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A interpretação extensiva na Lei Complementar nº 116/03 (ISSQN) e o Superior

6.1 O AGRAVO DE INSTRUMENTO COM INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DOS

6.1.2 A (in)compatibilidade de um rol taxativo com a interpretação

6.1.2.1 A interpretação extensiva na Lei Complementar nº 116/03 (ISSQN) e o Superior

465FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 8ª ed.,

Um dos argumentos para admissão da interpretação extensiva do rol taxativo estabelecido pelo art. 1.015 do CPC se dá base em alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça466. Em especial, aqueles que se referem à interpretação da lista anexa da Lei Complementar nº 116/03 que regula o imposto sobre serviço de qualquer natureza, no âmbito do direito tributário. Há, entretanto, traços de distinção que merecem ser levados em consideração.

Florence Haret ressalta que o direito tributário, assim como o direito penal, trabalha com a noção de tipo. Isso exige que para subsunção dos fatos a hipóteses reguladas (construção do tipo no caso concreto) alguns requisitos de lei sejam cumpridos467. De acordo com a doutrina de Paulo de Barros de Carvalho, há dois modos de tipificação: a) forma de construção - em que se enuncia a característica ou as características que o individuo precisa ter para pertencer àquela classificação; b) forma tabular – em que se enumeram os indivíduos que fazem parte de uma classificação468.

O que nos importa é que na primeira (forma de construção) por se tratar de inclusão de classe admite-se, como regra, as normas gerais inclusivas; já na segunda a taxatividade inerente à forma tabular é auto exclusivista, admitindo apenas aqueles preceitos que já estão dispostos na lei469. Isso nos auxilia, de certa forma, a demonstrar que na forma de construção tem-se um campo aberto para as interpretações mais abrangentes estando às hipóteses mais próximas das interpretações analógicas, diferente da segunda hipótese tabular, em que a interpretação restritiva prevalece, e mesmo para aqueles que admitirão uma interpretação extensiva, essa será, sem dúvidas, mais cautelosa470.

Com base nessas premissas, seria natural, portanto, que no caso da Lei Complementar nº 116/09, por estabelecer taxativamente as hipóteses em que se deve dar a tributação do imposto sobre serviço de qualquer natureza, a regra a ser seguida seria da forma tabular, em que, reitera-se, a interpretação restritiva prevalece.

466DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Agravo de Instrumento contra decisão que versa

sobre competência e a decisão que nega eficácia a negócio jurídico processual na fase de conhecimento.

RePro 242. Revista dos Tribunais, Abr.2015, p. 276/277.

467 HARET, Florence. Analogia e interpretação extensiva: apontamento desses institutos no Direito

Tributário brasileiro. Revista da Faculdade de Direito da USP. v.105, jan/fev. 2010, p. 995/998.

468CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, linguagem e método. São Paulo: Noeses, 3ª ed, 2009, p.

141.

469 HARET, Florence. Analogia e interpretação extensiva: apontamento desses institutos no Direito

Tributário brasileiro. Revista da Faculdade de Direito da USP. v.105, jan/fev. 2010, p. 995.

Entretanto, a expressão “e congêneres”, constante nos itens da lista anexa da mesma lei471, modifica totalmente as premissas anteriores, senão vejamos alguns itens da lista anexa:

1 – Serviços de informática e congêneres.

1.03 - Processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos, imagens, vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre outros formatos, e congêneres.

1.04 - Elaboração de programas de computadores, inclusive de jogos eletrônicos, independentemente da arquitetura construtiva da máquina em que o programa será executado, incluindo tablets, smartphones e congêneres.

Nesse caso, “congêneres” significa “do mesmo gênero, idêntico, semelhante, similar”472, o que contraria a tipicidade cerrada e modifica totalmente o raciocínio interpretativo utilizado e inerente às listas taxativas, se aplicando, ao contrário, à forma de construção, bem mais próxima à interpretação analógica.

Ressalta-se que quando a lei não utiliza essa a expressão, faz uso de outras que denotam maior abrangência, tais como: “qualquer natureza”473, ou ainda “e outros”474, enfim, expressões inclusivas que conferem amplitude aos serviços específicos e demanda a utilização do método analógico475.

471

A expressão aparece 94 (noventa e quatro vezes) na Lei Complementar nº 116/03.

472Melhoramentos minidicionário da língua portuguesa. São Paulo: Companhia melhoramentos, 1997, p.

123.

473Exemplos: 2.01 – Serviços de pesquisas e desenvolvimento de qualquer natureza; 3.03 – Exploração de

salões de festas, centro de convenções, escritórios virtuais, stands, quadras esportivas, estádios, ginásios, auditórios, casas de espetáculos, parques de diversões, canchas e congêneres, para realização de eventos ou negócios de qualquer natureza; 3.04 – Locação, sublocação, arrendamento, direito de passagem ou permissão de uso, compartilhado ou não, de ferrovia, rodovia, postes, cabos, dutos e condutos de qualquer natureza, etc.

474

Exemplos: 1.03 - Processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos, imagens, vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre outros formatos, e congêneres; 7.03 – Elaboração de planos diretores, estudos de viabilidade, estudos organizacionais e outros, relacionados com obras e serviços de engenharia; elaboração de anteprojetos, projetos básicos e projetos executivos para trabalhos de engenharia; 7.09

– Varrição, coleta, remoção, incineração, tratamento, reciclagem, separação e destinação final de lixo, rejeitos e outros resíduos quaisquer, etc.

475PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos federais, estudais e municipais. 10ª ed,

Em paralelo à essa consideração, deve-se analisar os julgados do STJ sobre a interpretação realizada à lista anexa da LC 116/03476. De forma exemplificativa, representa bem o entendimento, o REsp 920.386/SC, Rel. Min. Teori Zavascki, as razões de decidir:

“(...) não se pode confundir (a) interpretação extensiva que importa ampliação do rol

de serviços, com inclusão de outros de natureza diferente dos indicados, com (b) interpretação extensiva da qual resulta simplesmente a inclusão, nos itens já constantes da lista, de serviços congênere de mesma natureza, distintos em geral apenas por sua denominação. A primeira é que ofende o princípio da legalidade estrita. A segunda forma interpretativa é legítima.477”.

A partir da passagem, identifica-se justamente que a interpretação extensiva tratada pelo julgado, leva em consideração as relações de semelhanças essenciais (natureza) entre os itens, além de expressamente referenciar a expressão mencionada de serviços “congêneres”. Confirma, portanto, que a relação realizada e o método comparativo mais se aproxima de uma interpretação analógica, permitida pelo próprio texto legal478.

Outro julgado importante que complementa o estudo é o Recurso Especial Repetitivo n. 1.111.234/PR479. Nesse caso, além de se pacificar que, embora reconhecida a taxatividade da lista anexa da LC nº 116/03 seria admitida a “interpretação extensiva”, em especial, para fins tributação de serviços bancários não previstos expressamente pela lista, a Min ª. Eliana Calmon, relatora, utilizou outra razão de decidir, no sentido de que:

[...]embora a lista anexa ao Decreto-lei 406/68 e à Lei Complementar n. 116/2003 seja taxativa, permite-se a interpretação extensiva, devendo prevalecer não a denominação utilizada pelo banco, mas a efetiva natureza do serviço prestado por ele (...) A lógica é evidente porque, se assim não fosse, teríamos, pela simples mudança de nomenclatura de um serviço, a incidência ou não-incidência do ISS. Entretanto, é preciso fazer a distinção dos serviços que estão na lista, independentemente do nomen juris, dos serviços que não se enquadram em nenhum

dos itens da lista, sequer por semelhança.”

476Nesse sentido, são jurisprudências mais recentes: AgInt no AREsp 160.618/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO

NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/04/2017, DJe 04/05/2017; AgInt no REsp 1627818/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 06/04/2017; AgInt no REsp 1627818/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 06/04/2017.

477STJ, 1ª.T, REsp 920.386/SC, rel. Teori Albino Zavascki, j. 17.02.2009, DJe 04.03.2009.

478Inclusive o acórdão do STF que deu origem aos entendimentos posteriores do próprio STJ (RE 75.952-SP –

Rel. Min. Aliomar Baleeiro, Pleno – j. 19.10.73. RTJ 68/198) utiliza expressamente a nomenclatura interpretação analógica.

479REsp 1111234/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/09/2009, DJe

Com isso, fica nítido que outra característica inerente à lista anexa da LC nº 116/03 é a necessidade de a legislação acompanhar as constantes mutações na nomenclatura dos serviços tributáveis. Afinal, é comum que haja o surgimento de serviços cada vez mais especializados, que embora com nomen juris distinto, continua a ter a natureza jurídica de atividades já previstas.

Constata-se, portanto, que a interpretação extensiva para o STJ, no âmbito da LC nº 116/03, é sinônimo de interpretação analógica, não existindo qualquer distinção entre ambas.

Superada as considerações sobre as características peculiares da interpretação extensiva no direito tributário, passa a se enunciar sobre interpretação no direito processual penal do recurso em sentido estrito (art. 581, do CPP).

6.1.2.2 - A interpretação extensiva do cabimento do Recurso em Sentido Estrito (art. 581,