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As decisões interlocutórias e o Agravo de Instrumento (art 842, CPC/39)

3.2 A RECORRIBILIDADE DAS INTERLOCUTÓRIAS NO CPC/1939

3.2.3 As decisões interlocutórias e o Agravo de Instrumento (art 842, CPC/39)

Não obstante o princípio da taxatividade vir a atingir ambas as espécies de agravo, era natural que essa opção legislativa gerasse maiores repercussões para o Agravo de Instrumento, por justamente ser esse o recurso destinado a atender à recorribilidade imediata das interlocutórias, em uma mitigação clara ao sub princípio da irrecorribilidade em separado adotada pelo CPC/1939.

Dessa forma, o impacto da inexistência de uma cláusula geral para recorribilidade de interlocutórias com dano irreparável, e a ineficiência do rol estabelecido pelo art. 842 para abarcar todas as hipóteses em que o jurisdicionado necessitava de um meio de impugnação imediato, fizeram com que a doutrina debatesse exaustivamente o alcance das hipóteses casuísticas autorizadas por lei e suas consequências para o processo.

Partindo dessas premissas, houve a definição das hipóteses casuísticas de recorribilidade dos despachos interlocutórios, por meio do art. 842, senão vejamos quais eram:

Art. 842. Além dos casos em que a lei expressamente o permite, dar-se-á agravo de instrumento das decisões: (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942). I, que não admitirem a intervenção de terceiro na causa; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

II, que julguem a exceção de incompetência; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

III, que denegarem ou concederem medidas requeridas como preparatórias da ação; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

IV, que receberem ou rejeitarem “in limine” os embargos de terceiro. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.672, de 1965).

V, que denegarem ou revogarem o benefício de gratuidade, (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

VI, que ordenarem a prisão; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942). VII, que nomearem ou destituírem inventariante, tutor, curador, testamenteiro ou liquidante; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

VIII, que arbitrarem, ou deixarem de arbitrar a remuneração dos liquidantes ou a vintena dos testamenteiros; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942). IX, que denegarem a apelação, inclusive de terceiro prejudicado, a julgarem deserta, ou a relevarem da deserção; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

X, que decidirem a respeito de erro de conta ou de cálculo; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

XI, que concederem, ou não, a adjudicação, ou a remissão de bens; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

XII, que anularem a arrematação, adjudicação, ou remissão cujos efeitos legais já se tenham produzido; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

XIII, que admitirem, ou não, o concurso de credores, ou ordenarem a inclusão ou exclusão de créditos; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

XV, que julgarem os processos de que tratam os Títulos XV a XXII do Livro V, ou os respectivos incidentes, ressalvadas as exceções expressas; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

XVI, que negarem alimentos provisionais; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

XVII, que, sem caução idônea, ou independentemente de sentença anterior, autorizarem a entrega de dinheiro ou quaisquer outros bens, ou a alienação, hipoteca, permuta, subrogação ou arrendamento de bens. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 4.565, de 1942).

De início, ressalta-se que, assim como no atual sistema, a previsão taxativa não afastava outras disposições de lei extravagantes que previssem o agravo de instrumento como recurso cabível para determinadas decisões interlocutórias107.

Assim, por exemplo, em análise à Lei de Falências da época (dec.-lei nº 7.661, de 21 de julho de 1945) encontravam-se vários casos de agravo de instrumento, como da sentença que declarar a falência (art. 17); da sentença que fixava ou retificava o termo legal da falência (art. 22, § único); da sentença que ordenava o sequestro de bens do falido em poder de terceiro no caso de ação revocatória (art. 56, §3). Da mesma forma, na Lei de Luvas (dec. 24.150, de 20 de abril de 1943), que regulava as condições e o processo de renovação de contratos de locação de imóveis destinados a fins comerciais ou industriais, existindo nessa legislação hipóteses autorizadas para interposição de agravo de instrumento108.

Com relação às hipóteses previstas nos incisos, verifica-se que o legislador ora estabelecia o critério de recorribilidade unicamente pelo conteúdo da decisão proferida, tais como aquela que julgarem a exceção de incompetência (II), e as que decidirem a respeito de erro de conta ou de cálculo (X);

Quanto também, por vezes, cumulava-se o requisito do conteúdo como próprio sentido em que o juízo julgava a decisão (secundum eventum), como é exemplo o inciso I:“que não admitirem a intervenção de terceiro na causa”. Em interpretação literal ao dispositivo, a que

107REZENDE Filho, Gabriel José Rodrigues de. Curso de direito processual civil. V. III, 3ª. Ed, Saraiva: São

Paulo, 1953, p. 133.

admitisse a intervenção de terceiro seria irrecorrível; assim como acontecia nos demais nos incisos VI, XII, XVI, XVII.

Dessa maneira, a própria doutrina e a jurisprudência oscilavam quanto à interpretação da extensão dos incisos previstos pelo art. 842 do CPC/39.

A título de exemplo, havia divergência acerca da previsão para a recorribilidade da decisão que julgava procedente ou não a exceção de incompetência (art. 842, II). De um lado, aqueles que defendiam a recorribilidade por esse inciso se estendendo também para a incompetência decretada de ex offício pelo juízo109. De outro, àqueles que interpretavam restritivamente a hipótese, isto é, somente a decisão que declinava a competência por meio da exceção poderia autorizar a recorribilidade pelo agravo de instrumento, porque “exceção” não poderia ser entendida como “alegação do excipiente”, na medida em que aludiria ao direito objeto110.

Da mesma forma, acontecia com as decisões que nomeavam ou destituíam inventariante, tutor, curador, testamentário ou liquidante (art. 842, VII). Seabra Fagundes, estendia a interpretação para outras decisões ditas implícitas, mas que atenderiam à finalidade do inciso, como o indeferimento de escusa de tutela ou curatela equivale à nomeação do tutor ou curador, a rejeição de impugnação da qualidade do inventariante tem o mesmo efeito da designação original e a nomeação de depositário para os bens do espólio equivale à destituição do inventariante.111

Também sobre o inciso XI, que definia ser agravável a decisão que conceder ou não a adjudicação ou a remissão de bens, a possibilidade de extensão era controvertida. Desta vez, o próprio STF, em julgamento, estendeu a interpretação do referido inciso para a hipótese de impugnação que autorizaria a remissão não apenas de bens. Posição jurisprudencial, aliás, criticada por Odilon de Andrade, que defendia a interpretação restritiva do inciso, deixando

109FRAGA, Afonso. Instituições do Processo Civil do Brasil. Vol. III, São Paulo: Academica, p. 180.

110 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 2 ed. Rio de

Janeiro: Revista Forense, 1960, t.XI, p.317; FAGUNDES, Miguel Seabra. Dos Recursos Ordinários em

Matéria Civil. Forense. Rio de Janeiro. 1946, p. 319.GONZALEZ, Gabriel Araújo, A recorribilidade das decisões interlocutórias no código de processo civil 2015, JusPodivm, Salvador, 2016, p. 82.

111Ibid.p. 325-327. A mesma divergência não haverá no CPC/2015, ante a previsão expressa do parágrafo único

também clara sua posição, sobretudo, contra a impugnação por agravo de instrumento de decisão que homologava um ato já concedido anteriormente112.

Por último, o inciso X, que em sua disposição original tornava agravável por instrumento a decisão a respeito de erros de conta. A jurisprudência, todavia, interpretava o inciso, estendendo também para as hipóteses de erro de cálculo. Ressalta-se que, erros de contas eram aqueles decorrentes de operações meramente aritméticas, enquanto erro de cálculo fazia uma alusão direta à inclusão, exclusão de parcelas indevidas para o resultado final113. Com o Decreto-Lei 4.365/1962, a redação acrescentou os “erros de cálculos”, sendo, no entanto, digno de registro a extensão interpretativa até a mudança legislativa.

Diante disso, um sistema que originalmente privilegiou a celeridade processual, considerando a exposição de motivos do CPC/1939, acabou por sacrificar a segurança jurídica no que tange as hipóteses de cabimento de recurso das decisões interlocutórias, questão que será debatida no próximo tópico.

3.3 APRENDENDO COM AS LIÇÕES DO PASSADO: OS PROBLEMAS