tutela jurisdicional adequado às necessidades verificadas no plano das relações jurídicas que envolvem a conduta humana.69

A finalidade do direito material, entendida esta não como mera previsão abstrata de situações da vida, mas como possibilidade de proteção efetiva dos interesses jurídicos abstratamente tutelados, depende do direito processual como instrumento.70

Quanto mais houver procedimentos às especificidades da tutela pleiteada, mais próximos se estará da justa composição dos interesses em conflito, isto é, mais o direito processual concretizará o direito material abstrato e genérico, com vista a assegurar, com eficiência, a efetividade deste.

66

ARMELIN, Donaldo. Tutela jurisdicional do meio ambiente. Revista do Advogado 37 e ss. p. 49. 67

FAZZALARI, Elio. Note in Tema di Diritto e Processo. Milão, Giuffrè Editore, 157, p. 113 (trad. livre). 68

COMOGLIO, Luigi Paolo. Il modeli di garanzia costituzionale del processo. Riv. Trim. Di Dir. e Proc. Civ. 3/683, (trad. livre).

69

Appunti sulla Giustizia Civile, p. 43. 70

Fala-se hoje, no aspecto negativo da instrumentalidade do processo, que corresponde exatamente à posição aqui sustentada, no sentido de colocar um ponto final nas distorções causadas pelos excessos cometidos na fase autonomista.71 Não há como se vislumbrar, mesmo em perspectiva, a autonomia de um instituto que não tem razão na sua existência isoladamente.

A partir do momento em que houver normas processuais adequadas à realidade social e interpretadas em consonância com sua natureza instrumental, certamente se estará muito perto do objetivo tão almejado pela ciência processual: a efetividade da tutela jurisdicional.72

71

DINAMARCO, Candido Rangel. A instrumentalidade do processo. 3ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 1993, p. 267. “Como vem sendo dito, é relativizar o binômio substance-procedure. Não se trata de renunciar a autonomia do direito processual e muito menos aos princípios solidamente instalados em sua ciência a nível de garantias constitucionais. É que a autonomia do processo não implica o seu isolamento e o seu culto como se fosse um valor em si mesmo.”

72

BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo – influência do direito material sobre o processo, 2. ed., Malheiros Editores, 1997, São Paulo, p. 63.

3SUJEITO JURÍDICO

Sujeito de direito é aquele a quem cabe o dever de cumprir ou o poder de exigir, ou ambos – de acordo com o art. 1º do Código Civil. Direito, quanto ao sujeito, é a faculdade, ou o poder de agir, conferida a um sujeito ou titular. Todo sujeito de direito é pessoa. A palavra “pessoa” tem sua origem etimológica no latim persona, emprestada da linguagem teatral na antigüidade romana73 que significava uma máscara facial de cera.

Na Grécia, berço da criação e desenvolvimento da arte teatral, tal máscara era usada para configurar e caracterizar os tipos ou personagens e destinava-se a dar eco às palavras e maior ressonância à voz. Posteriormente, o vocabulário veio expressar o próprio indivíduo que representa papéis (personagem). Personare queria dizer ecoar, fazer ressoar. Modernamente, no sentido jurídico, todo ser humano é pessoa. Sujeito de direito é a pessoa a quem a lei confere a faculdade ou a obrigação de agir, exercendo poderes ou cumprindo deveres.

Não obstante, para Kelsen é sujeito jurídico quem é sujeito de uma pretensão ou titularidade jurídica 74. Para esse autor o conceito de sujeito de direito é auxiliar à descrição do direito. Pessoa é a unidade personificada que representa um complexo de direitos e deveres; é a unidade personificada das normas jurídicas que lhe impõe deveres e lhe confere direitos.

O direito positivo admite duas espécies de pessoas: “naturais e jurídicas”. Pessoas naturais são os seres humanos; as pessoas jurídicas podem ser de direito público ou de direito privado, sendo essas as associações, as sociedades (civis e comerciais) e as fundações, e aquelas, a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as autarquias no âmbito interno.

As pessoas jurídicas de direito público externo constituem-se pelos organismos internacionais. Tanto as pessoas naturais quanto as jurídicas são sujeitos de direito; entretanto, cada qual tem sua particularidade, sendo disciplinadas diversamente. A personalidade jurídica é atribuída pelo Direito tanto ao homem (pessoa física ou pessoa natural), ao nascer com vida75, como à pessoa jurídica.

73

SERPA LOPES, Miguel Maria. Curso de direito civil, vol 1, 3 ed., Ed. Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 1960, p. 253. "A palavra pessoa, em Roma, servia para designar a máscara trágica que engrossava a voz do ator.”

74

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 4a ed. Trad. João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1994, p.188. 75

GOMES, Orlando. Introdução ao estudo do direito. 12ª ed., atual. Por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 142. “A proteção jurídica do nascituro de ordem patrimonial está subordinada a uma condição suspensiva do nascimento com vida. O nascituro não é ainda uma pessoa, não é um ser dotado de personalidade jurídica.

Para Vicente Rào,76 a personalidade consiste, pois, na aptidão que a ordem jurídica reconhece às pessoas físicas, ou outorga às pessoas jurídicas, para serem sujeitos de direitos. Os homens, quando se unem para alcançar determinados fins, nada mais fazem do que realizar, materializando-a, uma tendência que de sua própria natureza resulta. De um lado a limitação de suas forças materiais e, de outro, os impulsos ditados pelos elementos intelectuais, morais e espirituais que formam a sua personalidade, justificam e determinam sua interdependência social e os levam a associar-se: neste sentido, o direito de associação é comumente incluído entre os direitos essenciais do homem, garantidos e assegurados pelas normas constitucionais.77

Entre o sujeito jurídico e o direito ou o dever está presente um nexo que os une. À união entre o sujeito e seu direito denomina-se “titularidade”. O sujeito de determinado direito é seu titular, como também a pessoa que é sujeito de certa obrigação. No entanto, o sujeito de direito pode ser titular de um direito sem poder exercê-lo. A idoneidade para o exercício de um direito é definida como “legitimação”. A legitimação pode corresponder a pessoa distinta ao titular do direito, como o procurador.

Presente determinado direito existirá um sujeito que tenha titularidade. Sujeito de um direito é a pessoa, natural ou jurídica, com personalidade jurídica atribuída pelo Direito, podendo ter direitos e contrair deveres. Sujeito de direito é a pessoa a quem a lei atribui a faculdade ou o dever de agir ou a pessoa a quem cabe o dever a cumprir.