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A legislação nacional e a constituição da educação infantil enquanto direito

DESCENTRALIZAÇÃO, REFORMA DO ESTADO E PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADO NA EDUCAÇÃO: onde fica a educação

POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL E EDUCAÇÃO: UMA QUESTÃO DE DIREITO?

3.3 A legislação nacional e a constituição da educação infantil enquanto direito

Comungando da mesma fonte que a CF, após ampla discussão, debates e embates nos bastidores das casas políticas brasileiras é sancionada, em 1996, a Lei 9394 que cria as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que tem por finalidade ser a principal lei que rege a educação brasileira. Esta legislação, de acordo com Brandão (2010), levou oito anos para ser finalizada, sendo iniciada no final dos anos 1980 e aprovada no início do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1996.

A LDB estabelece as normas que regularão a educação nacional, em todas as suas instâncias: demanda, matrícula, regulação, formação, financiamento entre outros, que estabelecem como esta deve ser organizada e a quem cabe a sua oferta e em quais condições.

O segundo capítulo da LDB trata Dos Princípios e Fins da Educação

Nacional, estabelecendo em seu Art. 2º, a exemplo da Constituição que a

educação é um dever do estado e da família. Sendo dever da família toda criança, adolescente e jovem, tem o direito de estudar e sendo dever do Estado, este tem a obrigação de garantir vagas suficientes a todos que queiram se matricular.

No entanto, quando no Art. 4º a LDB estabelece os deveres do Estado na oferta do ensino público, verifica-se que, embora seja direito de todos, apenas o ensino fundamental foi estipulado, em 1996, como de caráter obrigatório, o que levou muitos estados e municípios a investirem maciçamente nesta modalidade de ensino, não reservando os mesmos recursos para a educação infantil e para o ensino médio.

Em 2009, com a EC 59, a lei foi alterada instituindo a obrigatoriedade da oferta de ensino, pelos estados e municípios, às crianças de 04 a 17 anos até o ano de 2016. A lei inclui o ensino médio e a pré-escola, mas esquece das crianças de 0 a 3, que sequer teve contemplada a universalização da demanda pelo PNE 2014, que mantém a mesma meta do plano anterior de atender até 50% da demanda até o final de seu decênio.

Com esta emenda constitucional é abolido, também, um dos direitos adquiridos pelas famílias na Constituição de 1988, de matricularem suas crianças na pré-escola optativamente, pela obrigatoriedade.

Em relação ao fundo de investimento para a educação básica, na sua implantação, a LDB garantia repasse de recursos do Fundo de Valorização do Ensino Fundamental (FUNDEF) apenas para o ensino fundamental. Após muitas lutas dos movimentos sociais, foi estipulada a Emenda Constitucional nº 53/2006 e regulamentado pela Lei nº 11494/2007, substituindo o FUNDEF foi pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB).

É um fundo especial, de natureza contábil e de âmbito estadual (um fundo por estado e Distrito Federal, num total de vinte e sete fundos), formado, na quase totalidade, por recursos provenientes dos impostos e transferências dos estados, Distrito Federal e municípios, vinculados à educação por força do disposto no art. 212 da Constituição Federal. Além desses recursos, ainda compõe o Fundeb, a título de complementação, uma parcela de recursos federais, sempre que, no âmbito de cada Estado, seu valor por aluno não alcançar o mínimo definido nacionalmente. Independentemente da origem, todo o recurso gerado é redistribuído para aplicação exclusiva na educação básica.

Com vigência estabelecida para o período 2007-2020, sua implantação começou em 1º de janeiro de 2007, sendo plenamente concluída em 2009, quando o total de alunos matriculados na rede pública foi considerado na distribuição dos recursos e o percentual de contribuição dos estados, Distrito Federal e municípios para a formação do Fundo atingiu o patamar de 20%.

O aporte de recursos do governo federal ao Fundeb, de R$ 2 bilhões em 2007, aumentou para R$ 3,2 bilhões em 2008, R$ 5,1 bilhões em 2009 e, a partir de 2010, passou a ser no valor correspondente a 10% da contribuição total dos estados e municípios de todo o país (BRASIL, 2011, grifos meus).

Com esta ementa, os gastos com a educação básica passam a abranger a educação infantil e o ensino médio, ainda que em menores proporções que o ensino fundamental.

No inciso IX, a lei estabelece os padrões mínimos de qualidade para a educação de forma subjetiva, pois não estabelece que padrões seriam estes (BRANDÃO, 2010). Esta omissão isenta o Estado do não cumprimento do dever de ofertar uma educação de qualidade para a população, uma vez que, da maneira como foi redigido o inciso, por padrões mínimos pode se classificar toda e qualquer ação de oferta de ensino organizada pelos organismos

estatais. Justificando, assim, as parcerias público-privado estabelecidas entre as secretarias de educação e as ONGs para atender as crianças na educação infantil.

A LDB estabelece em seu Art. 9º as incumbências de cada instância governamental, cabendo a União, a elaboração do Plano Nacional de Educação (PNE), juntamente com os estados e municípios, bem como juntamente com estes órgãos estabelecer diretrizes e normas para todas as modalidades de ensino vigentes no país.

No Art. 11º são estabelecidas as incumbências a quem cabe à oferta da educação infantil no país:

Art. 11º. Os Municípios incumbir-se-ão de:

I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;

II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas; III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino; IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino;

V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.

Parágrafo único. Os Municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica (BRASIL, 2011, grifos meus).

De acordo com Brandão (2010), o inciso V aponta que cabe ao município atender a educação infantil em creches e pré-escolas, porém, a prioridade permanece no ensino fundamental, podendo estender sua oferta às demais instâncias da educação básica apenas após o suprimento desta demanda. Em decorrência deste inciso, todos os municípios priorizam a oferta ao ensino fundamental e a pré-escola, deixando a creche em último lugar na organização do seu sistema de ensino, outorgando para esta pouca ou nenhuma política pública para suprir a demanda. Disso resulta os números alarmantes de crianças de 0 a 3 anos não sendo atendidas nas instituições de educação infantil.

Doravante, será esta lei que estabelecerá, pela primeira vez na história da educação nacional, em seu Art. 21º, no capítulo Das Modalidades de

Ensino, a educação infantil como parte da educação básica,

Art. 21º. A educação escolar compõe -se de:

I - educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio;

II - educação superior (BRASIL, 2011, grifos meus).

Neste capítulo, na seção II são estabelecidos os critérios para educação das crianças na educação infantil:

Seção II

Da Educação Infantil

Art. 29º. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.

Art. 30º. A educação infantil será oferecida em:

I - creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade;

II - pré-escolas, para as crianças de quatro a seis anos de idade. (pela EC 59, esta etapa passa a ter matrícula obrigatória, deixando de ser escolha da família)

Art. 31º. Na educação infantil a avaliação far-se-á mediante acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental (BRASIL, 2011).

Desta seção destacam-se as finalidades da educação infantil, a maneira como ela será oferecida de acordo com a faixa etária das crianças e em locais próximos de sua residência, como diz a Lei 11700/08, que altera a LDB. No artigo 31 encontra-se estabelecido que a avaliação se dê em forma de registro, não sendo de caráter impeditivo a matrícula no ensino fundamental.

Observar esta disposição é importante quando sistemas de ensino públicos, como o do Rio de Janeiro, por exemplo, baseando-se na legislação, fizeram uma amostragem de mecanismos de avaliação para as crianças desta etapa da educação básica, contrariando os dispositivos estabelecidos nesta lei. Estas secretarias visavam a avaliação na educação infantil restrita aos saberes das crianças, como forma de classificá-las, contrariando a legislação que coloca a avaliação nesta etapa educacional referente, apenas, ao processo de

trabalho desenvolvido, à organização dos espaços e do currículo, de forma a melhorar o trabalho pedagógico realizado anualmente com as crianças pequenas.

Estas medidas, felizmente, não lograram êxito e o governo federal, via MEC, determinou que, a partir de 2016, a educação infantil passará a ser avaliada pela Avaliação Nacional de Educação Infantil (ANEI), via Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Esta avaliação seguirá parâmetros que focam o trabalho pedagógico, a formação dos professores, o espaço físico e os materiais disponibilizados para as crianças, entre eles os brinquedos, indo ao encontro do que já tinha sido preconizado pelos Indicadores da Qualidade na Educação Infantil.

A LDB estabelece a formação necessária aos profissionais para realizarem o trabalho com as crianças pequenas em creches e pré-escolas, bem como aponta formas de formação inicial e continuada em serviço as e os profissionais desta etapa educacional.

Art. 62º. A formação de docentes para atuar na educação básica far- se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.

44§ 1º A União, o Distrito Federal, os estados e os municípios, em regime de colaboração, deverão promover a formação inicial, a continuada e a capacitação dos profissionais de magistério.

45§ 2º A formação continuada e a capacitação dos profissionais de magistério poderão utilizar recursos e tecnologias de educação a distância.

46§ 3º A formação inicial de profissionais de magistério dará preferência ao ensino presencial, subsidiariamente fazendo uso de recursos e tecnologias de educação a distância (BRASIL, 2011).

A LDB estabelece, também, os recursos que devem ser destinados à educação, isto é, nunca menos que 18% pela União, e 25%, no mínimo, no que tange aos estados e municípios, os mesmos índices estabelecidos na Constituição.

Para fechar o ciclo de documentos legais relevantes para esta pesquisa, apresento as metas dos Planos Nacionais de Educação (PNE), eles mesmos elaborados em 2001 e 2014.

Saviani (2010) aponta que o Plano Nacional de Educação foi a principal medida outorgada pela LDB (1996) à educação.

Sua importância deriva de seu caráter global, abrangente de todos os aspectos concernente à organização da educação nacional, e de seu caráter operacional, já que implica a definição de ações, traduzidas em metas a serem atingidas em prazos determinados dentro do limite global de tempo abrangido pelo plano que a própria LDB definiu por um período de dez anos. Nessas circunstâncias o Plano Nacional da Educação torna-se, efetivamente, uma referência privilegiada para se avaliar a política educacional e para aferir o que o governo está considerando como, de fato, prioritário, para além dos discursos enaltecedores da educação, reconhecidamente um lugar comum nas plataformas e programas políticos dos partidos, grupos ou personalidades que exercem ou aspiram a exercer o poder político (SAVIANI, 2010, p. 03).

Neste contexto, o PNE é um documento que estabelece metas a serem alcançadas nas diferentes modalidades de ensino existentes no país, visando estabelecer, de acordo com o que promulgam a CF e LDB, padrões mínimos de qualidade do trabalho realizado nos estabelecimentos de ensino.

No tocante a educação infantil, segundo Nascimento (2012), o PNE traz uma concepção de infância que norteará os objetivos, metas e estratégias de ação, bem como sua formação e conteúdo para os governos municipais durante sua década de vigência.

O PNE de 2001 foi construído a partir de um passado recente em que a educação infantil se constituía como direito das famílias e, principalmente das crianças pequenas, sendo definida como primeira etapa da educação básica, ao mesmo tempo em que as creches foram, definitivamente, incorporadas à secretaria da educação, saindo da assistência.

Este foi um plano que visou nortear os próximos passos a serem dados para a universalização da educação da demanda das crianças de 0 a 6 anos no que tange à formação de professores (as), à universalização, ao financiamento e às matriculas, cujas ações as Secretarias Municipais de Educação (SMEs) deveriam organizar estratégias para alcançar.

As metas deste PNE para a educação infantil foram muito importantes, pois estabeleceram a necessidade de estabelecimento de infraestrutura adequada para o trabalho no chão das creches e pré-escolas, sejam estas públicas ou privadas. Esta organização espacial deverá ser pensada visando a organização de um ambiente adequadamente organizado. Esta meta se

complementa com a meta 25, quando determina que se deve assegurar que a União e o Estado unam-se aos municípios vulneráveis exercendo ação supletiva para necessidades técnicas e financeiras, de acordo com a Constituição.

Outra meta importante refere-se à obrigatoriedade de todo município organizar sua política para a educação infantil. Ainda que estas não caminhem ao encontro das lutas dos movimentos sociais por uma educação pública gratuita, laica e de qualidade, encontra seu valor ao obrigar as SME’s a organizarem tais políticas e assumirem as implicações que estas trazem à comunidade atendida, ainda que isso não garanta que todas as crianças frequentem os espaços das creches e pré-escolas.

Outra inovação vinda do PNE/2001 refere-se à obrigatoriedade de cada instituição de educação infantil, pública ou provada, elaborar coletivamente seus projetos pedagógicos, sendo obrigadas a olharem para a sua realidade e a partir do diagnóstico local elaborar um plano de trabalho anual. Através desta meta, será possível alcançar a meta 19 que, visando à melhoria da qualidade do trabalho realizado nas instituições, que se refere ao estabelecimento de parâmetros de qualidades dos serviços de educação infantil a partir de um trabalho de supervisão e avaliação das instituições pelas SMEs.

Garantir o programa de alimentação educacional nas creches e pré- escolas públicas e conveniadas, através de convênio com os estados e governo federal, e a inclusão destas no Censo Escolar, foram conquistas do PNE que muito contribuíram para uma maior transparência no trabalho pedagógico ofertado na educação infantil.

Para este trabalho destaco a meta número 1, devido a esta, no PNE 2014, quase não ter sofrido modificações no tocante a demanda na educação infantil, pois no primeiro PNE ficou estabelecido,

1. Ampliar a oferta de educação infantil de forma a atender, em