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2 FUNDAMENTOS

2.2 A PEDAGOGIA DA PRÁXIS E O CLUBE DE CIÊNCIAS

[...] A Pedagogia da Práxis é a teoria de uma prática pedagógica que procura não esconder o conflito, a contradição, mas, ao contrário, entende-os como inerentes à existência humana, explicita-os, convive com a contradição e o conflito. Ela se inspira na dialética [...] (GADOTTI, 1994, p. 1).

Práxis é ação transformadora, e não se confunde com pragmatismo. Tem sua raiz na antropologia, que considera o ser humano incompleto, inconcluso e inacabado. Por isso, um ser criador, sujeito da história, que se transforma à medida que transforma o mundo. Toda pedagogia se refere à prática, pretende prolongar-se na prática. Não há sentido sem ela, pois é ciência da educação. Fazer pedagogia, segundo Gadotti, é fazer prática teórica por excelência. É descobrir e elaborar instrumentos de ação social. Nela se realiza, de forma essencial, a unidade entre a teoria e a prática.

Dessa forma, com base na lógica dialética, Gadotti apresenta sete categorias para se pensar uma educação para o futuro. Essas características presentes nos alunos, futuros cidadãos globais, poderão contribuir na leitura de um mundo a ser construído por cidadãos e cidadãs conscientes de seu papel social, transformadores da sociedade e, ao mesmo tempo, transformados por ela, como ser que age e interage com o mundo que se encontra em perigo. São elas:

CIDADANIA

O que implica também tratar do tema autonomia, da questão da participação, da educação para e pela cidadania. Dentro dessa categoria, discutir-se-á particularmente o significado da concepção de escola cidadã e de suas diferentes práticas. Educar para a cidadania ativa faz parte de muitas escolas e sistemas educacionais: um cidadão envolvido, participante ativo nas suas relações sociais.

PLANETARIEDADE

A Terra é um novo paradigma da educação. Dadas as atuais condições em que ela se encontra hoje, o papel da educação é proporcionar uma visão ampla de nosso planeta, ainda desconhecido. Desde os primeiros passos, é preciso buscar a preservação desse planeta em

busca de uma vida saudável. Esta pedagogia nos orienta também a olhar na perspectiva de uma Ecopedagogia1 fazendo lembrar que existem outros saberes e que, da janela do nosso quintal, é preciso enxergar o mundo.

SUSTENTABILIDADE

Trata-se de uma educação sustentável para a sobrevivência do planeta. O que seria uma cultura da sustentabilidade. É necessário que essa ―cultura sustentável‖ nos direcione no sentido de transformar o planeta de fato, com mudanças nos hábitos de vida, na produção, no consumo, nas relações com a natureza, com profundas reflexões sobre a situação planetária.

VIRTUALIDADE

Este tema implica toda a discussão atual sobre a discussão à distância e o uso dos computadores na escola e da internet. A informática associada à telefonia nos inseriu definitivamente na era da informação. A transformação da realidade também passa pelo mundo virtual.

GLOBALIZAÇÃO

O processo de globalização está mudando a política, a economia, a cultura e a história; portanto, também a educação. É um tema que deve ser visto de diferentes formas. A globalização remete ao poder local e global fundido numa mesma realidade. O estudo dessa categoria remete à necessária discussão do papel dos municípios e do regime de colaboração nas perspectivas atuais da educação básica. Por esse novo enfoque, a escola continuará sendo o principal canal de acesso às necessidades básicas de aprendizagem, mas, não o único, levando em conta outros veículos de formação, como o rádio, a televisão, clubes, bibliotecas e outras múltiplas formas de educação comunitária, formal ou não formal, com uma vasta gama de tecnologias educacionais apropriadas a essas modalidades de formação. Para pensar a educação do futuro, é preciso refletir sobre o processo de globalização da economia, da cultura e das comunicações. Promover a justiça perante o direito humano é fundamental ao acesso à educação, mas também à permanência e possibilidade de usufruir os benefícios provadores dela. Ao acessar tais informações, é preciso ter cuidado, devendo ser acompanhado de reflexões, para que não se possibilite o controle de grupos dominantes em virtude de manipular a informação como forma de dominação.

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A Ecopedagogia, ou Pedagogia da Terra, pode ser entendida como um movimento social e político. Como todo movimento novo, está em processo de construção, passando por modificações. É complexo e pode tomar diferentes direções.

TRANSDISCIPLINARIDADE

Embora com significados distintos, certas categorias como transculturalidade, transversalidade, multiculturalidade e outras como complexidade e holismo também indicam uma nova tendência na educação. É uma interação entre as disciplinas, mas de superação das fronteiras entre as ciências, sem oposição de uma ou de outra. O conceito é impreciso e ainda se encontra em formação, mas sua ambição é grande: ultrapassar o "sistema fechado" de pensamento, motivado ou por ideologias, religiões, ou por filosofias. Recompõe-se uma "unidade da cultura", engendra "uma civilização de escala planetária", que se fortalece em grande diálogo intercultural e se abre a singularidade de cada um e a integralidade do ser. Na era do conhecimento, deverá surgir também um novo aluno, sujeito da própria formação, autônomo, motivado para aprender, disciplinado, organizado, mas cidadão do mundo, solidário e, sobretudo, curioso.

DIALOGICIDADE

Não podemos negar a validade de uma pedagogia dialógica ou da práxis. Não há palavra que não seja práxis, ou que não surja da práxis. Quando pronunciamos a palavra, estamos pronunciando e transformando o mundo. Na dialogicidade estão sempre presentes as dimensões da ação e da reflexão. Ao pronunciarmos o mundo, mostramos que humanamente existimos; se existimos, agimos e modificamos o mundo dado.

Questionamos: A Pedagogia da Práxis pode ser encontrada no Clube de Ciências? Para que possamos responder a essa questão, é necessário analisar cada uma dessas categorias, conforme mostra a Figura 1.

Figura 1 – Categorias da Pedagogia da Práxis

Fonte: Elaborado pelo autor (2014).

Assim, o Clube de Ciências pode constituir uma ferramenta pedagógica para alcançar essas categorias relacionadas por Gadotti na perspectiva da Pedagogia da Práxis. Essas contribuições podem surgir na medida em que as atividades sejam desenvolvidas; portanto, como possibilidade no ensino das ciências. Nas reuniões do Clube de Ciências, durante as discussões os participantes desenvolvem atividades que necessitam de uma gama de conhecimentos, as quais estão relacionadas ao cotidiano dos alunos, ou seja, numa aproximação com a realidade deles. Promover a transformação da realidade é algo também a ser alcançado ao mesmo tempo que esse aluno contribui para as mudanças no seu meio. Por meio de suas ações, um é influenciado pelo outro.

Segundo Gadotti, a análise dessas categorias e a identificação da sua presença na pedagogia contemporânea podem constituir um grande programa educacional. O Clube de Ciências não tem o objetivo de resolver todos os problemas destacados no ensino de ciências, embora seja possível analisar suas contribuições. Em que momentos o projeto Clube de Ciências possibilita condições para que essas categorias emerjam dessa prática pedagógica? Essa é uma das questões que pretendemos discutir no fim desta pesquisa. Desse modo, preparar alunos

cidadania planetaridade sustentabilidade virtualidade globalização transdisciplinaridade dialogicidade

que atuem em nossa sociedade como cidadãos críticos, participativos, com uma visão globalizante, preparados para enfrentar as ―artimanhas do capitalismo‖, com foco na sustentabilidade, quebrando o paradigma da disciplinaridade, e construir uma visão dialógica, em que teoria e prática se juntem na práxis. Podem melhorar a interação com o mundo, suas relações sociais, com a ciência, tecnologia e o ambiente, numa visão integradora e globalizante. Brasil (2013, p. 137), ao pesquisar o potencial pedagógico da primeira Feira Estadual de Ciências e Engenharia do Espírito Santo para o desenvolvimento de uma educação CTSA nas escolas públicas estaduais, verificou que houve indícios da Pedagogia da Práxis, conforme destaca:

[...] No cenário da escola pública estadual do Espírito Santo, as práticas pedagógicas desenvolvidas nas escolas e relacionadas à realização de projetos de trabalho, que culminaram na participação dos estudantes em FCCT, favoreceram a autonomia dos envolvidos, a interdisciplinaridade, o protagonismo, o pensamento crítico e a construção de valores para além do conhecimento científico. Nesse sentido, considerando a natureza dos projetos expostos na I FECEES e a forma como foram construídos, surgiram indícios de uma educação CTSA e da Pedagogia da Práxis, ambas voltadas para uma educação pautada em questões sociais e no pensamento crítico [...] (BRASIL, p. 137).

Isso evidencia que a participação das escolas em feiras de ciências, mostras culturais e o desenvolvimento de projetos de ciências podem potencializar a construção de diversos valores na escola, bem como promover a diminuição das barreiras entre as disciplinas por meio da interdisciplinaridade, possibilitando, desse modo, uma educação pautada nas questões sociais e na criticidade. Esses projetos propõem romper a fragmentação e a rotina imposta pelo modelo disciplinar hegemônico de ensino e aprendizagem, uma vez que os espaços e os tempos escolares não favorecem a interdisciplinaridade, tampouco a contextualização por meio de projetos de trabalho.

2.3 A PEDAGOGIA DE PROJETOS: UMA DAS POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS