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A OPÇÃO PELA LIMITAÇÃO DE RESPONSABILIDADE

No documento MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO (páginas 33-51)

Atualmente, a limitação da responsabilidade dos sócios da pessoa jurídica é uma realidade tão corriqueira e presente, que muitos autores a tratam como uma decorrência natural da própria autonomia da pessoa jurídica. Soa natural que, reconhecendo-se personalidade à pessoa jurídica e lhe outorgando autonomia quanto à pessoa de seus sócios, essa autonomia também seja estendida ao aspecto patrimonial, garantindo-se a limitação de responsabilidade de seus sócios. Como anota Fábio Ulhoa Coelho, atualmente a limitação da responsabilidade é uma decorrência natural da personalização da sociedade empresária:

“A personalização da sociedade limitada implica a separação patrimonial entre a pessoa jurídica e seus membros. Sócio e sociedade são sujeitos distintos, com seus próprios direitos e deveres. As obrigações de um, portanto, não podem se imputar ao outro. Desse modo, a regra é a irresponsabilidade dos sócios da sociedade limitada pelas dívidas sociais. Isto é, os sócios respondem apenas pelo valor das quotas com que se comprometem, no contrato social (CC, art. 1.052). É esse o limite de sua responsabilidade.”23

Todavia, historicamente, a limitação de responsabilidade não surgiu atrelada ao instituto da personalidade jurídica, havendo um grande período durante o qual a responsabilidade dos sócios de uma pessoa jurídica não era limitada. Segundo Karen Vandekerckhove, enquanto o reconhecimento de personalidade jurídica às entidades empresárias remontaria ao Século XVII, a limitação de responsabilidade dos seus proprietários teria sido adotada pelos

diversos países apenas a partir do Século XIX, como exigência da crescente necessidade de investimento privado na atividade econômica:

“The need for limited liability arose out of the growth of enterprises in the nineteenth century, needing increasing investment and capital accumulation. In order to encourage such growth, it proved necessary to protect investors, limiting their potential liability to the amount of their capital investment. In continental Europe, limited liability has been consecrated following its adoption in Napoleon’s Commercial Code in 1807. In Belgium, for instance, it became generally available in 1873. In the United States, limited liability became firmly established as the general rule by 1830. The determination of the period when limited liability emerged in the United Kingdom is the subject of debate. On the legislative front, it was only in 1855 and 1856 that the English Parliament enacted the first Limited Liability Act and the Joint Stock Companies Act.”24

Nesse sentido, Pontes de Miranda já enunciava que a separação patrimonial entre a pessoa jurídica e as pessoas dos sócios é uma criação do Direito Positivo25. Tanto é que, atualmente, ainda há formas societárias segundo

as quais a personalidade jurídica não é acompanhada da limitação de responsabilidade de seus sócios, como é o caso, por exemplo, das sociedades em nome coletivo no Direito brasileiro:

“Há direitos, como o do Reino Unido (Farrar-Hannigan, 1985:79/81), que associam a personalização da sociedade à limitação da responsabilidade dos sócios. Para tais sistemas, as sociedades em que os sócios respondem integralmente pelas obrigações sociais são despersonalizadas. Em outras ordens jurídicas, inclusive a brasileira, não existe necessária correlação 24“A necessidade de limitação de responsabilidade surgiu com o crescimento das empresas no

século XIX, necessitando de crescentes investimentos e acúmulo de capital. De forma a encorajar esse crescimento, provou-se necessário proteger os investidores, limitando sua potencial contingência ao valor do capital por eles investido. Na Europa continental, a limitação de responsabilidade foi consagrada após sua adoção no Código Comercial de Napoleão em 1807. Na Bélgica, por exemplo, ela se tornou regra corrente em 1873. Nos EUA, a limitação de responsabilidade se estabeleceu como regra geral por volta de 1830. A determinação de quando a limitação de responsabilidade emergiu no Reino Unido é objeto de debate. Na frente legislativa, foi apenas em 1855 e 1856 que o Parlamento Inglês promulgou a primeira Lei de Responsabilidade Limitada e a Lei de Sociedades por Ações” (tradução livre, VANDEKERCKHOVE, Karen. op. cit., p. 4).

25MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. 3. ed. Rio de Janeiro:

entre esses dois temas societários. A personalização da sociedade não está ligada sempre à limitação da responsabilidade dos seus integrantes. Quer dizer, há no Brasil sociedades personalizadas em que sócios respondem ilimitadamente pelas obrigações sociais (p.ex., a sociedade empresária em nome coletivo), assim como há uma hipótese de articulação de esforços despersonalizada, em que os participantes podem responder dentro de um limite (os sócios participantes da conta de participação, se assim previsto em contrato).”26

Como bem anota Marçal Justen Filho, a limitação de responsabilidade inicialmente era reservada pelo Direito às sociedades que desenvolviam atividades de caráter publicístico, como era o caso das companhias ultramarinas, que ampliavam o poder, a influência e a riqueza das nações:

“A sociedade anônima do século XIX filiava-se às companhias ultramarinas, que nasceram com extremado cunho publicístico. A sociedade anônima era visualizada como um corpo que não se identificava com os interesses e a pessoa dos sócios, ao contrário das sociedades ditas contratuais (de pessoas).”27

Também Fábio Konder Comparato chama a atenção para o fato de que a personalidade jurídica é apenas mais uma das ferramentas adotadas pelo Direito para promover a blindagem patrimonial, existindo outras formas de limitação de responsabilidade que não estão de qualquer forma vinculadas à autonomia patrimonial da pessoa jurídica:

“O que não se pode perder de vista é o fato de ser a personalização uma técnica jurídica utilizada para se atingirem determinados objetivos práticos – autonomia patrimonial, limitação ou supressão de responsabilidades individuais – não recobrindo toda a esfera da subjetividade, em direito. Nem todo sujeito de direito é uma pessoa. Assim, a lei reconhece a certos agregados patrimoniais, como espólio ou a massa falida, sem personalizá- los. E o direito comercial tem, nesse particular, importantes 26COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: direito de empresa, cit., v. 2, p. 7.

exemplos históricos, com a parceria marítima, as sociedades ditas irregulares ou a sociedade em conta de participação.

No curso da História, são numerosos os exemplos de técnicas jurídicas de gestão de um patrimônio, em benefício coletivo, sem a criação de uma pessoa coletiva. No direito romano, o patrimônio dos collegia e das solidates pertencia a um só dos membros. A

corporation sole, do velho direito inglês, compreendia a Coroa e

os ofícios eclesiásticos, tais como o do bispo e o do vigário. O

trust alcança o objetivo da separação patrimonial sem

personalização, assim como a propriedade em mão comum do direito germânico.”28

Como destaca Phillip Blumberg, a adoção universal da responsabilidade limitada como regra por muitos ordenamentos jurídicos do mundo ocidental resulta de legislações relativamente recentes, que revelam antes uma opção político-econômica, e não uma decorrência natural e necessária da própria natureza da pessoa jurídica29. Na Inglaterra, até o final do Século XVI, os Tribunais não tratavam da limitação de responsabilidade dos sócios das sociedades de capital fechado, até porque tais sociedades normalmente contavam com o caráter publicístico e a proteção do Estado, acima relatados. A partir desse momento, no entanto, algumas sociedades passaram a prever tal limitação em seus respectivos contratos sociais. Gradativamente, até o fim do Século XVIII, o Direito Inglês passou a entender que, na ausência de disposição expressa no contrato social, a responsabilidade limitada dos sócios deveria prevalecer. No que se refere às sociedades por ações livremente negociadas, por sua vez, desde o início o Direito inglês entendeu pela responsabilidade ilimitada dos sócios. Nessa forma de sociedade, não havendo qualquer caráter publicístico, a priori, ou proteção governamental, desde logo se aceitou que aqueles que se aventurassem nos negócios da sociedade deveriam estar preparados para arcar

28COMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima, cit., p. 290-291. 29BLUMBERG, Phillip I. op. cit., p. 7 e ss.

com suas dívidas, caso o capital social fosse insuficiente para tanto. A primeira manifestação da limitação de responsabilidade nessa forma de sociedade se deu por meio dos contratos sociais, nos quais as sociedades passaram cada vez mais a prever a inexistência de responsabilidade dos sócios da pessoa jurídica. Tais disposições, em que pese o fato de serem válidas para a relação mantida entre a sociedade e seus respectivos sócios, e entre esses, não podiam ser opostas aos terceiros os quais a sociedade contratava, com o que, perante esses, a responsabilidade dos sócios permanecia sendo ilimitada.

A fim de tentar mitigar essa situação, até meados do século XVIII a maior parte das sociedades procurava incluir nos contratos celebrados com terceiros a previsão de limitação da responsabilidade dos seus sócios, o que também era visto com reservas, uma vez que, entendia-se, tais sociedades procuravam obter os benefícios das sociedades de capital fechado sem incorrer nos custos e burocracias enfrentadas por essas sociedades (que incluíam, entre outras, a obtenção de autorização estatal para sua constituição). Independentemente dessa questão em aberto, as sociedades de ações livremente negociadas se expandiram, uma vez que as sociedades de capital fechado continuavam sendo custosas, além de ser difícil obter autorização estatal para sua constituição.

A crescente necessidade de capital para possibilitar os altos investimentos exigidos pela industrialização logo tornou o tema da limitação da responsabilidade uma questão política relevante. Se, de um lado, os empresários exigiam a adoção da limitação, como ferramenta para estimular os investimentos necessários à capitalização das sociedades, de outro, a cultura agrária da população estimulava um comportamento de hostilidade com relação às sociedades comerciais e via a limitação de responsabilidade como um privilégio

injustificável. Se as famílias que desempenhavam atividades agrícolas e pecuárias há séculos sempre responderam de forma ilimitada pelo insucesso de seus negócios, não havia justificativas para que a nova classe de empresários capitalistas fosse poupada desse risco. Propostas legislativas de limitação de responsabilidade na Inglaterra geraram muitas manifestações contrárias, sendo duramente criticadas. Além da preocupação econômica, uma vez que a limitação era vista como estímulo ao investimento especulativo e à irresponsabilidade, havia um forte apelo moral dos que temiam as consequências que uma norma que suprimisse responsabilidades poderia causar no seio da comunidade.

Após muitos debates, a primeira norma a tratar do tema, a Lei de Registro, Incorporação e Regulação das Sociedades de Capital Aberto, de 1844, continha a previsão de que os sócios eram solidariamente responsáveis pelas obrigações da sociedade que não fossem satisfeitas com seu próprio patrimônio. Contudo, tal Lei permaneceu em vigor por pouco mais de uma década. Entre os fatores que levaram à sua revogação, destaca-se sua ineficácia, uma vez que não impedia a transferência de ações como meio de evitar a responsabilização do sócio; assim como o desestímulo que causou aos investimentos por parte das camadas mais ricas da população, conquanto a previsão de responsabilidade solidária dos sócios fez com que os indivíduos de maior patrimônio temessem que, inadimplida uma obrigação societária, os credores tenderiam a exigi-la daquele que demonstrasse maior possibilidade de arcar com o seu pagamento. Ainda, fatores de ordem prática reduziram a resistência popular à ideia de limitação de responsabilidade, como, por exemplo, a necessidade de instituição da responsabilidade limitada decorrente das atividades relacionadas à construção e à administração de estradas de ferro.

Finalmente, a Lei de Responsabilidade Limitada, de 1855, e a Lei das Sociedades por Ações, de 1856, fizeram com o que o Direito Inglês passasse a adotar a limitação de responsabilidade como regra, o que prevalece desde então30.

No entanto, é interessante notar que a adoção da responsabilidade limitada no Direito inglês só veio a ocorrer séculos após o reconhecimento das sociedades como pessoas jurídicas de personalidade autônoma com relação à de seus sócios, um século após a Revolução Industrial e décadas depois de sua adoção nos EUA e na Europa continental. Portanto, a experiência inglesa demonstra de forma inquestionável que a opção pela limitação de responsabilidade decorre de propósitos políticos e econômicos, e não da própria natureza da pessoa jurídica ou como decorrência necessária de autonomia de sua personalidade jurídica com relação à de seus sócios.

A experiência norte-americana, por sua vez, coloca em dúvida a concepção geral de que a limitação de responsabilidade corresponderia a uma ampliação nos investimentos particulares na atividade econômica. No início do Século XIX, a limitação de responsabilidade não era um tema central no cenário político ou jurídico norte-americano. Também nos EUA, no entanto, as sociedades de capital fechado, de caráter publicístico e dependentes de autorização estatal, normalmente gozavam do benefício da limitação de responsabilidade. Em que pese aos EUA terem, de início, ratificado a legislação inglesa no que diz respeito às sociedade empresariais, as legislações de cada Estado não eram claras quanto à existência ou não de limitação de responsabilidade com relação às

30Para uma descrição detalhada da evolução da legislação inglesa sobre a limitação de

sociedades de capital aberto. No Estado de Massachusetts, por exemplo, nenhum contrato social de então previa a limitação de responsabilidade dos sócios pelas obrigações societárias. No Estado da Nova Inglaterra, inclusive, a maior parte dos contratos previa expressamente a responsabilidade ilimitada. Já naquele momento, a jurisprudência de Tribunais dos Estados de Carolina do Sul, Nova York e Geórgia reconheciam a possibilidade de o credor se valer do patrimônio dos sócios de uma pessoa jurídica a fim de satisfazer um crédito detido contra essa pessoa jurídica31.

Com o crescimento das sociedades e a premente necessidade de captação de investimentos populares, no entanto, o entendimento dos Tribunais passou a mudar, tendo início um movimento que passou a entender que, na ausência da disposição em contrário no contrato social, a responsabilidade dos sócios seria limitada ao valor investido na companhia. Como reflexo desse novo posicionamento, a maioria dos Estados passou a adotar a responsabilidade limitada como regra, com exceção de Nova Inglaterra, que apenas adotou a responsabilidade limitada em 1830, e da Califórnia, que a adotou apenas no Século XX. No entanto, deve-se ressaltar que, até o início do Século XX, a maioria das legislações estaduais norte-americanas previa que a responsabilidade limitada dos sócios não se resumia ao valor investido na companhia, mas sim a um teto previamente estabelecido. Na maioria dos casos, adotava-se como teto o mesmo valor investido (i.e., o sócio respondia com o valor investido na sociedade, por exemplo, de US$ 1.000,00, e mais US$ 1.000,00 de seu patrimônio pessoal), mas em alguns casos previa-se como teto duas vezes o valor investido (i.e., se o investidor aplicou US$ 1.000,00 na sociedade, ainda

poderia ser chamado a destinar mais US$ 2.000,00 de seu patrimônio pessoal para saldar débitos não liquidados da companhia).

Também no caso dos Estados que adotavam como regra a ilimitação de responsabilidade, na prática era rara a utilização do patrimônio particular dos sócios para responder por dívidas da pessoa jurídica. No caso específico da Califórnia, no entanto, há de se notar que a legislação não proibia a adoção da cláusula de limitação de responsabilidade nos contratos firmados com terceiros. Além disso, o prazo prescricional para cobrar qualquer valor dos sócios da pessoa jurídica expirava em três anos a contar da data em que a obrigação foi constituída, e não do momento do inadimplemento. Com isso, é possível que, na prática, a responsabilização pessoal do sócio pelas dívidas societárias tenha ocorrido em pouquíssimos casos.

De qualquer forma, a despeito da convivência de diferentes modelos de responsabilidade societária nos EUA, naquele período, os economistas não são capazes de indicar com segurança quais os efeitos para a economia dos diferentes modelos adotados. Até a década de 1830, quando Massachusetts e Rhode Island adotaram a responsabilidade limitada, não houve sinais de que tal política tenha afetado de forma prejudicial o desenvolvimento econômico. Do mesmo modo, a Califórnia, único Estado a manter a política de ilimitação de responsabilidade por quase mais um século, conheceu um crescimento prodigioso nesse período. No entanto, não é possível determinar se tais Estados cresceram em razão dessa política, se o fizeram independentemente dessa política ou a despeito dela. Em outras palavras, a análise puramente histórica não permite determinar se a adoção da responsabilidade ilimitada foi responsável pelo crescimento econômico desses Estados, se foi indiferente para esse crescimento

ou se impossibilitou que tal crescimento fosse ainda maior32.

No Brasil, a primeira norma a instituir claramente a limitação de responsabilidade dos sócios das sociedades empresárias foi o Decreto nº 3.708, de 10.1.1919, o qual regulou a constituição das sociedades por quotas de responsabilidade limitada. Referido Decreto, editado a partir do capítulo destinado a regular as sociedades de responsabilidade limitada no anteprojeto de Código Comercial elaborado por Inglez de Souza, foi proposto pelo próprio governo brasileiro e tinha como clara finalidade estimular o empreendedorismo privado, retirando, assim, o país da economia extrativista e de monocultura então vigente.

Fato é que, por razões históricas, sociais, políticas e econômicas, optou- se, em boa parte dos ordenamentos jurídicos ocidentais, pelo modelo de limitação de responsabilidade.

Como anota Karen Vandekerckhove, os economistas em geral enxergam lados positivos e negativos na opção pela limitação de responsabilidade dos proprietários da pessoa jurídica33. Quanto aos benefícios, a limitação de responsabilidade é vista como uma forma de fomentar a atividade econômica e atrair o investidor passivo, assim entendido como aquele que não participa da administração e gestão dos negócios da sociedade, e que não investiria caso estivesse exposto ao risco de ser responsabilizado ilimitadamente pelos débitos da sociedade. Tal benefício, além de ser importante para o fomento da economia em geral, é especificamente decisivo na criação das sociedades de grande porte, aquelas responsáveis por desenvolver atividades tão complexas ou custosas que jamais poderiam ser desenvolvidas por pequenas e médias sociedades ou, muitas

32BLUMBERG, Phillip I. op. cit., p. 13-14.

vezes, pelo próprio Estado. Isso porque, tais sociedades dependem de um grau de investimento que exige a participação de centenas, às vezes milhares de indivíduos, sendo faticamente impossível que todos esses investidores participassem da gestão e administração da sociedade. Em outras palavras, há casos em que o investidor passivo é necessário, até mesmo indispensável para o desenvolvimento da atividade econômica.

A limitação de responsabilidade é vista, ainda, como uma condição indispensável ao estabelecimento do mercado de capitais como o conhecemos hoje. Isso porque, caso a responsabilidade dos sócios fosse ilimitada, nenhum investidor adquiriria ações de uma companhia sem antes conhecer todos os seus demais sócios e analisar a situação financeira de cada um deles. Caso os sócios tivessem que responder ilimitadamente pelos débitos da sociedade, isso inviabilizaria um mercado no qual os investidores desconhecessem seus sócios (como no caso das sociedades por ações comercializadas na bolsa de valores), além de criar custos de informação que praticamente inviabilizariam qualquer investimento, na medida em que o investidor passivo teria que realizar uma análise exaustiva da situação econômica de todos os demais sócios de determinada companhia antes de optar por realizar qualquer investimento. Por outro lado, acreditamos que tais benefícios também seriam atingidos caso se adotasse a responsabilidade ilimitada pro rata dos sócios, e não solidária, uma vez que o investidor teria noção do valor de sua exposição e não precisaria preocupar-se com a situação financeira dos demais acionistas.

Quanto aos aspectos negativos da limitação de responsabilidade, a limitação de responsabilidade pode estimular investimentos de risco excessivo e desencorajar as sociedades a adotarem medidas de redução de riscos de seus

negócios. Além disso, a limitação parece injusta nos casos de credores involuntários, aqueles cujos créditos decorrem da responsabilização da sociedade por um ato ilícito extracontratual (“tort”). Nesses casos, os credores não tiveram a oportunidade de analisar a situação patrimonial da sociedade antes de contratá- la. Não tiveram a oportunidade de exigir garantias adicionais dos proprietários da sociedade e não assumiram voluntariamente o risco de ver seu crédito inadimplido em razão da situação econômica da pessoa jurídica.

No documento MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO (páginas 33-51)