• Nenhum resultado encontrado

A obrigação da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro

4. O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO À CONFIANÇA COMO LIMITAÇÃO À

4.3 Proteção à Confiança como limitação à modificação unilateral dos Contratos

4.3.1 A obrigação da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro

A garantia legal da obrigatória manutenção do equilíbrio econômico- financeiro em um contrato administrativo é o fator que talvez melhor traduz a aplicação do princípio da proteção à confiança aos contratos administrativos. Faz parte das chamadas garantias do administrado, figurando positivada na lei172 justamente para contrapor-se à prerrogativa de alteração unilateral dos contratos por parte da Administração Pública, com o fito da garantir, aconteça o que acontecer, a manutenção da equação econômico financeira.

A manutenção do equilíbrio econômico-financeiro, também denominada de equação econômico-financeira, significa, no presente caso, que, se por ventura a Administração exercer a sua prerrogativa de alteração do contrato administrativo, obrigatoriamente deverá restabelecer o equilíbrio do financeiramente pactuado. Em outras palavras, deverá realizar o devido acréscimo, proporcional à mudança promovida, na remuneração da contratada.

Esse direito da contratada é pacífico na lei, doutrina e jurisprudência pátrias, refletindo o que também dispõem outros ordenamentos jurídicos estrangeiros. Sobre o assunto, colhe-se excerto do magistério de Celso Antônio Bandeira de Mello:

Na teoria do contrato administrativo, a mantença do equilíbrio econômico-financeiro - não sem razão - é aceita como verdadeiro "artigo de fé". Doutrina e jurisprudência brasileiras, em sintonia com o pensamento alienígena, assentaram-se pacificamente em que, neste

172

tipo de avença, o contratado goza de sólida proteção e garantia no que concerne ao ângulo patrimonial do vínculo, até mesmo como contrapartida das prerrogativas reconhecíveis ao contratante governamental.173

Não é difícil imaginar o que poderia acontecer se não existisse a obrigatoriedade do respeito a esse preceito por parte da Administração. Seria possível a essa, por exemplo, lançar edital de licitação com proposta de contratação de determinado serviço, contra pagamento de determinada quantia, e, ato contínuo, após firmada a avença e com o contrato já em execução, promover modificação no encargo conferido à contratada, sem realizar a necessária compensação financeira.

Essa situação seria perniciosa para ambas as partes, uma vez que, para a contratada, traria terrível prejuízo financeiro, e para a Administração, prejudicaria a credibilidade perante a iniciativa privada, dificultando a contratação de empresas para serviços futuros. Em suma, tal situação iria de encontro a tudo o que foi exposto nesse trabalho, ferindo de morte o princípio da proteção à confiança e, por consequência, os princípios da segurança jurídica e do Estado de Direito. Violaria, também, a consensualidade que marca as relações modernamente travadas pelo Estado.

É o que ensina Celso Antônio Bandeira de Mello acerca da matéria:

Por qualquer ângulo que se considere o assunto, resulta sempre que a estabilidade da equação econômico-financeira é requisito insuprimível do contrato administrativo e que sua falta chocar-se-ia contra princípios e normas de Direito cujo desatendimento seria gravoso para o próprio interesse público que preside tais vínculos.174 Juarez Freitas também ressalta que a garantia da mantença da equação econômico-financeira originalmente pactuada é uma das formas de proteção à segurança e à confiança dos particulares:

[O] princípio da segurança das relações jurídicas, na sensata relativização com os demais princípios, precisa nortear as relações da administração pública, já ao proteger os direitos adquiridos, os atos jurídicos perfeitos, os efeitos constitutivos de atos discricionários e vinculados, já ao preservar a intangibilidade da equação econômico-financeira dos contratos públicos.175

173 BANDEIRA DE MELLO, 2010b, p. 210. 174 BANDEIRA DE MELLO, 2010b, p. 214. 175 FREITAS, 2009, p. 99.

Eliminando qualquer possível dúvida acerca do assunto, transcreve-se, ainda, a opinião de Marcelo Losso:

Os ajustes são realizados segundo esses objetivos e condições na confiança que não sofrerão alterações ou variações substanciais no futuro. A crença pressupõe que se houver alteração, deverão ser mantidas as condições existentes na época da contratação, de modo a assegurar, ao longo da vigência contratual o que fora desejado pelas partes.176

Sendo assim, cabe mais uma vez ressaltar que não é interessante à Administração locupletar-se do contratado, pagando a menor por um serviço prestado. Toda e qualquer compra ou serviço contratado pela Administração tem como fim a satisfação do interesse público. E mostra-se abrangida pelo interesse público a obrigatoriedade de a Administração portar-se com lealdade e boa-fé nas obrigações firmadas com particulares, protegendo, por conseguinte, a confiança que estes legitimamente lhe imputaram. É o que diz o tantas vezes citado Celso Antônio Bandeira de Mello:

[O] Estado não é um especulador e não se pode converter em um explorador ganancioso. Em relação que pressupõe um voluntário atrelamento de vontades convergentes, onde primam os deveres de lealdade e boa-fé, descabe à Administração procurar esquivar-se ao dever de restaurar o equilíbrio econômico segundo cujos termos obteve a vinculação espontânea de outrem177.

Interessante destacar nesse ponto outra forma de proteção à confiança do particular garantida pela Lei 8.666/93, relacionada ao que está em estudo. Refere- se, também, à necessidade de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro frente às modificações contratuais realizadas pela Administração. Vale consignar, portanto, que as cláusulas econômicas do contrato administrativo são intangíveis, só podendo ser alteradas nessa única hipótese de restabelecimento da equação financeira pactuada, sendo passíveis de modificação apenas as cláusulas regulamentares, ou seja, que versem sobre o seu objeto. Para esclarecer, remete-se o leitor à lição de Hely Lopes Meirelles, transcrita no item 2.4.1 do primeiro capítulo deste trabalho178.

176 LOSSO, 2008, p. 133. 177 BANDEIRA DE MELLO, 2010b, p. 249. 178

[A] alteração, devidamente motivada, só pode atingir as denominadas cláusulas regulamentares ou de serviço, isto é, aquelas que dispõem sobre o objeto do contrato, mas sem modificar o núcleo do objeto originalmente pactuado, sob pena de nulidade, e o modo se sua execução. (MEIRELLES, 2011, p. 220)

Por último, cabe ressaltar, ainda, que "não é necessário, para a restauração da equação inicial, um desequilíbrio grave; basta que se descomponha a equivalência originalmente contemplada pelas partes."179

4.3.2 Limitação percentual das modificações quantitativas e qualitativas do objeto do