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A MEDIATIZAÇÃO DA IMAGEM NA MENSAGEM PUBLICITÁRIA

A EMOÇÃO: TEMAS E ABORDAGENS

2.4. A MEDIATIZAÇÃO DA IMAGEM NA MENSAGEM PUBLICITÁRIA

Ao nos dirigirmos a um teatro, ou a um cinema, vamos ver histórias, que têm autores, directores, actores, temáticas, enquadramentos, que em menor ou maior grau são nossa escolha consciente e cúmplice. A luminosidade do ambiente, ténue quase sempre, gera um maior intimismo e facilita a concentração da atenção de quem assiste e sua sintonia com a acção que é desenvolvida no palco – tela – vídeo.

De facto, uma das particularidades próprias da imagem é abolir a distancia que separa o espectador do espectáculo. "Et l'image est d'autant plus réussie que cette distance est plus radicalement abolie. Elle est manquée lorsque l'image est perçue comme image. Les professionnels de l'image savent gérer l'annulation de cette distance. Par exemple, au début de la science du cinéma, on voit l'écran, les rideaux, les premiers rangs, le plafond... Mais si le film est bon, au bout de quelques instants, on ne voit plus que l'image, et on est dedans. Observez les enfants au spectacle de Guignol, ou regardant la publicité... Et il en est évidemment de même pour les adultes. Ce n'est qu'une fois sorti du spectacle qu'on rentre à nouveau dans le réel et qu'on parvient à reprendre la distance. Et, souvent, il faut attendre un petit moment pour que la magie du spectacle s'estompe et qu'on revienne sur terre." (Kriegel, 2003, 110-111).

Quando, todavia, nos encontramos frente a um televisor, as reacções possíveis, para além do comportamento manifesto de estar-se com atenção àquilo que é veiculado, são infinitamente mais diversificadas.

Além do comportamento diverso do acto de estar com atenção ao televisor durante os intervalos publicitários, devemos considerar que o meio televisão sofre a concorrência de tudo o que concomitantemente possa estar a ocorrer no local onde o aparelho se encontra instalado – normalmente numa residência – um cão a ladrar, um telefone que toca, o bebé que chora, a campainha, o aspirador, etc., etc... Também é realista levarmos em conta outras actividades que alguém que assista televisão possa ao mesmo tempo estar a desempenhar, o que de facto ocorre com muita frequência – leitura de jornais, preparação de refeições, conversas paralelas, enfim, um elevado rol de

alternativas comportamentais que vai no sentido contrário à concentração e atenção aplicadas ao acto de assistir ao que é transmitido na televisão.

Mas, ainda assim, e praticamente a nível mundial, a televisão é o meio preferido dos anunciantes, e para onde convergem os maiores investimentos em publicidade provavelmente no mundo inteiro. Em Portugal, esta tendência verifica-se há algumas décadas, tendo-se acentuado a partir do surgimento das emissoras privadas de televisão (SIC em 1993 e TVI em 1994, além da TV Cabo, esta ainda de importância residual para a publicidade explicita, à altura que redigimos estas linhas).

A publicidade na televisão, pode surgir de variadas maneiras, mas que se evidenciam nos chamados espaços ou segmentos publicitários, que ocorrem de maneira intercalar à programação. Os segmentos publicitários, em termos clássicos, são interrupções, por um período de alguns minutos, da sequência de um programa específico ("show", filme, telenovela, etc.) que ocorrem em espaços de tempo fixos do programa. Por exemplo, no intervalo entre dois tempos de um jogo de futebol, ou entre o fim de um desenho e o começo de outro num programa infantil, ou em intervalos fixos normalmente de 7 a 15 minutos, podendo chegar a 20 ou 30, em outros tipos de programa, como filmes ou telenovelas. Há pouco dissemos "em termos clássicos", querendo com isto explicitar que tal tipo de enquadramento é, na realidade, extremamente flexível, e sobretudo dentro de uma estratégia concorrencial, onde existem várias emissoras que lutam por um "share" mais abrangente. Surge assim a contra-programação, técnica que consiste em alterar o tempo de emissão de um programa (em Portugal o telejornal, a telenovela) sem intercalá-lo com intervalos comerciais, quando a emissora que mais directamente concorre tem algum programa bastante atraente (futebol, por exemplo, em Portugal) no mesmo horário. Assim supõe- se evitar o "zaping", inimigo maior da publicidade. Mas outras técnicas existem, também, para que se mantenha o espectador sintonizado numa estação de emissão, como a dos intervalos flexíveis, onde a duração de um segmento de programação e publicidade é quase aleatória, podendo no caso de um filme, de uma ou duas horas, passarem-se mais de 30 minutos sem inserções comerciais, e num determinado período surgirem comerciais a cada 5 ou 10 minutos, variando-se também o tempo de duração da publicidade e o número de videogramas emitidos. Uma autêntica técnica de "reforçamento intermitente", como diriam os colegas comportamentalistas!

Nesta breve reflexão sobre a publicidade audiovisual, não nos podemos furtar a mencionar as técnicas de "merchandising", isto é, a publicidade que é inserida directa ou indirectamente mas de forma "natural", no programa a que assistimos. Este costuma ser, na verdade, o tipo de publicidade mais eficiente, uma vez que o espectador associa, na maior parte das vezes inconscientemente, o produto ao enquadramento desejado pelo patrocinador. Pode variar desde o nome de uma marca na camisola de uma equipa de futebol, ao automóvel ou guarda-roupa utilizado pelas personagens principais de uma telenovela. O mobiliário do ambiente onde se desenrola uma trama, o local geográfico onde decorre a acção, nada é deixado ao acaso pela produção, existindo sempre uma multiplicidade de interesses promocionais na maior parte dos produtos mediáticos.

No filme Kramer vs Kramer (de Stanley Jaffe, 1980, com Meryl Streep e Dustin Hoffman), que abordava a separação de um casal de estrato médio alto e suas consequências na vida do seu filho, um menino em idade pré-escolar, trabalho bastante distinguido e obra de grande sensibilidade, o personagem principal, um publicitário interpretado por Dustin Hoffman, não possuía automóvel, utilizando-se nas suas deslocações, de táxis, da "Yellow Cab" empresa líder deste tipo de transportes nos EUA, que estavam sempre por perto e disponíveis. Os táxis amarelos aparecem, então, em dezenas de cenas de rua, mesmo quando não eram utilizados por nenhum personagem do filme. Um exemplo: tendo decorrido largos meses após a separação do casal, período em que o filho esteve ao cuidado do pai, o Sr. Kramer, vai pela primeira vez avistar-se com a ex-esposa, personagem interpretada por Meryl Streep, para tratarem de formalidades relativas ao divórcio, e principalmente, qual dos dois ficava com a guarda do filho. Trata-se de um momento importante da trama, cercado de grande "suspense". O Sr. Kramer caminha por uma rua. A Sra. Kramer encontra-se sentada, no interior de um Café, o que é mostrado por um movimento de câmara. Para chegar ao Café, é necessário ir até uma esquina e atravessar a rua. Enquanto a câmara foca a Sra. Kramer no Café, supostamente como a veria o Sr. Kramer, do outro lado da rua e através das amplas vidraças daquele estabelecimento, passam pela rua vários táxis "Yellow Cab", que têm a sua imagem ainda duplicada pela vidraça, aonde o espectador concentra a sua atenção para que possa vislumbrar o semblante da Sra. Kramer. Trata-se de uma forma bastante subtil de impor inconscientemente para a maioria dos espectadores, num momento de grande tensão do filme, a mensagem publicitária.

Outra técnica não explícita de promoção, esta bastante questionável do ponto de vista ético, é a chamada técnica subliminar, de que já falámos em pormenor no capítulo 1. Resumidamente, esta consiste em emitir uma mensagem de forma a que a mesma não possa, racional e conscientemente, ser percebida mesmo que a procuremos, estando abaixo do liminar de nossa percepção consciente. Este efeito é conseguido colocando-se a mensagem que se quer transmitir intercaladamente, em intervalos fixos pré-fixados do filme, durante algum tempo, de forma que sem que o receptor perceba, vá constituindo mentalmente a referência enunciada. Este procedimento é proibido por lei num grande número de países, onde se inclui Portugal, dadas as suas possibilidades de manipulação comportamental. Tem sido, porém, largamente utilizado com fins políticos, principalmente em países autocráticos ou regimes militares.