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A interpretação extensiva do cabimento do Recurso em Sentido Estrito (art 581,

6.1 O AGRAVO DE INSTRUMENTO COM INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DOS

6.1.2 A (in)compatibilidade de um rol taxativo com a interpretação

6.1.2.2 A interpretação extensiva do cabimento do Recurso em Sentido Estrito (art 581,

No direito processual penal a incidência do princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias, como regra, não é de longe uma novidade. Não obstante, também nessa matéria, há exceções à regra estabelecida. Em especial, pelo cabimento do recurso em sentido estrito das decisões interlocutórias nas hipóteses expressamente dispostas do art. 581 do CPP480.

Em respeito ao princípio da taxatividade dos recursos, não se discute na doutrina especializada que é requisito, tanto no estabelecimento das espécies de recursais, assim como

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Art. 581. Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença: I - que não receber a denúncia ou a queixa; II - que concluir pela incompetência do juízo; III - que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição; IV – que pronunciar o réu; V - que conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança, indeferir requerimento de prisão preventiva ou revogá-la, conceder liberdade provisória ou relaxar a prisão em flagrante; VII - que julgar quebrada a fiança ou perdido o seu valor; VIII - que decretar a prescrição ou julgar, por outro modo, extinta a punibilidade; IX - que indeferir o pedido de reconhecimento da prescrição ou de outra causa extintiva da punibilidade; X - que conceder ou negar a ordem de habeas corpus; XI - que conceder, negar ou revogar a suspensão condicional da pena; XII - que conceder, negar ou revogar livramento condicional; XIII - que anular o processo da instrução criminal, no todo ou em parte; XIV - que incluir jurado na lista geral ou desta o excluir; XV - que denegar a apelação ou a julgar deserta; XVI - que ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial; XVII - que decidir sobre a unificação de penas;XVIII - que decidir o incidente de falsidade; XIX - que decretar medida de segurança, depois de transitar a sentença em julgado; XX - que impuser medida de segurança por transgressão de outra; XXI - que mantiver ou substituir a medida de segurança, nos casos do art. 774; XXII - que revogar a medida de segurança; XXIII - que deixar de revogar a medida de segurança, nos casos em que a lei admita a revogação; XXIV - que converter a multa em detenção ou em prisão simples.

nas hipóteses de cabimento, que essas estejam prevista por lei481. Por outro lado, a possibilidade de interpretação extensiva e/ou interpretação analógica do rol do art. 851 do CPP, por sua vez, gera intenso debate. Embora se reconhecendo extremos das doutrinas que defendam a total impossibilidade de interpretação extensiva482 ou mesmo a possibilidade de interpretação analógica483, destacamos as visões ponderadas de Vicente Greco Filho e Tourinho Filho, respectivamente, ao deixarem claro que:

O rol legal, portanto, constante do art. 581 e lei especiais é taxativo, não comportando ampliação por analogia, porque é exceptivo da regra da irrecorribilidade das interlocutórias. Todavia, como qualquer norma jurídica, podem as hipóteses receber a chamada interpretação extensiva. Esta não amplia o rol legal, apenas admite que determinada situação se enquadra no dispositivo interpretado, a despeito de sua linguagem mais restritiva. A interpretação extensiva não amplia o conteúdo da norma; somente reconhece que determinada hipótese é por ela regida, ainda que a sua expressão verbal não seja perfeita; Assim, em diversos incisos do art. 581, serão apontadas situações por eles regidas, porque equivalentes às do texto literal, sem que isso signifique ampliação do rol legal484.

(...) Cremos que a matéria é de direito estrito e, assim, não pode comportar aplicação analógica. Ali não há enumeração exemplificativa, mas taxativa. Fosse exemplificativa e não haveria necessidade de se elencarem todas aquelas hipóteses. Tampouco se cuidaria da apelação como recurso residual para os casos de decisões definitivas ou com força de definitivas (CPP, art. 593, II).485

Quanto a interpretação judicial sobre o tema, foram analisados acórdãos do STJ de 2002 a 2017, a intenção da breve pesquisa é demonstrar sobre quais hipóteses e de que maneira a interpretação extensiva e/ou interpretação analógica do rol taxativo do art. 581 do CPP tem sido aplicada, a fim de nos auxiliar sobre o (possível) comportamento deste tribunal diante das hipóteses do art. 1.015 do CPC.

Nos julgados analisados de 2002 a 2008, fala-se expressamente em admissão da interpretação analógica e interpretação extensiva para contemplar algumas hipóteses não previstas

481 GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antônio Magalhães; FERNANDES, Antônio Scarance.

Recursos no Processo Penal: Teoria geral dos recursos – recursos em espécie – ações de impugnação; revisão criminal; habeas corpus; mandado de segurança contra ato jurisdicional penal; reclamação aos tribunais. 7ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 34.

482Nesse sentido, Florêncio de Abreu. Comentários ao Código de Processo penal. Rio de Janeiro: Forense,

1945, v.5, p. 249.

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GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antônio Magalhães; FERNANDES, Antônio Scarance.

Recursos no Processo Penal: Teoria geral dos recursos – recursos em espécie – ações de impugnação; revisão criminal; habeas corpus; mandado de segurança contra ato jurisdicional penal; reclamação aos tribunais. 7ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 133. Nesse sentido, LIMA, Marcellus Polastri. Curso de Processo Penal. volume III, 2ª ed. – Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, pág. 331.

484Manual de Processo Penal. 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 1999, p. 365.

485TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. Vol. 4, 34ª ed. rev. e de acordo com a Lei n.

expressamente pelo rol. Destaque para as hipóteses de extensão do inciso XI (suspensão condicional da pena) para a suspensão condicional do processo486, e ainda para julgado interessante que admite a interpretação extensiva do inciso XV (denegar a apelação ou a julgar deserta a apelação) para decisão que julga “prejudicada” a apelação487. De um modo geral, pode se dizer que, naquele momento, admitia-se a interpretação extensiva ou analógica às hipóteses de cabimento do recurso em sentido estrito, "desde que a situação a que se busca enquadrar tenha similitude com as hipóteses do art. 581 do CPP" (REsp 197.661/PR, 6.ª Turma, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJe de 01/12/2008).

A partir de 2013, viu-se uma tendência em se admitir que as hipóteses de cabimento de recurso em sentido estrito, trazidas no art. 581 do Código de Processo Penal e em legislação especial, seriam exaustivas, admitindo a interpretação extensiva, mas não a analógica (REsp 1.078.175/RO, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 16/04/2013, DJe 26/04/2013)488.

Uma das hipóteses recorrentes de admissão da interpretação extensiva é a do inciso V (conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança, indeferir requerimento de prisão preventiva ou revogá-la, conceder liberdade provisória ou relaxar a prisão em flagrante) para alcançar decisões que tenham revogado medidas cautelares diversas da prisão489. Além desta, há julgado aplicando o inciso XVI (ordenar a suspensão do processo, em virtude de questão prejudicial) também para a suspensão de inquérito policial490.

No primeiro caso, a interpretação se justificaria porque, antes da reforma realizada pela Lei 12.403/2011, as medidas preventivas cabíveis diversas da prisão eram aquelas expostas no inciso V do art. 581, do CPP. Após a reforma, e o acréscimo à possibilidade da concessão de

486REsp 263.544/CE, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 12/03/2002,

DJ 19/12/2002, p. 457; REsp 601.924/PR, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 28/09/2005, DJ 07/11/2005, p. 339; REsp 310.182/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 16/12/2004, DJ 14/03/2005, p. 404.

487RMS 15.470/SP, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 09/11/2004, DJ

13/12/2004, p. 458

488REsp 1.628.262-RS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, por unanimidade, julgado em 13/12/2016, DJe

19/12/2016.

489REsp 1575297/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 09/05/2017,

DJe 15/05/2017; REsp 1628262/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016

490REsp 1550458/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em

medida diversa da pena privativa de liberdade, seria natural que também a hipótese recursal acompanhasse a mudança. Já no segundo caso, não se poderia negar que a ratio legis do inciso XVI seria a de impedir que o processo fosse paralisado de maneira equivocada por uma decisão prejudicial, do mesmo modo, o inquérito policial, como procedimento pré-processual, mas que, da mesma forma, também pode ser prejudicado por uma decisão equivocada, mereceria uma revisão imediata.

É interessante notar, por último, que muito embora a tendência nos julgados mais recentes sejam aceitar a interpretação extensiva e não interpretação analógica, a possibilidade de uma interpretação mais elástica dos incisos continua a ser a essencialidade da semelhança entre o caso expressamente previsto pela norma e aquele não previsto, buscando-se sempre a compreensão finalística da norma491.

Inexiste, portanto, na interpretação judicial analisada, um rigor teórico de um marco objetivo nessa diferenciação entre interpretação extensiva e a interpretação analógica, parece o tribunal diferenciá-lo, nesse caso, de maneira genérica: se o grau de semelhança é elevado, e se enquadra dentro da finalidade da norma, estamos diante de uma interpretação extensiva. Caso contrário, diante de uma semelhança que não relevante, considera-se essa interpretação analógica, o que contraria alguns dos preceitos doutrinários já mencionados, na medida em que mesmo na interpretação analógica as semelhanças entre os fatos devem ser essenciais para ser utilizada.

Ressalta-se, por último, o entendimento do STJ, reiterado recentemente, de que cabe recurso em sentido estrito da decisão que indefere a produção antecipada de provas. O que chama atenção é que não há qualquer inciso do art. 581 do CPP se assemelha a hipótese, sendo o entendimento pautado pura e simplesmente na necessidade de se impugnar a decisão (AgRg no REsp 1539695/GO, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 01/06/2017, DJe 12/06/2017)492. Ou seja, o julgado é uma fissura e vai de encontro totalmente

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Conforme passagem do julgado observe-se que a Lei n. 12.403/2011 permitiu uma hipótese de privação da liberdade diversa do enclausuramento, pela imposição de outras medidas que se mostrarem também eficazes à condução do processo ou à proteção da sociedade, a qual não está prevista expressamente no art. 581, V, do CPP, mas inserta na compreensão finalística da norma. (REsp 1575297/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 09/05/2017, DJe 15/05/2017).

492Nesse mesmo sentido, outros julgados daquela casa: AgRg no REsp n. 1.618.145⁄RN, Rel. Ministro Antonio

Saldanha Palheiro, DJe de 15⁄2⁄2017; REsp n. 1.630.598⁄RN, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, DJe de 13⁄2⁄2017; REsp n. 1.633.337⁄SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 24⁄11⁄2016; REsp n. 1.604.709⁄RN,

as contestáveis premissas traçadas pelo mesmo tribunal de que deveria existir um certo grau de similitude para a interpretação extensiva.

Ante ao exposto, embora o próprio STJ diga que diferencia interpretação extensiva e interpretação analógica, a faz com critérios escusos, e ainda, há julgados que reconhecem, sem qualquer indicação de similitude com as hipóteses indicadas nos incisos do at. 581 do CPP, tão e somente a necessidade de se impugnar a decisão interlocutória.

6.1.2.3 – Conclusões sobre a interpretação extensiva/interpretação analógica no STJ em outras